Acórdão nº 209/18.0JAFAR-F.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 10 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução10 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: A - Relatório: Nestes autos de recurso independente em separado proveniente do Tribunal Judicial da Comarca de Évora - Juízo de Instrução Criminal de Évora - o Mmº Juiz, por despacho de 12-01-2022, decidiu indeferir o requerimento do arguido MAT para revogar ou, ao menos, baixar o valor da caução aplicada ao arguido.

O arguido MAT foi indiciado pela prática de um crime de corrupção activa, previsto e punido pelos arts. 18º, nº 1 e 19º, nº 2 da Lei nº 34/87, redacção dada pela Lei nº 108/2001, de 28-11, Lei nº 30/2008, de 10-07, Lei nº 41/2010, de 03/09, Lei nº 4/2011, de 16-02, Lei nº 4/2013. de 14/01 e Lei nº 10/2015, de 22/04.

* Inconformado com aquela decisão dela interpôs o arguido o presente recurso, com as seguintes conclusões: I. É objeto do presente Recurso o despacho judicial com a referência 31322041, ponto I., que indeferiu integralmente o requerido pelo arguido no dia 13 de dezembro de 2021.

  1. O requerimento do arguido do dia 13 de dezembro de 2021 solicitou a revogação da medida de caução imposta por despacho do dia 15 de abril de 2021 (ou, subsidiariamente, a redução do montante em valor não superior a 50 mil euros) em virtude da alteração das circunstâncias que presidiram ao decretar, inicial, de tal medida.

  2. Aquando da determinação, no dia 15 de abril de 2021, da caução, foi feito constar que a mesma se justificava para acautelar o cumprimento, para além do mais, de outras medidas de coação, como a proibição de contactos.

  3. Essa medida de proibição de contactos foi declarada extinta (despacho judicial com a referência 31205091).

  4. Por outro lado, o arguido sempre compareceu em atos processuais para os quais tenha ou venha a ser chamado, dando sempre integralmente cumprimento ao disposto no artigo 196.º do Código de Processo Penal.

  5. Nos presentes autos foram apreendidos todos os bens e elementos que o detentor da ação penal entendeu serem importantes para a descoberta da verdade material, foram realizadas interceções telefónicas, foi apreendida correspondência eletrónica, vários documentos, ouvidas várias testemunhas e prestadas declarações pelos arguidos, quer perante Juiz de Instrução Criminal quer, quando para tal notificados e convocados, perante o detentor da ação penal.

  6. Atento o período já decorrido de investigação e as demarches processuais (bem como a recolha de prova acima indicada), não existe, agora, qualquer perigo concreto de perturbação de inquérito, conservação da prova, continuação de qualquer atividade (alegadamente) criminosa ou pressões de qualquer espécie sobre testemunhas e/ou arguidos (para além de tal medida já ter sido declarada extinta) que importe garantir – e é essa a natureza das medidas de coação.

  7. Ao decidir como decidiu, o Tribunal, smo, violou o disposto no artigo 212.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, não só porque o despacho que determinou a aplicação da caução visava garantir outras medidas de coação declaradas extintas como, também, as obrigações genéricas de arguido têm sido cumpridas.

  8. Por outro lado, à presente data, não existem quaisquer perigos concretos previstos no artigo 204.º do Código de Processo Penal que justifiquem a aplicação de medidas de coação, nomeadamente a manutenção da caução.

  9. Mesmo quanto ao pedido subsidiário – de diminuição do valor de caução – o Tribunal, ao decidir como decidiu, violou o disposto no artigo 212.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, igualmente tendo em conta a alteração e atenuação (até objetiva) das exigências cautelares que determinaram, no início, a caução.

  10. O Tribunal determinou, legalmente, um montante de € 300.000,00 (trezentos mil euros) face a promoção do Ministério Público de um montante não inferior a € 70.000,00 (setenta mil euros).

  11. Ao decidir como decidiu, ao justificar a manutenção da medida de caução e seu montante, com recurso ao disposto no artigo 214.º, n.º 4, do Código de Processo Penal, o Tribunal não fez uma interpretação e aplicação correta de tal preceito legal.

  12. Ao aplicar da forma como aplicou tal preceito legal, fica sem lugar a aplicação o disposto no artigo 212.º, nomeadamente os seus n.º 1, alínea b) e o n.º 3, todos do Código de Processo Penal.

  13. Por outro lado porque a letra e teleologia da norma (artigo 214.º, n.º 4, do Código de Processo Penal) não se coaduna com a interpretação e aplicação realizadas pelo Tribunal uma vez que o arguido não foi condenado – nem sequer alvo de acusação (pressuposto daquela norma).

  14. A extinção, nomeadamente por via de revogação, ou alteração - por via de redução – da medida de caução não ocorre, apenas, por via do disposto no artigo 214.º, n.º 4, do Código de Processo Penal, como erradamente feito constar no despacho objeto de recurso.

  15. Acresce que, seguindo a interpretação e aplicação de tal preceito nos termos constantes do despacho judicial objeto de recurso, justificar-se-ia a aplicação de uma caução a qualquer arguido para cumprimento do dever genérico de obrigações a que o arguido está sujeito (como o comparecimento em atos processuais), sem concretização in casu, sendo que o Tribunal, em rigor, justificou tal aplicação para cumprimento de outra medida de coação que foi declarada extinta.

  16. Mais: o Tribunal, ao aplicar o artigo 214.º, n.º 4, do Código de Processo Penal com a justificação de que existe possibilidade de ser condenado nos presentes autos não tem em conta, como já acima foi enunciado, a letra e espírito de tal normativo que tem como pressuposto a extinção de tal medida com o início da execução da pena se o arguido vier a ser condenado em prisão (o que objetivamente não ocorre nos presentes autos).

  17. Em rigor, o Tribunal ao decidir como, agora, decidiu, entra (também) em contradição com os fundamentos que presidiram à aplicação da caução (garantia de cumprimento de medidas de coação entretanto extintas, para além de acautelar perigos que, em concreto, já não existem), pelo que deverá ser revogado o despacho e substituído por outro que determine a revogação da caução prestada ou, subsidiariamente, diminuir o valor da mesma para valor não superior a €...

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