Acórdão nº 1601/13.2TBTVD-A.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelMARIA DA GRAÇA TRIGO
Data da Resolução17 de Junho de 2021
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1. AA instaurou, em 22 de Março de 2019, acção de alteração de regulação das responsabilidades parentais contra a requerida BB, pedindo que a pensão de alimentos devida à filha maior CC fosse reduzida de 900 para 200 euros e lhe fosse entregue directamente, e, a pensão de alimentos devidos ao filho menor DD cessasse ou, assim não se entendendo, fosse fixada em 250 euros, e as despesas de saúde e de educação fossem pagas em partes iguais.

Os autos seguiram os seus termos e, em 10 de Julho de 2020, foi proferida sentença que, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu: - Cessar a pensão de alimentos devida à filha CC desde finais de Março de 2019, sem prejuízo de ser reiniciada, no montante de 200 euros, logo que a filha retomasse a pós-graduação ou outra actividade similar e, então, acrescida do pagamento das prestações escolares devidas; e, - Fixar a pensão de alimentos devidos ao filho DD em 600 euros desde 22 de Março de 2019 (data da propositura da acção), “sem prejuízo do disposto no art. 2007.º, n.º 2, do CC”, acrescida do pagamento das despesas escolares e de metade das despesas de saúde extraordinárias e não comparticipadas.

A requerida interpôs recurso para o Tribunal da Relação …., pedindo a revogação da sentença e a manutenção do valor da prestação de alimentos fixado no acordo de regulação das responsabilidades parentais, celebrado em 2013; e, se assim não se entendesse, relativamente à filha CC, pedindo que seja fixada para esta pensão de alimentos não inferior a 500 euros.

Também o requerente apelou pedindo que o valor da pensão de alimentos a pagar ao filho DD fosse reduzido para 58,19 euros, mantendo-se a sua obrigação de pagamento do seguro de saúde do menor, assim como do pagamento das despesas escolares e com explicações e de 50% das despesas de saúde não comparticipadas; e impugnando a decisão no que respeita à aplicação do art. 2007.º, n.º 2, do Código Civil.

Por acórdão de 25 de Fevereiro de 2021, foi julgado improcedente o recurso apresentado pela requerida e parcialmente procedente o recurso apresentado pelo requerente, decidindo-se: - Fixar a pensão de alimentos devidos ao filho DD em 450 euros; - Revogar a decisão na parte que ressalva a aplicação do artigo 2007.º, n.º 2, do Código Civil; - Manter em tudo o mais o decidido na sentença.

  1. Inconformada, veio a requerida interpor recurso de revista, por via normal, e, subsidiariamente, por via excepcional, formulando as seguintes conclusões: «1. O presente Recurso incide sobre o Acórdão proferido pelo T.R…., que julgou totalmente improcedente o recurso apresentado pela Requerida/Recorrente e julgou parcialmente procedente o recurso apresentado pelo Requerente, mediante o qual se alterou a sentença recorrida (que fixou o valor em €600,00), fixando-se em €450,00 o montante a ser entregue pelo Progenitor/Requerente a título de pensão de alimentos do filho de ambos menor, e por outro, revogando-a na parte em que ressalvou a aplicação do disposto no artigo 2007.º, n.º 2 do Código Civil, determinando-se, assim, que os valores seriam devidos desde a data da propositura da acção.

  2. Funcionando este S.T.J. como segundo grau de jurisdição face a decisões tomadas ex novo pelos tribunais da Relação, sempre deverá o presente recurso de revista ser admitido nos termos gerais, atendendo ao valor da causa e à inexistência de dupla conforme.

  3. Pese embora a restrição de recorribilidade ínsita no n.º 2 do art. 988.º do C.P.C, aplicável ex vi do artigo 12.º do R.G.P.TC., por se tratar de um processo de jurisdição voluntária, importa ter em linha de conta que a presente impugnação não se circunscreve aos juízos de oportunidade ou de conveniência adotados pelo Tribunal a quo, questionando-se, isso sim, a própria interpretação e aplicação dos critérios normativos em que se baliza a decisão recorrida.

  4. No caso presente, a Recorrente/Requerida pretende a sindicância por este Alto Tribunal das seguintes questões: a viciação do acórdão recorrido por excesso de pronúncia e contradição entre os fundamentos e a decisão e a violação da lei processual, consistente em inobservância dos critérios previstos no artigo 987.º do C.P.C., por inaplicabilidade do 2007.º, n.º 2, do Código Civil, no que respeita à retroactividade do valor dos alimentos que são devidos, à data da propositura da acção, tudo conforme art. 674.º, n.º 1, al. c) e b), respectivamente.

  5. No que respeita à invocada violação das disposições processuais, tem vindo a ser entendido pela jurisprudência corrente do Supremo Tribunal de Justiça que esse fundamento não concorrerá para a formação da dupla conforme prevista no n.º 3 do citado artigo 671.º, na medida em que tal violação seja imputada apenas à Relação, caso em que não ocorrerá, nessa parte, coincidência com a decisão da 1.ª instância, não sendo, portanto, a recorribilidade alcançada pelo impedimento da dupla conforme ali prescrito.

  6. Não obstante, sempre se dirá que, quanto à segunda questão acima aludida, não só não se verificou a ocorrência de dupla conforme - pois a mesma não foi confirmada pelo Acórdão recorrido - como o valor da causa excede a alçada deste Tribunal e, ademais, nos termos do artigo 629.º do C.P.C., o valor da sucumbência representa €22.650,00 (valor devidamente destrinçado no corpo do presente).

  7. Pelo que, verificados que estão os requisitos de revista ordinária, deverá o presente Recurso ser admitido como tal.

  8. De todo o modo, e para os devidos efeitos legais, não sendo aceite a dupla jurisdição, nos termos ora invocados, desde já se suscita a correspondente inconstitucionalidade, por violação do artigo 20.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, quando se interprete o artigo 671.º do C.P.C. no sentido de não se aceitar recurso para o S.T.J. de questões decididas, ex novo, pelo Tribunal da Relação.

    [excluem-se as conclusões respeitantes à admissibilidade da revista por via excepcional] 14. Acresce ainda, salvo melhor opinião, que a decisão desta questão pela instância anterior revela-se ostensivamente errada, juridicamente insustentável e, quanto a nós, com o devido respeito, suscita fundadas dúvidas acerca da sua bondade, nomeadamente ao assentar ela própria em critérios de legalidade estrita, colocando em causa o superior interesse do menor, atenta a clamorosa diminuição do valor da pensão de alimentos e revogação da decisão de 1.ª instância no que concerne à aplicação do n.º 2 do artigo 2007.º do C.C..

  9. Sucintamente, o Progenitor/Requerente, estava obrigado a liquidar a quantia de €1.800,00 a título de pensão de alimentos dos seus filhos, alterando-se esse valor, em sede de 1.ª instância para €600,00 e, por Acórdão proferido pelo Tribunal a quo, para €450,00.

  10. Nesta última fase, o Tribunal a quo considerou, para efeitos de cálculo do valor da pensão de alimentos, uma parcela que, não só não se confunde com aquele valor, como a ele é completamente alheio, e que representa a média do valor respeitante às despesas de educação com o apoio escolar das explicações.

  11. Valor esse que, quer no primitivo Acordo de Regulação das Responsabilidades Parentais, quer na Sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, quer ainda no pedido formulado pelo Progenitor/Requerente no âmbito do seu recurso, foi fixado como completamente autónomo do valor da pensão de alimentos.

  12. Por outro lado, entendeu o Tribunal a quo, contrariamente ao decidido pelo Tribunal de 1.ª instância, que não tinha aplicabilidade ao caso, o teor do n.º 2 do artigo 2007.º do Código Civil, decidindo-se, neste conspecto, revogar a Sentença de 1.ª instância, determinando-se que, nos termos do artigo 2006.º, os alimentos seriam devidos desde a data da propositura da acção, o que implica um encontro de contas /compensação, no valor de €22.650,00! 19. Neste sentido, se a breve exposição do caso, assim descrito, ofende a solução de direito encontrada – ofensa aos “critérios de conveniência e oportunidade” e do Princípio do Superior Interesse do Menor –, porque não tem respaldo nos critérios processualmente fixados, rapidamente se constata que tal solução jurídica alcançada pelo Tribunal recorrido é iníqua e ofensiva daquele princípio.

  13. Com a decisão proferida, o Tribunal da Relação de Lisboa atingiu uma solução injusta em si mesma e violadora quer da norma, quer do princípio que norteia este tipo de processos, pela errada conceptualização e valoração da noção jurídica dos critérios que devem presidir os processos de jurisdição voluntária, frustrando o legítimo direito do menor, ao arrepio da efetiva prestação e solvência de cuidados básicos diários (alimentação, higiene, habitação), contrariando a salvaguarda do superior interesse da criança que impõe que se alcance a solução que melhor promova o harmonioso desenvolvimento físico, intelectual e moral, bem como sua a estabilidade emocional, tendo em conta a idade, o seu enraizamento ao meio sociocultural e a disponibilidade e capacidade dos progenitores em assegurar tais objetivos, o que passa, também, pela garantia de condições materiais que tornem possível o são desenvolvimento da sua personalidade.

  14. Concretizando: a Recorrente não pode concordar com o método quantitativo que subjaz ao apuramento do valor da pensão de alimentos do menor DD e, muito menos, com a conclusão alvitrada, isto é, com o montante fixado a final.

  15. O Tribunal a quo, para aferir do valor da pensão de alimentos, teve em consideração um triplo vértice, a saber: o dobro de 50% do valor do indexante dos apoios sociais (0.5x438.81x2); o valor correspondente a 50% do vencimento da empregada doméstica; e a média das despesas de educação com o apoio escolar das explicações.

  16. Começando por referir que, face àquele cálculo, o Progenitor/Requerente teria de liquidar, a título de pensão de alimentos do filho menor, o valor de €666,66, concluindo, depois, que “Como nas despesas do DD está incluído o valor das despesas com as explicações que o pai paga directamente, no montante de...

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