Acórdão nº 366/21 de Tribunal Constitucional (Port, 27 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Lino Rodrigues Ribeiro
Data da Resolução27 de Maio de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 366/2021

Processo n.º 954/20

3.ª Secção

Relator: Conselheiro Lino Rodrigues Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional

I – Relatório

1. No âmbito dos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, o primeiro veio, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (LTC), interpor recurso da decisão proferida por aquele Tribunal no dia 15 de outubro de 2020, que confirmou a decisão de não admitir o recurso interposto pelo arguido da decisão do Tribunal da Relação do Porto que o condenou pela prática, em coautoria material, de um crime de ofensa à integridade física, p. e p. pelo disposto no artigo 143.º, n.º 1, do Código Penal, numa pena de prisão efetiva de 8 (oito) meses, concedendo assim provimento parcial ao recurso interposto pelo arguido da decisão da 1.ª instância que o condenara em pena de prisão efetiva de 10 (dez) meses.

2. O arguido veio então interpor recurso de constitucionalidade (fls. 2482 a 2487 dos autos), por considerar inconstitucional o artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do Código de Processo Penal, interpretado «de modo a vedar o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça “de acórdãos proferidos, em recuso, pelas relações que apliquem pena não privativa da liberdade ou pena de prisão inferior não superior a 5 anos». É o seguinte, na íntegra, o teor do requerimento de interposição de recurso:

«(...)

1. O ora (Recorrente foi condenado, por sentença proferida, em 15 de (dezembro de 2016, peia prática em coautoria material e na forma consumada de um crime de ofensa à integridade física p. e p. pelo número 1 do artigo 143° do Código (Penai, na pena de 10 meses de prisão efetiva.

2. Inconformado com a decisão do tribunal, o ora recorrente decidiu interpor recurso para o tribunal da (Relação do Porto por entender que existiu um erro notório na apreciação da prova produzida e considerar que a prova testemunhal se revela manifestamente injusta e infundada.

Neste sentido,

3. No acórdão de 15 de janeiro de 2020, os excelentíssimos juízes Desembargadores do Tribunal da Relação decidiram modificar pontualmente a matéria de facto reduzindo a pena de prisão do ora requerido para 8 meses.

4. (Por não concordar com a mera e insuficiente modificação, o ora recorrente, por considerar injusta a aplicação da pena de prisão efetiva, recorreu para o Supremo Tribunal de justiça para que os seus direitos, liberdades e garantias fossem respeitados e que fosse feita a verdadeira justiça.

5. Isto porque, os direitos constitucionalmente consagrados no artigo 13º, 18º, 32º e 205º estão as ser violados.

Sucede porém que,

6. Os (Excelentíssimos juízes conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça não admitiram o recurso do ora recorrente, por considerar a irrecorribilidade da decisão, mesmo tendo acrescido uma alteração na relação

Face ao exposto,

7. Inconformado, o ora recorrente apresentou reclamação para o Expio. (presidente do Supremo Tribunal de Justiça nos termos do número 1 do artigo 405° do Código Processo Penal

8. Onde foi indeferido a reclamação e confirmou a decisão sumária do relator,

9. (Rejeitando o recurso com fundamento no preceito legai consagrado na alínea e) do número 1 do artigo 400° do Código Processo Penai

Vejamos,

10. O n° 1 do artigo 32° da Constituição da República Portuguesa prevê "O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso".

11. Analisando todo o exposto é inquestionável que o ora recorrente vê vedado o seu direito a recorrer.

Acresce ainda que,

12. (Está legalmente consagrado, no artigo 399° do Código Processo Penal, o direito de recurso como mecanismo de impugnação das decisões judiciais.

Ora,

13. O Acórdão do Tribunal Constitucional 641/09, Processo n.° 914/09 sustenta que "O direito ao recurso tem cabimento no âmbito das garantias de defesa consagradas no artigo 32° da Constituição da República Portuguesa e desde logo, por força do direito de acesso aos tribunais, constante no artigo 20° da nossa Lei Fundamental".

14. 'Tendo como finalidade a correção de um vício imputado à decisão recorrida, e que, em regra, só pode ser interposta por quem, afetado peio erro, tenda interesse na revogação da decisão e na sua substituição por outra que lhe seja mais favorável

Ainda neste sentido,

O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 21 de maio de 2009, refere que "O direito ao recurso em processo penal é um elemento integrador das garantias de defesa do arguido (artigos 32°, n.° 1 da Constituição da República Portuguesa e 2º do Protocolo n.° 7 à Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais), daí decorrendo que o arguido tem de ter a possibilidade/faculdade de recorrer das sentenças condenatórias e/ou de quaisquer atos judiciais que privem ou restrinjam a sua liberdade ou quaisquer outros dos seus direitos fundamentais."

E é, por isso,

15. Que o ora recorrente questiona a constitucionalidade da alínea e) do número 1 do art.º 4000 do Código de Processo Penal, quando esta é interpretada de modo a vedar o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça "de acórdãos proferidos, em recurso, pelas relações que apliquem pena não privativa de liberdade ou pena de prisão não superiora 5 anos."

16. No caso em apreço, estamos perante uma pena de 8 meses de prisão.

Por outro lado,

17. Há que considerar que a melhor forma de diminuir o erro judiciário para assim melhorar a qualidade da decisão consegue-se através de uma nova apreciação da causa por um tribunal superior.

É ainda de ressalvar que,

18. O direito de recurso está previsto em legislação internacional, nomeadamente no art.014° n.º 5 do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos - "Qualquer pessoa declarada culpada de crime terá o direito de fazer examinar por uma jurisdição superior a declaração de culpabilidade e a sentença, em conformidade com a lei".

Ora,

19. Não é aceitável do ponto de vista da defesa efetiva dos direitos do arguido, que este não possa levar o caso perante o STJ,

20. Para ver a suspensão da execução da sua pena, ou até para junto do mais alto tribunal defender a sua absolvição.

21. Assim e face ao exposto, urge realçar que a gravidade da decisão e as consequências para a vida do arguido são demasiado nefastas para se poder levantar com leveza a admissão ou não do recurso do reclamante.

CONCLUSÕES

1-O Recorrente foi condenado, por sentença proferida, em 15 de dezembro de 2016 pela prática em coautoria material de um crime de ofensa à integridade física simples, p. e p. pelo art.º 143°, n.° 1, do Código Penal na pena de 10 meses de prisão.

2-Inconformado, decidiu interpor recurso para o Tribunal da Relação do Porto, que culminou na modificação pontual da matéria de facto, em 15 de janeiro de 2020, para uma pena de prisão de 8 meses.

3-Ainda inconformado recorreu e por considerar que havia motivos suficientes para recorrer para instância superior, o Recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça,

4-No entanto, o recurso interposto para o Supremo 'Tribunal de Justiça não foi admitido.

5-Assim, inconformado com tal decisão foi alvo de reclamação para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, não tendo o mesmo sido aceite.

6-Levanta-se, a questão da constitucionalidade do art.° 400° n.° 1 al. e) do Código de Processo Penal, na medida em que viola o artigo 32º n.° 1 da Constituição da República Portuguesa, onde se prevê que "O processo criminal assegura todas as garantias de defesa, incluindo o recurso".

7-No processo em questão, ao vedar-se o direito do ora Recorrente recorrer de uma pena de prisão de 8 meses, estão a ser violadas as garantias e liberdades fundamentais desta para assegurar o direito de punir.

8-Nestes termos e nos melhores de Direito deve o presente recurso ser admitido e nesse sentido ser declarado nulo o douto acórdão por inconstitucionalidade do artigo 400° n.° 1 al. e) do Código de Processo Penal

Nestes temos e nos melhores de Direito deve o presente recurso ser admitido e nesse sentido ser declarado nulo o douto acórdão por inconstitucionalidade do artigo 400º n.º l alª e) do Código de Processo Penal

3. Através da Decisão Sumária n.º 715/2020, decidiu-se, ao abrigo do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não julgar inconstitucional a norma contida no artigo 400.º, n.º 1, alínea e), do CPP, na redação introduzida pela Lei n.º 20/2013, de 21 de fevereiro, interpretado no sentido de que é irrecorrível o acórdão proferido, em recurso, pelo Tribunal da Relação que aplique pena privativa da liberdade não superior a cinco anos, concedendo provimento parcial ao recurso interposto pelo arguido de uma decisão proferida pelo tribunal de 1.ª instância que aplicara já uma pena privativa da liberdade. Consequentemente, negou-se provimento ao recurso.

Foi a seguinte a fundamentação apresentada na referida Decisão Sumária:

«3. A questão que constitui objeto do presente recurso foi já apreciada por este Tribunal Constitucional inúmeras vezes, designadamente nos Acórdãos n.os 101/2018, n.º 804/2017, e n.º 357/2017, todos prolatados no sentido da não inconstitucionalidade. O último aresto referido foi o primeiro a pronunciar-se sobre esta questão depois de o Acórdão n.º 429/2016 ter vindo julgar inconstitucional a norma do artigo 400.º, n.º 1...

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