Acórdão nº 948/18.6T9LSB-B.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelANTÓNIO GAMA
Data da Resolução07 de Abril de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 948/18.6T9LSB-B.S1 Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça I 1. O arguido AA, vem nos termos do disposto no art. 449.º/1/d, CPP, interpor recurso extraordinário de revisão do acórdão transitado em julgado que o condenou pela prática de um crime de abuso sexual de crianças p. e p. pelo artigo 171.º, n.º 1, CP, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão e pela prática de um crime de abuso sexual de crianças p. e p. pelo artigo 171.º, n.º 1, do Código Penal, na pena de 3 anos de prisão, e na pena única de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão.

  1. Fundamenta o pedido, na sua parte concludente, no seguinte (transcrição): « (…) III – Do fundamento de facto da revisão Os novos factos ou meios de prova, que de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitam graves dúvidas sobre a justeza da condenação e que tornam possível a revisão em nome da defesa são os seguintes: - “a ofendida BB, de menor idade, há muito que tinha um comportamento inadequado para a sua idade - Tendo sido desde muito cedo confrontada coma realidade da vida de sua mãe CC, que fazia vida de alterne.

    - A BB apesar da sua idade, era uma criança problemática na escola, tendo tido aí vários problemas.

    - Tendo havido a necessidade de intervenção da CPCJ junto do agregado familiar.

    - A ofendida (BB) visionava filmes porno pra adultos, aos quais tinha acesso em sua própria casa.

    - Segundo constava no Bairro, a menor BB por vezes em sai própria casa assistia a cenas íntimas da mãe com outras pessoas.

    ” Doc.º 1 - Declaração – subscrita por DD Por outro lado, no tocante à personalidade do arguido, cabe salientar que este é considerado como “boa pessoa”, “não tendo por hábito rejeitar ajudar conhecidos nem mesmo desconhecidos”, contactando e convivendo com crianças “sem maldade ou imoralidade” como sempre tem feito com os demais, tal como qualquer outro adulto”.

    Pelo que “nunca chegou ao conhecimento” da apontada testemunha EE, “algum acontecimento dessa natureza vinda do AA pelo qual está a ser acusado”.

    “Custa crer que tal acusação seja confiável”.

    Doc.º 2 - Declaração – subscrita por EE – De igual modo, a própria cunhada do arguido, FF, vem esclarecer – e de modo desassombrado – que as suas filhas, que sempre conviveram com o arguido, sem “nunca haver qualquer tipo de desrespeito do AA para com elas” . “Ele esteve sempre presente na vida delas desde o seu nascimento sem nunca avançar ou mesmo insinuar para tal perversidade”.

    Continuando: “Sou bastante vigilante e nunca detetei sinais estranhos vindos do AA para a crianças da família e amigos; ao contrário disso ele sempre brincou com elas e as acompanhou até à sua fase adulta ajudando-as no que fosse necessário”.

    Para também em síntese concluir que: “Desta forma considero o AA um cidadão de bem para o Mundo” (SIC).

    Doc.º 3 - Declaração – subscrita por FF Ora, tais pessoas, que adiante se identificarão formalmente – de acordo com a exigência da Lei Processual Penal – não atribuíram grande importância ao ocorrido, na pessoa do recorrente - sendo certo que o recorrente AA também não as notificou ou arrolou como testemunhas aquando da sua audiência de discussão e julgamento, desconhecedor que então era de que estas pessoas não se opunham em abonar a sua personalidade.

    Só agora, depois da prisão do recorrente – e da estupefacção de muitas dezenas de pessoas, amigos e conhecidos do arguido, sobretudo na região de ... – é que estas tendo indagado junto dos familiares do AA do que realmente acontecera e porque razão este se encontrava a cumprir pena de prisão no estabelecimento prisional ..., as mesmas se prontificaram a depor perante o Tribunal, relatando o que sabiam da personalidade do recorrente.

    O que desde já se alega face à exigência contida no supracitado art.º 449.º n.º 2 do CPP uma vez que comprovadamente o arguido ignorava o conhecimento que estas pessoas teriam tido do ocorrido, o mesmo é dizer, ignorava a sua existência relevante para o caso dos autos (só nesse sentido devendo ser interpretada a expressão “ignorava a existência” contida no apontado preceito legal).

    Pelo que assume toda a relevância as declarações escritas de estas duas pessoas, ora arroladas como testemunhas.

    Disponibilizando agora o seu nome, o que não foi feito antes como se disse, em virtude de o arguido desconhecer que essas pessoas, tendo esse conhecimento, se encontravam dispostas a comprovar a sua razão e ciência junto do douto Tribunal.

    Pelo que o douto acórdão condenatório – ao concluir sem mais pela culpabilidade agravada do recorrente – fez – na óptica do recorrente e salvo sempre o muito o elevado respeito – que é muito e bem devido - um juízo de apreciação global que suscita, em nossa opinião, sérias dúvidas sobre a justiça da condenação.

    Considera-se assim imprescindível, enquanto meio de prova superveniente para a inteira descoberta da verdade material, a consideração/valoração da prova documental ora apresentada, que deverá ser ainda positivamente considerada e valorada pelo douto Tribunal, Termos em que se requer a V.ª Ex.ª s Venerandos Conselheiros, que depois de considerados os meios de prova ora apresentados, seja decretada a revisão do douto acórdão e para o efeito sejam os autos remetidos para novo julgamento na sua totalidade».

  2. No tribunal recorrido o Ministério Público emitiu parecer no sentido de que deverá o recurso extraordinário de revisão interposto pelo arguido ser declarado improcedente e, consequentemente, ser negada a revisão requerida, devendo ser integralmente mantido o acórdão proferido nos autos e já transitado em julgado.

  3. Pronunciando-se sobre o mérito do pedido (art. 454.º, CPP), disse a juíza do processo (transcrição): «Tendo presente os fundamentos do recurso extraordinário de revisão enunciados no artigo 449.º, n.º 1 do Código de Processo Penal, o recorrente alicerçou a sua pretensão na alínea d) do mencionado artigo.

    Para tanto alega, em síntese, que o arguido foi apenas condenado com base nas declarações prestadas pela ofendida, considerando que por via da descoberta de novos factos ou meios de prova, se suscitam dúvidas sobre a justeza da condenação, o que, sustenta, poderia resultar da inquirição de duas testemunhas.

    Pese embora o alegado, crê-se, contudo, que não assiste razão ao recorrente e que inexistirá fundamento para a procedência do recurso.

    De facto, como já se deixou expresso no despacho antecedente, o recorrente não coloca em crise a ocorrência dos factos que determinaram a sua condenação, os quais, aliás, foram em parte reconhecidos pelo arguido no decurso da audiência – como se mostra patenteado na motivação da decisão de facto vertida no acórdão condenatório proferido nesta 1ª Instância –, limitando-se a pretender colocar em crise a credibilidade conferida pelo Tribunal ao depoimento prestado pela ofendida, por via do depoimento de duas testemunhas e do teor de três declarações que apresentou (Doc. 1, 2 e 3 que acompanham o requerimento), desde logo resultando de tais elementos e do alegado na motivação do recurso que os subscritores de tais declarações nenhum conhecimento possuem sobre a concreta factualidade em causa nos autos, sendo que o eventual conhecimento que têm circunscrever-se-á a eventuais características pessoais e de personalidade do arguido e da vítima.

    Como tal, entende-se que inexistirão graves dúvidas sobre a justiça da condenação imposta nestes autos a AA e, por conseguinte, deverá ser considerado como manifestamente improcedente».

  4. Já neste Tribunal o Ministério Público foi de Parecer que deve ser negado o pedido de revisão de sentença formulado pelo arguido 6. Colhidos os vistos e após a realização da conferência cumpre decidir.

    II A Factos provados (transcrição): 1. A menor BB nasceu em .../.../2005, é filha de GG e de CC, residindo em Janeiro de 2018 apenas com a sua progenitora na Rua ..., ... em ..., em ....

  5. A menor BB frequentava habitualmente a residência do arguido, uma vez que a companheira deste, HH era amiga de infância de progenitora da menor e era uma pessoa em quem esta depositava a sua confiança, permitindo que BB aí pernoitasse.

  6. BB também gostava de frequentar a casa do arguido por ser muito amiga de II, de 8 anos de idade, filha do arguido, com quem costumava brincar.

  7. No fim-de-semana de 27 e 28 de Janeiro de 2018, a menor BB pernoitou na habitação do arguido, sita na Avenida ..., ..., ..., em ....

  8. Na segunda-feira à tarde, após sair da escola, a menor telefonou à sua mãe dizendo-lhe que iria pernoitar nessa noite na casa do arguido, pedido a que a progenitora da menor não se opôs.

  9. Assim, após ter jantado e brincado com a sua amiga II, na casa desta, BB adormeceu num colchão, que havia sido colocado sobre o chão, próximo da cama da II no interior do quarto desta.

  10. Por volta das 2h00 da madrugada já do dia 30 de Janeiro de 2018, o arguido entrou no quarto onde dormiam as menores e deitou-se no colchão onde se encontrava a menor BB.

  11. Em seguida, aproveitando o facto da menor BB se encontrar a dormir, o arguido, deitou-se ao seu lado, colocou uma das suas mãos nas mamas da menor, acariciando-as por cima do pijama que aquela envergava.

  12. Na sequência de tal conduta, a menor abriu os olhos e reparou que o arguido se encontrava deitado ao seu lado.

  13. Para evitar que aquele continuasse com tal...

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