Acórdão nº 127/19.5IDBRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 21 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelC
Data da Resolução21 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães.

  1. Relatório 1.

    Nos presentes autos de processo comum com intervenção do tribunal singular, com o número 127/19.5IDBRG, do Tribunal Judicial da Comarca de Braga, Juízo Local Criminal de Braga, realizado julgamento foi proferida sentença, constando do respetivo dispositivo o seguinte: «(…) Condenar a arguida M. C., pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo artigo 105.º, n.º 1, do Regime Geral das Infrações Tributárias, na pena de 150 (cento e cinquenta) dias de multa, a 06,00€ (seis Euros) por dia, totalizando o montante de 900,00€ (novecentos Euros); b) Condenar a sociedade arguida X – UNIPESSOAL, LDA., pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelos artigos 7.º e 105.º, n.º 1, ambos do Regime Geral das Infrações Tributárias, na pena de 180 (cento e oitenta) dias de multa, a 05,00€ (cinco Euros) por dia, totalizando o montante de 900,00€ (novecentos Euros); c) Declarar improcedente a perda da vantagem patrimonial requerida pelo Ministério Público; d) Condenar as arguidas M. C. e X – UNIPESSOAL, LDA., no pagamento das custas do processo, fixando a taxa de justiça em 04 (quatro) Unidades de Conta, reduzida a metade nos termos do artigo 344.º, n.º 2, alínea c), do Código de Processo Penal.

    (…)».

    1. Não se conformando com o decidido, na parte em que se declarou improcedente a perda da vantagem patrimonial, veio o Ministério Público interpor o presente recurso, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões: «1) O Mmo Juiz julgou improcedente o pedido de declaração de perda das vantagens do facto ilícito típico a favor do Estado, considerando que “o ofendido é o Estado que, através da Autoridade Tributária, optou, como é competência sua, pela execução fiscal, arredando o Ministério Público de intervenção na recuperação daquela quantia por considerar que tem meios suficientes para cobrança coerciva do imposto em causa, acrescentando que a Administração Tributária já tinha a correr termos execução fiscal e não deu instruções ao Ministério Público para que fosse deduzido pedido cível, ou seja, interpretando instituto previsto no artigo 110.º do C.P, como se de um verdadeiro pedido de indemnização civil se tratasse.

      2)Ao julgar improcedente o pedido de declaração de perda das vantagens do facto ilícito típico a favor do Estado, a Sentença recorrida violou o disposto nos artigos 7.º do CPP, 110.º e 130.º, ambos do Código Penal.

      3) Na verdade, a pendência de mecanismos fiscais de recuperação das vantagens da prática do crime de abuso de confiança fiscal não impede que na sentença seja declarado o perdimento do valor dessas mesmas vantagens, assim fazendo ver à comunidade que o crime não compensa.

      4) O valor declarativo dessa sentença não deve ser confundido com a possibilidade da sua execução futura, não havendo norma legal que impeça a existência de vários títulos executivos.

      5) A perda de vantagens não é uma pena acessória, trata-se antes de uma medida sancionatória análoga à medida de segurança, pois baseia-se na necessidade de prevenção do perigo da prática de crimes.

      6) Para efeitos de prevenção geral e prevenção especial a sentença deverá, sem prejuízo dos direitos de terceiros, declarar a perda das vantagens decorrentes da prática do crime, assim demonstrando que ele não compensa, reforçando e confirmando a validade e a vigência da norma jurídica violada.

      7) O procedimento de execução fiscal e mesmo o pedido de indemnização civil, não são suficientes para assegurar as necessidades de prevenção do perigo da prática de crimes que pretende salvaguardar a perda de vantagens.

      8) Na verdade, da conjugação do artigo 110.º com o art.º 130.º, ambos do Código Penal, conclui-se não existirem limites ao confisco, nomeadamente aqueles que podiam advir da mera possibilidade de ser deduzido um pedido de indemnização civil.

      9) Salvo melhor opinião, não se pode dizer que pelo facto da Administração Fiscal não pretender que o Ministério Público, em sua representação, deduza pedido cível, ficaria impedido de peticionar a perda de vantagem. De facto, tal como se refere no artigo 110.º n.ºs 1e 6, do CP, “são perdidos a favor do Estado, sem prejuízo dos direitos do ofendido (…)”, pelo que o Ministério Público age por direito próprio no interesse supra individual da comunidade e não em representação da Administração Tributária enquanto lesada.

      10) A tese defendida na sentença põe em causa o princípio da suficiência do processo penal previsto no artigo 7.º do CPP, colocando nas mãos do lesado e dos seus interesses, a resolução de uma questão penal, quando, na verdade, o Ministério Público, nos termos do disposto no artigo 110.º, n.º 1, do C.P., deve promover e o Juiz, quando estão reunidos os respectivos pressupostos legais, deve declarar perdidos a favor do Estado as vantagens da prática do crime, em face da formulação imperativa consagrada na Lei penal.

      11) Nos presentes autos as arguidas foram condenados pela prática de um ilícito criminal, crime de abuso de confiança fiscal, tendo sido dado como provado que tal ilícito foi consubstanciado na ocultação de valores com o objectivo de obter vantagens patrimoniais...

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