Acórdão nº 232/15.7GEACB-D.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução15 de Junho de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

I - Relatório 1.1.

O Ministério Público interpôs recurso do despacho sentença proferida pelo Juízo Local Criminal ..., do Tribunal Judicial da Comarca ..., que indeferiu o requerimento do arguido a solicitar o pagamento em prestações de multa que lhe fora aplicada nos autos como pena principal, tendo determinado a conversão daquela pena de multa em prisão subsidiária por considerar que o requerimento apresentado pelo arguido era extemporâneo, considerando o recorrente que aquele requerimento do arguido – face ao contexto dos autos – deveria ter sido interpretado ou avaliado como princípio de prova de falta de culpabilidade do arguido no não pagamento, de forma a permitir a suspensão da prisão subsidiária.

1.2.

No recurso em apreciação o Ministério Público apresentou as seguintes conclusões: 1. Decorre do artigo 49.º, n.º 3, do Código Penal, lido conjuntamente com o prescrito pelo artigo 491.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, que compete ao arguido requerer, se o Ministério Público o não fizer, a suspensão da prisão subsidiária, provando que a razão do não pagamento da multa lhe não é imputável.

2. Todavia, no caso concreto, julgando equivocadamente que ainda se encontrava em tempo de requerer o pagamento da pena de multa em que foi condenado, o arguido alegou, através do requerimento que apresentou a 04-03-2021, que apenas se encontra empregado desde 08-02-2021 – tendo feito juntar o respectivo contrato de trabalho -, o que, face ao teor do requerimento que apresentou 23-01-2020, em que alega que iria ter ajuda de terceiros para pagar tal pena de multa, porque se encontrava desempregado, aliado às pesquisas nas bases de dados disponíveis, permite o juízo de que nunca deixou de estar desempregado.

3. Mais, no sobredito requerimento que apresentou 23-01-2020, o arguido referiu que, por não auferir rendimentos, iria ter “ajuda de terceiros” para proceder ao pagamento da pena de multa, o que, face ao teor literal do seu mais recente requerimento remetido aos autos, permite o juízo indiciário de que, mesmo a ter recebido tal ajuda, ela não tenha sido suficiente para obstar à impossibilidade de pagamento da pena de multa ou que, em última instância, ela não tenha sequer sido providenciada ao arguido.

4. Ora, no despacho recorrido, ao fazer consignar que, face ao mais recente requerimento do arguido, não se vislumbra que exista um princípio de prova do pressuposto da suspensão da execução da prisão subsidiária, o Tribunal a quo parte do princípio de que o arguido, por ter requerido, num primeiro momento, a substituição da multa em que foi condenado por trabalho a favor da comunidade e depois revertido tal pedido porque iria ter “ajuda de terceiros”, deixou de poder gozar da possibilidade da não culpabilidade quanto ao não pagamento da pena de multa, uma vez que naquele segundo momento afirmou ter meios para a pagar.

5. Em bom rigor, tal interpretação, tendo por base a alegação do arguido de que havia recebido “ajuda de terceiros” (ainda que no mesmo momento tenha referido que não auferia quaisquer rendimentos), é insensível, não só ao alegado, mas também ao esforço probatório trazido aos autos pelo arguido, que logrou provar que apenas começou a trabalhar na data que referiu no seu requerimento, e ignora todas as vicissitudes que sempre podem ocorrer nas dinâmicas interpessoais, naturalmente mais acentuadas durante um período de crise sanitária e, por arrastamento, económica, como a que vivemos.

6. Em face do exposto, entende o Ministério Público que, pelo menos, indiciariamente o arguido demonstrou que o não cumprimento da pena de multa em que foi condenado lhe não é imputável, reputando-se, portanto, ilegal o raciocínio vertido no despacho recorrido, em confronto com o disposto no artigo 49.º, n.º 3, do Código Penal.

7. Pois bem, tendo em conta que o alegado pelo arguido relativamente à sua situação económica é susceptível de fundar um juízo de não culpabilidade quanto ao não pagamento da pena de multa, deve o Tribunal cuidar de saber se a concreta situação económica e financeira do arguido justificava ou não a falta de pagamento da multa em que foi condenado.

8. Em face do exposto, o Ministério Público pugna pela revogação do despacho recorrido e a sua substituição por outro que, para efeitos do disposto no artigo 49.º, n.º 3, do Código Penal, se solicite à Direcção-Geral de Reinserção e Serviços Prisionais a elaboração de breve informação acerca da situação económica do arguido, devendo tal informação conter os deveres ou regras de conduta de conteúdo não económico ou financeiro a cumprir pelo mesmo, em caso de eventual suspensão da prisão subsidiária.

1.3.

O arguido não respondeu ao recurso.

1.4.

No parecer a que alude o art. 416º, n.º 1, do Código de Processo Penal, o Ministério Público junto ao Tribunal da Relação emitiu parecer no sentido de ser julgado procedente o recurso, concordando genericamente com a posição do recorrente.

*** II - Fundamentação de Facto A - (Transcrição do despacho sob recurso) O arguido foi condenado, por sentença transitada em julgado em 14.10.2019 na pena de 150 dias de multa, à taxa diária de €6,00.

O arguido requereu a substituição por trabalho da multa por trabalho, que veio a ser deferida.

Porém, em 23.01.2020 o arguido requereu que lhe fosse autorizado o pagamento da pena de multa, por ter “recebido ajuda de terceiros”, o que foi deferido, sem que o arguido tenha procedido ao pagamento.

Foi instaurada execução para cobrança coerciva da pena de multa, sem que se tenha logrado a cobrança de qualquer quantia.

Notificado para se pronunciar sobre a eventual conversão da pena em prisão subsidiária, veio agora o arguido requerer o pagamento da multa em prestações.

O Digno Magistrado do Ministério Público pugnou pelo indeferimento do requerido, por extemporâneo.

Cumpre apreciar.

Nos termos do art.47.º, n. º3, do Código Penal, «Sempre que a situação económica e financeira do condenado o justificar, o tribunal pode autorizar o pagamento da multa dentro de um prazo que não exceda um ano, ou permitir o pagamento em prestações, não podendo a última delas ir além dos dois anos subsequentes à data do trânsito em julgado da condenação.».

Para além do pagamento da multa poder ser diferido ou realizado em prestações, o art.48º, n. º1, do Código Penal, prevê a possibilidade de substituição da multa por trabalho, ao estatuir que «A requerimento do condenado, pode o tribunal ordenar que a pena de multa fixada seja total ou parcialmente substituída por dias de trabalho, quando concluir que esta forma de cumprimento realiza de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.» Dispõe ainda o artigo 49.º, n. º1 do Código Penal que “se a multa, que não tenha sido substituída por trabalho, não for paga voluntária ou coercivamente, é cumprida prisão subsidiária pelo tempo correspondente reduzido a dois terços, ainda que o crime não fosse punível com prisão”.

No que concerne ao...

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