Acórdão nº 319/20.4PBVCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 09 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelTERESA BALTAZAR
Data da Resolução09 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

- Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo – Juízo Local Criminal de Viana do Castelo.

- Recorrente: O arguido M. S..

- Objecto do recurso: No processo comum singular n.º 319/20.4PB VCT, do Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo – Juízo Local Criminal de Viana do Castelo, foi proferida sentença, na qual, no essencial e que aqui importa, se decidiu, nos termos seguintes: “DECISÃO: Pelo exposto e sem mais considerações, decide-se julgar procedente a acusação e, em consequência: - como autor material de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art.3º, nºs.1 e 2 do D.L.nº.2/98, de 3-1, condena-se o arguido M. S.

na pena de 10 meses de prisão; - como autor material de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelo art.292º, nº.1 do C.P., condena-se o arguido M. S.

na pena de 7 meses de prisão; - em cúmulo jurídico das penas parcelares aplicadas, condena-se o arguido M. S.

na pena única de 1 ano e 2 meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação, com vigilância electrónica - a executar na habitação sita na Rua …, Viana do Castelo, ou noutra que venha a ser indicada - autorizando-se ainda as ausências excepcionais e ocasionais que forem analisadas pela equipa de VE e se revelarem razoáveis e oportunas, tudo nos termos do art.43º do C.P. e nos moldes a indicar pela D.G.R.S.P.; e, - condena-se também o arguido, de harmonia com o disposto no art.69º, nº.1, al. a) do C.P., na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, pelo período de 1 ano e 8 meses.

(…)” – (o sublinhado é nosso).

***Inconformado com a supra referida decisão, o arguido M. S., dela interpôs recurso, terminando a sua motivação com as conclusões, seguintes (transcrição): “I - O recorrente não se conforma com a douta sentença que o condenou como autor material e concurso efetivo de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3º nºs 1 e 2 do Dec. Lei nº 2/98 de 03.01 e de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 292º, nº 1 e 69º, nº 1, al. a) do Cód. Penal, na pena única de 1 ano e 2 meses de prisão a cumprir em regime de permanência na habitação, com vigilância eletrónica, e ainda na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, pelo período de 1 ano e 8 meses (cfr. arts. 69º, nº 1, al. a do Cód. Penal).

DA ERRADA SUBSUNÇÃO DOS FACTOS AO DIREITO II - À data da prática dos factos (a saber, 26.04.2020), o artigo 130º do Cód. Da Estrada, tinha a redação que lhe foi dada pelo Dec. Lei n.º 40/2016, de 29.07.

Atenta essa redação, o entendimento da jurisprudência é no sentido de que só incorre na prática de um crime de condução sem habilitação legal quem conduzir veículo com o respetivo título de condução cancelado, sendo que, esse cancelamento não é automático (não opera ope legis) carecendo de um ato/de uma decisão por parte do IMT, conforme prevê o art. 2.º,n.º 1 do Reg. da Habilitação Legal para Conduzir (Dec. Lei n.º138/2012, de 5.07).

III- Por ordem de ideias, quando alguém conduzir veículo com o título de condução apenas caducado, pratica somente um ilícito meramente contraordenacional.

IV - A respeito, sumariou o douto Ac. do Tribunal da Relação do Porto, de 25.11.2020, proferido no processo nº 20/19.1GALSD.P1, o seguinte: “I – Actualmente, após as alterações introduzidas ao artigo 130º do Código da Estrada pelo dec-lei nº 138/2012, de 05/07, só incorre na prática de um crime de condução sem habilitação legal quem conduzir veículo com o respectivo título de condução cancelado; II – Quando alguém conduzir veículo com o título de condução apenas caducado, pratica um ilícito meramente contraordenacional. III – O cancelamento de título de habilitação para conduzir, desde que verificados os necessários pressupostos legais, carece de despacho nesse sentido por parte do IMTT.” (nosso negrito e sublinhado). Em igual sentido vai na fundamentação do douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 03.10.2019, proferido nos autos nº 587/17.9GFSTB-A.S1 V – No caso dos autos o que se pode ler na informação constante dos autos a fls. 89, prestada pelo IMT, é o seguinte: “(…) o arguido possuía título de condução provisório (carta de condução nº VC -...) tendo caducado na sequência da sanção de inibição de conduzir no processo nº 382/13.4PBVCT, em 07.04.2014.

Assim sendo, em 26.04.2020 o arguido não era titular de nenhum título que o habilitasse a conduzir na via pública (…). – ponto 11 dos factos dados como provados.

VI - Da informação prestada pela referida entidade administrativa resulta apenas que na data da prática dos factos, o título de condução do arguido estava caducado, sendo certo que dessa informação nada consta relativamente ao cancelamento do aludido título, pese embora tal informação tenha sido prestada pela entidade que teria competência para determinar esse cancelamento, dai que se o mesmo tivesse sido determinado sempre dele teria conhecimento e disso informaria o douto tribunal “ a quo”.

VII - Essa informação não consta da acusação, não consta de qualquer outra documento e/ ou informação que tenha sido prestada nos autos, nem sequer da douta sentença proferida pelo tribunal “a quo”, dai que, outra não poderá ser a conclusão senão a de que não foi proferido pelo IMT – como deveria ter sido – qualquer despacho que determinasse o cancelamento do título de condução do arguido.

VIII - Neste medida, os factos que ditaram a sua condenação pela prática do concreto crime em análise, não integram a prática de um ilícito penal mas tão somente a prática da contraordenação a que se alude no item 7 do art. 130.º do Cód. da Estrada.

IX - É irrelevante a atual redação do art. 130.º, do Cód. da Estrada dada pelo Dec. Lei nº 102B/20 de 9.12, distinta da redação em vigor à data da prática dos factos e que deixou de prever a distinção entre caducidade e cancelamento do título de condução. Isto porque, estando perante uma sucessão de leis no tempo, onde assume relevância a classificação de uma certa conduta como crime, é relevante a lei em vigor no momento da prática dos factos, isto é, no momento em que o arguido conduz sem habilitação legal, pois é este o tipo legal de crime que está em discussão.

In casu, essa lei é a redação que é dada ao art. 130º pelo Dec. Lei n.º 40/2016, de 29 de Julho.

X – A douta sentença proferida pelo tribunal “a quo” deveria ter sido no sentido da absolvição do arguido no que concerne à prática do crime de condução sem habilitação legal, ordenando-se a extração de certidão dos elementos pertinentes e respetiva remessa à ANSR, para que esta procedesse à instauração e instrução de um processo de contraordenação contra o Recorrente, pela prática da infração a que se alude no nº 7 do artigo 130.º do Cód. da Estrada.

DA OMISSÃO DE PRONÚNCIA XI- Como resulta do exposto, saber se o título de condução do Recorrente foi, ou não, alvo de despacho de cancelamento por parte do IMT, é essencial para aferir da verificação, ou não, dos elementos do tipo de crime de condução sem habilitação legal pelo qual o Recorrente foi condenado.

XII- Como elemento essencial que é, o mesmo deveria ter sido alvo de prova! Aliás, na contestação por si apresentada, com os fundamentos a que se alude nas conclusões supra [e no ponto A) da motivação], o recorrente requereu que se oficiasse ao “IMT para que venha informar aos autos se proferiu, ou não, despacho de cancelamento do título de condução do arguido”. Porém, a verdade é que, a douta sentença foi proferida sem que essa informação tivesse sido junta aos autos.

XIII- Não constando dos autos se o título de condução do recorrente está ou não cancelado, verifica-se no caso em concreto uma omissão de pronúncia, devendo declarar-se a nulidade da douta sentença proferida e a baixa dos autos à 1ª instância, para que se faça prova do cancelamento ou não, do título de condição do Recorrente.

DA ILEGALIDADE, POR DESPROPORCIONALIDADE COM A GRAVIDADE DOS FACTOS, A CULPA DO AGENTE e AS DEMAIS CIRCUNSTÂNCIAS ATENUANTES, DA MEDIDA DA PENA DE PRISÃO EM QUE O RECORRENTE FOI CONDENADO XIV - A aplicação das penas visa a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente, sendo que, em caso algum a pena pode ultrapassar a medida da culpa. – cfr. n.ºs 1 e 2 do artigo 40º do Código Penal.

XV - A determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, tendo o tribunal que, na sua determinação, atender a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente, considerando, nomeadamente a gravidade das consequências do facto, os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram, as condições pessoais do agente e a sua situação económica, a conduta anterior ao facto e a posterior a este, especialmente quando esta seja destinada a repararas consequências do crime, entre outras… (cfr. n.ºs 1 e 2 do artigo 70º do Cód. Penal e Ac. TRC de 20/01/2010, Ac. TRP de 2/06/2010, Ac. TRP de 30/01/2008, Ac. TRP de 30/09/2009 e Ac. TRC de 3/02/2010, todos no dgsi.pt.) XVI - A pena de prisão efetiva de um ano e dois meses de prisão, a cumprir em regime de permanência na habitação com vigilância eletrónica, aplicada ao recorrente é excessiva face à matéria de facto que se considerou provada e não vai de encontro aos critérios que devem estar subjacentes à determinação da medida da pena, não sendo pois um reflexo sério e justo da culpa do recorrente e das reais e atuais necessidades de prevenção, geral e especial, que a situação reclama, não tendo tido em consideração nenhum dos factos que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do arguido (as circunstâncias atenuantes verificadas in casu), como lhe impunha o citado artigo 71º, nº 2, do Cód. Penal e ainda o artigo 72º do mesmo diploma legal. Tanto mais se considerarmos que este não pode ser punido - como foi – pela prática do crime de condução sem habilitação legal, como supra...

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