Acórdão nº 472/21 de Tribunal Constitucional (Port, 24 de Junho de 2021

Data24 Junho 2021
Órgãohttp://vlex.com/desc1/2000_01,Tribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 472/2021

Processo n.º 98/21

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, o primeiro veio interpor recurso de constitucionalidade ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), da decisão proferida por aquele tribunal no dia 18 de março de 2020, que concedeu provimento parcial ao recurso interposto pelo arguido da decisão proferida pela 1.ª instância e o condenou, pela prática de uma pluralidade de crimes de ofensa à integridade física qualificada, numa pena única conjunta de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão efetiva.

2. O recurso para o Tribunal Constitucional tem o seguinte teor:

«A., arguido nos autos supra referenciados e nos mesmos melhor identificado, notificado do douto acórdão proferido e improcedência das inconstitucionalidades invocadas relativamente à subsunção jurídica e interpretação de várias normas legais adjetivas e substantivas, vem, nos termos e para os efeitos dos arts. 280º n.º 1 b) da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP brevitatis causa), 70º n.º 1 b) e n.º 2, 75º e 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional bem como da alínea i) do n.º 1 do art. 61º do Código de Processo Penal (doravante CPP brevitatis causa), apresentar

RECURSO DE CONSTITUCIONALIDADE

nos termos e com os seguintes

FUNDAMENTOS:

VENERÁVEIS JUÍZES CONSELHEIROS

TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

Dando cumprimento ao plasmado nos n.ºs 1 e 2 do art. 75º-A da LTC, refere-se que o presente recurso versa sobre sete questões muito simples e objetivas, que contendem com a conformidade constitucional da subsunção jurídica e interpretação de várias normas legais, quer do Código Penal quer de Processo Penal, melhor indicadas infra.

Suscitou-se a inconstitucionalidade de tais interpretações normativas, como decorre da douta decisão recorrida, por se defender a não conformidade do decidido à Lei fundamental.

Por forma a recortar o objeto recursório formularam-se tais questões concretas e objetivas, expostas nos parágrafos seguintes, suscitadas no recurso interposto para o venerando Tribunal da Relação de Coimbra (na motivação e conclusões C, F, H, T, U, X e DD), remetido via Citius, a contender com a interpretação e dimensão normativa de vários artigos normativos:

A. É inconstitucional, por violação dos princípios da legalidade bem como da não subtração de competência do Tribunal o entendimento e dimensão normativa do art. 358º n.º 1 CPP segundo o qual "Para efeitos de comunicação de alteração não substancial de factos em sede de processo comum coletivo não se mostra exigível a intervenção dos três juízes que compõem o tribunal, bastando-se com a comunicação individual a levar a acabo pelo Juiz presidente e sem que haja qualquer assinatura da ata a posteriori pelos demais juízes".

B. Mostra-se inconstitucional, por violação do principio da vinculação temática ao objeto do processo bem como demais garantias de defesa, o entendimento e dimensão normativa do art. 358º n.º 1 CPP segundo o qual "Mostra-se permitido e conforme às garantias de defesa do arguido a consideração como provada da falta de manifestação de arrependimento sempre e quando, não constando a mesma do teor da douta acusação pública deduzida, não tenha sido comunicada a título de alteração não substancial dos factos";

C. Mostra-se inconstitucional, por violação do direito ao silêncio, o entendimento e dimensão normativa do art. 71º n.º 2 e) CP quando interpretado no sentido de "Mostra-se permitido ao Tribunal dar como provada a ausência de manifestação de arrependimento resultante do exercício do direito ao silêncio e consequente não assunção dos factos pelo arguido em audiência de discussão e julgamento";

D. Mostra-se inconstitucional o entendimento e dimensão normativa do art. 132º n.º 2 h) CP quando no sentido de "Para que tenha lugar a qualificação ao abrigo da prática de ato ilícito conjuntamente com mais duas pessoas tal situação de vantagem numérica não tem de estar sempre preenchida e verificada ao longo de todo o episódio criminoso e face a todos os intervenientes";

E. É disforme à lei fundamental o entendimento e dimensão normativa do art. 132º n.º 2 h) CP quando no sentido de "Para que tenha lugar a qualificação ao abrigo da prática de ato ilícito conjuntamente com mais duas pessoas tal situação de vantagem numérica não tem de ser apurada em concreto pelas características dos concretos intervenientes para efeitos de aferir se de facto e objetivamente constituíam ou não vantagem efetiva e clara, seja pela altura, idade ou compleição física";

F. Mostra-se inconstitucional o entendimento e dimensão normativa do art. 4º DL 401/82, por violação do princípio da culpa, quando interpretado no sentido de "Para efeitos de análise e ponderação da aplicação do regime penal especial para jovens deverá o Tribunal atentar primacialmente no circunstancialismo vivencial futuro do arguido sem atentar decisivamente no circunstancialismo à data de prática dos factos";

G. Mostra-se inconstitucional o entendimento e dimensão normativa do art. 71º n.º 1 CP segundo o qual "As diferenças ao nível da medida da culpa do agente e das exigências de prevenção, as quais estão subjacentes e presidem à determinação da medida da pena, apenas intervêm ao nível da pena única, permitindo que as penas parcelares aplicadas a dois arguidos sejam iguais não obstante as diferenças sensíveis ao nível dos antecedentes criminais e idade aquando da prática dos factos";

Como fundamento do recurso aponta-se o entendimento sufragado no douto acórdão recorrido, proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, de março de 2020, a concluir pela legalidade do processado e conformação da douta decisão condenatória recorrida.

Tudo em violação dos princípios da legalidade, in dubio pro reo, da igualdade, da proporcionalidade, da culpa, da segurança jurídica, da proteção da confiança e interpretação das leis, em nome de obediência pensante, sendo violador, desde logo, dos arts. 9º CC e 1º, 2º, 13º, 18º,20º,32º n.ºs 1 e 10, 202º n.º 2 e 203º a 205º da CRP, para além de diversas normas legais consagradoras de tais direitos e princípios, sejam nacionais ou com consagração e assento em diversos textos de Direito internacional.

Tais questões afiguram-se não só relevantes como decisivas e essenciais para a boa decisão da causa, uma vez que em causa estão direitos, liberdades e garantias do recorrente, constitucionalmente tutelados e aptos a gerar, com a sua violação, danos e sacrifícios decorrentes da dosimetria da pena, sendo manifestamente contrário às mais elementares garantias de defesa bem como aos princípios subjacentes a um Direito penal que se queira materialmente justo e processualmente conforme a punição acrescida em nome de uma alegada censurabilidade e perversidade, com a majoração punitiva decorrente ...

Razão pela qual, nos termos do art. 78º LTC deverá o recurso ter efeito suspensivo e subir nos próprios autos, sendo certo que em sede de alegações se corporizarão os fundamentos do presente recurso em termos a serem os mesmos devida e cabalmente apreendidos por V/Exas, que, como sempre, não deixarão de fazer a almejada Justiça.

E não se pretende a sindicância da decisão jurisdicional. na dimensão de apreciação da situação concreta dos presentes autos. mas sim a análise de tais dimensões normativas enunciadas enquanto regras abstratas tendente a uma aplicação genérica pois não está em causa a interpretação levada a cabo nos presentes autos mas sim em toda e qualquer outra situação similar, entendendo-se que a injustiça se mostrará sempre existente em razão da perduração da conceção que permita tal punição acrescida.

O grande erro na aplicação e interpretação da lei reside numa obsessão pela sua literalidade, sem cuidar da sua teleologia e integração sistemática, sendo tal entendimento estribado que se combate em sede de constitucional idade, pois, diga-se a verdade em clamoroso auxílio do recorrente. a aplicação interpretativa das leis em causa é injusta e inconstitucional. ao denegar as mais flagrantes garantias de defesa das pessoas: o direito ao silêncio e legalidade assente no princípio da culpa bem como in dubio pro reo!

Dúvidas inexistem igualmente da pertinência das questões válida e previamente suscitadas (por devidamente identificadas as desconformidades constitucionais), as quais radicam no coração da decisão de mérito proferida e interpretação normativa efetivada em sede decisória.

E adota o arguido postura de crença e confiança no poder judicial e no Tribunal, verdadeiro e efetivo órgão de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo. assegurando a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, reprimindo a violação da legalidade em observância da lei fundamental, não deixando de aguardar pelo provimento do presente recurso! Afinal, stare decisis ...

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Destarte,

mui respeitosamente e sempre com o V/ mui douto suprimento, se interpõe para o Tribunal Constitucional o competente recurso de tal decisão negativa de inconstitucionalidade, o qual deverá ser admitido, com todas as demais consequências legais.

V/ Exas., seres humanos sábios, pensarão e decidirão necessariamente de forma justa, alcançando a costumada e almejada Justiça, na medida em que, citando Marquês de Condorcet e Dante Alighieri, uma alma nobre faz justiça, mesmo aos que a recusam, não deixando de pesar, em balanças...

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