Acórdão nº 6812/20.1T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelVERA SOTTOMAYOR
Data da Resolução31 de Março de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

APELANTE: R. S.

APELADA: X – INDUSTRIA DE COMPONENTES PARA CALÇADO E TÊXTIL, LDA Tribunal da Comarca de Braga, Juízo do Trabalho de Vila Nova de Famalicão Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães I – RELATÓRIO R. S. instaurou acção declarativa comum emergente de contrato individual de trabalho contra X – INDUSTRIA DE COMPONENTES PARA CALÇADO E TÊXTIL, LDA e pede que se considere lícita e fundamentada a resolução com invocação de justa causa do contrato de trabalho que mantinha com a Ré, por si operada em 23 de Setembro de 2020 e consequentemente se condene a Ré a pagar-lhe: - o valor de € 293,08 a título de formação profissional continua não prestada pela entidade patronal; - a quantia de €927,88, a título de proporcionais de férias e subsídio de férias referente ao trabalho prestado no ano da cessação; - a quantia de € 635,00 referente às férias vencidas a 1 de Janeiro de 2020, referente ao trabalho prestado no ano de 2019, e que ela Autora não gozou; - a quantia de € 317,88, referente ao subsídio de férias, vencido de igual modo a 1 de Janeiro de 2020; - a quantia de € 211,65 a título de subsídio de Natal não pago, referente ao ano de 2020; - a quantia de € 15.451,67 referente à compensação que alude o art.º 396º do Código do Trabalho; Realizada a audiência de partes e frustrada a tentativa de conciliação, a Ré veio contestar, concluindo pela total improcedência da acção e pela sua consequente absolvição.

Os autos prosseguiram a sua normal tramitação e por fim foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: “DECISÃO Face ao exposto: » julga-se a acção totalmente improcedente, e, em consequência, absolve-se a Ré do pedido; » julga-se a reconvenção parcialmente procedente, e, em consequência, condena-se a Autora/reconvinda R. S. a pagar à Ré/Reconvinte “X – INDÚSTRIA DE COMPONENTES PARA CALÇADO E TÊXTIL, LDA.” a quantia de € 1.270 (mil duzentos e setenta euros) a título de indemnização a que alude o artigo 399.º do Código do Trabalho, absolvendo-se do demais peticionado.

» Custas da acção a suportar pela Autor; custas da reconvenção a suportar pela Autora e Ré, na proporção do decaimento. (Cfr. Artigo 527.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil) » Valor da acção: já fixado em 30.04.2021 » Notifique.” Inconformada com o decidido a Autora R. S. interpôs recurso de apelação para este Tribunal da Relação de Guimarães, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões: “- Enferma a Douta Sentença proferida em 1ª Instância de erro de julgamento, quer no que tange à decisão sobre a matéria de facto, quer no que concerne à aplicação do direito, incorrendo assim em violação dos preceitos legais aplicáveis.

- No que tange desde logo à matéria de facto, dir-se-á desde logo que o Tribunal recorrido fez errada aplicação das regras da repartição do ónus da prova, especialmente no que se refere aos direitos de crédito peticionados pela recorrente, reportados não só à vigência da relação laboral, como também à cessação da mesma.

- Concretamente, refere-se a recorrente aos créditos decorrentes da formação profissional não ministrada, como também às férias e subsídio de férias não pagos respeitantes ao trabalho prestado no ano anterior ao da cessação, bem como aos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal proporcionais ao tempo de trabalho prestado no ano da cessação.

- A propósito de tais créditos, foi entendido, e mal, pelo Tribunal recorrido que a recorrente não logrou fazer prova dos mesmos, pelo quer se deu como não provada a factualidade respectiva, conforme se vislumbra pelo rol de factos não assentes descritos sobre os pontos 10, 11, 12 e 13.

- Com efeito, contráriamente ao que foi decidido, os referidos pontos da matéria de facto deveriam ter sido dados por provados, já que, para tal, à recorrente competia tão somente fazer prova de que era trabalhadora da Ré, e que o contrato de trabalho se manteve até à data da sua cessação, prova essa que foi sobejantemente produzida, e que resulta mesmo da factualidade dada por assente na conjugação das alíneas A), E), G) e S) da factualidade dada por assente.

- Por seu turno, provado a recorrente quer a existência e vigência do contrato de trabalho, quer a sua cessação, competiria à recorrida fazer prova de que pagou os direitos invocados pela recorrente.

- Ora, em relação a tal, não alegou ou invocou sequer a recorrida ter feito o pagamento de qualquer quantia, pelo que a falta de pagamento os créditos laborais peticionados pela recorrente deveriam dar-se por provados, até por confissão.

- Consequentemente, por devida aplicação das regras do ónus da prova, dever-se-á dar por provados os factos que foram dados por não assentes, descritos nos referidos pontos 10 a 13 do rol dos factos não assentes, e, assim, dar-se por provado que: - à autora nunca foi facultada formação profissional; - a autora não recebeu os proporcionais de férias e subsídio de férias relativos aos ano de 2020; - a autora não recebeu os proporcionais de subsídio de Natal relativos ao ano de 2020.

Doutro passo, - Se é certo que enferma a decisão sobre a matéria de facto de erros de julgamento por errónea aplicação das regras de repartição do ónus da prova, é também certo que tais erros ocorrem também de deficiente apreensão quer da prova documental, quer da prova testemunhal, quer ainda da prova por depoimento de parte e da prova por declarações de parte.

- Em relação a estas últimas, aliás, demonstrou o Douto Tribunal uma notória desatenção em relação às declarações prestadas pela Autora, retirando qualquer valor às mesmas, o que, mesmo tendo em conta o princípio da livre apreciação da prova, não deveria ocorrer, sob pena de violação da lei.

- De qualquer forma, e no que se refere às alíneas j), m), n) e o) dos factos considerados por provados, deu o Douto Tribunal recorrido por provada tal factualidade, estribando tal posição na documentação junta aos autos, e nos depoimentos das testemunhas, salientando neste ponto o testemunho de M. F., funcionária de escritório na empresa Ré.

- Ora, contráriamente ao entendido em 1ª Instância, o depoimento de tal testemunha não merece qualquer credibilidade, pois que desde logo foi esta que, perante evidências concretas, quis desmentir em Tribunal a existência de um só contrato de trabalho sem qualquer interrupção temporal (como pretendia a Ré), negando ser a autora da escrita em envelopes que serviam para efectuar os pagamentos dos salários sem qualquer desconto para a Segurança Social.

- A falta de credibilidade desta testemunha, é, aliás, acompanha pela notória falta de credibilidade das demais testemunhas arroladas pela recorrida, que, nos respectivos depoimentos demonstram uma estranha precisão e rigor em relação aos factos supostamente favoráveis à entidade patronal, e um esquecimento considerável em relação aos factos que eventualmente o não eram.

- Tal falta de credibilidade, que só se poderá justificar pelo natural ascendente que a entidade patronal de uma pequena empresa sempre têm em relação aos seus trabalhadores, faz com que a prova testemunhal produzida não tenha a força necessária para se dar por provada a factualidade acima descrita, até porque, estando em causa a questão da suposta afixação do novo horário de trabalho, é no mínimo estranho que os trabalhadores soubessem com enorme certeza que tal mapa havia sido afixado no dia 9 de Junho de 2020, quando nem sequer o mesmo lhes dizia respeito, já que a eles não se aplicava.

- De igual modo, e agora no que se refere à ocorrência da reunião com a Autora, supostamente realizada a 18 de Junho de 2020, também aqui se notam divergências sérias nos diversos depoimentos prestados, quer no que concerne aos intervenientes na reunião, quer no que concerne ao seu conteúdo, quer mesmo no que respeita à hora de realização da mesma.

- Assim, se o representante legal da Ré situa tal reunião no início da manhã, no seu escritório, as demais testemunhas ouvidas situam-na no final da tarde, junto ao relógio de ponto.

- Se o representante legal da recorrida afirma que em tal reunião pedir à recorrente que aceitasse a alteração de horário, pois que tal alteração se demonstrava necessária para se proceder à higienização do equipamento, já outras testemunhas não se lembram do teor da comunicação, ou então referiram que tal alteração será necessária por cauda do excesso de encomendas.

- Todas estas circunstâncias, aliadas à falta de qualquer outro meio de prova, fazem com que se deva dar por não provada a factualidade em referência, devendo a mesma transitar para o rol dos factos não assentes.

- Por seu turno, e agora no que respeita à factualidade que foi dada por não assente, e concretamente aquela que está vertida nos pontos 10 a 13 da relação de factos dados por não provados, dir-se-á que a decisão respectiva enferma de errada interpretação e aplicação das regras de repartição do ónus da prova, pois que, contráriamente ao que foi decidido, sendo tais direitos decorrentes da existência da relação laboral, e da sua cessação, competia à recorrente fazer prova da sua condição de trabalhadora e da data de cessação da relação laboral, competindo por seu turno à recorrida fazer prova de ter cumprido tais obrigações.

- Não o tendo feito, atendendo à presunção legal da existência de tais direitos, deveria a factualidade em causa transitar para o rol de factos assentes, como devido.

- Por outro lado, também a matéria de fáctica que foi dada por não provada, e que consta dos pontos 2, 3, 4, 5, 6, 9, 9, 14, 15 e 16 da relação dos factos não assentes, deveriam ter sido dados por provados, resultando a mesma da conjugação do depoimento prestado pelas testemunhas arroladas pela recorrente, com as declarações prestadas por esta última, e mesmo até, resultando tal prova das regras da experiência de um qualquer cidadão comum.

- Com efeito, descreveu a Autora, com notória sinceridade, toda a pressão que foi exercida sobre ela, especialmente decorrente da sua não...

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