Acórdão nº 131/18.0GTSTB.L1-5 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Junho de 2021

Magistrado ResponsávelARTUR VARGUES
Data da Resolução22 de Junho de 2021
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, em conferência, na 5ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I–RELATÓRIO: 1.

–Nos presentes autos com o NUIPC 131/18.0GTSTB, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Local Criminal de Almada – Juiz 2, em Processo Comum, com intervenção do Tribunal Singular, foi o arguido AR condenado, por sentença de 08/10/2020, pela prática de um crime de condução de veículo sob a influência de estupefacientes, p. e p. pelo artigo 292º, nº 2, do Código Penal, na pena de 70 dias de multa, à razão diária de 6,00 euros, no montante global de 420,00 euros.

Mais foi condenado na pena acessória de proibição de condução de veículos a motor, de qualquer categoria, pelo período de 3 meses, ao abrigo do estabelecido no artigo 69º, nº 1, alínea a), do Código Penal.

  1. –O arguido não se conformou com o teor da decisão e dela interpôs recurso, sendo que na mesma peça processual se insurge também contra o despacho judicial de 01/10/2020, proferido no decurso da audiência de julgamento, que julgou não verificada a nulidade do despacho que indeferiu a impetrada notificação do perito subscritor do “Parecer” junto aos autos para prestar esclarecimentos complementares relativamente às conclusões ali constantes.

    2.1–Extraiu o recorrente da motivação as seguintes conclusões (transcrição): A.

    – O douto despacho exarado na acta da audiência de discussão e julgamento de 01.10.2020 - “Considerando a forma mediante a qual foi obtido o resultado da quantidade/qualidade de produto estupefaciente no sangue do arguido, o relatório de exame pericial junto aos autos fls. 04 e ainda o teor dos esclarecimentos prestados pelo sr. Perito a fls 140/1, face à clarividência do ali exposto, entende o Tribunal, salvo o devido respeito pela posição da defesa, que as questões que se pretendem ver esclarecidas, nada importam para a decisão a proferir nestes autos, sendo questões de ordem técnica gerais sem aplicação ao caso vertente. Termos em que, se entende indeferir, por desnecessário e inútil à decisão da causa. Notifique.”. - é nulo, nos termos do disposto no artigo 120.º, n.º 2, alínea d) do Código de Processo Penal e foi impugnado acto contínuo à sua prolação, como emerge documentado na acta da audiência de discussão e julgamento, 2.

    a sessão, 01.10.2020, gravado no suporte magnetofónico da prova e das declarações, de minutos 10:35:25 a minutos10:38:16, com fundamento na omissão de diligência essencial à descoberta da verdade material e à boa decisão da causa, por denegar ao arguido, ora recorrente, a possibilidade de contraditar os esclarecimentos prestados pelo Perito Médico, de fls. 140 e 141, mostrando-se violados os artigos 340.º do Código de Processo Penal, 32.º da Constituição da República e 6.º, n.º 3, alínea d) da Convenção Europeia dos Direitos do Homem, termos em que, deve tal despacho ser substituído por outro que, em homenagem às mais elementares garantias de defesa, possibilidade ao arguido, ora recorrente, contraditar todos os elementos de prova carreados para os autos, possibilitando-lhe ver esclarecidas as questões enunciadas em 7., só assim se repondo a legalidade que nos termos supra expostos se mostra violada.

    B.

    – A douta sentença recorrida é nula por omitir no enunciado dos factos provados e não provados, qualquer referência e qualquer decisão sobre a verificação de o arguido, ora recorrente, ter sido submetido a exame de rastreio a produtos estupefacientes, deixando por explicar como e em que circunstâncias foi este submetido a colheita e análise sanguínea, afirmando apenas que “o sangue do arguido continha as seguintes substâncias (...)”, factos suscitados pela defesa, resultando da discussão da causa que o arguido não foi sujeito a qualquer exame de rastreio, tendo sido preteridos os procedimentos positivados na Lei 18/2007, de 17 de Maio, assim violando, respectivamente, o estatuído nos artigos 339º, nº 4, e 368º, nº 2, do CPP, estando, assim, nos termos do artigo 379º, nº 1, alínea c), do mesmo diploma legal, inquinada de nulidade por omissão de pronúncia, violando também o disposto no artigo 374º, nº 2, do CPP, estando, assim, nos termos do artigo 379º, nº 1, alínea a), do mesmo diploma legal, inquinada de nulidade por falta de fundamentação.

    C.

    – O arguido, ora recorrente, considera incorrectamente julgados os pontos 2, 4, 5 e 6 levados à dimensão de matéria de facto provada, os quais devem ser integralmente julgados não provados.

    C.1- Impõe que o ponto 2 da matéria de facto seja julgado não provado a circunstância de o arguido, ora recorrente, que não foi submetido a exame de rastreio, ter sido submetido a um exame de confirmação de substâncias estupefacientes sem terem sido observados os procedimentos estabelecidos na lei relativamente à metodologia a seguir na realização dos exames para a detecção do estado de influenciado por substâncias psicotrópicas, com concreta preterição das formalidades legalmente estabelecidas nos artigos 10.º, 11.º e 12.º da Lei 18/2007, de 17 de Maio, o que implica que a prova assim recolhida, porque obtida de forma viciada, não possa ser utilizada para fundamentar a aquisição da convicção positiva do julgador, devendo, em consequência, ser julgado não provado o ponto 2 da matéria de facto provada, o que se requer.

    C.2- Impõe que o ponto 4 da matéria de facto seja julgado não provado a circunstância ter sido utilizado na formação da convicção do julgador meio de prova não concretamente submetido ao contraditório em audiência de julgamento, concretamente o expediente de fls. 140 e 141, o que, na conjugação com a o depoimento da testemunha PSR, prestado em audiência de discussão e julgamento na sessão de 16.09.2020 e documentado na respectiva acta, gravado no sistema de conservação da prova em uso de minutos 15:59 a 16:04, que referiu acreditar que a causa do despiste haja sido um encandeamento solar e ainda a total ausência de prova do alegado estado de influenciado, impõe dever, em consequência, ser julgado não provado o ponto 4 da matéria de facto, o que se requer.

    C.3-O arguido, ora recorrente, considera, também, incorrectamente julgados os pontos 5 e 6 da matéria de facto provada, os quais consubstanciam a factualidade atinente ao preenchimento do elemento subjectivo do tipo legal cuja prática lhe é assacada, convicção que o Tribunal extraiu dos factos objectivos que considerou provados - e que acima resultam impugnados - com base na teoria das presunções e que, precisamente por força da impugnação a que os factos objectivos foram sujeitos, fica prejudicada, pedindo-se, por razões decorrentes da lógica, seja tal matéria julgada não provada.

    NESTES TERMOS, SEMPRE AMPARADOS COM O JUSTO E PERFEITO SUPRIMENTO DE V. EXCELÊNCIAS, SE REQUER SEJA JULGADO PROCEDENTE O PRESENTE RECURSO E, POR VIA DE TAL JULGAMENTO, SEJA ANULADA A DECISÃO RECORRIDA, CUJA SUBSTITUIÇÃO POR OUTRA EM CONFORMIDADE COM A LEI SE REQUER, ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA! 3.–A Magistrada do Ministério Público junto do Tribunal a quo respondeu à motivação de recurso, pugnando por lhe ser negado provimento.

  2. –Nesta Relação, a Exmª Procuradora da República (Ordem de Serviço do PGRL nº 3/2021, de 01/02) emitiu parecer no sentido da manutenção da decisão recorrida.

  3. –Foi dado cumprimento ao disposto no artigo 417º, nº 2, do CPP, não tendo sido apresentada resposta pelo arguido.

  4. –Dispensados os vistos, foram os autos à conferência.

    Cumpre apreciar e decidir.

    II–FUNDAMENTAÇÃO 1.–Âmbito do Recurso O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões que o recorrente extrai da respectiva motivação, havendo ainda que ponderar as questões de conhecimento oficioso, mormente os vícios enunciados no artigo 410º, nº 2, do CPP – neste sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição, Editorial Verbo, pág. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª edição, Edições Rei dos Livros, pág. 103, Ac. do STJ de 28/04/1999, CJ/STJ, 1999, Tomo 2, pág. 196 e Ac. do Pleno do STJ nº 7/95, de 19/10/1995, DR I Série A, de 28/12/1995.

    No caso em apreço, atendendo às conclusões da motivação de recurso, as questões que se suscitam são as seguintes: Nulidade do despacho de 01/10/2020, proferido no decurso da audiência de julgamento, que julgou não verificada a nulidade do indeferimento da impetrada notificação do perito subscritor da peça de fls. 140/141 para prestar esclarecimento complementar relativamente às conclusões ali constantes.

    Nulidade da sentença por omissão de pronúncia e falta de fundamentação.

    Impugnação da matéria de facto/erro de julgamento.

  5. –A Decisão Recorrida O Tribunal a quo deu como provados os seguintes factos (transcrição): 1.

    –No dia 25 de Setembro de 2018, cerca das 8 horas e 50 minutos, o arguido conduziu o motociclo com a matrícula 04..., pelo km 4,600 do I.C. 20, Almada.

  6. –Naquele momento, o sangue do arguido continha as seguintes substâncias: - D9 - Tetrahidrocanabinol (THC), na quantidade de 1,8 ng/ml; - Nor - 9 - carboxi - D9 - tetrahidrocanabinol (THC - COOH), na quantidade de 33 ng/ml; - 11 - Hidroxi - D9 -tetrahidrocananinol (11 - OH - THC), na quantidade de 10,5 ng/ml.

  7. –O arguido interveio em acidente de viação do qual resultou para a perda do membro superior direito.

  8. –O arguido sabia que tinha consumido substâncias estupefacientes e que, por influência das mesmas, não se encontrava em condições de exercer a condução do motociclo em segurança e, não obstante, não se coibiu de fazê-lo, conforme quis e concretizou.

  9. – O arguido agiu livre, deliberada e conscientemente.

  10. –O arguido sabia que a sua conduta era proibida por lei e criminalmente punível.

  11. –O arguido AR vive com a companheira e uma filha de sete anos...

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