Acórdão nº 620/12.0TACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 29 de Junho de 2022
Magistrado Responsável | ROSA PINTO |
Data da Resolução | 29 de Junho de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Decisão Sumária (artigo 417.º, n.º 6, alínea c), do Código de Processo Penal) A – Relatório 1.
Pela Comarca de Coimbra (Juízo Central Criminal de Coimbra – Juiz 2), sob acusação do Ministério Público, pelos crimes de tráfico de pessoas, previsto e punido pelos artigos 26º e 160º, nº 1, alíneas a) e b) do Código Penal e de falsificação de documentos, previsto e punido pelos artigos 255º, alínea a), e 256º, nº 1, alíneas a), c), d), e) e f), ambos do mesmo diploma legal, foi submetido a julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, o arguido AA, filho de AA e de BB, nascido a .../.../1960, ..., ..., casado, empresário da construção civil, residente na Rua ..., ..., ..., ..., actualmente em cumprimento de pena de prisão efectiva no EP ....
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O Ministério Público requereu, ao abrigo do disposto no artigo 111º, nºs 2 e 4, do Código Penal, que o arguido fosse condenado a pagar ao Estado o montante correspondente às vantagens obtidas através dos factos ilícitos típicos descritos na acusação e de que se apropriou ilegitimamente, no montante global de 40.970,00 euros.
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Realizada a audiência de julgamento, foi proferido acórdão, a 15.3.2022, decidindo-se: “A)- absolver o arguido AA da prática do imputado crime de tráfico de pessoas, previsto e punido pelo artigo 160º, n.º 1, alíneas a) e b) do Código Penal; B)-condenar o arguido AA pela prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de falsificação de documentos, previsto e punido pelos artigos 255º, alínea a) e 256º, n.º 1, alíneas a), c), d), e) e f), todos do Código Penal, na pena de trezentos dias de multa à taxa diária de oito euros, o que perfaz o montante de 2.400,00 euros (dois mil e quatrocentos euros), ou caso não efectue o pagamento da multa, terá que cumprir duzentos dias de prisão subsidiária, nos termos do artigo 49º, do Código Penal; C)- condenar o arguido AA no pagamento de cinco UC’s de taxa de justiça e demais encargos, nos termos conjugados dos artigos 513º, nºs 1, 2 e 3 e 514º, nº 1, ambos do Código de Processo Penal e artigo 8º, nº 9, do RCP e tabela III; D) - absolver o arguido AA da “perda de vantagens” peticionada pelo Ministério Público e, por isso, não o condenar no pagamento de qualquer quantia ao Estado”.
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Inconformado com o douto acórdão, veio o Ministério Público interpor recurso do mesmo, terminando a motivação com as seguintes conclusões: “1ª O douto acórdão proferido nos presentes autos a 15.03.2022 condenou o arguido AA na pena de multa de 300 dias, à taxa diária de €8,00, pela prática de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelos arts. 255º-a) e 256º-1-a)-c)-d)-e)-f), ambos do Código Penal.
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Consideramos, com o devido respeito, que tal opção pela pena de multa se mostra errada e desajustada, tendo em conta as evidentes e agudas exigências de prevenção geral, bem como de prevenção especial, o que, desde logo, resulta do extenso passado criminal do arguido, actualmente em cumprimento de pena de prisão efectiva no EP ....
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Do seu certificado de registo criminal resulta a prática, pelo arguido e após contabilização total, de 1 crime de furto qualificado, 1 crime de falsificação de documento, 1 crime de desobediência, 3 crimes de emissão de cheque sem provisão, 4 crimes de abuso de confiança fiscal e 3 crimes de abuso de confiança contra a Segurança Social.
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Dos factos provados resulta que o arguido se ausentou de Portugal em 2007, apenas regressando em finais de 2017, bem como que o arguido foi declarado contumaz a 06.06.2017, situação que perdurou até 06.10.2021, data em que foi detido e prestou TIR nos autos, logo iniciando o cumprimento de pena de prisão pendente noutro processo.
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Esse período de ausência do arguido, para parte incerta, ocorreu quando sobre este impendiam diversos processos judiciais e condenações transitadas em julgado, sendo que, por força do seu alheamento, diversas penas foram declaradas extintas por efeito da prescrição, bem como viu revogada a suspensão de execução de pena de prisão determinada no processo identificado no facto provado 68.4, e revogada a substituição da pena de prisão no processo identificado no facto provado 68.12.
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O Tribunal a quo, sem esmiúçar as concretas exigências de prevenção geral e especial presentes in casu e após referência tímida ao percurso criminal e de vida do arguido, o qual desvalorizou, concluiu, de modo singelo e contraditório, em face da factualidade dada como provada, que a pena de multa, no caso concreto, ainda é suficiente para acautelar as finalidades da punição.
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Tal escolha violou, de modo evidente, o disposto no art. 70º do Código Penal.
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Perante os antecedentes criminais do arguido, reveladores da sua personalidade desviante e desafiadora dos valores comunitariamente aceites pela sociedade, impõe-se condená-lo em pena de prisão a título de pena principal, por a pena de multa se mostrar completamente insuficiente, desajustada e ineficaz.
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Ao assim decidir, o Tribunal a quo procedeu a uma deficiente interpretação do critério norteador para a escolha da pena principal, tendo assim violado o disposto nos arts. 70º e 256º-1, ambos do CP”.
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Na sequência do acórdão proferido, o arguido vem apresentar requerimento peticionando que seja declarada a prescrição do procedimento criminal relativo ao crime de falsificação de documento, ordenando-se o consequente arquivamento dos autos.
Alega, em síntese, que ao referido crime corresponde um prazo de prescrição de 5 anos, nos termos do artigo 118º, nº 1, alínea c), do Código Penal; o último facto é de 14.2.2012; o arguido foi declarado contumaz em 6 de junho de 2017 e inexistem quaisquer outras causas de suspensão ou interrupção da prescrição até àquela data; resulta daqui que o procedimento criminal quanto a este crime prescreveu no dia 14 de Fevereiro de 2017.
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Após contraditório ao M.P., foi proferido despacho a 23.5.2022, indeferindo o requerido, não tendo sido declarada a extinção do procedimento criminal relativo ao crime de falsificação de documento, por não se verificar a prescrição do procedimento criminal. Em suma, entende o tribunal a quo que ocorreu a interrupção da prescrição com a dedução da acusação pública a 11.1.2017, na qual AA adquiriu a qualidade de arguido.
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Inconformado com o douto despacho, veio o arguido interpor recurso do mesmo, terminando a motivação com as seguintes conclusões: “1- O Meritíssimo Juiz a quo errou, quando, por douto despacho datado de 23/5/2022, considerou não prescrito o procedimento criminal relativo ao crime de falsificação de documento.
2- Contrariamente ao que decorre daquele despacho, a dedução da acusação não conduz à constituição de arguido exigida pelo artigo 121º, nº 1, alínea a), do Código Penal, por força do estabelecido no artigo 57º, nº 1, do mesmo código.
3- A assunção da qualidade de arguido decorrente da dedução da acusação (artº 57 nº 1 CPP) só relevará para efeitos de interrupção da prescrição quando aquela for notificada ao arguido.
4- A interrupção da prescrição tem como fundamento a existência de atos processuais que, ocorridos com normalidade, levam ao conhecimento do arguido a vontade de exercício da acção punitiva do Estado, como seja um ato de notificação ao arguido: da constituição como arguido (alínea a. do art. 121 CP); da acusação ou da decisão instrutória (alínea b. do artº 121º do CP); para se apresentar, sendo que esta é feita editalmente (alínea c. do artº 121º do CP ) e, por último, a notificação do despacho que designa dia para a audiência na ausência do arguido ( alínea d. do artº 121 do CP).
5- Só com a constituição solene, formal, de arguido, nas precisas circunstâncias exigidas pelos artigos 58.º e 59.º do CPP, o arguido pode tomar conhecimento da pretensão do Estado em exercer a ação penal.
6- Por tal motivo, cremos não fazer sentido, nem ter qualquer apoio jurisprudencial ou sequer doutrinário, a perspetiva dada pelo tribunal recorrido de que a prescrição se interrompe com a atividade do estado no desenvolvimento da ação de perseguir determinada pessoa contra quem está instaurado o respetivo procedimento criminal, independentemente de este ser notificado de tal esforço.
7- É pois manifesto que a interpretação do tribunal recorrido, plasmado na decisão de que se recorre, viola frontalmente do disposto na al. a) do nº 1 do artigo 121º do CPP e que o tribunal a quo faz uma errónea interpretação da referida norma.
8- Tendo o último ato pelo qual o arguido foi acusado e condenado, ocorrido em 14/02/2012, não se tendo verificado até 14/02/2017 qualquer causa de suspensão ou interrupção da prescrição, o procedimento criminal pelo crime de falsificação de documento encontra-se prescrito desde esta última data, nos termos conjugados da alínea c) do nº 1 do artigo 118º e nº 1 do artigo 256º, ambos do CP.
9- Sustentam as conclusões acima expendidas, para além de outros, os seguintes: a) Acórdão do TR... proferido no processo 1405/02...., 18-10-2006; b) Acórdão do TR... proferido no processo 370/08...., de 09/09/2012; c) Acórdão do TR... proferido no processo 27/08...., de 14/1/2010; Normas violadas: - Artigos 57º, 58º e 59º do CP - Alínea c) do nº 1 do artigo 118º do CP.
- Alínea a) do nº 1 do artigo 121º do CP.
Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente, ordenando … o arquivamento dos autos decorrente da extinção do procedimento criminal por prescrição”.
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O Ministério Público respondeu ao recurso interposto pelo arguido, pugnando pela sua improcedência e confirmação do despacho recorrido, alegando, em síntese, que: - Quanto ao crime de falsificação de documento em causa (art. 256º-1 do CP), o prazo prescricional do respectivo procedimento criminal (que, in casu, é de 5 anos) iniciou-se a 14.02.2012 (facto provado nº59).
- Ocorreu, a 11.01.2017, causa de interrupção do prazo de prescrição do procedimento criminal com a dedução da acusação pública (enquanto manifestação expressa do jus puniendi), onde o denunciado AA adquiriu a qualidade de arguido, passando a...
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