Acórdão nº 678/21 de Tribunal Constitucional (Port, 19 de Agosto de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Teles Pereira
Data da Resolução19 de Agosto de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 678/2021

Processo n.º 843/2021

Plenário

Relator: Conselheiro José António Teles Pereira

Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional.

I – A Causa

1. A concelhia de Lisboa do CDS-PP, através do respetivo Presidente, dirigiu, em 12/07/2021, quatro “denúncias” à Comissão Nacional de Eleições (CNE), concluindo com pedidos no sentido de esta entidade “[…] determinar à Câmara Municipal de Lisboa a imediata remoção […] [de] dispositivos publicitários ilegais”. Juntou cinco fotografias de outdoors e tapumes visíveis na zona do Parque das Nações, em Lisboa.

1.1. A Câmara Municipal de Lisboa foi ouvida e pronunciou-se no sentido do arquivamento do processo.

1.2. Apreciando as participações, a CNE, em reunião plenária de 12/08/2021, deliberou: (i) determinar a abertura de procedimento contraordenacional contra o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, por violação do n.º 4 do artigo 10.º da Lei n.º 72-A/2015, de 23 de julho; e (ii) notificar o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa para proceder à remoção dos outdoors melhor identificados na queixa apresentada, no prazo de 48 horas, sob pena de cometer crime de desobediência. Assentou tal deliberação nos seguintes fundamentos:

“[…]

4. A partir da publicação do decreto que marque a data das eleições, no caso, desde 08/07/2021, é proibida a publicidade institucional por parte dos órgãos do Estado e da Administração Pública de atos, programas, obras ou serviços, salvo em caso de grave e urgente necessidade pública, nos termos do n.º 4 do artigo 10.º da Lei n.º 72-A/2015, de 23 de julho.

Assim, logo que publicado o decreto que fixa a data da eleição, incumbe ao titular do órgão do Estado ou da Administração Pública, por sua iniciativa, determinar a remoção de materiais que promovam atos, programas, obras ou serviços e/ou suspender a produção e divulgação de formas de publicidade institucional até ao dia da eleição sob pena de, não o fazendo, violar a norma por omissão, como refere o Tribunal Constitucional no seu Acórdão n.º 545/2017.

5. O fundamento de tal proibição inscreve-se nos deveres de neutralidade e imparcialidade a que as entidades públicas se encontram sujeitas, designadamente, nos termos do artigo 41.º da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais e de idênticas disposições das demais leis eleitorais.

6. A proibição estabelecida pelo n.º 4 do referido artigo 10.º, conjugada com a sujeição aos especiais deveres de neutralidade e imparcialidade, visa impedir que as entidades públicas, através dos meios que estão ao seu dispor, os utilizem a favor de determinada candidatura em detrimento das demais, inserindo-se aqui um fator de desequilíbrio entre elas e afetando sobremaneira o princípio – ínsito em todas as leis eleitorais – da igualdade de oportunidades das candidaturas, plasmado na alínea b) do n.º 3 do artigo 113.º da CRP.

Neste sentido, é elucidativo o Acórdão TC n.º 586/2017 quando afirma que tal garantia de igualdade demanda que os titulares de entidades públicas, mormente os que se pretendam recandidatar, não possam, por via do exercício dessas funções, afetar os recursos e estruturas da instituição à prossecução dos interesses da campanha em curso.

7. Acresce que, para efeitos da proibição legal, é irrelevante se os materiais publicitários foram encomendados, produzidos ou colocados antes da publicação do decreto que marque a data da eleição, devendo a entidade pública abster-se de usar tais materiais desde esta publicação e até ao termo do dia da eleição. Defender o contrário tornaria o regime inteiramente incongruente e ineficaz. “Uma vez que o início do período eleitoral assume alguma previsibilidade, fácil seria aos agentes vinculados contornar a apontada proibição e assim frustrar o intento do legislador democrático.” (Cfr. Acórdãos TC n.ºs 545/2017 e 591/2017).

8. No fundo, a lei pretende impedir que, em período eleitoral, a promoção pelas entidades públicas “de uma atitude dinâmica favorável quanto ao modo como prosseguiram ou prosseguem as suas competências e atribuições, coexista no espaço público e comunicacional com as mensagens de propaganda das candidaturas eleitorais, as quais podem, por essa via, objetivamente, favorecer ou prejudicar” (cf. Acórdão TC n.º 545/2017). E continua, o mesmo aresto: “Por assim ser, entendeu o legislador que, para o funcionamento do princípio da igualdade de oportunidade e de tratamento das diversas candidaturas (artigo 113.º, n.º 3, al. b), do Constituição), as prerrogativas de divulgação institucional das entidades, órgãos ou serviços públicos deveriam ceder no período eleitoral, salvo em casos de necessidade pública urgente”.

9. Assim, apenas é aceitável que as entidades públicas veiculem determinado tipo de comunicações para o público em geral, informando sobre bens ou serviços por si disponibilizados, quando tal comunicação seja imprescindível à sua fruição pelos cidadãos ou seja essencial à concretização das suas atribuições, numa situação de grave e urgente necessidade pública, o que não ocorre no caso vertente.

10. Em geral, encontram-se proibidos todos os atos de comunicação que visem, direta ou indiretamente, promover junto de uma pluralidade de destinatários indeterminados, iniciativas, atividades ou a imagem de entidade, órgão ou serviço público, que nomeadamente contenham slogans, mensagens elogiosas ou encómios à ação do emitente ou, mesmo não contendo mensagens elogiosas ou de encómio, não revistam gravidade ou urgência.

11. Como se refere no Acórdão do TC n.º 590/2017, revela-se “... muito eficaz, em termos publicitários, a utilização de associações discretas, contendo uma mensagem não explícita, mas indutora de um estado de espírito de recetividade e adesão à imagem veiculada e de consequente memorização da ligação à entidade identificada como promotora”.

De salientar que “a proibição legal de publicidade institucional não impede também o cumprimento dos deveres de publicitação de informações impostos legalmente, como é o caso de avisos ou painéis relativos à legislação de licenciamento de obras, ou das publicações em Diário da República, bem como das publicações obrigatórias realizadas em publicação institucional ou por editais e outros meios. Nestes casos, a publicitação deve conter somente os elementos que a respetiva legislação exija.” (cf. Acórdão TC n.º 461/2017).

12. A Comissão Nacional de Eleições é, de harmonia com o estabelecido nos n.ºs 2 e 3 do artigo 1.º da Lei n.º 71/78, de 27 de dezembro, o órgão superior de administração eleitoral, colegial e independente, que exerce as suas competências relativamente a todos os atos de recenseamento e de eleições para os órgãos de soberania, das regiões autónomas e do poder local.

Entre outras competências que legalmente lhe estão cometidas, ao abrigo do disposto na al. b) do n.º 1 do artigo 5.º do mesmo diploma legal, compete à Comissão Nacional de Eleições assegurar a igualdade de tratamento dos cidadãos em todos os atos do recenseamento e operações eleitorais, sendo-lhe conferidos, para o efeito, os poderes necessários ao cumprimento das suas funções sobre os órgãos e agentes da Administração (cfr. artigo 7.º do diploma legal em referência).

A CNE, nas palavras do Tribunal Constitucional, “atua na garantia da igualdade de oportunidades das candidaturas e da neutralidade das entidades públicas perante as ações de propaganda política anteriores ao ato eleitoral e, por isso, destinadas a influenciar diretamente o eleitorado quanto ao sentido de voto” (cfr. Acórdão do TC n.º 46l1/2017).

De toda a factualidade apurada no âmbito do presente processo,...

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