Acórdão nº 0134/21.8BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelANÍBAL FERRAZ
Data da Resolução23 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.

A…………, S.A., …, com cobertura do disposto pelos artigos (arts.) 25.º n.ºs 2 a 4 e 26.º do Decreto-Lei n.º 10/2011 de 20 de janeiro (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAMT).) e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), interpôs, para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA, recurso, objetivando uniformização de jurisprudência, da decisão (colegial) proferida, no âmbito de pedido de pronúncia arbitral, formulado no processo nº 89/2021-T, do Centro de Arbitragem Administrativa (caad), que decidiu julgar improcedente o pedido arbitral (respeitante, em primeira linha, à apreciação da legalidade de autoliquidação, de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), referente ao exercício de 2017, na parte relativa à não dedução à coleta de benefício fiscal, apurado no âmbito do Regime Fiscal de Apoio ao Investimento (RFAI)).

Aponta-lhe contradição/oposição, com a, também, decisão arbitral, datada de 12 de outubro de 2020, exarada no processo nº 220/2020-T.

A recorrente (rte) apresentou alegação, finalizada com as seguintes conclusões: «

  1. Da oposição no âmbito da mesma questão fundamental de direito entre a decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral fundamento A) É de sublinhar a identidade da questão tratada na decisão arbitral recorrida (processo n.º 89/2021-T), de uma parte, e na decisão arbitral fundamento (processo n.º 220/2020-T), de outra parte.

    1. Em ambos os casos o que está em causa é a mesma situação e a mesma questão fundamental de direito referente à mesma legislação: o artigo 2.º, n.º 3, do CFI, e a Constituição, autorizam ou não que a portaria de execução habilitada pelo citado artigo 2.º, n.º 3, do CFI, a Portaria n.º 282/2014, de 30 de Dezembro, precluda, exclua, actividade reconhecidamente abrangida no artigo 2.º, n.º 2, do CFI, aprovado pelo Decreto-Lei (emitido sob autorização legislativa) n.º 162/2014 de 31 de Outubro, aplicável ao RFAI ex vi artigo 22.º, n.º 1, do mesmo CFI.

    2. Dito de outro modo, questão fundamental de direito que em ambos os casos passou pela discussão de saber se a Portaria n.º 282/2014, de 30 de Dezembro estava legalmente habilitada pela sua norma habilitante, o artigo 2.º, n.º 3, do CFI, e se podia, constitucionalmente falando, estar habilitada, para afastar actividade reconhecidamente subsumível no artigo 2.º, n.º 2, do CFI, aprovado pelo Decreto-Lei (emitido sob autorização legislativa) n.º 162/2014 de 31 de Outubro, e aplicável ao RFAI ex vi artigo 22.º, n.º 1, do mesmo CFI.

    3. A decisão arbitral recorrida concluiu que a referida portaria estava validamente habilitada a fazê-lo (a afastar actividade reconhecidamente, pela própria decisão arbitral recorrida, subsumível no artigo 2.º, n.º 2, do CFI), enquanto a decisão arbitral fundamento, transitada em julgado, concluiu, contrariamente, que a referida portaria não estava habilitada a excluir actividade subsumível no artigo 2.º, n.º 2, do CFI.

    4. Inexiste alteração da regulamentação jurídica aplicável entre um e outro caso.

    5. Deve, pois, ser admitido o presente recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152.º do CPTA, por remissão do artigo 25.º, n.ºs 2 e 3, do RJAT (na redacção dada pela Lei n.º 119/2019, de 18 de Setembro), e fundado na oposição sobre a mesma questão fundamental de direito entre a decisão arbitral recorrida proferida em 27.09.2021 no processo n.º 89/2021-T, e a decisão arbitral fundamento de 12.10.2020 proferida no processo n.º 220/2020-T, por se verificarem os requisitos exigidos para o efeito.

  2. Disposições legais violadas pela decisão arbitral recorrida G) A decisão arbitral recorrida viola isolada ou conjugadamente, o artigo 2.º, n.ºs 2 e 3 do CFI, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014 de 31 de Outubro, aplicável ao RFAI aqui em causa ex vi artigo 22.º, n.º 1, do mesmo CFI, e os artigos 103, n.º 2, 112.º, n.º 5 e 165, n.º 1, alínea i), da Constituição.

  3. Porque improcede o entendimento da decisão arbitral recorrida H) Como se expôs no precedente pedido de pronúncia arbitral, não impedindo o direito comunitário, num caso (decisão arbitral recorrida) como no outro (decisão arbitral fundamento), a elegibilidade para efeitos do benefício RFAI das actividades em causa, I) a Portaria de regulamentação do CFI, n.º 282/2014, se quiser afrontar este diploma legal, só se tem a si mesma e ao seu valor jurídico, para o fazer.

    1. Ora, como bem explica a decisão arbitral fundamento, o mandato que a lei habilitante (artigo 2.º, n.º 3, do CFI, aplicável ao RFAI ex vi artigo 22.º, n.º 1, do CFI) confere à portaria, é de executar a concretização dos códigos correspondentes às atividades referidas no número anterior (no n.º 2 do mesmo artigo 2.º do CFI)”.

    2. Nenhum mandato é conferido pela lei habilitante à lei regulamentadora para não definir os códigos “correspondentes às atividades referidas no número anterior”, ou para não definir códigos, muitos ou poucos, os que lhe apetecer, “correspondentes às atividades referidas no número anterior”.

    3. Não, o mandato é claro e sem ambiguidades: por portaria serão definidos os “códigos de atividade económica (CAE) correspondentes às atividades referidas no número anterior”, sem adições nem subtracções, que nenhuma a lei habilitante autoriza (o artigo 2.º, n.º 3, do CFI).

    4. Nenhuma lei habilitante, in casu o artigo 2.º, n.º 3, do CFI, autoriza, e nenhuma poderia constitucionalmente autorizar, como resulta evidente, e é conhecido, dos artigos 112.º, n.º 5, e artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição (e como constatou igualmente a citada decisão arbitral fundamento, proferida no processo n.º 220/2020-T).

    5. Donde que, previsto que está em lei (artigo 2.º, n.º 2, do CFI, aplicável ao RFAI ex vi artigo 22.º, n.º 1, do CFI) a aplicação do RFAI, entre outros sectores, ao das telecomunicações, não pode um outro acto normativo sem natureza de lei (a citada Portaria n.º 282/2014) afastar normativamente um dos sectores previstos, o das telecomunicações, do âmbito de aplicação do referido RFAI.

    6. Tal modificação normativa / revogação parcial / suspensão parcial do regime do benefício fiscal em causa, não pode operar, é ilegal, dada a hierarquia superior, constitucionalmente sancionada, do Decreto-Lei (que instituiu o CFI) emitido sob autorização legislativa da Assembleia da República, relativamente à portaria de execução do mesmo (violação pela portaria das normas de grau hierárquico superior constantes dos artigos 2.º, n.ºs 2 e 3, do CFI, aplicáveis ao RFAI ex vi artigo 22.º, n.º 1, do CFI), P) Portaria esta que padece ainda, quando afronta o referido CFI, e quando modifica matérias de reserva de lei, de inconstitucionalidade material (violação da hierarquia constitucional dos actos normativos) formal e orgânica (violação da reserva de lei).

    7. Finalmente, se se vir no artigo 2.º, n.º 3, do CFI, uma lei habilitante que conferiria a uma portaria, delegaria numa portaria, autoridade para modificar, ou recortar de outra maneira, revogando ou suspendendo parcialmente, a previsão normativa do n.º 2 do artigo 2.º do CFI, delimitadora dos sectores de actividade a que se aplica, entre outros, o benefício fiscal do RFAI, R) haverá então, óbvia e evidentemente, inconstitucionalidade da própria lei habilitante (o artigo 2.º, n.º 3, do CFI, aplicável ao RFAI ex vi artigo 22.º, n.º 1, do CFI).

    8. Donde que, a previsão normativa prevista no artigo 2.º, n.º 3, do CFI, ou o segmento normativo do artigo 22.º, n.º 1, do CFI, “tendo em consideração os códigos de atividade definidos na portaria prevista no n.º 3 do referido artigo [2.ºdo CFI]”, interpretadas(os) com o sentido normativo de previsões de delegação em, ou reenvio para, portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da economia, da palavra final, ou interpretadas(os) com o sentido normativo de previsões que habilitam portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da economia a ter a palavra final, ou interpretadas(os) com o sentido normativo de previsões que autorizam portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da economia a ter a palavra final, e por conseguinte a superiorizar-se (a portaria), via definição dos CAE, à definição dos sectores de actividade elegíveis para efeitos do benefício fiscal do RFAI constante do artigo 22.º, n.º 1 do CFI em articulação com o artigo 2.º, n.º 2, do mesmo CFI, e por conseguinte a afastar (a portaria) o sector das telecomunicações neste acto legislativo (CFI) eleito e previsto, são inconstitucionais, por violação do artigo 112.º, n.º 5, da Constituição, que proíbe qualquer lei de “conferir a actos de outra natureza o poder de, com eficácia externa, interpretar, integrar, modificar, suspender ou revogar qualquer dos seus preceitos”, e por violação dos artigos 103.º, n.º 2, e 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição, que reservam às leis da Assembleia da República e aos decreto-lei do Governo autorizados por aquelas, o exclusivo do legislar sobre a criação de impostos e respectivos benefícios fiscais ou, noutra formulação, o exclusivo do legislar sobre a criação de impostos e sistema fiscal.

    9. Em síntese e em conclusão, a decisão arbitral recorrida, que decidiu e concluiu em sentido contrário, viola, pois, o artigo 2.º, n.ºs 2 e 3 do CFI, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 162/2014 de 31 de Outubro, aplicável ao RFAI aqui em causa ex vi artigo 22.º, n.º 1, do mesmo CFI, e os artigos 103, n.º 2, 112.º, n.º 5 e 165, n.º 1, alínea i), da Constituição.

    10. Como ainda agora se pronunciou o STA a propósito de questão estruturalmente idêntica, no acórdão de 6 de Outubro de 2021, proferido no processo n.º 064/15.2BEVIS 0188/18, confirmando e reafirmando a jurisprudência do acórdão de 11 de Outubro de 2021, proferido no processo n.º 01361/16 (…): “Enfim, estes regulamentos complementares ou de execução são, tipicamente, regulamentos «secundum legem», sendo...

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