Acórdão nº 809/21 de Tribunal Constitucional (Port, 26 de Outubro de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Pedro Machete
Data da Resolução26 de Outubro de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 809/2021

Processo n.º 516/20

1.ª Secção

Relator: Conselheiro Pedro Machete

Acordam na 1.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A., na qualidade de executado por reversão, deduziu, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, oposição à execução fiscal instaurada no Serviço de Finanças de Cascais-1 pelo Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu, IP, contra a sociedade B., Lda.

Aquele Tribunal, por sentença de 16 de setembro de 2019, julgou procedente a oposição à execução, absolvendo o oponente A. da instância executiva e condenando o exequente Instituto de Gestão do Fundo Social Europeu, IP, nas custas.

Elaborada a conta de custas, o Ministério Público apresentou reclamação da mesma, mas, por despacho de 26 de fevereiro de 2020, tal reclamação foi indeferida.

2. Inconformado, o Ministério Público interpôs então o presente recurso de constitucionalidade, ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de maio (LTC), nos seguintes termos (cf. fls. 87-87/v.º):

«[…]

Pretende-se […] a apreciação da referida norma do artigo 26º, nº 7, do Regulamento das Custas Processuais, na interpretação feita pela Mma. Juiz a quo de que será de admitir, com fundamento na mesma, que o valor de custas de parte devidas à parte vencedora da lide processual, que tenha litigado com o beneficio do apoio judiciário, e posteriormente a reverter para o Instituto de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça, possa entrar em regra de custas e incluído como tal na conta de custas a liquidar pela secretaria.

Para a apreciação do recurso consigna-se que, e a nosso ver, foi violado pelo despacho recorrido, na interpretação e aplicação da norma referida, o princípio constitucional da igualdade, que consta da disposição do artigo 13º, da Constituição, e isto porque no caso das custas de parte devidas ao vencedor que tenha litigado sem gozar do benefício do apoio judiciário, o pagamento das mesmas, pela parte vencida, é feito extraprocessualmente, sem qualquer intervenção da secretaria e muito menos com a inclusão do valor das custas de parte na conta do processo, o que traduz um tratamento desigual na forma de cobrança das custas de parte.

Por outro lado, mais se consigna que a inconstitucionalidade referida fora suscitada pelo Ministério Público na reclamação da conta de custas, e, ainda, que o despacho recorrido não admite recurso ordinário à luz do disposto no artigo 31º, nº 6, do Regulamento das Custas Processuais, pois da decisão do incidente de reclamação da conta só cabe recurso em um grau se o montante exceder o valor de 50 UC, o que não é o caso uma vez que o valor liquidado é de €1.224,00.».

3. Admitido o recurso (cf. fls. 89) e subidos os autos a este Tribunal, foi determinado o prosseguimento do processo, tendo o Ministério Público apresentado alegações, que concluiu da seguinte forma:

«1) Na base dos presentes autos está uma dívida da Sociedade “B., Lda.”, no valor de €38.719,14, relativa a verbas indevidamente recebidas do Fundo Social Europeu e do Estado Português, através do Orçamento da Segurança Social, dívida, essa, respeitante a ações de formação profissional realizadas, pela referida empresa, entre 15 de Novembro de 1993 e 30 de Junho de 1994 (cfr. supra nº 1 das presentes alegações);

2) Esta verba deveria ter sido objeto de reembolso, a efetuar junto do DAFSE - Departamento para os Assuntos do Fundo Social Europeu, mas tal reembolso não se verificou, por parte da Sociedade B.(cfr. supra nº 2 das presentes alegações);

3) Por esse motivo, foi instaurado, em 27 de Janeiro de 1998, no Serviço de Finanças de Cascais - 1, contra a Sociedade B., processo de execução fiscal, para cobrança da quantia referida;

4) Posteriormente, por despacho de 12 de Janeiro de 2012, o Chefe do Serviço de Finanças de Cascais, dada a inexistência de bens da originária devedora, ao abrigo do disposto no artigo 153º, nº 2, alínea b) do Código de Procedimento e Processo Tributário e na alínea b) do nº 1 do artigo 24º da Lei Geral Tributária, chamou ao processo de execução fiscal, por via do instituto da reversão, A., enquanto responsável subsidiário (cfr. supra nº 3 das presentes alegações);

5) Este deduziu, no entanto, oposição à execução fiscal (cfr. supra nº 4 das presentes alegações);

6) O oponente requereu, também, a concessão do benefício de assistência judiciária (cfr. fls. 11-15 dos autos), que lhe veio a ser concedida em 16 de março de 2012, na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo, por se ter comprovado a sua insuficiência económica (cfr. fls. 25 dos autos e supra nº 5 das presentes alegações);

7) Remetidos os autos, pela Autoridade Tributária e Aduaneira, ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (cfr. fls. 26-27 dos autos), veio a digna magistrada judicial prolatar sentença, em 16 de Setembro de 2019 (cfr. fls. 66-72 dos autos), pela qual julgou procedente a oposição à execução (cfr. supra nº 6 das presentes alegações);

8) Em consequência desta decisão, foi a Exequente condenada no pagamento das custas, nos termos do artigo 527º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil e artigo 7º, tabela II do Regulamento das Custas Processuais;

9) O digno magistrado do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, veio, em 17 de outubro de 2019, apresentar reclamação da conta de custas (cfr. supra nº 7 das presentes alegações), por entender que as custas de parte não podem ser incluídas na conta de custas, liquidada pela secretaria, por tal não o permitir, quer o artigo 30º, nº 1, da Portaria 419-A/2009, quer o artigo 26º, nº 7, do Regulamento das Custas Processuais;

10) A digna magistrada judicial do TAF de Sintra, no entanto, não entendeu assim e proferiu despacho, em 26 de fevereiro de 2002 (cfr. fls. 82-85 dos autos), pelo qual indeferiu a reclamação da conta de custas (cfr. supra nº 9 das presentes alegações);

11) Ora, como referido pelo Ministério Público na instância, é duvidoso que assim seja e que haja uma justificação para a diferença de tratamento na liquidação das custas de parte, diferença, essa, aliás, que a digna magistrada judicial acaba por reconhecer existir;

12) Nos termos do art. 3º, nº 1 do Regulamento das Custas Processuais, «as custas processuais abrangem a taxa de justiça, os encargos e as custas de parte»;

13) Por outro lado, nos termos do art. 16º, nº 1 do mesmo Regulamento, ainda relativo à matéria de custas processuais (…):

“1 - As custas compreendem os seguintes tipos de encargos:

a) Os reembolsos ao Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça, I.P.:

i) De todas as despesas por este pagas adiantadamente;

ii) Dos custos com a concessão de apoio judiciário, incluindo o pagamento de honorários”;

14) O art. 19º, nº 1 do mesmo Regulamento prevê, pelo seu lado, em matéria de encargos (…):

“1 - Quando a parte beneficie de isenção de custas ou de apoio judiciário, os encargos são sempre adiantados pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça, I.P., sem prejuízo de reembolso.”;

15) E o art. 20º, nºs 1 e 2 do mesmo diploma, veio acrescentar (…):

“1 - Os encargos são pagos pela parte requerente ou interessada, imediatamente ou no prazo de 10 dias a contar da notificação do despacho que ordene a diligência, determine a expedição ou cumprimento de carta rogatória ou marque a data da audiência de julgamento.

2 - Quando a parte requerente ou interessada beneficie de isenção de custas ou de apoio judiciário, as despesas para com terceiros são adiantadas pelo Instituto de Gestão Financeira e das Infra-Estruturas da Justiça, I.P.”;

16) O art. 24º, nº 2 do citado Regulamento veio regular a imputação na conta de custas, estabelecendo (…):

“2 - No final, os encargos são imputados na conta de custas da parte ou partes que foram nelas condenadas, na proporção da condenação.”;

17) O art. 25º do Regulamento das Custas Processuais aborda a nota justificativa de custas, referindo o nº 1 desta disposição (destaques do signatário):

“1 - Até 10 dias após o trânsito em julgado ou após a notificação de que foi obtida a totalidade do pagamento ou do produto da penhora, consoante os casos, as partes que tenham direito a custas de parte remetem para o tribunal, para a parte vencida e para o agente de execução, quando aplicável, a respetiva nota discriminativa e justificativa, sem prejuízo de esta poder vir a ser retificada para todos os efeitos legais até 1 O dias após a notificação da conta de custas.”;

18) Por seu lado, o art. 26º do Regulamento das Custas Processuais contempla o regime de custas, referindo, designadamente (…):

“1 - As custas de parte integram-se no âmbito da condenação judicial por custas, salvo quando se trate dos casos previstos no artigo 536.º e no n.º 2 do artigo 542.º do Código de Processo Civil.

2 - As custas de parte são pagas diretamente pela parte vencida à parte que delas seja credora, salvo o disposto no artigo 540.º do Código de Processo Civil, sendo disso notificado o agente de execução, quando aplicável.

3 - A parte vencida é condenada, nos termos previstos no Código de Processo Civil, ao pagamento dos seguintes valores, a título de custas de parte:

a) Os valores de taxa de justiça pagos pela parte vencedora, na proporção do vencimento;

b) Os valores pagos pela parte vencedora a título de encargos, incluindo as despesas do agente de execução;

c) 50 /prct. do somatório das taxas de justiça pagas pela parte vencida e pela parte vencedora, para compensação da parte vencedora face às despesas com honorários do mandatário judicial, sempre que seja apresentada a nota referida na alínea d) do n. º 2 do artigo anterior;

d) Os valores pagos a título de...

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