Acórdão nº 691/22 de Tribunal Constitucional (Port, 20 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelCons. António José da Ascensão Ramos
Data da Resolução20 de Outubro de 2022
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 691/2022

Processo n.º 860/2022

2.ª Secção

Relator: Conselheiro António José da Ascensão Ramos

Acordam, em Conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. A. e B. interpuseram recurso, para o Tribunal da Relação de Lisboa, da decisão de 1.ª instância que condenara cada um dos arguidos pela prática de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.º 1, alínea d) e n.º 2, do Código Penal, na pena, respetivamente de três e quatro anos de prisão, cuja execução foi suspensa pelo período de três anos quanto à primeira arguida, e de quatro anos de prisão, quanto ao segundo arguido, sujeitas a regime de prova (cf. fls. 1-19).

Por acórdão datado de 27 de janeiro de 2022, aquele Tribunal concedeu provimento parcial ao recurso, com fundamento na valoração de prova proibida e determinou a prolação de nova sentença (cf. fls. 20-32). Nessa sequência, foi proferida, em 1.ª instância, nova decisão condenatória, datada de 30 de março de 2022 (cf. fls. 33-50).

Notificados desta decisão, os arguidos apresentaram novo recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, que, em 3 de agosto de 2022, o julgou parcialmente procedente, reduzindo a pena aplicada à arguida para dois anos de prisão e para dois anos e seis meses quanto ao arguido, ambas suspensas na sua execução, sujeitas a regime de prova (cf. fls. 76-97).

2. Os arguidos vieram então interpor recurso para o Tribunal Constitucional, delimitando o respetivo objeto nos seguintes termos (cf. fls. 99):

«1. Após a prolação do Ac. desta Relação de 27 de Janeiro de 2022, foi proferida decisão pelo Tribunal de 1.ª instância que, em resumo, deu cumprimento (apenas) formal ao determinado naquela decisão.

Com efeito,

2. O Tribunal de 1.ª Instância limitou-se a retirar do texto da decisão a prova que foi considerada proibida, mantendo em tudo o mais a decisão sob censura.

3. Dessa decisão, foi interposto recurso no qual os recorrentes alegaram que o cumprimento do determinado pelo Ac. da Relação de Lisboa de 27 de Janeiro de 2022 foi apenas de carácter formal uma vez que a prova dos factos dados por assentes [alíneas i) a p) da decisão de 1.ª Instância] é decalcada das declarações produzidas pelos recorrentes perante o Tribunal de Família e Menores de Lisboa que foi considerada prova proibida por violação do direito à não auto-incriminação, nemo tenetur se ipsum accusare.

4. O Acórdão ora produzido e de que se pretende recorrer, datado de 3 de Agosto de 2022, desconsiderou essa alegação - que consta do texto do recurso e das conclusões (cfr., designadamente/conclusões XVI. a XXV. e XLVIII.) - o que, do ponto de vista dos recorrentes constituí também violação do já aludido princípio e, em consequência, do artigo 32.º, n.º 1 da CRP.

5. Tal questão foi devidamente elencada no recurso apresentado.

6. Atendendo às regras processuais penais, não é permitido recurso ordinário do Acórdão de 3 de Agosto de 2022.

7. Assim e pelo exposto, ao abrigo dos artigos 280.º, n.º 1, alínea b) da CRP e dos artigos 70.º, n. 1, alínea b), 72.º, n.º 1, alínea b) e 2 da da Lei 28/82, de 15 de Novembro (na última redacção introduzida pela Lei Orgânica 1/2022 de 4 de Janeiro), requerem a Vossa Excelência que se digne admitir o presente recurso, seguinte os demais termos previstos na já citada Lei 28/82.»

3. Por despacho proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 17 de agosto de 2022, não foi admitido o recurso, com os seguintes fundamentos (cf. fls. 100-101):

«(…)

Com efeito, nos termos do disposto no art.º 72.º, n.º 2, da LCT, “Os recursos previstos nas alíneas b) e f) do n.º 1 do artigo 70.º só podem ser interpostos pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade ou da ilegalidade de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer.”

Questões de inconstitucionalidade normativa não se confundem com questões de inconstitucionalidade diretamente imputadas à decisão recorrida.

No caso destes autos, nas suas alegações de recurso para o TRL, os recorrentes limitam-se a referir, entre o mais, que:

“35. Serve isto por dizer que até ao julgamento que se iniciou em 23/03/2021, pouco ou nada foi acrescentado ã investigação, pelo que não se compreende nem se pode aceitar tal demora que colide frontalmente com os direitos do ofendido e dos arguidos, por violação do princípio constitucional de julgamento em prazo razoável (cfr. artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa).

85. Para além do já deliberado por esta Relação, reitera-se que o aproveitamento de tais declarações pelo Tribunal a quo constituí uma violação do princípio nemo tenetur se ipsum accusare que consta do artigo 32.º, n.º 1 da CRP, e vertido no 356.º do CPP, tal como...

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