Acórdão nº 2131/21.4T8AMD.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelANTÓNIO MOREIRA
Data da Resolução27 de Outubro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados: JR propôs acção declarativa com processo comum contra o condomínio (representado pelos seus administradores, FS e JL), pedindo que sejam anuladas as deliberações tomadas na assembleia geral extraordinária de condóminos que teve lugar em 28/9/2021.

Citado o condomínio R., veio apresentar contestação onde, para além do mais, invoca a excepção dilatória da ilegitimidade passiva, por entender, em síntese, que são os próprios condóminos que devem ser pessoalmente demandados quando estão em causa deliberações das assembleias de condóminos, e sem prejuízo de deverem ser representados em juízo pelo administrador ou por quem a assembleia de condóminos designar para o efeito.

O A. exerceu o contraditório, sustentando a legitimidade processual do condomínio R., com a improcedência da excepção dilatória em questão.

Em audiência prévia foi proferido despacho saneador onde foi julgada procedente a excepção dilatória da ilegitimidade processual do condomínio R., com a sua absolvição da instância.

O A. recorre desta decisão final, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem: 1- O Autor recorrente intentou em Novembro de 2021 acção de anulação das deliberações da assembleia de condóminos do Prédio onde reside contra o Condomínio do mesmo prédio, representado pelos seus administradores, perfilhado o entendimento de que quem deve figurar como parte passiva nas acções de impugnação das deliberações condominiais é o condomínio e não os condóminos que votaram favoravelmente as deliberações anulandas.

2- Nesta data eram, no essencial, duas as teses em presença relativamente a quem possui legitimidade passiva para estas acções - se o condomínio representado pelo seu Administrador, como resulta da análise conjugada dos artigos 12º, al. e) do CPC, 1437º e 1436º, nº 1 al. h), fazendo apelo aos critérios interpretativos do artigo 9º nº 3, todos do CC ou se os condóminos que votaram a favoravelmente a deliberação cuja anulação se pretende, conforme artigo 1433º nº 6 do CC, cabendo a sua representação judiciária ao administrador ou à pessoa que a assembleia designar.

3- A favor de qualquer uma das teses em presença se pronunciou, vastamente, a jurisprudência e também a doutrina, havendo argumentos válidos e consistentes a abonar cada um dos entendimentos, como consta das sínteses feitas nos diversos arestos citados.

4- No entanto, à data da apresentação desta acção, já se prefigurava como entendimento maioritário aquele que considerava que - a acção de impugnação de deliberação da assembleia de condóminos deve ser instaurada contra o condomínio, por só ele ter legitimidade passiva, embora representado pelo administrador, conforme acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 04-05-2021, p.3107/19.7T8BRG.G1.S1, Relator Conselheiro Fernando Samões, proferido em sede de revista excepcional, ao abrigo do disposto no artigo 672º nº1 al. a) e b) do CPC, havendo muitos outros no mesmo sentido, quer do STJ quer da Relação de Lisboa, do Porto, Coimbra, Guimarães e Évora.

5- Na verdade, a redacção do nº 6 do artigo 1433º, anterior nº 4 do mesmo artigo na versão anterior ao DL 267/94, de 25-10, data de um período em que o Condomínio não detinha personalidade judiciária, que só lhe foi conferida pela extensão operada pelo artigo 6º al. e) do CPC, na revisão que resultou da alteração legislativa de 1995/1996, correspondendo ao actual artigo 12º al. e), alteração esta que veio permitir que o Condomínio, que representa o conjunto do condóminos, pudesse passar a ser demandado em juízo, sendo citado na pessoa do seu legal representante, o administrador, conforme artigo 231º nº 1 do CPC de 1961, actual artigo 223 nº 1 do CPC e representado em juízo pelo respectivo administrador, de acordo com o artigo 1437º CC, dispositivo que lhe atribui legitimação para agir em nome do conjunto dos condóminos.

6- Daí que, face à atribuição de personalidade judiciária ao condomínio, Miguel Mesquita, na obra citada, fale na necessidade de levar a cabo uma interpretação actualista do nº 6 do artigo 1433º do CC, e outros interpretes, em que o legislador incorreu nalguma incorrecção de expressão, dizendo menos do que queria, já que o que se visava era a entidade colectiva, o Condomínio, vinculado pelas deliberações impugnadas, devendo assim o nº 6 do artigo 1433º do CC passar a ser interpretado extensivamente, vendo nele escrito que «a representação judiciária do conjunto dos condóminos contra quem as acções são propostas», uma vez que o condomínio é o conjunto organizado dos condóminos.

7- De acordo com o artigo 12º nº 6 do CPC, o condomínio tem personalidade judiciária relativamente às acções que se inserem no âmbito dos poderes do administrador, compreendendo-se nestes poderes os de executar as deliberações da assembleia, de acordo com o artigo 1436º nº 1 al. h) do CC [actual al. i)], pelo que, por igualdade de razão, cumpre‑lhe igualmente sustentar a existência, a validade e a eficácia dessas mesmas deliberações, em representação do condomínio.

8- A deliberação tomada em assembleia de condóminos, exprime a vontade do condomínio, do grupo, e não dos condóminos individualmente considerados, assumindo autonomia própria, autónoma da vontade individual de cada um dos condóminos presentes na assembleia, sendo que a decisão judicial que a venha a anular será oponível ao condomínio, como ente colectivo.

9- Por outro lado, sendo os condóminos pessoas singulares ou colectivas, detentores de personalidade jurídica, mal se compreende que tenham que ser representados em juízo pelo administrador.

10- O entendimento que melhor serve o ordenamento jurídico é o que considera que é o condomínio parte legítima na acção de impugnação das deliberações da assembleia de condóminos, representado em juízo pelo seu administrador, porque é o que resulta da conjugação das normas que regem a propriedade horizontal e as normas processuais civis, sendo igualmente o que permite um exercício mais ágil e célere do direito de acção, valores primordiais que o processo civil não deve olvidar.

11- Este entendimento não foi posto em causa pela alteração legislativa introduzida aos artigos 1436º e 1437º do CC pela Lei nº 8/2022, 10-01, antes pelo contrário, o mesmo ficou agora consagrado na nova redacção conferida ao artigo 1437º, que visou clarificar e pôr termo à divergência doutrinal e jurisprudencial que se verificava, conforme exposição de motivos do diploma e entendimento de quem foi chamado a pronunciar-se sobre o projecto de diploma, como seja o Conselho Superior do Ministério Público, e como também já é o entendimento da jurisprudência.

12- O artigo 1437º, cuja epígrafe deixou de ser “Legitimidade do administrador” e passou a ser “Representação do condomínio em juízo”, e que entrou em vigor no dia seguinte ao da publicação da Lei, prevê expressamente a representação do condomínio em juízo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT