Acórdão nº 1979/16.6T8LRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 08 de Setembro de 2021

Magistrado ResponsávelRAMALHO PINTO
Data da Resolução08 de Setembro de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra: O Fundo de Acidentes de Trabalho instaurou a presente acção para a efectivação de direitos resultantes de acidente de trabalho contra a A… – Companhia de Seguros, S.A.

, pedindo que seja julgada procedente e provada a acção e, por via dela, ser declarado o acidente sofrido por B… como de trabalho, condenando-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de € 25.454,40, correspondente ao triplo da remuneração auferida pelo sinistrado [(€ 530,00 x 14) + (€ 4,40 x 22 dias x 11 meses) x 3].

Alegou para tanto, em síntese e tal como consta da sentença recorrida, que, no dia 24.05.2016, B… encontrava-se cedido pela sua entidade empregadora, C…– Empresa de Trabalho Temporário, Lda, à sociedade D…, Lda, sob cujas ordens, direcção e fiscalização se encontrava a trabalhar, tendo sofrido um acidente de trabalho que lhe provocou lesões e de que resultou directa e necessariamente a sua morte, no estado civil de solteiro, o qual não deixou beneficiários legais, tendo o Autor direito ao pagamento da quantia peticionada, estando a responsabilidade do seu pagamento a cargo da Ré, para quem a entidade empregadora do sinistrado havia transferido a responsabilidade infortunística laboral.

A Ré - A… – Companhia de Seguros, S.A., deduziu contestação invocando, em síntese, que o acidente ocorreu porque o sinistrado se encontrava em cima da cobertura de um armazém, tendo caído do mesmo de uma altura de 8 metros, o que sucedeu porque o sinistrado não utilizava arnês de segurança. Mais referiu que o sinistrado não foi sujeito a exames de saúde e de admissão, não tendo sido verificada a sua aptidão para trabalhos em altura, não lhe tendo sido ministrada qualquer formação nem informação sobre os riscos a que estaria exposto e respectivas medidas preventivas e sobre a necessidade de qualificação profissional adequada e de vigilância médica especial para aquele posto de trabalho.

Conclui, referindo que a responsabilidade pelo sinistro ficou a dever-se à actuação da entidade empregadora e da empresa utilizadora para quem o sinistrado prestava serviço, sendo estas entidades solidariamente responsáveis pela reparação dos danos emergentes deste acidente, sendo que muito embora caiba à Ré satisfazer, em primeira linha, as prestações que seriam devidas caso não houvesse actuação culposa, tem a mesma direito de regresso contra a entidade empregadora (tomadora do seguro) bem como contra a empresa utilizadora.

A final, pediu a intervenção da entidade empregadora do sinistrado, C… – Empresa de Trabalho Temporário, Lda, e da empresa utilizadora, D… , Lda., e que seja declarado que o acidente de trabalho se deveu à violação culposa das normas de segurança pelas intervenientes e, em consequência, que seja declarado que estas deverão reembolsar a Ré das quantias que esta venha a ser condenada na presente acção.

Foi, oportunamente, deferida a intervenção da entidade empregadora do sinistrado, C… – Empresa de Trabalho Temporário, Lda, e da empresa utilizadora, D…, Lda.

A C… apresentou o respectivo articulado, tendo rejeitado a violação de qualquer regra de segurança e saúde no trabalho e, consequentemente, qualquer responsabilidade pela eclosão do acidente de trabalho em apreço, referindo que a empresa utilizadora actuava ao abrigo de um contrato de subempreitada que havia celebrado com a empreiteira E…, SA e que ambas deveriam ter em obra representantes e coordenadores de segurança e higiene no trabalho durante a execução da obra, a quem o sinistrado devia obediência às ordens e instruções. Mais alegou que a empresa utilizadora tinha conhecimento que o sinistrado não possuía aptidões profissionais ou experiência para realizar trabalhos de construção em altura; sendo um trabalhador não especializado estava apto a desenvolver tarefas que não envolvessem conhecimentos ou aptidões especiais, o que não é o caso de trabalhos de reparação de uma cobertura com a altura de 8 metros.

Termina pedindo que o Tribunal não dê provimento ao pedido da seguradora A…, e ainda que no âmbito da presente acção seja proferida sentença que reconheça que a C… não foi culpada na produção do acidente de trabalho e bem assim que não teve condutas omissivas susceptíveis de serem causa adequada na produção do acidente que vitimou o trabalhador B… e, consequentemente, que não seja reconhecido o direito de regresso da seguradora A… no pagamento da indemnização peticionada pelo Fundo de Acidentes de Trabalho nem no pagamento de outras quaisquer quantias pecuniárias despendidas pela seguradora, decorrentes do acidente de trabalho.

A empresa utilizadora, D…, Lda, apresentou também o respectivo articulado, alegando que a entidade empregadora do sinistrado com quem celebrou um contrato de utilização de trabalho temporário conhecia a área de actividade da utilizadora e sabia qual era o perfil de trabalhador pretendido, tendo rejeitado a violação de qualquer regra de segurança e saúde no trabalho, porquanto forneceu a todos os trabalhadores, incluindo ao sinistrado, equipamento de protecção individual apropriado, incluindo arnês de segurança para se amarrarem às linhas de vida montadas na cobertura, tendo ainda prestado formação e informação acerca dos riscos associados às funções a desempenhar e das medidas preventivas a adoptar.

Termina pedindo a sua absolvição da instância, procedendo as excepções por si alegadas quanto ao erro na forma do processo e à ilegitimidade passiva da Ré, devendo ainda a acção ser julgada totalmente improcedente, devendo ser negada procedência ao pedido da seguradora relativo ao direito de regresso sobre a Ré – D… a em relação a quaisquer quantias decorrentes do sinistro em apreço.

Requereu ainda a intervenção da respectiva companhia de seguros, a F… – Companhia de Seguros, S.A., para a qual se encontrava transferida a responsabilidade infortunística laboral.

Por despacho proferido nos autos, foi indeferida a intervenção da F… – Companhia de Seguros, S.A.

Efectuado o julgamento, foi proferida sentença, cuja parte dispositiva transcrevemos: “Pelos fundamentos expostos, decide-se julgar procedente a presente acção para a efectivação de direitos resultantes de acidente de trabalho e, em consequência: 1. Condena-se a Ré, “A… – Companhia de Seguros, S.A.” a pagar, desde já e a título principal, ao Autor, Fundo de Acidentes de Trabalho, a quantia de € 25.454,40 (vinte e cinco mil quatrocentos e cinquenta e quatro euros e quarenta cêntimos) sem prejuízo do direito de regresso, nos termos do disposto no n.º 3 do art.º 79.º da Lei n.º 98/2009, de 04/09; 2. Condena-se a entidade empregadora C… – Empresa de Trabalho Temporário, Lda. e a empresa utilizadora de trabalho temporário, D… , Lda. A pagarem, solidariamente, nos termos do disposto no art.º 18.º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009, de 04/09, ao Autor, Fundo de Acidentes de Trabalho, a mencionada quantia de € 25.454,40 (vinte e cinco mil quatrocentos e cinquenta e quatro euros e quarenta cêntimos).

* * Custas a cargo da entidade empregadora C…– Empresa de Trabalho Temporário, Lda., da empresa utilizadora de trabalho temporário, D…, Lda. e da Ré, A… – Companhia de Seguros, S.A. na proporção dos decaimentos (art.º 527º, n.º 1, in fine, do Código de Processo Civil, aplicável subsidiariamente por força do disposto no art.º 1º, n.º 2, al. a) do Código de Processo do Trabalho).

* Fixa-se o valor desta acção, nos termos do art.º 120º, n.º 3 do Código de Processo do Trabalho, em € 25.454,40 – art.º 120.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo do Trabalho”. x Inconformada, vieram as Rés- C… e D…interpor recurso, formulando as seguintes conclusões: (…) A Ré- seguradora contra-alegou em relação ao recurso da C…, pugnando pela manutenção do julgado.

Foram colhidos os vistos legais.

O Exmº PGA emitiu parecer fundamentado no sentido da improcedência das apelações.

x Definindo-se o âmbito dos recursos pelas suas conclusões, temos, como questões a decidir: - a impugnação da matéria de facto; - se o acidente se deve considerar ocorrido devido a violação de regras de segurança por parte das Rés- apelantes.

x A 1ª instância fixou da seguinte forma a matéria de facto: Factos provados: 1) O Sinistrado, B…, no dia 24 de Maio de 2016, e em …, trabalhava sob ordens, direcção e fiscalização da sociedade C…– Empresa de Trabalho Temporário, Lda., com a categoria profissional de trabalhador não especializado, mediante a remuneração de € 530,00 x 14 meses, acrescida de € 4,40 x 22 dias x 11 meses, num total anual ilíquido de € 8.484,80 – alínea A) dos factos assentes.

2) Na referida data, o Sinistrado havia sido cedido pela sua Entidade Empregadora, C…– Empresa de Trabalho Temporário, Lda., à sociedade D…, Lda. E encontrava-se numa obra de construção de um pavilhão industrial da empresa G…, Lda., a cargo da sociedade D…, Lda., em cima da cobertura de um armazém em construção, quando se desequilibrou e caiu da mesma para o solo, de uma altura de cerca de 8 metros – alínea B) dos factos assentes.

3) Em consequência desse evento, o Sinistrado B…, sofreu as lesões descritas no relatório de autópsia junto a fls. 107 a 111 dos autos, cujo teor se dá aqui por reproduzido para os legais efeitos, nomeadamente lesões traumáticas crânio-meningoencefálicas, toraco-abdominais e dos membros superior e inferior direitos, de que resultou a sua morte, em 17 de Junho de 2016 – alínea C) dos factos assentes.

4) Na data referida em A), e quando foi encontrado no solo, o Sinistrado não tinha arnês de segurança colocado e esse equipamento não estava na cobertura.

5) O Sinistrado e o seu irmão, I…, foram cedidos pela empresa C…– Empresa de Trabalho Temporário, Lda. à empresa utilizadora D…, Lda., tendo sido destacados para a obra mencionada em 2), por iniciativa da empresa utilizadora, tendo o Sinistrado entrado ao serviço desta no dia 23 de Maio de 2016.

6) O Sinistrado não tinha experiência em trabalhos em altura.

7) O Sinistrado não foi sujeito a exame de saúde e de admissão nem antes nem após ter iniciado...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT