Acórdão nº 740/21 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução23 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 740/2021

Processo n.º 633/2021

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é reclamante A. e reclamado o Ministério Público, o primeiro reclamou, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4, da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do despacho da Vice-Presidente daquele Tribunal, de 17 de junho de 2021, que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional.

2. O ora reclamante, na qualidade de arguido em processo criminal, interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra da sentença do Tribunal de 1.ª instância que o condenou numa pena de multa e em pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez.

Por acórdão de 7 de abril de 2021, o Tribunal da Relação de Coimbra negou provimento ao recurso, confirmando a sentença condenatória.

Notificado de tal decisão, o arguido dela interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça. Não tendo tal recurso sido admitido pela relatora no Tribunal da Relação, com fundamento em irrecorribilidade, foi apresentada reclamação, nos termos do artigo 405.º do Código de Processo Penal.

Por despacho de 11 de junho de 2021, foi a reclamação indeferida pela Vice-Presidente daquele Tribunal.

Inconformado com essa decisão, o ora recorrente dela interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, através de requerimento com o seguinte teor:

«Recurso penal

A., arguido nos autos acima referenciados^ não se conformando com o indeferimento do indeferimento da reclamação de recurso e de recurso, vem dele fazer recurso para o Tribunal Constitucional:

Venerandos e Meritíssimos Senhores Juízes Conselheiros do Tribunal Constitucional:

1- Da questão prévia do recurso:

1- Recorreu-se para o STJ, no âmbito do acórdão:

Processo n. ° 1002/14 IP Secção

Relator: Conselheira Maria de Fátima Mata-Mouros

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional

Julgar inconstitucional a norma que estabelece a irrecorribilidade do acórdão da Relação que, inovatoriamente face à absolvição ocorrida em 1.ª instância, condena os arguidos em pena de prisão efetiva não superior a cinco anos, constante do artigo 400.°, n.° 1, alínea e), do Código de Processo Penal, na redação da Lei n.°20/2013, de 21 de fevereiro, por violação do direito ao recurso enquanto garantia de defesa em processo criminal, consagrado no artigo 32. °, n. ° 1 da Constituição.

2- O recorrente faz o per sente recurso por entender que o art. 400 n° 1 do CPP o art. 400 n° 1 do CPP, é inconstitucional, na parte em que limita o recurso.

3- Recorre-se por se entender que está em causa direitos do recorrente.

4- Cujos argumentos abaixo escreve.

II- Da questão da "Grundnorm nacional":

5- No seu prefácio o seguinte, estatui a CRP:

Preâmbulo

A 25 de Abril de 1974, o Movimento das Forças Armadas, coroando a longa resistência do povo português e interpretando os seus sentimentos profundos, derrubou o regime fascista.

Libertar Portugal da ditadura, da opressão e do colonialismo representou uma transformação revolucionária e o início de uma viragem histórica da sociedade portuguesa.

A Revolução restituiu aos Portugueses os direitos e liberdades fundamentais. No exercício destes direitos e liberdades, os legítimos representantes do povo reúnem-se para elaborar uma Constituição que corresponde às aspirações do País.

A Assembleia Constituinte afirma a decisão do povo português de defender a independência nacional, de garantir os direitos fundamentais dos cidadãos, de estabelecer os princípios basilares da democracia, de assegurar o primado do Estado de Direito democrático e de abrir caminho para uma sociedade socialista, no respeito da vontade do povo português, tendo em vista a construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno.

A Assembleia Constituinte, reunida na sessão plenária de 2 de abril de 1976, aprova e decreta a seguinte Constituição da República Portuguesa:

6- Mais estatui o artigo 58º da CRP o seguinte:

Artigo 58. °

Direito ao trabalho

1. Todos têm direito ao trabalho.

2. Para assegurar o direito ao trabalho, incumbe ao Estado promover:

a) A execução de políticas de pleno emprego;

b) A igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou género de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado, em função do sexo, o acesso a quaisquer cargos, trabalho ou categorias profissionais;

c) A formação cultural e técnica e a valorização profissional dos trabalhadores

5- O trabalhador vai ficar sem poder trabalhar.

6- Vai-lhe ser restringido um direito fundamental, previsto na Constituição da República Portuguesa.

III-Da sentença, e, dos factos dados como provados e não provados:

7- A douta sentença, acórdão, considerou provados, factos que aqui se dão por reproduzidos nos termos lesais, condenando, pelo crime que vinha acusado.

8- A douta sentença considerou provados;

a. Os factos vertidos da sentença, cujo teor se dá aqui como reproduzido por os mesmos serem extensos.

9- Tendo decidido o Tribunal, em confirmar a acusação, condenando o arguido.

10- De quer se fazer recurso.

IV- Da livre apreciação da prova pelo tribunal e da contradição entre a fundamentação e decisão:

11- O Tribunal pode-se socorrer sempre para a valoração da prova da alma legislativa do artigo 127° do CPP, da livre apreciação da prova.

12-"Sabendo-se que é na audiência que tal princípio assume particular relevo, a livre apreciação da prova terá subjacente sempre uma motivação ou fundamentação - o substrato racional que dela emerge - e que encontra eco, de resto no artigo 374, n° 2. Vide in Código de Processo Penal Anotado, Vol. I, Simas Santos e Leal Henriques, 1999, Rei dos Livros, pág. 684.

13- De relembrar que o princípio cia livre apreciação da prova consagrado no artigo não liberta das provas que se produzirem nos autos, pois é com elas, com base nelas, que terá que decidir, já que quod no est in actis non est in mundo.

14- A sua Uberdade circunscreve-se, assim, á livre apreciação dessas mesmas provas dentro dos parâmetros legais, não podendo, porém, entender essa liberdade até ao ponto de cair no puro arbítrio " - Vide in Código de Processo Penal Anotado, Vol. 1, Simas Santos e Leal Henriques, 1999, Rei dos Livros, pág. 685

15- O Tribunal deveria ter sido mais zeloso na comparação da prova testemunhal.

16- Cuja mesma não foi reproduzida em tribunal.

17- Pelo que o arbítrio do tribunal na valoração da prova testemunhal e documental, violou os artigos 128°, 129, n° do art. 355° do CPP.

18-- O Tribunal ao admitir prova, sem obediência aos princípios do n° do art. 355° do CPP, violou o princípio da legalidade estatuído no art. 3 o da CRP.

V-Da pena aplicada:

19- O arguido não tem vida económica.

20- Vive de biscates.

21- Vive na pobreza.

22- Assim, sem carro fica limitado no direito ao trabalho.

23- Pelo que deveria ter sido aplicado ao mesmo pena mais baixa.

VI- Do direito da prova documental processo penal:

24- O artigo 355° do CPP consagra como epígrafe das provas que não podem ser valoradas pelo tribunal, mesmo para a sua convicção.

25- Este artigo tem inerente a questão da valoração de provas, consagrando princípio da imediação.

26- Não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de convicção do Tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência. - art. 355 n° 1 do CPP.

27- De referir que nenhum exame a documento, e, ou confirmação, foi produzido ou examinado em audiência.

28- Assim como os elementos da autoridade que compareceram à audiência para prestar depoimento diziam que confirmavam, mas diziam versão diferente, contraditória.

29- "O n° 1 enuncia, assim a regra geral de proibição da proibição da valoração de provas não produzidas ou examinadas em audiência, enquanto que o n° 2 aponta, desde logo, a exceção resultante das autorizações de leitura em audiência de atos processuais concedidas pelos artigos seguintes, cujas provas que contêm podem pois ser valoradas". Vide in Código de Processo Civil Anotado, Simas Santos e Leal Henriques, Rei dos Livros, II Vol., 2000, pág. 387.

30- As provas reais para poderem ser tomadas em consideração devem ser examinadas em audiência. Entre as provas reais assume importância particular a prova documental. Regra é a mesma: devem ser juntos ao processo e examinados em audiência de julgamento. - Vide in Curso de Processo Penal, germano Marques da Silva, 1994, Ed. Verbo, pág. 257.

31- Sucede que na sentença é valorada muita prova documental, já acima identificada, que não foi examinada em audiência.

32- Pelo que a mesma não deverá ter qualquer valor.

33- "No que respeita aos demais documentos, resulta a contrário daqueles citados artigos que a leitura não é permitida em audiência, tendo, sim, que ser examinados, como impõe o artigo 355° n.° 1 do Código de Processo Penal". Vide in BMJ 424, 535.

34- Não obstante haver jurisprudência que entenda que os documentos não proibidos de leitura podem ser produzidos sem que sejam lidos.

35- O que não confere o direito de prova do conteúdo da matéria inerente ao mesmo, que está sujeita à imediação e valoração em audiência.

36- Logo muitos dos documentos indicados na sentença como meios de prova não foram provados em audiência, como se observa a transcrição efetuada e das gravações dos depoimentos.

37- Caso os documentos fossem de per si considerados produzidos, e a essa produção o Juiz conferisse força...

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