Acórdão nº 66/21.0YHLSB.L1-PICRS de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Janeiro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA DA LUZ SEABRA
Data da Resolução27 de Janeiro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam em conferência, na Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão, do Tribunal da Relação de Lisboa I. RELATÓRIO: 1.SO…, SA, intentou ao abrigo do disposto nos artigos 38.º e seguintes do Novo Código da Propriedade Industrial, recurso do despacho do Diretor de Marcas do INPI que recusou o pedido de registo da marca nacional n.º 631726 "AUDAZ SÓ PARA OS MAIS FORTES", no seguimento da decisão de deferimento do pedido de modificação da decisão anteriormente proferida de concessão, pedindo que fosse revogado o despacho recorrido e admitido o referido registo.

Alegou, em síntese, ser a decisão errada por não existir risco de confusão entre a marca registanda e as marcas da recorrida nº 624916- AUDAZES e nº 624918- AUDAZ, face à inexistência de afinidade entre os produtos e os serviços das classes 35 e 43 e, os produtos que a sua marca se destina assinalar na classe 30.

  1. A então Recorrida O… SGPS apresentou resposta ao recurso, alegando que a decisão do INPI devia ser mantida porquanto se estabelece risco de confusão com as suas marcas, existindo afinidade entre os produtos/serviços e semelhança gráfica, fonética e semântica entre os sinais.

  2. Foi proferida sentença final, pela qual se decretou o seguinte: “Pelo exposto, julgo procedente o recurso interposto e, em consequência revogo o despacho do Instituto Nacional da Propriedade Industrial aludido na al. a), dos factos provados, sendo substituído pelo de concessão do registo da marca pedida.

    Custas pela recorrido/a - (artigo 527º do Código de Processo Civil).

    Valor da causa: 30.000,01 euros.

    Registe, notifique e, após trânsito, comunique ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial.

    Após trânsito da sentença, cumpra-se o artigo 34º, nº 5, aplicável nos termos do artigo 46º, do CPI.” 4.

    Inconformada, a Recorrida/aqui Recorrente O… SGPS interpôs recurso de apelação da sentença final, em que, nas conclusões: i) impugna a decisão de direito, com fundamento em errada interpretação do artigo 238º do CPI, sustentando que há risco de confusão entre a marca da Apelada e as suas marcas, estando preenchido o requisito da afinidade entre produtos/serviços, requisito que o tribunal a quo não considerou verificado.

    Conclui, pedindo seja o presente recurso de apelação julgado totalmente procedente, revogando-se a decisão recorrida.

  3. A aqui Recorrida SO…, SA não ofereceu contra-alegações.

  4. Foram observados os vistos legais.

  5. No presente recurso de apelação, a Apelante formulou as seguintes CONCLUSÕES A. O Tribunal a quo concluiu, de forma errada, que entre os sinais em confronto não existe semelhança/afinidade entre os serviços e produtos.

    B. A não afinidade foi julgada segundo uma interpretação de especificação de produtos.

    C. No entanto, uma classificação mais abrangente, é mais difícil de ser bem-sucedida, e, por conseguinte, goza de uma proteção mais ampla.

    D. Essa proteção é colocada em causa pela decisão do Tribunal a quo.

    E. Conforme analisámos, existem decisões anteriores que consideram que os serviços de retalho de bens alimentares, serviços de restauração, e os produtos assinalados pela marca da Apelada na classe 30 são afins, ou semelhantes em grau reduzido.

    G. Resulta das mesmas decisões, que o grau reduzido pode ser colmatado se houver fortes semelhanças gráficas, fonéticas e/ou conceptuais, o que se verifica no caso concreto.

    H. O Tribunal a quo parece ter ignorado estas decisões ao não proferir uma palavra sobre as mesmas e limitar-se a reger o seu argumento utilizando apenas uma decisão do INPI.

    I. No entanto, o recurso administrativo, vulgo modificação de decisão, do INPI foi favorável para a Apelante.

    J. Havendo semelhança ou afinidade no presente caso, é necessário avaliar a comparação gráfica e fonética dos sinais em confronto.

    L. O termo dominante, e principal, da marca da APELADA é o termo “AUDAZ”, que é idêntico ao termo AUDAZ da marca da Apelante.

    M. Deste modo não restam dúvidas que deverá ser considerado que as marcas da Apelada preenchem o conceito de imitação presente no artigo 238.º do CPI.

    Concluiu, pedindo que seja julgado procedente a apelação, revogando a Douta Sentença recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA! * II. DELIMITAÇÃO do OBJECTO do RECURSO: O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigos 635º, nº 3, e 639º, n.ºs 1 e 2, do CPC.

    Por outro lado, ainda, sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso, o tribunal de recurso não pode conhecer de questões não antes suscitadas pelas partes perante o Tribunal de 1ª instância, sendo que a instância recursiva, tal como configurada no nosso sistema de recursos, não se destina à prolação de novas decisões, mas à reapreciação pela instância hierarquicamente superior das decisões proferidas pelas instâncias. ([1]).

    * No seguimento desta orientação, a questão a decidir no presente recurso é a seguinte: Se o registo da marca da Apelada deve ser recusado por preencher o conceito de imitação previsto no art. 238º do CPI.

    * III. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO: 1.

    O Tribunal de 1ª instância julgou provados os seguintes factos:

    1. Por despacho de 17/12/2020, o Senhor Diretor do Departamento de Marcas e Desenhos ou Modelos do INPI, por subdelegação de competências do Conselho Diretivo, recusou o registo da marca nacional n.º 631726, AUDAZ SÓ PARA OS MAIS FORTES, pedida em 14/10/2019; b) A marca referida assinala os seguintes produtos da classe 30, da Classificação Internacional de Nice: MOLHOS; PIRIPIRI; MOLHOS PICANTES. Cfr. teor da decisão constante do processo de registo, remetido aos autos pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial; c) A recorrida é titular da marca nº 624916 - AUDAZES, requerida em 26.06.2019 e concedida por despacho de 25.10.2019 para assinalar na classe 35 da Classificação Internacional de Nice os serviços de “administração de empresas; serviços de gestão comercial; gestão de projetos empresariais; organização de gestão de negócios; publicidade; serviços de venda a retalho relacionados com alimentos, e na classe 43 “serviços de restaurante e bar; serviços hoteleiros”, d) A recorrida é titular da marca nº 624918 - AUDAZ, requerida em 25.05.2019 e concedida por despacho de 10.10.2019, para identificar na classe 43 “serviços de restaurante e bar; serviços hoteleiros”. * IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA.

      Imitação entre a marca da Apelada e as marcas da Apelante.

      O presente recurso vem interposto da sentença recorrida que, tendo revogado o despacho do Director de Marcas do INPI que recusou o pedido de registo da marca nacional nº 631726 “AUDAZ SÓ PARA OS MAIS FORTES”, concedeu o registo da referida marca à aqui Apelada.

      Tal como decorre das conclusões de recurso, a Apelante considera que o tribunal a quo interpretou de forma incorrecta o art. 238º do CPI, ao concluir, de forma errada, que entre os sinais em confronto não existe semelhança/afinidade entre os serviços e produtos.

      Como fundamento da sua pretensão invocou a Apelante que os serviços de venda a retalho relacionados com alimentos e o de fornecimento de alimentos e bebidas (serviços de restauração e bar) apresentam afinidade em relação aos molhos, piripiri e molhos picantes que constituem produtos alimentícios, que a proteção de que as suas marcas beneficiam por serem prioritárias é abrangente, compreendendo a venda a retalho de bens alimentícios os molhos, piripiri e molhos picantes que a marca registanda pretende assinalar, coincidem normalmente quanto ao produtor, ao público relevante e aos canais de distribuição, tendo o INPI já proferido decisões no sentido de considerar que entre os produtos inseridos na classe 30 e os serviços da classe 43 se estabelece uma relação de afinidade, que os produtos e os serviços confrontados destinam-se à mesma finalidade e à satisfação da mesma utilidade, sendo que perante um molho alimentício “AUDAZ SÓ PARA OS MAIS FORTES” da Apelada poderá ser associado ao comércio/restaurante/bar com a marca AUDAZ/AUDAZES da titularidade da Apelante, causando confusão por associação, que a prejudicaria, não se verificando diferenças entre os sinais que permitam que as marcas possam coexistir no mercado português sem risco de confusão, sendo o termo AUDAZ o elemento predominante e o único distintivo na marca da Apelada com total identidade gráfica e fonética com as marcas da Apelante.

      O conceito de Marca extrai-se do art. 208º do NCPI, que dispõe que, a marca pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais suscetíveis de representação gráfica, nomeadamente palavras, incluindo nomes de pessoas, desenhos, letras, números, sons, cor, a forma do produto ou da respetiva embalagem, ou por um sinal ou conjunto de sinais que possam ser representados de forma que permita determinar, de modo claro e preciso, o objeto da proteção...

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