Acórdão nº 02478/14.6BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 18 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelLu
Data da Resolução18 de Junho de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os juízes deste Tribunal Central Administrativo Norte, Secção do Contencioso Administrativo:* Município (...) (Praça (…)) interpõe recurso jurisdicional de decisão do TAF de Braga em acção administrativa especial intentada por C.

e J.

(R. das (…)), julgada parcialmente procedente.

O recorrente conclui: 1. Os AA, ora Recorridos, intentaram Acção Administrativa Especial, contra o ora Recorrente, peticionando que fosse: a) ser o Município réu condenado a praticar o ato de aprovação do projeto de arquitetura da obra descrita no presente articulado, no prazo de 30 dias, uma vez que o mesmo cumpre as disposições legais e regulamentares em vigor, seguindo-se os demais termos até final.

SUBSIDIARIAMENTE, e para o caso deste Tribunal julgar improcedente o pedido formulado na alínea a) supra, b) deve ser declarada a nulidade do ato de destaque (certidão de destaque e o seu teor) emitido pelo Município réu no dia 10 de Maio de 2011, e supra melhor identificado e, neste caso, CUMULATIVAMENTE, c) ser o Município réu condenado a pagar aos Autores a quantia de 6.898, 75 € pelos danos patrimoniais que lhe foram causados, das proveniências acima indicadas, e bem assim, por todos os demais danos que os mesmos venham a sofrer em virtude da conduta do réu Município (...), relegando-se a sua quantificação para execução de sentença nos termos supra expostos.” 2. Por sua vez, o Réu, ora Recorrente, apresentou a sua Contestação, defendendo-se por impugnação, pugnando pela improcedência da acção quanto à condenação do Município a aprovar o licenciamento em questão e no que respeita à condenação a pagar aos AA. qualquer indemnização.

  1. Proferida a sentença, verificou-se que salvo o devido respeito, o Tribunal a quo andou mal, decidindo no sentido da procedência parcial da acção, nos seguintes termos: a) Totalmente improcedente, o pedido formulado pelos autores a título principal sob a alínea a) do respetivo petitório, absolvendo o Município (...) do mesmo; b) Procedente, o pedido formulado subsidiariamente sob a alínea b) do respetivo petitório, e, em consequência, declaro nulo o ato de destaque (certidão de destaque e o seu teor) emitido pelo Município (...) no dia 10 de Maio de 2011; c) Parcialmente procedente, o pedido formulado subsidiariamente sob a alínea c) do respetivo petitório, e em consequência, condeno o réu Município (...) a pagar aos autores: c1) A quantia de € 6.095,09 (seis mil e noventa e cinco euros e nove cêntimos), pelos danos patrimoniais sofridos e já quantificados; c2) A quantia que se vier a liquidar em ulterior liquidação de sentença, a título de danos que os autores venham a sofrer em virtude da certidão de destaque emitida pelo réu e referida nestes autos, especificando-se que apenas cabem aqui as despesas necessárias à reposição da situação do prédio originário, e o IMI que entretanto haja sido suportado; d) Absolvo o réu do demais peticionado quanto ao pedido subsidiariamente formulado sob a alínea c) do respetivo petitório.

  2. Não pode a Recorrente deixar de apresentar as suas alegações quanto à matéria de direito, porquanto andou mal o Tribunal a quo ao decidir conforme decidiu, uma vez que a sentença recorrida, julgando não assistir razão ao Recorrente no que à indemnização peticionada diz respeito, viola alguns dos mais basilares princípios da boa administração da justiça.

  3. O Recorrente, em sede de Contestação, suscitou que quanto ao pedido de condenação no pagamento de indemnização, entendia não estarem preenchidos os pressupostos inerentes à responsabilização do Município, dado que, nos termos do requerimento apresentado para emissão de certidão de destaque, era impossível aos serviços municipais saberem que a parcela integrava o lote n.º 3 do loteamento em causa, o que sempre conduziria à improcedência do pedido.

  4. Sucede que o Tribunal a quo entende que todos os pressupostos da responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais entidades públicas, doravante RRCEE, nos termos da Lei nº 67/2007, de 31 de dezembro, se encontram preenchidos, correspondendo esses aos requisitos que se encontram previsto no Código Civil.

  5. Para que ocorra a responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas coletivas públicas por atos ilícitos e culposos dos seus órgãos ou agentes, no exercício das suas funções e por causa delas, é necessária a verificação cumulativa dos seguintes pressupostos: facto ilícito, culpa, dano e nexo de causalidade adequada entre o facto e o dano, pelo que a ação improcederá se um destes requisitos se não verificar.

  6. Se é certo que os requisitos do facto voluntário e ilicitude se encontram preenchidos, o requisito da culpa já não se encontra preenchido, discordando-se da douta sentença nesse aspecto.

  7. O Tribunal a quo considera a existência de culpa leve, sendo esta uma presunção ilidível, sob a forma de negligência no acto prático pelo funcionário na sua função administrativa, nos termos do nº 2 do art. 10º da Lei nº 67/2007.

  8. O funcionário do Município, ora Recorrente, agiu de acordo com a diligência e actuação pretendida para um funcionário medianamente diligente, perante o caso em concreto, enquadrando-se na diligência pretendida para um bom pai de família, conforme dita o nº 2 do art. 487º do CC.

  9. Tal como resulta do facto 11 da matéria provada, a descrição predial do prédio em causa não faz qualquer referência ao loteamento, uma vez que à data, não era obrigatório o registo do alvará de loteamento, pois foi licenciado à luz do Decreto-Lei n.º 289/73, de 6 de junho, que nada determinava a propósito do registo, só sendo obrigatório posteriormente.

  10. Os AA, no requerimento que apresentam para emissão da certidão de destaque, não referem expressamente e claramente, por escrito, que o prédio onde pretendiam executar a operação de destaque, constituía, como bem sabiam, o lote 3 de um loteamento.

  11. Aliás, o enquadramento de um funcionário zeloso e diligente não se enquadra ou afere pelos actos que o Tribunal a quo define como tal, nomeadamente a analise e consulta dos documentos da descrição predial, da visita ao local para verificar a situação do prédio, não seria suposto que o funcionário analisasse os documentos constantes da certidão predial, nem que se deslocasse ao local para verificar a situação do prédio.

  12. A aferição da diligência de um bom pai de família também se determina pelas circunstâncias concretas e dos meios disponíveis para executar os actos.

  13. À data da emissão da certidão de destaque, o Recorrente dependia única e exclusivamente das declarações prestadas pelos Requerentes nos requerimentos apresentados ao Município, uma vez que o os registos prediais do alvará de loteamento não eram obrigatórios, só o sendo com o Decreto-Lei n.º 448/91 e à data da emissão da certidão de destaque, em 10/05/2011, o Recorrente não tinha ainda acesso ao Sistema de informação geográfica, que lhe permitisse cadastrar os alvarás de loteamento do Município.

  14. Acresce a realidade de que os Recorridos não fizerem qualquer menção expressa e clara de que o prédio onde pretendia executar o destaque, constituía o lote 3 de um loteamento, embora disso tivessem conhecimento, pois a Recorrida era comproprietário do referido prédio.

  15. Perante a situação concreta, a legislação em vigor e os meios existentes, o funcionário actuou de forma zelosa e diligente, respeitando e actuando de acordo com o ónus de diligência que cabe ao Recorrente, previsto no art. 58º do Código de Procedimento Administrativo, inexistindo qualquer défice de instrução no acto da emissão da certidão de destaque, mas antes culpa do lesado, dos Recorridos, nos termos do art. 4º do RRCEE.

  16. Estes sabiam da existência do loteamento no prédio para o qual pretendiam realizar o destaque e no requerimento não fizeram qualquer menção expressa e clara ao mesmo, sendo esse um elemento essencial do requerimento, para que o Recorrente pudesse analisar a viabilidade da emissão da certidão de destaque, incorrendo num comportamento omissivo e lesivo, violando o disposto no art. 60º do CPA, que define que um ónus de colaboração para os interessados, tendo estes o dever de cooperar com a Administração Pública, com vista à fixação rigorosa dos pressupostos da decisão e obtenção de decisões legais e justos, não devendo formular pretensões ilegais, factos contrários à verdade nem requerer diligências dilatórias.

  17. Os Recorridos contribuíram, com culpa, para a produção de um acto ilegal e lesivo, provocando um acto danoso na sua esfera, não tendo usado os meios processuais ao seu alcance para eliminar o acto jurídico, consciente não transmitiram ao Recorrido a informação necessária para emitir ou não a certidão solicitada e não culpa do Recorrente, pois este, com os elementos que tinha à sua disposição, teve uma conduta diligente, prudente, zelosa e sempre no alcance de emitir decisões legais e justas.

  18. Destarte, a contribuição do lesado para a produção do facto danoso ou para o agravamento dos danos - aquilo que se designa por concorrência da culpa do lesado, pode conduzir á redução ou mesmo exclusão do direito á indemnização, pois os Recorridos não utilizaram os meios processuais ao seu alcance para eliminar o acto jurídico gerador dos prejuízos, sendo tal fundamental para a repartição de responsabilidades, que in casu, conduz à exclusão da responsabilidade do Recorrente.

  19. Conclui-se então por um entendimento diverso do Tribunal a quo, uma vez que se considera que se não fosse essa omissão dos Recorridos, o Recorrente não teria emitido a certidão de destaque, não ocorrendo, subsequentemente, os danos patrimoniais ocorridos na esfera patrimonial dos Recorridos, que só ocorreram em virtude da emissão dessa certidão, emitida por culpa dos Recorridos e não do Recorrente, 22. Sendo claramente ilidida a culpa leve do Recorrente com a demonstração de que a sua actuação preenche um padrão médio de razoabilidade que poderia evitar o dano, não fossem causas fortuitas ou imprevisíveis terem ocorrido...

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