Acórdão nº 64/16.5GCBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 26 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelARMANDO AZEVEDO
Data da Resolução26 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os juízes que constituem a Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães: I- RELATÓRIO 1.

No processo comum, com intervenção de tribunal singular nº 166/20.3PBBGC, do Tribunal Judicial a Comarca de Bragança, Juízo Local Criminal de Braga – J2, em que é arguido S. M.

, com os demais sinais nos autos, por despacho datado de 16.02.2022, foi decidido revogar a pena de substituição de suspensão da execução da pena de 2 anos e 8 meses de prisão aplicada ao referido arguido, tendo-se ordenado o consequente cumprimento da pena.

  1. Não se conformando com tal decisão, dela interpôs recurso o arguido, extraindo da respetiva motivação, as seguintes conclusões (transcrição integral (1)): I - Por sentença proferida e transitada em julgado em 21 de fevereiro de 2018 foi o arguido S. M. condenado “como autor material de um crime de extorsão, p. e p.p. artº 223.º, n.º 1) do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão, suspensa na sua execução, pelo período de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses, com regime de prova e subordinada aos seguintes deveres e regras de conduta: - Proibição de contactar, por qualquer forma, com a assistente M. R.; - Abster-se de publicar ou divulgar, por qualquer meio, fotografias ou imagens da ofendida M. R.; - Pagar à ofendida, no período da suspensão, e por conta da indemnização em que vai condenado em sede de indemnização civil: a quantia de €8.000,00 (oito mil euros), em 31 (trinta e uma) prestações, sendo a primeira, no valor de €500,00 (quinhentos euros), no prazo de dois meses, após o trânsito em julgado da sentença; e as restantes 30 (trinta) prestações mensais, iguais e sucessivas, cada uma no valor de €250,00 (duzentos e cinquenta euros), vencendo-se a primeira destas 30 prestações, no prazo de três meses após o trânsito da sentença e as restantes em igual dia dos meses subsequentes. (…)” II - Por douto despacho proferido em 16 de fevereiro de 2022, notificado ao arguido em 25 de fevereiro de 2022, foi decidido que “nos termos do disposto no art. 56.º, n.º 1, a) e n.º 2, Código Penal, revogo a suspensão da Execução da pena de 2 (dois) anos e 8 (oito) meses de prisão em que o arguido S. M. foi condenado nestes autos e determino o cumprimento efetivo daquela pena de prisão”, não podendo o arguido se conformar com o mesmo.

    III - Em primeiro lugar, com o devido respeito, que é muito, o despacho recorrido contém lapso, uma vez que do mesmo resulta que “Compulsados os autos, verificamos que o arguido praticou, durante o período da pena, cinco crimes de roubo e furto, designadamente qualificados, tendo sido condenado em penas de prisão efetiva”, o que não resulta do certificado de registo criminal junto aos autos em 03/02/2022, o que deve ser retificado.

    IV - Em segundo lugar, o despacho recorrido é nulo por ter sido determinada a revogação da suspensão da execução da pena de prisão sem audição prévia e presencial do arguido/Recorrente, nos termos do disposto na al. c) do artigo 119.º do Código de Processo Penal em conjugação com o n.º 2 do artigo 495.º do Código de Processo Penal.

    V - Resulta dos autos que o tribunal recorrido procedeu à marcação de audição do arguido nos termos do disposto no artigo 495.º, n.º 2 do Código de Processo Pena, que o arguido faltou à mesma, no entanto não resulta dos autos que tivessem sido encetadas todas as diligências possíveis para fazer comparecer o arguido e ouvi-lo, tendo em conta o superior comando da “audição da presença”, uma vez que poderia ter sido perspetivado a emissão de mandados de detenção para a comparência do mesmo, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 116.º do Código de Processo Penal.

    VI - Na situação em apreço, não foram encetadas, com o devido respeito, todas as diligências para a audição presencial do arguido/Recorrente antes de ter sido proferido o despacho recorrido, o que determina que se esteja perante uma nulidade insanável, nos termos do disposto na al. c) do artigo 119.º do Código de Processo Penal, cuja nulidade expressamente se argui para todos os devidos efeitos legais (cfr., nesse sentido, Ac. Do TRC, de 09 de setembro de 2015, processo n.º 83/10.5PAVNO.E1.C1, in www.dgsi.pt).

    VII - Pelo exposto, o Despacho Recorrido é nulo nos termos da al. c) do artigo 119.º do Código de Processo Penal, devendo o despacho recorrido ser revogado e substituído por outro que diligencie pela audição presencial do arguido/Recorrente nos termos do disposto no artigo 495.º, n.º 2 do Código de Processo Penal.

    VIII - Caso assim não se entenda, em terceiro lugar, o Tribunal Recorrido ao proferir despacho a revogar a suspensão da execução da pena de prisão de dois anos e oito meses em que foi condenado nos autos e determinado o cumprimento efetivo daquela pena de prisão incorreu na violação dos artigos 40.º, 55.º, 56.º, n.º 1 al. a), bem como deveria ter procedido à aplicação do disposto no artigo 57.º do Código Penal.

    IX - O Recorrente não pode de todo concordar com o despacho recorrido, uma vez que não houve qualquer culpa ou violação grosseira do dever imposto nos autos que fundamente a revogação da suspensão da execução pena de prisão.

    X - Dos artigos 55.º e 56.º do Código Penal afere-se que qualquer alteração à suspensão da execução da pena, por violação dos deveres ou regras de conduta impostas na sentença, pressupõe a culpa no não cumprimento da obrigação e, no caso de revogação, a culpa há-de ser grosseira. Sendo que, a revogação da suspensão da execução da pena de prisão não é um efeito automático decorrente do incumprimento dos deveres ou condições impostas ao arguido no momento da suspensão da pena e a jurisprudência dos tribunais superiores tem considerado que a apreciação sobre a falta de cumprimento dos deveres impostos em sentença como condicionante da suspensão da execução da pena deve ser cuidada e criteriosa e apenas uma falta grosseira determina a revogação.

    XI - Acontece que, in casu, não se mostra verificada qualquer culpa do arguido/Recorrente que fundamente a revogação da suspensão da execução da pena de prisão, pois a prova junta aos autos não foi toda analisada, no sentido de se verificar que o arguido/Recorrente não dispunha de condições económicas para proceder ao pagamento à ofendida do montante de €8.000,00 (oito mil euros).

    XII - Nos presentes autos foi homologado o plano de readaptação social, o qual foi elaborado pela DGRSP, cujo plano o arguido/Recorrente foi cumprindo, com exceção do pagamento à ofendida pelo facto de não dispor de condições económicas para o efeito.

    XIII - O arguido/Recorrente, ao contrário do constante no despacho recorrido, manifestou vontade de cumprir, justificou a falta de pagamento, ao longo do período da suspensão foi colaborando, demonstrando ao tribunal que se encontrava desempregado, onde realizava trabalhos esporádicos e beneficiava da ajuda dos pais, bem como demonstrou, ao longo do tempo, conforme também decorre do despacho recorrido, vontade em cumprir com a obrigação de pagar à ofendida o montante de €8.000,00, (oito mil euros) pois através dos vários requerimentos apresentados nos autos foi requerendo prazos para o efeito.

    XIV - Contudo, apesar da boa vontade do arguido/Recorrente, que é efetivamente muita, o mesmo não conseguiu arranjar emprego e o pouco trabalho esporádico que tinha servia para face às suas despesas, para a sua condigna sobrevivência, o que se encontra a ser ignorado pelo tribunal recorrido.

    XV - Acresce que, foram efetuadas diligências pelo tribunal recorrido para verificar das condições económicas do arguido, onde se verifica que junto da Autoridade Tributária e Aduaneira o mesmo não dispunha de rendimentos, nem de bem imóveis (conforme ofício junto aos autos em 15 de maio de 2021) e junto do Instituto da Segurança Social que o arguido não apresenta registo de remunerações, assim como não se encontra a receber qualquer subsídio ou pensão (conforme oficio junto aos autos em 17 de maio de 2021).

    XVI - Solicitadas informações pelo tribunal recorrido às instituições bancárias vieram a mesma corroborar a falta de rendimentos do arguido/Recorrente, conforme resulta dos ofícios da Caixa ..., datados de 02 de junho de 2021 e 07 de junho de 2021, do ofício da Caixa …, datado de 01 de julho de 2021, do ofício do Banco …, datado de 01 de outubro de 2021, transcrito na motivação do presente recurso, o que se dá aqui reproduzido para todos os devidos efeitos legais.

    XVII - Atentas as diversas declarações do arguido/Recorrente, de que o mesmo está desempregado, conjugado com a prova documental junta aos autos, resulta de forma evidente que é por culpa não imputável ao arguido que o mesmo não conseguiu pagar à ofendida o montante de 8.000,00€ (oito mil euros) e o facto de constar em nome do arguido um motociclo não pode ser valorado pelo tribunal, pois o tribunal recorrido não ouviu o arguido, não encetou todas as diligências para o mesmo esclarecer o tribunal de todas as circunstâncias quanto ao seu incumprimento, nem as circunstâncias de como o motociclo ficou em seu nome.

    XVIII - Não se pode concluir, por ser despropositado, desproporcionado, injusto e irrazoável, com o devido respeito, que é muito, mas perante todo o circunstancialismo que os autos revelam, que o incumprimento pelo pagamento da obrigação à ofendia se traduziu numa violação grosseira da sua obrigação pelo Recorrente, até porque dos autos nem sequer existe qualquer factualidade que permita concluir que o Arguido/Recorrente, por culpa que lhe fosse imputável, tenha agravado o seu estado financeiro...

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