Acórdão nº 712/21 de Tribunal Constitucional (Port, 17 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução17 de Setembro de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 712/2021

Processo n.º 547/2021

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Guimarães, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»), do acórdão daquele Tribunal, de 24 de janeiro de 2021.

2. Pela Decisão Sumária n.º 439/2021, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«3. Segundo o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º, da Constituição, e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, «identificando-se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto de tal recurso» (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/98).

O recorrente enuncia do seguinte modo o objeto do presente recurso: «por violar os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança, princípios inerentes do estado de direito democrático, da igualdade, do acesso ao direito e tutela jurisdicional efetiva, das garantias de defesa e da legalidade, todos ínsitos nos artigos 2.º, 13.º, n.º 1, 20.º, 32.º, n.º 1, 165.º; n.º 1; alínea c) e 205.º, n.°1 da Constituição da República Portuguesa (C.R.P.) é inconstitucional a interpretação segundo a qual um recurso, fundado e peremptório, em face da decisão proferida pelo Tribunal ad quem, interposto pelo arguido, admitido com efeito suspensivo, integra a previsão legal contida no artigo 125.º, n.º1, alínea a), do C.P., nomeadamente, na expressão por força da lei a execução não puder começar».

Tal como o recorrente o define, o objeto do recurso integra o juízo de que a situação dos autos – a interposição de um recurso admitido com efeito suspensivo e o seu provimento pelo tribunal ad quem – é subsumível no artigo 125.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, como causa de suspensão da prescrição das penas criminais. Ora, tal juízo excede os poderes cognitivos da jurisdição constitucional, inscrevendo-se no domínio reservado ao exercício da função jurisdicional. O Tribunal Constitucional não pode apreciar a decisão judicial de que determinada realidade se subsume ou não em determinada norma legal – uma questão de interpretação e aplicação da lei ordinária −, mas apenas a conformidade constitucional da norma que resultou da interpretação judicial da lei e que foi aplicada na decisão recorrida como ratio decidendi. Como tal juízo é um elemento essencial do objeto do recurso de constitucionalidade, tal como o recorrente o definiu – na realidade, o recorrente não aponta nenhuma inconstitucionalidade à norma do artigo 125.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, em si mesmo considerada –, é inevitável concluir pela falta de idoneidade do mesmo. Como se escreveu no Acórdão n.º 695/2016: «o sistema português de controlo da constitucionalidade normativa assenta na ideia de que a jurisdição constitucional deve ser o juiz das normas e não o juiz dos juízes. O papel do Tribunal Constitucional na arquitetura da nossa democracia constitucional é o de controlar a atuação do legislador e dos seus sucedâneos; os erros judiciais são corrigidos através do regime de recursos próprio da ordem jurisdicional a que as decisões pertencem».

Tal obsta ao conhecimento do objeto do recurso, justificando a prolação da presente decisão, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.»

3. De tal Decisão Sumária vem agora o recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, nos seguintes termos:

«A., Recorrente nos autos de Recurso acima melhor identificados, não se conformando com Decisão Sumária n.º 439/2021, de 29/06/2021, constante de fls. ..., dos presentes autos, conforme a notificação operada por via postal registada, elaborada em 30/06/2021, vem, ao abrigo do disposto no artigo 78.2-A, n.º 3, na redação vigente, da Lei Orgânica do Tribunal Constitucional (L.O.T.C.), instituída pela Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, apresentar a sua RECLAMAÇÃO para a Conferência;

Nos termos e com os seguintes fundamentos:

EXCELENTÍSSIMOS(AS) SENHORES(AS) JUÍZES CONSELHEIROS:

Por Decisão Sumária n.º 439/2021, proferida ao abrigo do disposto artigo 78.º-A, n.º 1, da L.O.T.C., o(a) Ex.mo(a) Senhor(a) Juiz Conselheiro(a) Relator(a) decidiu não conhecer do objeto do recurso apresentado porque, sustenta, o Recorrente (...) não aponta nenhuma inconstitucionalidade à norma do artigo 125.º n.º 1, alínea a), do Código Penal, em si mesma considerada (...).

No essencial, a decisão agora sob escrutínio que (...) o objeto do recurso integra o juízo de que a situação dos autos (...) é subsumível no artigo 125.º n.º 1, alínea a), do Código Penal, como causa de suspensão da prescrição das penas criminais (...) e que tal juízo excede os poderes cognitivos da jurisdição constitucional (...).

Cremos,

Porém, ressalvado o devido respeito que o(a) Ex.mo(a) Senhor(a) Juiz Conselheiro(a) Relator(a) nos merece, que o entendimento prolatado naquela Decisão Sumária não pode proceder, porquanto, na verdade, a decisão recorrida, não obstante o juízo realizado sobre se a interposição do recurso admitido com efeito suspensivo e o seu provimento pelo tribunal ad quem era, ou não, subsumível à previsão legal contida no artigo...

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