Acórdão nº 3229/16.6T8LRS.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA JOSÉ COSTA PINTO
Data da Resolução26 de Janeiro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa 1. Relatório 1.1.

AAA, intentou a presente acção emergente de acidente de trabalho, sob a forma do processo especial, contra BBB e BBB, peticionando a condenação das RR. a pagar ao A. a título indemnização por incapacidades temporárias um total de € 16.883,75 e a pensão devida por IPATH a contar da data em que é devida e com as actualizações legais, bem como o subsídio de elevada incapacidade permanente de € 5.700,00 e as despesas de deslocação no valor de € 15,00, tudo acrescido de juros de mora vencidos e vincendos.

Em fundamento da sua pretensão, alegou, em síntese: que no dia 02 de Outubro de 2014 foi vítima de um acidente de trabalho, quando estava ao serviço da 2.ª R. empregadora mediante o salário anual de € 14.328,50; que a R. seguradora assumiu o acidente e lhe prestou assistência até 5 de Outubro de 2015; que a empregadora tinha um seguro válido antes da ocorrência do sinistro pois no dia 2 de Outubro de 2014 o seu gerente foi ao mediador e chegou ao local antes das 09 horas, fez o seguro e pagou o prémio, sendo o movimento registado; que o acidente causou IPATH ao A., e não apenas a IPP de 16% fixada pelo perito médico do tribunal, pelo que requer a realização de junta médica.

A R seguradora contestou alegando, em suma: que celebrou com a R. empregadora, com efeito a partir de 05 de Maio de 2014, um contrato de seguro na modalidade de prémio fixo, sendo nele considerados pessoas seguras três trabalhadores, cujos nomes e retribuições se podem ler na respectiva proposta e Condições Particulares que junta, ali não constando o A.; que em 02 de Outubro de 2014, através do mediador, a R. empregadora propôs uma alteração à Apólice para inclusão e exclusão de “pessoas seguras”, passando o quadro de pessoal seguro a ser composto por sete trabalhadores, entre eles o ora A., conforme Acta Adicional que junta; que a proposta foi preenchida pelas 10 horas, 21 minutos e 21 segundos de 02 de Outubro de 2014, pretendendo-se o início da cobertura no próprio dia da apresentação da proposta, e que autorizou a emissão da Acta Adicional; que, pretendendo-se o início da cobertura no próprio dia da apresentação da proposta, a R. aceita mas apenas na condição de a cobertura se iniciar a partir de 4 horas decorridas sobre a criação informática da proposta de seguro e, por isso, na Acta Adicional ficou consignado “inclusão de pessoas seguras a partir das 14:25 do dia 02-10-2014” pelo que que a cobertura do risco relativamente ao autor se iniciou pelas 14:25 horas desse dia; que a empregadora preencheu a participação de sinistro de acidentes de trabalho deixando em branco o espaço destinado à indicação da “hora do acidente”; que o acidente ocorreu pelas 09:40 horas, antes de se iniciar a cobertura do seguro ao A.; que a co-ré, no momento em que pretendeu segurar o risco, não poderia desconhecer que o acidente já ocorrera, tendo conscientemente omitido tal facto ao seu mediador, sendo que o A. trabalhava para a co-ré pelo menos, desde 09 de Dezembro de 2013; que a pretensão de incluir o A. na cobertura da apólice foi uma vã e arrojada tentativa de, fraudulentamente, fazer recair sobre a seguradora as consequências do dever de reparação, ainda que sem o pagamento do respectivo prémio, não cobrindo a apólice o A. que dela não constava como “pessoa segura”, no momento do acidente. Impugnou ainda os factos alegados na petição inicial e alegou, à cautela, que o acidente foi devido a falta de condições de segurança e que a retribuição auferida é superior à transferida, pelo que sempre teria de haver lugar à aplicação do artigo 79º, nº 4 da Lei 98/2009.

Proferido despacho a solicitar esclarecimentos ao Autor e à Ré seguradora, vindo a ambas as partes a prestá-los a fls. 212 verso e 204 verso e ss., respectivamente.

Foi proferido despacho saneador e seleccionados os factos assentes, bem como organizada a base instrutória. Organizou-se processo apenso para fixação da incapacidade.

Procedeu-se ao julgamento, sendo que entre as sessões do mesmo foi proferida decisão que, atenta a extinção da R. CCC declarou verificada a excepção dilatória da sua falta de personalidade judiciária e, por conseguinte, absolveu-a da instância. Do mesmo passo, foi determinada a intervenção na acção do Fundo de Acidentes de Trabalho (FAT), citando-se o mesmo para, enquanto interveniente principal e dentro dos seus poderes, prosseguir nesta acção. Desenvolvidos os necessários trâmites processuais e concluído o julgamento, o Mmo. Juiz a quoproferiu sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, tendo em consideração quer o decidido no apenso A, quer a fundamentação acima exarada, fixo ao sinistrado AAA a IPP de 18,4% c/IPATH. Considerando também que a ré entidade empregadora está extinta e, por isso, foi absolvida da instância, decido: a) O sinistrado tem direito à pensão anual e vitalícia no montante de € 4.128,73 (quatro mil, cento e vinte e oito euros e setenta e três cêntimos), com início em 01-06-2016; b) Sendo a ré “BBB” responsável pelo pagamento da pensão anual e vitalícia de € 3.584,50 (três mil, quinhentos e oitenta e quatro euros e cinquenta cêntimos) – valor devido em 2016 –, acrescida das atualizações entretanto introduzidas por portaria; c) E o Fundo de Acidentes de Trabalho, enquanto garante das prestações que caberiam à empregadora, responsável pelo pagamento da pensão anual e vitalícia de € 544,23 (quinhentos e quarenta e quatro euros e vinte e três cêntimos), acrescido das atualizações legalmente previstas; Condeno, ainda, d) A ré “BBB.” a pagar ao sinistrado, a título de subsídio por situações de elevada incapacidade permanente, o montante de € 3.628,18 (três mil, seiscentos e vinte e oito euros e dezoito cêntimos); e) O Fundo de Acidentes de Trabalho, enquanto garante das prestações que caberiam à empregadora, a pagar ao sinistrado, a título de subsídio por situações de elevada incapacidade permanente, o montante de € 550,87 (quinhentos e cinquenta euros e oitenta e sete cêntimos); Mais condeno, f) A ré “BBB.” a pagar ao sinistrado a indemnização por incapacidade temporária absoluta entre 03-10-2014 a 31-05-2016, no montante de € 8.129,37 (oito mil, cento e vinte e nove euros e trinta e sete cêntimos); g) O Fundo de Acidentes de Trabalho, enquanto garante das prestações que caberiam à empregadora, a pagar ao sinistrado a indemnização por incapacidade temporária absoluta entre 03-10-2014 a 31-05-2016, no montante de € 1.234,28 (mil, duzentos e trinta e quatro euros e vinte e oito cêntimos).

h) Às quantias mencionadas nas alíneas b), d) e f) acrescem juros de mora à taxa legal desde as respetivas datas de vencimento até integral pagamento.

E, no que respeita às prestações em espécie, i)A ré BBB deve assegurar o fornecimento e manutenção/substituição de material de compressão específico das cicatrizes hipertróficas; j) A ré BBB deve assegurar assistência médico-cirúrgica periódica para vigilância das cicatrizes e da sua evolução; k)A ré BBB deve assegurar o apoio/assistência psicológico/psiquiátrica, caso o sinistrado venha a necessitar.

E l) Absolvo a ré seguradora do pedido de pagamento de despesas de deslocação.

Custas a cargo da Seguradora.

Valor da ação: € 82.397,53 (art.º 120.º do CPT).

Notifique a sentença à ACT Centro Local de Lisboa Central c/ref. ao Inquérito Sumário e Urgente de AT, n.º 1714000041, de 02/10/2014, apenas para tomar conhecimento.

*Notifique a sentença ao IEFP, c/ref. ao Parecer n.º 1151/DEM/EM-OC/2020, apenas para tomar conhecimento […].» 1.2.

A R. seguradora, inconformada interpôs recurso desta decisão, tendo formulado, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: (…) 1.3.

Igualmente o FAT interpôs recurso da sentença, na arte referente à sua condenação a pagar o subsídio de elevada incapacidade permanente. Terminou a minuta alegatória com o seguinte núcleo conclusivo: (...) 1.6.

Recebidos os autos nesta Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto Parecer no sentido de não se conceder provimento ao recurso.

Apenas o A. se pronunciou sobre este Parecer, com ele concordando.

* Colhidos os “vistos” e realizada a Conferência, cumpre decidir.

* 2. Objecto do recurso * O âmbito dos recursos é delimitado pelas conclusões das alegações dos recorrentes – artigo 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, aplicável “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho –, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso que ainda não tenham sido conhecidas com trânsito em julgado.

Assim, vistas as conclusões do recurso da R. seguradora, verificamos que a este tribunal se coloca essencialmente: a) a questão da nulidade da sentença por excesso de pronúncia; b) a questão da sindicância da decisão de facto no que diz respeito ao ponto xviii dos factos provados e à alínea i) dos factos “não provado”; c) a questão de saber se, em 2 e Outubro de 2016, à hora a que o A. sofreu o acidente de trabalho descrito na sentença – breves instantes antes das 09:36h –, se encontrava transferida para a recorrente seguradora a responsabilidade civil emergente de acidente de trabalho sofrido pelo A. ao serviço da segunda R., sua empregadora; d) em caso afirmativo, se era à seguradora lícito recursar a cobertura por comportamento doloso do tomador do seguro nos termos da cláusula 11.ª, n.º 1, alínea c), da Portaria n.º 256/2011, de 5 de Julho.

E, vistas as conclusões do Fundo de Acidentes de Trabalho, verificamos que no correspondente recurso a este tribunal se coloca apenas a questão de saber se, respondendo a apelante seguradora pela proporção do valor salarial que esteve na base da pretendida alteração do contrato de seguro, é devido o pagamento de alguma quota-parte do subsídio por situação de elevada incapacidade por parte do FAT.

Conhecer-se-á das questões suscitadas atenta a ordem lógica da sua apreciação.

* 3. Da nulidade da sentença Invoca a recorrente que o tribunal a...

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