Acórdão nº 3107/19.7T8BRG.G1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 04 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAMÕES
Data da Resolução04 de Maio de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça – 1.ª Secção[2]: I. Relatório AA, na qualidade de condómina do prédio urbano, em propriedade horizontal, no qual se encontra instalado o Centro Comercial ................, sito na Rua ............., n.ºs ... a ..., em ......, intentou, em 3/6/2019, acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra os CONDÓMINOS, não identificados, que votaram favoravelmente a deliberação da assembleia de condóminos de ../4/2019, representados por BB, na qualidade de administradora do referido condomínio, alegando ilegalidade dessa deliberação e pedindo a anulação da mesma, nos termos e ao abrigo do disposto no art.º 1433.º, n.ºs1 e 4, do Código Civil.

Citada, a referida administradora do condomínio não apresentou contestação.

Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, onde foi julgada procedente a excepção dilatória da ilegitimidade passiva dos réus com o fundamento de que as acções de impugnação de deliberação da assembleia de condóminos devem ser propostas contra o condomínio, representado pelo respectivo administrador, e não contra os condóminos, individualmente considerados, que aprovarem a deliberação impugnanda. Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação que o Tribunal da Relação de Guimarães julgou improcedente, por unanimidade e com idêntica fundamentação, mantendo a decisão recorrida.

Ainda irresignada, a autora interpôs recurso de revista excepcional, ao abrigo do disposto no art.º 672.º, n.º 1, als. a) e b) do CPC, sustentando, no essencial, a tese de que, segundo o preceituado no art.º 1433.º, n.º 6, do Código Civil, as acções nele previstas, como a presente, devem ser propostas contra os condóminos que votaram favoravelmente a deliberação impugnada, representados pelo administrador do condomínio, convocando vários arestos dos Tribunais Superiores em que assim foi entendido.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Por acórdão de 13/10/2020, a Formação admitiu a revista excepcional assim interposta, considerando verificados os pressupostos invocados, pois que estamos perante uma “questão jurídica essencial em relação à qual profunda divergência jurisprudencial existente justifica ainda uma insistente intervenção clarificadora por parte deste Supremo Tribunal, em ordem a potenciar, tanto quanto possível, uma adequada sedimentação do critério decisório e a proporcionar um maior nível de segurança jurídica nas relações condominiais”.

A recorrente apresentou a sua alegação com as seguintes conclusões (expurgadas da matéria referente à admissibilidade da revista excepcional, das repetições das alegações, e das decisões impugnadas, com citações jurisprudenciais, e da extensão, que nada têm de sintético, em manifesto incumprimento do preceituado no art.º 639.º, n.º 1, do CPC, pelo que não se reproduzem aqui): “… XI - Conforme se pode ler no douto Acórdão recorrido (aliás, como já o dizia também a douta sentença de 1ª instância), existem, quanto a esta questão jurídica concreta, ora em apreço, duas correntes de entendimento, duas "escolas" de pensamento.

XII - Salvo o devido respeito, e fazendo-se valer dos argumentos da doutrina e da jurisprudência que dão eco e suporte à construção que a recorrente deu à acção na sua petição inicial, a mesma (recorrente) entende que configurou correctamente a acção, demandando quem devia demandar; XIII - E não olvidou nem se cansou de alegar e fundamentar, em vários pontos da sua petição, as razões de facto pelas quais se viu forçada, por acção ---ou melhor, por omissão--- da administração de condomínio, a demandar condóminos de cuja identificação não dispunha nem podia dispor; XIV - Nem de invocar a "rigidez" formal dos formulários eletrónicos disponíveis, a cuja programação e ou formatação a recorrente é, obviamente, alheia.

XV - E o entendimento da ora recorrente radica em duas ordens de razões: em primeiro lugar, no elemento literal da norma jurídica em apreço.

XVI - Com efeito, o artº 1433º, do Código Civil, mormente no seu nº 6, diz expressamente "condóminos contra quem são propostas as acções".

XVII - Em segundo lugar, num factor lógico: no entendimento da recorrente, só fará sentido que o condómino que pretenda impugnar uma deliberação da assembleia, o faça contra seus outros condóminos; e não demandar o condomínio de que ele próprio faz parte, sob pena de, além dos demais condóminos, estar a demandar-se também ... a ele próprio !!! Salvo o devido respeito, no entendimento da recorrente, esta última solução não será lógica.

XVIII - Como já anteriormente foi referido nos presentes autos (douta sentença 1ª instância) ---trecho de que aqui ora se faz eco, por consubstanciar o entendimento da ora recorrente---, "para uns, a ação deve ser intentada contra os condóminos que votaram favoravelmente as deliberações impugnadas, entendimento defendido pela autora (...), e acompanhando, entre outros, nos seguintes acórdãos: ….

Para outros, tais ações devem ser intentadas contra o condomínio representado pelo seu administrador, em especial nos casos em que a ação se funda em irregularidades procedimentais, como é o caso em apreço. Neste sentido, veja-se, entre outros, os seguintes acórdãos: … XIX - Conforme a ora recorrente alegou suficientemente na precedente apelação ---e, bem assim, na sua petição inicial---, é condómina no prédio… XX - O condomínio do identificado centro comercial (Centro Comercial ................) é administrado por BB, NIF ............., residente na Praça ...................., nº .. -........, ......, ....-... .......

XXI - Em 4 de abril de 2019, teve lugar uma assembleia de condóminos; XXII - Com a seguinte ordem de trabalhos: 1. Apreciação e votação do relatório de atividade e contas do exercício de 2018.

  1. Eleição da entidade administradora para o exercício de 2019.

  2. Apreciação e votação do orçamento para o exercício de 2019.

  3. Outros assuntos de interesse comum.

    XXIII - A recorrente fez-se representar, na assembleia de condóminos de 04 de abril de 2019, por procurador, seu Pai, CC; tendo votado desfavoravelmente (voto "contra") todos os pontos da ordem de trabalho submetidos à votação da assembleia.

    XXIV - Sucede que a referida assembleia de condóminos e respectiva(s) deliberação(ões) e ata, enfermam de vários vícios, formais e substantivos (ou materiais), que insanavelmente atingem a sua validade e eficácia e, assim, as torna(m) anuláveis.

    XXV - A saber: - A convocatória NÃO veio acompanhada de qualquer documento de suporte, ou informação, que permitisse aos condóminos ---ao que ao caso importa, à recorrente--- a prévia, adequada e necessária apreciação dos assuntos constantes da ordem de trabalhos.

    XXVI - A ata de reunião (rectius: assembleia) de condóminos, não foi redigida no acto (isto é, até ao final da reunião); nem sequer por apontamento ---o que pode levar a (ou, pelo menos, permite) alterações por parte da administração, sem conhecimento dos condóminos; sendo que nem tudo o que é declarado ou reclamado pelos condóminos é reduzido a escrito e vertido para as atas.

    XXVII - A ata não foi assinada pelos próprios condóminos no ato (reunião ou assembleia); apenas tendo sido assinada uma folha de presença, mas que (referida folha de presenças) não pode servir para fundamentar ou validar a respectiva ata.

    XXVIII - Conforme já aconteceu em anteriores assembleias de condóminos, as atas são enviadas aos condóminos após um mês (ou mesmo mais) da data da reunião; para que estes não possam exercer, dentro dos prazos legais, o direito de se opor ou impugnar as mesmas, ou de exercer quaisquer outros direitos conferidos pela lei aos condóminos ---como, de resto, acontece com a ata da referida reunião de 04 de abril de 2019; sendo que, até à presente data, a recorrente não tem cópia da mesma e desconhece o respetivo conteúdo. O que igualmente se invoca, para todos os legais efeitos.

    XXIX - Sendo que a propósito da legitimidade passiva, a própria recorrente alegou na apelação ---tal como, aliás, já havia aduzido na sua petição inicial---, que: (segue-se a citação de dois acórdãos com transcrição dos respectivos sumários).

    … XXX - Nesta conformidade, a recorrente peticionou que a ação fosse julgada inteiramente procedente, por provada, e, consequentemente, fosse decretada a anulação, nos termos e ao abrigo do disposto no artº 1433º, nºs 1 e 4, do Cód. Civil, da deliberação da assembleia de condóminos de .. de abril de 2019; e, bem assim, serem os Réus condenados nas custas, e tudo o mais que for devido.

    XXXI - Tendo requerido que a Administradora do Condomínio fosse citada para, em representação dos condóminos que aprovaram a deliberação da assembleia de 04 de abril de 2019, sob a cominação e no prazo legais, querendo, contestar, seguindo-se os ulteriores termos até final.

    XXXII - Por zelo e diligência, formulou expressamente os requerimentos de que, ao abrigo do disposto no art. 1433º, nº 6 do C. Civil, requer a CITAÇÃO de todos os réus apenas na pessoa da administradora, BB, NIF ............., residente na Praça ...................., nº .. - ........, ......., ....-... ......; e que, no acto de...

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