Acórdão nº 63/20.2PFBRR.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelLUÍS GOMINHO
Data da Resolução15 de Março de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na Secção Criminal (5.ª) da Relação de Lisboa: I - Relatório: I - 1.) Inconformado com o despacho aqui melhor constante de fls. 57 a 60 no qual a Mm.ª Magistrada do Juízo Local Criminal do Barreiro (Juiz 1), Comarca de Lisboa, rejeitou a acusação pública deduzida contra o Arguido P. , na qual se lhe imputava a prática de um crime de detenção de arma proibida p. e p. na conjugação dos art.ºs 86.º, n.º 1, al. d) e 3.º, n.º 2, al. ab), ambos do Regime Jurídico das Armas e Munições, aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23/02, por entender dela não constar “a necessária factualidade tendente ao preenchimento do (respectivo) tipo legal de crime… nem de qualquer outro ilícito jurídico-penal”, recorreu o Ministério Público para esta Relação, apresentando as seguintes conclusões: 1.ª - No douto despacho recorrido a Mmª Juiz a quo decidiu rejeitar a acusação pública, por considerar que “a acusação é manifestamente infundada, pois os factos que a integram, nos moldes em que vêm exarados nessa peça processual, não constituem crime”.

  1. - Sustentando tal decisão por entender, em suma, que a faca detida pelo arguido seria uma arma branca, porém, por ser uma faca de cozinha e, por essa via, se encontrar afecta às lides domésticas, tendo aplicação definida, não é passível de ser integrada na classe A, não sendo proibida a sua detenção.

  2. - O Ministério Público não pode acolher esta fundamentação do tribunal a quo para rejeitar a acusação pública, pois, salvo o devido respeito, tal despacho revela uma fundamentação contra legem, não tendo tido em conta as alterações introduzidas ao REGIME JURÍDICO DAS ARMAS E MUNIÇÕES, pela Lei n.º 140/2019, de 24 de Julho, entradas em vigor em 22-09-2019.

    i. Na verdade, a Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro (doravante RJAM), na sua actual redacção estabelece na alínea m) do n.º 1 do artigo 2.º, como definição de arma banca “Todo o objecto ou instrumento portátil dotado de uma lâmina ou outra superfície cortante, perfurante ou corto-contundente, de cumprimento superior a 10 cm (…)” ii. Por outro lado, relativamente à classificação das armas foi aditada a alínea ab) ao n.º 2 do artigo 3.º do RJAM, que classifica como arma da classe A “As armas brancas com afectação ao exercício de quaisquer práticas venatórias, comerciais, agrícolas, industriais, florestais, domésticas ou desportivas, ou objecto de colecção, quando encontradas fora dos locais do seu normal emprego e os portadores não justifiquem a sua posse”.

    iii. A mencionada lei procedeu ainda à alteração da alínea d) do n.º 1 do artigo 86.º do RJAM, onde, para além do mais, criminaliza de forma expressa a detenção das “armas brancas constantes da alínea ab) do n.º 2 do artigo 3.º”.

    iv. Isto é, com a entrada em vigor, da Lei n.º 50/2019, de 24 de Julho, o legislador respondeu adequadamente às expectativas comunitárias, passando a englobar na incriminação a posse das armas brancas com aplicação definida, quando encontradas fora dos locais destinados à sua utilização e cuja posse não seja justificada.

  3. - Com o muito respeito devido pela posição assumida pela Mm.ª Juiz a quo, entendemos que o despacho proferido não se mostra de acordo com as normas jurídicas em vigor à data dos factos, nem com os factos narrados na acusação e consequente imputação jurídico penal.

  4. - Assim, e considerando que o arguido, P. , no dia 16-11-2020, detinha na sua posse, na via pública (Largo dos Cravos) uma faca de cozinha com uma lâmina perfurante e cortante em aço inox, com um comprimento de 19 cm, que sabia que detinha tal instrumento fora do local onde a mesma se destina a ser usada e não justificou a sua posse, estando consciente da punibilidade da sua conduta, praticou o mesmo um crime de detenção de arma proibida, encontrando-se preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do respectivo tipo legal, (cfr. artigo 3.º, n.º 2, alínea ab) e artigo 86.º, n.º 1 alínea d) do RJAM).

  5. - A douta decisão recorrida, violou as seguintes disposições: artigos 86.º, n.º 1, alínea d) e 3.º, n.º 2, alínea ab), ambos da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, artigo 311.º, n.º 1, n.º 2, alínea a) e n.º 3, alínea d) do Código de Processo Penal e artigo 32.º, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa 7.ª - Pelo que, deverá ser revogado o despacho sob recurso, substituindo-se por outro que determine o recebimento da acusação, devendo o processo prosseguir os demais termos até final.

    II - 2.)...

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