Acórdão nº 208/18.2JACBR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelNUNO GARCIA
Data da Resolução25 de Janeiro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES QUE INTEGRAM A SECÇÃO CRIMINAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA RELATÓRIO No âmbito do processo 208/18.2JACBR procedeu-se ao julgamento de JF e no âmbito do mesmo foi proferido acórdão contendo o seguinte dispositivo (na parte que interessa): “Tudo ponderado, decide o Tribunal: a) Absolver JF da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de abuso sexual de crianças, previsto e punido pelo artigo 171.º, n.º 2, do Código Penal; b) Condenar JF pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de abuso sexual de crianças, na forma agravada, previsto e punido pelo artigo 171.º, n.º 1, e 177.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, por referência aos artigos 69.º-B, n.º 2, e 69.º-C, n.º 2, do mesmo diploma legal, na pena de 5 (cinco) anos de prisão, na pena acessória de proibição de exercício de funções por crimes contra a autodeterminação sexual e a liberdade sexual, cujo exercício envolva contacto regular com menores, e na pena acessória de proibição de confiança/guarda da menor EF e inibição de responsabilidades parentais relativamente à mesma pelo período de 5 (cinco) anos; c) Declarar suspensa a execução da pena de prisão pelo período de 5 (cinco) anos, subordinada ao dever de JF se abster de contactar EF, excepto em cumprimento de regime de visitas vigiadas estipuladas por decisão judicial proferida por Tribunal com competência no âmbito da Jurisdição de Família e Menores, pelo período de 5 (cinco) anos, contado do trânsito em julgado da presente decisão; d) Sujeitar a suspensão da execução da pena de prisão aplicada a JF a regime de prova, assente em plano social de recuperação a elaborar pelo Instituto de Reinserção Social, que preveja necessariamente um acompanhamento técnico e psicoterapêutico especializado do arguido, com especial incidência na aquisição de adequadas competências no âmbito do desenvolvimento da sua normatividade sexual; e) Julgar procedente o pedido civil deduzido por MS, em representação de EF, contra JF e, em consequência, condenar este a pagar àquela a quantia de €10.000,00 (dez mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, a contar da data da notificação do pedido civil e até integral pagamento; f) Condenar JF a pagar as custas criminais, fixando em 3UC a taxa de justiça, sem prejuízo da protecção jurídica de que beneficia; g) Condenar o demandado no pagamento das custas do pedido civil, em face do seu decaimento; h) Determinar, após trânsito em julgado, a recolha a JF do perfil de ADN (ácido desoxirribonucleico) para fins de investigação, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 1.º, n.ºs 1 e 2, 8.º, n.º 2, e 18.º, n.º 3, da Lei n.º 5/2008, de 12 de Fevereiro; i) Ordenar a comunicação da presente decisão, após trânsito, ao Instituto de Reinserção Social, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 494.º, n.º 3, do Código de Processo Penal; j) Ordenar a comunicação da presente decisão aos Serviços do Ministério Público do Tribunal com competência no âmbito da Jurisdição de Família e Menores na área da residência da menor; k) Ordenar a comunicação da presente decisão, após trânsito, ao Ministério da Educação; # Não se tendo conformado com a referido decisão, dela recorreu o arguido tendo terminado a motivação de recurso com as seguintes conclusões: “1. O arguido foi condenado, pela prática de crime de abuso sexual de crianças, p. e p. no art.º 171.º n.º 1, agravado pelo 177.º n.º 1 al a) do Código Penal na pena de prisão de 5 anos, suspensa na sua execução e nas penas acessórias de proibição do exercício de actividade profissional e de inibição do exercício das responsabilidades parentais, não se conformando com as penas aplicadas, por as mesmas se revelarem desconformes às regras da determinação da pena; 2. Desde logo, porque na fundamentação da determinação da medida da pena o Tribunal a quo não ter considerado e relevado a diminuição da culpa do arguido, provocada pela menor capacidade de culpa, assente na doença mental que ficou provada afectar o arguido; 3. O Tribunal a quo deu como provado (factos provados 22, 23 e 31 a 34) que o arguido sofre de doença afectiva bipolar e que, há data da prática dos factos, registava excessos de consumo de álcool e haxixe e que tal circunstância influenciava os seus comportamentos; 4. Sendo os comportamentos do arguido condicionados e influenciados pelo conjunto destes factores e sendo a referida doença causadora quer da propensão para os excessos dos consumos, quer para prática de actos desequilibrados e desajustados, a actuação do arguido fica marcada pelo seu estado de saúde mental; 5. Estando a capacidade de compreensão, de decisão e motivação do arguido condicionada e influenciada por esse estado, a sua debilidade psíquica conduz a uma capacidade de culpa diminuída, que traduz um grau de culpa também diminuído, em função de tal circunstância; 6. O grau de capacidade de culpa afectado deveria influenciar a determinação da medida da pena e o Acórdão, na justificação da medida da pena não se reporta à culpa e grau de censurabilidade do arguido, o que significa que não levou a mesma em linha de conta; 7. Além de ter considerado que depunham contra o arguido a ausência de arrependimento, o que advém de uma juízo de formulação negativa decorrente do exercício do direito ao silêncio, violador do disposto no art.º 343 n.º 1 do CPP, porquanto o Tribunal concluiu ser esta atitude por o arguido não ter querido prestar depoimento; 8. Para além de o Tribunal ter partido de uma presunção acerca de quais as motivações do arguido, na certeza que a culpa não se afigura susceptível de juízo presuntivo; 9. A decisão da pena aplicada ao arguido, violou o disposto no art.º 40.º n.º 2 do Código Penal, porquanto a mesma não atendeu à medida da culpa do arguido JF; 10. Devendo o Acórdão ser revogado, no que se reporta à determinação da pena de prisão a aplicar ao arguido e ser substituído por decisão que, considerando o grau de culpa diminuído, pela reduzida capacidade de culpa, decorrente do estado de saúde mental do arguido, na data da prática dos factos, aplique pena de prisão que seja fixada próxima do limite mínimo da moldura penal em que o mesmo incorre

  1. Também deve ser revogada a parte do Acórdão em que se determinou a aplicação da sanção acessória de proibição do exercício de profissão, previsto no art.º 69-º B do Código Penal; 12. A sanção acessória prevista no art.º 69.º B do CP foi aplicada no pressuposto de o sentido interpretativo da mesma ser de resultar do seu conteúdo a aplicação automática da mesma; 13. Sendo esse o sentido interpretativo da referida norma, a mesma atenta contra a Constituição, por violação concreta do disposto no art.º 18.º 2 e do art.º 30.º n.º 4 da CRP, por as mesmas e os princípios nela ancorados consagrarem a proibição de a proibição do exercício de direitos profissionais de forma automática; 14. A aplicação da sanção acessória referida e a sua cumulação no caso concreto com a pena de prisão e a inibição do exercício das responsabilidades parentais, afigura-se violadora dos princípios da necessidade e da proporcionalidade, não existindo no acórdão elementos que revelem que a proibição do exercício de actividade profissional do arguido JF se revele necessária; 15. A Aplicação da referida sanção afigura-se desadequada, desproporcional e injustificada, devendo ser revogada

  2. Deve, assim, ser substituída a pena de prisão por outra menor, próxima do limite mínimo, adequado ao grau de culpa diminuído do arguido e não ser aplicada a sanção acessória de proibição do exercício de actividade profissional

    Termos em que, com o mui douto suprimento de Vossas excelências, Venerandos Juízes Desembargadores, deve o recurso ser julgado procedente e, em consequência, ser: 1. Revogada a pena de prisão de 5 anos aplicada ao arguido e ser a mesma substituída por outra mais próxima do limite mínimo do arguido; 2. Revogada a pena de proibição do exercício de actividades profissionais que envolvam contacto com crianças prevista no art.º 69.º B do Código Penal, não devendo a mesma ser aplicada ao arguido

    Assim julgado se faz a...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT