Acórdão nº 02486/19.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 21 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução21 de Maio de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: RELATÓRIO M. instaurou acção administrativa contra o Instituto da Segurança Social, I.P., ambos melhor identificados nos autos, peticionando a condenação deste a deferir-lhe as prestações por morte de J., previstas no artigo 8.º do DL 322/99, de 18 de outubro, com efeitos retroactivos à data do óbito, acrescidas de juros de mora sobre as quantias em dívida desde fevereiro de 2019 até efectivo e integral pagamento.

Por sentença proferida pelo TAF do Porto foi julgada procedente a acção e condenado o Réu a, no prazo de 30 (trinta) dias, deferir o requerimento de prestações por morte de J., com efeitos à data do óbito, procedendo ao seu pagamento, acrescido de juros de mora desde março de 2019 até efectivo e integral pagamento.

Desta vem interposto recurso.

Alegando, o Réu concluiu: 1. Vem o presente recurso interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou totalmente procedente a ação administrativa intentada por M. e, em consequência, condenou ora Recorrente a, no prazo de 30 (trinta) dias, deferir o requerimento de prestações por morte de J. formulado pela Autora, com efeitos à data do óbito, procedendo ao seu pagamento, acrescido de juros de mora contados desde o mês de Março de 2019 até ao seu efetivo e integral pagamento.

  1. Dos factos assentes e provados da sentença resulta que em 14 de março de 2019, a Autora, na qualidade de membro de união de facto, requereu ao Centro Nacional de Pensões a atribuição de prestações pelo óbito de J., faleceu em 03 de fevereiro de 2019.

  2. Por despacho de 02 de Setembro de 2019, do Diretor de Núcleo de Processamento de Prestações de Sobrevivência do Réu determinou o indeferimento do requerimento de prestações por morte formulado pela Autora, com o seguinte fundamento: “art.º 1.º, n.º 2 da Lei n.º 7/2001, de 11/05, na redação da Lei nº 23/2010, de 30/08, por ter a união de facto duração inferior a dois anos”.

  3. A Autora casou-se com J., em 13 de Agosto de 1998, casamento declarado dissolvido por decisão proferida pela 3ª Conservatória do Registo Civil do Porto, em 06 de fevereiro de 2017, tendo na mesma data transitado em julgado.

  4. O Presidente da Junta de Freguesia de Paranhos emitiu um documento designado de “Atestado”, datado de 27 de Fevereiro de 2019, através do qual declarou que “atesta com base em prova testemunhal, que a Autora viveu em união de facto com o seu companheiro J.

    desde 22/02/2014 ateì aÌ data do seu falecimento ocorrido em 03/02/2019.

  5. Resulta do artigo 8º Decreto-Lei nº 322/90, de 18 de outubro, dada pela Lei nº 23/20210, de 30 de agosto, que o direito às prestações previstas neste diploma e o respetivo regime jurídico são tornados extensivos às pessoas que vivam em união de facto, sendo o a prova desta situação efetuada nos termos definidos na Lei nº 7/2001, de 11 de maio, na versão em vigor dada pela Lei nº 71/2010, de 31 de dezembro 7. No entanto, o reconhecimento e a atribuição das referidas prestações, por parte do Recorrente, está condicionada pela verificação negativa das exceções previstas no artigo 2º alíneas a) a e), por um lado, e pela prova de que requerente e falecido viveram em união de facto por período superior a dois anos, à data do falecimento, que deverá ser feita nos termos do nº 4 do artigo 2º - A, aditado à Lei 7/2001 pela Lei 23/2010, de 30/08.

  6. Estipulando o artigo 2º, alínea c), da Lei 7/2001, que constitui impeditivo dos efeitos jurídicos decorrentes da presente lei o “Casamento não dissolvido, salvo se tiver sido decretada separação judicial de pessoas e bens”.

  7. Com efeito, estando a união de facto equiparada ao casamento, conforme disposto no artigo 2020º do Código Civil e artigo 1º e alínea c), do artigo 2º, da Lei nº 7/2001, não pode nenhum dos membros ter, para efeitos de tutela jurídica da união de facto, simultaneamente, a qualidade de casado e a qualidade de unido de facto durante o período dois anos à data do falecimento do beneficiário do regime de segurança social 10. Não obstante o facto de a Autora ter entregue toda a documentação exigida para a tramitação do procedimento administrativo em causa, resulta da instrução do mesmo, nomeadamente do averbamento que consta da certidão de nascimento da Autora que, há data da morte deste, ou seja, 03 de fevereiro de 2019 não se encontrava, em termos legais, ultrapassado o prazo de dois anos de vivência em união de facto.

  8. Tendo a decisão de divórcio da Autora com J. transitado em julgado em 06 de fevereiro de 2017, só a partir dessa data é que o divórcio começou a produzir os seus efeitos jurídicos, ou seja, apenas a partir desse momento essa situação se tornou definitiva na esfera jurídica das partes.

  9. O que determinará o indeferimento do requerimento de prestações por morte apresentado pela Autora/requerente, uma vez que não se verificou um dos requisitos essenciais para a sua atribuição, e que é a duração da união de facto há mais de dois anos - ex vi artigo 1º nº 2 da Lei 7/2001, na redação dada pela Lei 23/2010.

  10. E, portanto, só a partir desse momento, é que a Autora e o beneficiário falecido iniciaram a sua vivência em união de facto para efeitos de aplicação do regime jurídico previsto na Lei 7/2001, nomeadamente de proteção na eventualidade de morte do beneficiário, pela aplicação do regime geral da segurança social e da lei por ex vi art. 2º, alínea c) e artigo 3º deste diploma uma vez que até essa data, legalmente a Autora se encontrava no estado civil de casada.

  11. Efetivamente é entendimento do Recorrente que não são as características da convivência existente entre as pessoas que releva para se aferir se a pessoa eì casada ou não, mas sim a sua situação jurídica, para efeitos de reconhecimento de eficácia jurídica da situação de união de facto nos termos da Lei nº 7/2011.

  12. Em sentido idêntico pronunciou-se o Tribunal Central Administrativo Norte, acórdão de 12 de Abril de 2019 no processo no 01994/16.0BEPRT. «I.1-tendo o casamento da Recorrida com o falecido sido dissolvido por divórcio em 23/01/2013 e o óbito deste ocorrido em 14/11/2014 não se mostra preenchido o requisito temporal - 2 anos de vivência em situação análoga aÌ dos cônjuges - para que, face aos normativos legais em vigor se possa considerar a situação daquela e do falecido como de união de facto e como tal constitutiva de direitos; I.2- Para efeitos do preenchimento do requisito temporal (dois anos de vivência em união de facto), não se cumula todo o tempo que durou a relação da Autora com o falecido - em regime de casamento e em união de facto -;3- casamento/divórcio/união de facto são opções de vida distintas com implicações, natural e logicamente, distintas; I.4-no caso concreto a existência da união de facto, que soì pode ser considerada após o trânsito em julgado da sentença que decretou o divórcio, não teve a duração mínima de dois anos, razão pela qual não estão reunidas as condições para que possa ser reconhecido aÌ Recorrida o direito aÌ pensão de sobrevivência. ( ...) 16. É manifesto que a relação jurídica do casamento não cessa, informalmente, com o início e manutenção de uma situação de união de facto por parte de qualquer dos cônjuges com um terceiro (cfr. Artigo 1788º do Código Civil).

  13. O artigo 1789º, nº 1, primeira parte, do Código Civil, diz expressamente que “Os efeitos do divórcio produzem-se a partir do trânsito em julgado da respetiva sentença (…)”.

  14. Ou seja, apesar de os efeitos do divórcio só se produzirem após a data do trânsito em julgado da sentença, é perfeitamente admissível que os cônjuges pudessem já antes encontrar-se há muito separados de facto.

  15. É até admissível que os cônjuges se encontrem a viver em condições análogas com terceiros, no entanto é entendimento do Recorrente, que a tutela jurídica da união de facto, apenas opera por período superior a dois anos, após o transito em julgado do divórcio 20. Situação que encontra, aliás, prevista no nº 2 do art.º 1789º do Código Civil, onde se diz que “Se a separação de facto entre os cônjuges estiver provada no processo, qualquer deles pode requerer que os efeitos do divórcio retroajam à data, que a sentença fixará, em que a separação tenha começado”.

  16. Pelo que, ao contrário do entendimento da sentença ora recorrida, bem andou o Recorrente, em respeito pelo princípio da legalidade a que está obrigada, ao indeferir o requerimento para atribuição das prestações por morte à Autora, por verificação do impedimento constante da alínea c) do artigo 2.º da Lei da União de Facto, Lei nº 7/2001, na redação dada pela Lei nº 23/2010.

  17. É que, salvo o devido respeito, que é muito, não poderia a sentença decidir como decidiu, fundamentando a sua decisão aderindo à fundamentação constante dos acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal Administrativo que tomou posição sobre o assunto, em arestos, nomeadamente, de 09 de janeiro de 2020 proferido no processo n.º 01994/16 e de 17 de dezembro 2019 proferidos nos processos nº 01378/17.2BEBRG e 0442/16.0BEBRG e Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de maio de 2013 considerando, “o acto impugnado mediatamente impugnado padece de ilegalidade material, por violação do disposto no n.º 2 do artigo 1º da Lei nº 7/2001”.

  18. Ao decidir como decidiu, a sentença, ora recorrida, violou o disposto no artigo 2º, alínea c), da Lei nº 7/2001, na redação dada pela Lei nº 23/2010, por não ter em conta o impedimento ali previsto consubstanciado na existência de casamento não dissolvido há menos de dois anos de um dos membros da união de facto, no caso a Autora, a contar da data da morte do beneficiário J. o qual acarretará a não produção dos efeitos previstos no artigo 3º, nº 1, alínea e), da referida lei.

    Nestes termos, e nos mais de direito e sempre com o suprimento, deve ser dado provimento ao recurso interposto, tudo de acordo com as conclusões anteriores, assim se fazendo JUSTIÇA! A Autora juntou contra-alegações, concluindo: 1- Na sua...

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