Acórdão nº 40/21.6PFEVR-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA FILOMENA SOARES
Data da Resolução26 de Abril de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Criminal (1ª Subsecção) do Tribunal da Relação de Évora: I [i] No âmbito do processo de Inquérito nº 40/21.6 PFEVR, que corre termos no Departamento de Investigação e Acção Penal da Comarca de Évora, 1ª Secção, o arguido DP (devidamente identificado nos autos), em sede de primeiro interrogatório judicial de arguido detido, realizado no dia 17.09.2021, foi sujeito à medida de coacção de prisão preventiva e de proibição de contacto com a vítima, indiciado pela prática, em autoria material e concurso real, de dois crimes de violência doméstica agravados, um p. e p. pelo artigo 152º, nºs 1, alíneas b) e c), 2, alínea a), 4 e 5, [sendo ofendida sua companheira, E], e outro p. e p. e p. pelo artigo 152º, nºs 1, alínea d), 2, alínea a), 4 e 5, [sendo ofendida a menor, sua filha, L], do Código Penal

O despacho judicial, naquela sede proferido, tem o seguinte teor: “(…) O arguido D invoca, logo quando foi iniciada a tomada de declarações para memória futura, a nulidade da detenção, sustentando para tal, a pretensão do arguido se apresentar voluntariamente junto deste tribunal; nos termos do artigo 257.º, n.º1, do Cód. Processo Penal, poderão ser emitidos mandados de captura e, em particular, nos presentes autos, quando se verifique em concreto alguma das situações previstas no artigo 204.º do Cód. Processo Penal e se mostrar imprescindível para a protecção da vítima; e, tendo em conta que os factos foram praticados ao dia 21 de agosto p.p., considera-se que perante tudo quanto foi requerido pelo arguido e bem assim já tendo corrido com sentença transitada em julgado o processo de regulação das responsabilidades parentais (que decidiu que o arguido inclusivamente pudesse estar com a sua filha menor no regime de fim de semana de quinze em quinze dias e também uma vez por semana); o arguido, volvido quase cerca de um mês, nunca representou qualquer perigo em concreto e abstracto para a ofendida

Consequentemente, o arguido entende que existe a nulidade, nos termos do art.º 120.º, n.º2, al. d), e 257.º, um do Cód. Processo Penal, uma vez que inexiste um perigo de continuação da actividade criminosa, nem que os mandados de detenção se mostravam necessários e não fica demonstrada a necessidade de emissão dos mandados

Nos termos do art.º 257.º, do Cód. Processo Penal: «1 - Fora de flagrante delito, a detenção só pode ser efectuada por mandado do juiz ou, nos casos em que for admissível prisão preventiva, do Ministério Público:

  1. Quando houver fundadas razões para considerar que o visado se não apresentaria voluntariamente perante autoridade judiciária no prazo que lhe fosse fixado; b) Quando se verifique, em concreto, alguma das situações previstas no artigo 204.º, que apenas a detenção permita acautelar; ou c) Se tal se mostrar imprescindível para a protecção da vítima

    2 - As autoridades de polícia criminal podem também ordenar a detenção fora de flagrante delito, por iniciativa própria, quando:

  2. Se tratar de caso em que é admissível a prisão preventiva; b) Existirem elementos que tornem fundados o receio de fuga ou de continuação da actividade criminosa; e c) Não for possível, dada a situação de urgência e de perigo na demora, esperar pela intervenção da autoridade judiciária.» No caso dos autos, o arguido foi detido em execução de mandados de detenção emitidos pelo Ministério Público, nos termos dos arts. 254.º n.º 1, al. a) e nº 2, 257.º nº 1 e 258.º do CPP, portanto, foi detido fora flagrante delito

    Neste quadro, as objecções do arguido não podem proceder, afigurando-se nos que a detenção respeitou os pressupostos legais alternativos, como decorrem do supramencionado preceito, e não cumulativos, como refere erradamente o arguido

    Na verdade dos elementos recolhidos dos autos pelo órgão de polícia criminal, vejam-se a última publicação do perfil de DP no dia 3 de Setembro de 2021, após a regulação das responsabilidades parentais, estava-se perante um ilícito de acentuada gravidade, para o qual é admissível prisão preventiva nos termos do art.º 202.º do Cód. Processo Penal, sendo a violência com os contornos de alguma dimensão e gravidade inegável, cujas consequências nefastas ao nível do contributo da vítima no apuramento da verdade material, permitiram acautelar através da detenção

    O receito do perigo de continuação da actividade criminosa e de perturbação do inquérito já se patenteava no processo (veja-se, nomeadamente, fls. 93), no qual o arguido anunciava uma “espera” através da Rede Social Facebook

    O mandado de detenção emitido contém fundamentação bastante, sendo expressamente alicerçado no pressuposto legal do crime imputado permitir a prisão preventiva e ter sido invocado o pressuposto de que só a detenção do arguido permite acautelar o perigo de continuação da actividade criminosa e de protecção da vítima (vejam-se, respectivamente, as alíneas b) e c) do n.º1 do art.º 257º)

    No âmbito da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, a detenção não depende da consideração do comportamento do arguido, ou seja, de se considerar, ou não, que o visado se não apresentaria voluntariamente perante autoridade judiciária no prazo que lhe fosse fixado, porquanto ainda é aplicável o disposto no art.º 30.º, n.º2 da mencionada Lei

    Ora, dispõe o art.º 30.º, n.º2, da Lei n.º 112/2009, de 16 de Setembro, que «Para além do previsto no n.º 1 do artigo 257.º do Código de Processo Penal, a detenção fora de flagrante delito pelo crime previsto no número anterior pode ser efetuada por mandado do juiz ou do Ministério Público, se houver perigo de continuação da atividade criminosa ou se tal se mostrar imprescindível à proteção da vítima.»

    Tais pressupostos verificaram-se no caso em concreto. Para tal basta confrontar o teor da prova documental com a interpretação feita pela própria vítima receosa dos comportamentos do então suspeito

    A detenção efectuada, fora de flagrante delito e por crime público punido com pena de prisão que permite a prisão preventiva, obedeceu aos requisitos legais e como tal declaro-a válida

    Foi respeitado o prazo de apresentação a que se referem os artigos 141º, nº 1 e 254º, ambos do Código de Processo Penal e 28º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa

    * DP, tendo requerido a constituição de arguido e que fosse sujeito a primeiro interrogatório e a aplicação de medidas de coacção, nomeadamente Termo de Identidade e Residência, nos termos do art.º 59.º, n.º2, do Cód. Processo Penal, insurge-se contra o indeferimento proferido pelo Ministério Público, invocando e requerendo que nunca deveria ter sido indeferido o seu requerimento para a constituição como arguido e que para tal o despacho deveria de ter sido fundamentado, consequentemente estamos perante uma nulidade que desde já se invoca e perante uma inconstitucionalidade, por violação directa do art.º 32.º, n.º1 e 8 CRP. Subsidiariamente, invoca que o indeferimento da constituição como arguido constitui irregularidade e invoca-a para todos os efeitos legais

    Assim, considera o arguido que: - da conjugação dos artigos 58.°, 59.°, n.º 2 61.°, n.º 1, al. g) e artigo 144.° do CPP, a requerida constituição de arguido e primeiro interrogatório, representa, na fase de inquérito, um verdadeiro "poder-dever" que recai sobre o Ministério Público, pois no seu poder de direcção da fase de inquérito, este terá de pautar toda a sua actividade de investigação de forma isenta (o que de modo algum se coloca em causa), recolhendo todos os meios de prova essenciais à descoberta da verdade material, o que passa obrigatoriamente pela realização de todas as diligências de prova, a favor e contra o contra quem correr o inquérito (suspeito ou arguido), por ser este o objecto do processo penal; - sendo a direcção do inquérito da exclusiva responsabilidade do Ministério Público, esta actividade também terá de ser direcionada na defesa das garantias da pessoa visada, através da prática de todos os actos jurisdicionais; durante a fase de inquérito, não merecerá grande sabatina afirmar-se que será o momento maior em que o Ministério Público deverá - no e do vasto conjunto de actos jurisdicionais comportados pela prossecução do fim material do processo (a descoberta da verdade) - ser o maior garante dos princípio de igualdade, isenção, legalidade, do pedido, da audição prévia do arguido e da presunção de inocência. Só desta forma se poderá, na fase de inquérito, falar legitimamente de uma eficácia dos princípios contidos e decorrentes do artigo 32.º da CRP

    - considera o suspeito que o despacho que indefere sem fundamentação a sua constituição de arguido é inconstitucional, por violação directa do artigo 32.°, n.ºs 1, 3, 5, 7 e 8: por violação directa do n.º 1, uma vez que ao suspeito não estão a ser dadas todas as garantias de defesa, nomeadamente recusando-lhe o conjunto de deveres e de direitos que decorrem da constituição de arguido; verifica-se a inconstitucionalidade do despacho na parte em que indefere a audição do arguido em sede de primeiro interrogatório, por violação do n.º 5, porque ao arguido foi negado o direito ao contraditório; é inconstitucional o despacho que interpreta o disposto nos artigos 32.° da CRP, artigos 59.°, n.º 2,61.°, n,º 1, 144.°,262.° e 263.° do Código de Processo Penal “no sentido de, com a impossibilidade do suspeito poder requerer desde já eventuais meios de prova que venha a considerar necessários para efeitos de aplicação de uma eventual medida de coação” (sic)

    No caso dos autos: - no dia 21 de Agosto de 2021, E apresentou queixa contra DP por ter sido agredida, em termos gerais, com um soco no ombro esquerdo e chapada no lado esquerdo da face, tendo resultado lesões físicas

    - no dia 23 de Agosto de 2021, por email pessoal de V, foi remetido requerimento em nome de DP no qual requeria à Procuradora do Diap de … a sua constituição de arguido e que fosse ouvido em primeiro interrogatório

    - por despacho de 26 de Agosto de 2021 foi indeferido o requerido por DP

    - no dia 16 de Setembro 2021, pelas...

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