Acórdão nº 3610/18.6T8CSC.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelCHAMBEL MOURISCO
Data da Resolução29 de Setembro de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo n.º 3610/18.6T8CSC.L1. S1 (Revista) - 4ª Secção Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

AA, BB, CC, DD, EE, FF, e GG intentaram ação declarativa emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra Até Ao Fim Do Mundo – Imagens e Comunicação, Lda., Semba Comunicação, Lda., e ERIGO VII – Fundo de Capital de Risco gerido por ERIGO, Sociedade de Capital de Risco, S.A., pedindo a condenação solidária destas a pagar-lhes a quantia global de € 361.260,68, proveniente de créditos laborais, que discriminam na petição em relação a cada um deles.

Para o efeito, alegaram, em síntese, que foram trabalhadores da Masemba, Lda., tendo resolvido os respetivos contratos com justa causa com fundamento na falta de pagamento de retribuições; que sendo a Masemba, Lda., objeto de um processo especial de revitalização as aqui rés respondem solidariamente pelos créditos salariais devidos por aquela, bem como pelo pagamento das indemnizações devidas a cada um dos autores por força da justa causa de resolução dos respetivos contratos de trabalho.

  1. A 1.ª Ré Até Ao Fim Do Mundo – Imagens e Comunicação, Lda apresentou contestação na qual alegou, em síntese: que a Masemba, Lda., indicou como sede as suas instalações mas fê-lo apenas temporariamente, enquanto se realizavam as obras na sua sede e para efeitos de recebimento de correspondência; que em momento nenhum qualquer trabalhador da Masemba, Lda., prestou trabalho naquelas instalações e que inexiste qualquer fundamento para a sua responsabilização solidária, pelo que defende a improcedência da ação, com a sua absolvição do pedido. Pede ainda a condenação dos autores como litigantes de má-fé.

  2. A 2.ª Ré Semba Comunicação, Lda.

    , contestou, alegando, em síntese: que não foi indicado o valor da ação; que os créditos dos AA. foram reconhecidos no PER que identificam relativo à sua empregadora Masemba, Lda.; que não existe qualquer relação de grupo entre si e qualquer das restantes rés; que inexiste qualquer relação entre si e a Masemba, Lda. e que os créditos dos autores já se encontram acautelados âmbito do Processo Especial de Revitalização n.º 18737/…, cujo plano já foi aprovado e homologado por sentença, pelo que deve ser julgada a improcedência da ação, com a sua absolvição do pedido.

  3. A 3.ª Ré ERIGO VII – Fundo de Capital de Risco apresentou a sua contestação, sustentando, em síntese: a sua ilegitimidade passiva por não ser uma sociedade comercial e não se encontrar incluída no leque de sociedades elencada nos preceitos do Código das Sociedades Comerciais para o qual remete o artigo 334.º do Código do Trabalho; que não se encontra em relação de grupo com qualquer das restantes rés; que os créditos dos autores já se encontram acautelados no âmbito do Processo Especial de Revitalização n.º 18737/..., cujo plano já foi aprovado e homologado por sentença, o que gera a inutilidade superveniente da presente lide, e que deve ser absolvida do pedido.

  4. Os autores apresentaram resposta às exceções invocadas e concluíram como na petição inicial.

  5. Foi proferido despacho pré-saneador, o qual julgou improcedentes as questões suscitadas relativas ao valor da causa e à irrelevância do PER. Foi fixado o valor da causa em € 361.260,68 e saneado o processo, julgando-se improcedente a exceção da ilegitimidade suscitada, dispensando-se a realização de audiência preliminar. Fixou-se o objeto do litígio e dispensou-se a enunciação dos temas da prova.

  6. Realizado o julgamento, foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «[…] Destarte, julga-se a ação parcialmente procedente e, consequentemente:

    1. CONDENA-SE a 3.ª ré ERIGO VII – FUNDO DE CAPITAL DE RISCO, nos termos do artigo 334.º do CT [solidariamente com a empregadora], a pagar aos autores, a título de créditos laborais, as seguintes quantias: a.1) a quantia de € 4.141,27 (quatro mil cento e quarenta e um euros e vinte e sete cêntimos), à autora AA, acrescida dos juros de mora, vencidos desde as datas do respetivo vencimento e vincendos, à taxa legal de 4%; a.2) a quantia de € 4.974,21 (quatro mil novecentos e setenta e quatro euros e vinte e um cêntimos), à autora BB, acrescida dos juros de mora, vencidos desde as datas do respetivo vencimento e vincendos, à taxa legal de 4%; a.3) a quantia de € 9.415,34 (nove mil quatrocentos e quinze euros e trinta e quatro cêntimos), à autora CC, acrescida dos juros de mora, vencidos desde as datas do respetivo vencimento e vincendos, à taxa legal de 4%; a.4) a quantia de € 10.934,82 (dez mil novecentos e trinta e quatro euros e oitenta e dois cêntimos), ao autor DD, acrescida dos juros de mora, vencidos desde as datas do respetivo vencimento e vincendos, à taxa legal de 4%; a.5) a quantia de € 12.804,75 (doze mil oitocentos e quatro euros e setenta e cinco cêntimos), à autora EE, acrescida dos juros de mora, vencidos desde as datas do respetivo vencimento e vincendos, à taxa legal de 4%; a.6) a quantia de € 5.507,26 (cinco mil quinhentos e sete euros e vinte e seis cêntimos), à autora FF, acrescida dos juros de mora, vencidos desde as datas do respetivo vencimento e vincendos, à taxa legal de 4%; a.7) € 1.821,64 (mil oitocentos e vinte e um euros e sessenta e quatro cêntimos), à autora GG, acrescida dos juros de mora, vencidos desde as datas do respetivo vencimento e vincendos, à taxa legal de 4%.

    2. CONDENA-SE a 3.ª ré ERIGO VII – FUNDO DE CAPITAL DE RISCO, nos termos do artigo 334.º do CT [solidariamente com a empregadora], a pagar aos autores a título de indemnização nos termos do artigo 396.º do CT as seguintes quantias: b.1) a quantia de € 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros) à autora AA, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da citação; b.2) a quantia de € 15.924,25 (quinze mil novecentos e vinte e quatro euros e vinte e cinco cêntimos) à autora BB, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da citação; b.3) a quantia de € 41.854,75 (quarenta e um mil oitocentos e cinquenta e quatro euros e setenta e cinco cêntimos) à autora CC, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da citação; b.4) a quantia de € 3.934,52 (três mil novecentos e trinta e quatro euros e cinquenta e dois cêntimos) ao autor DD, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da citação; b.5) a quantia de € 29.952,00 (vinte e nove mil novecentos e cinquenta e dois euros) à autora EE, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da citação; b.6) a quantia de € 26.660,99 (vinte e seis mil seiscentos e sessenta euros e noventa e nove cêntimos) à autora FF, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da citação; e b.7) a quantia de € 12.085,08 (doze mil e oitenta e cinco euros e oito cêntimos) à autora GG acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da citação.

    3. ABSOLVE-SE a 3.ª ré ERIGO VII – FUNDO DE CAPITAL DE RISCO do demais peticionado pelos autores; D) ABSOLVE-SE a 1.ª ré ATÉ AO FIM DO MUNDO – IMAGENS E COMUNICAÇÃO, Lda., e a 2.ª ré SEMBA COMUNICAÇÃO, Lda., dos pedidos contra elas deduzidos pelos autores.

  7. A R.

    Erigo VII – Fundo de Capital de Risco, inconformada, interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação decidido: ̶ Julgar parcialmente procedente a impugnação da decisão de facto, alterando o facto 21. da sentença, nos termos sobreditos; ̶ Conceder provimento ao recurso e, em consequência, alterar a sentença da 1.ª instância no que respeita à condenação do ora recorrente ERIGO VII – Fundo de Capital de Risco, absolvendo-se este dos pedidos contra si formulados pelos autores ora recorridos.

  8. Inconformadas com o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação as autoras AA, BB, CC, EE, FF, e GG, interpuseram recurso de revista, tendo formulado as seguintes conclusões: 1.º- O objetivo do legislador ao instituir o regime de responsabilidade previsto no art.º 334º do CT foi reforçar a garantia patrimonial dos créditos emergentes de contrato de trabalho, ou da sua violação ou cessação, obviando a que a inserção do empregador numa coligação societária possa prejudicar os direitos dos trabalhadores.

    1. - Uma interpretação literal que limitasse a extensão da responsabilidade apenas a uma sociedade, estaria a desvirtuar a ratio da norma, que visa oferecer uma repartição do risco, dependendo da constituição do grupo, por uma ou mais sociedades do grupo para além do empregador signatário do contrato de trabalho.

    2. - No artigo 334.º encontramos um importante desvio à ratio subjacente à responsabilidade solidária prevista no artigo 501.º do CSC, uma vez que se prevê que qualquer sociedade do grupo pode ser responsabilizada pelos créditos laborais do trabalhador de qualquer empresa do grupo, extensão essa que vai muito além daquilo que o legislador societário desenhou na lei societária e visa intensificar a garantia patrimonial dos créditos laborais.

    3. - Na verdade a lei procura evitar que através da descapitalização abusiva de uma sociedade ou através da utilização de meios legítimos como a possibilidade de emissão de instruções desvantajosas – vide artigo 503.º do CSC – se reduza as garantias de pagamento aos trabalhadores.

    4. - Apela por outro lado ao princípio da igualdade afirmando que, existindo a necessidade de garantir um tratamento uniforme relativamente a todos os trabalhadores, só a aplicação do regime do artigo 334.º a todas às situações em que se verifique a existência de créditos laborais, cumpre o aludido princípio.

    5. - As, ora, Recorrentes alegaram e provaram que a Recorrida se encontra numa relação de domínio com a Masemba, Lda., mas o Tribunal da Relação de Lisboa, adotando um conceito estritamente formal da noção de sociedades previstas no art.º 334º do CT, veio declarar que um Fundo de Capital de Risco não se inclui nas sociedades que podem vir a ser responsabilizadas por créditos vencidos.

    6. - Ressalvado o devido respeito, não é esse o espírito do legislador, criando uma situação de tratamento desigual, entre os...

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