Acórdão nº 296/21 de Tribunal Constitucional (Port, 13 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelCons. Assunção Raimundo
Data da Resolução13 de Maio de 2021
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 296/2021

Processo n.º 976/20

2.ª Secção

Relatora: Conselheira Assunção Raimundo

Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional:

I. Relatório

1. A., inconformada com despacho proferido no Juízo do Comércio do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, a 20 de maio de 2020, no âmbito do respetivo processo de insolvência, que considerou “sustadas todas as diligências para entrega efetiva do imóvel onde reside habitualmente a insolvente até ao termo da situação excecional provocada pelo corona vírus SARS-CoV2 e da Doença COVID-2” e julgou improcedentes “a arguição de nulidade suscitada” e “o pedido de destituição do administrador de insolvência”, interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra que, por acórdão de 21 de setembro de 2020, julgou a apelação improcedente, confirmando a decisão recorrida.

2. Notificada desse acórdão, interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do art. 70.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, doravante LTC), no qual formulou as seguintes conclusões (cf. fls. 19-25):

“A) Vem o ora recorrente interpor recurso de Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Coimbra datado de 21 de setembro de 2020, que negou provimento ao recurso, confirmando integralmente a sentença proferida em sede de primeira instância, e em sumula julgou: O disposto nº 6 do artigo 7º da Lei nº 1-A/2020, de 19 de março (na redação que lhe foi introduzida pelo artigo 2º da Lei nº 4-A/2020, de 6 de abril) - que estabeleceu medidas excecionais e temporárias de resposta à situação epidemiológica provocada pelo coronavírus SARS-CoV-2 e da doença Covid-19 -, não é de aplicação analógica às diligências de venda a efetuar no processo de insolvência. O artigo 6º da Lei nº 1-A/2020 (na redação da Lei nº 16/2020, de 29 de maio), apenas determina a suspensão dos atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência que se encontrem relacionados com a concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família. As medidas excecionais e temporárias contidas na Lei nº 1-A/2020, de 29 de maio, nas sucessivas alterações que lhe foram sendo introduzidas, não implicavam a suspensão das diligências e atos de venda em processo de insolvência.

B) Decisão que, a ora Recorrente não pode aceitar, é inequívoco que nos presentes autos se encontram já para si irremediável e completamente esgotados todos os meios ou recursos jurisdicionais ordinários, que possibilitem à recorrente reagir contra a decisão, entendendo verificar-se a violação de direitos legais e constitucionais fundamentais que cumpre conhecer pelo Tribunal Constitucional, suprimindo-se assim a referida violação. Pelo que, com o presente recurso visa a recorrente submeter a apreciação da constitucionalidade da interpretação e aplicação do referido normativo nos presentes autos, entendendo-se que ao decidir como decidiu o Venerando Tribunal da Relação violou princípios constitucionais, designadamente o direito de habitação, igualdade e proporcionalidade. Com efeito, entende o recorrente que a interpretação dos artigos 6.º e 7.º da Lei 1-A/2020 com as suas sucessivas alterações normativas, realizada pelo Venerando Tribunal, não atendeu ao propósito último da introdução de normas excecionais, normas essas que visaram proteger um conjunto de realidades, nomeadamente a proteção da habitação num contexto pandémico.

C) Inexistindo razões que submetam a aplicação de regime diferenciado, em processo de insolvência e em processo de ação executiva, uma vez que as necessidades habitacionais são igualmente validas e devem neste conspecto serem tratadas de forma igual. Inexiste assim fundamento para um tratamento diferenciado do insolvente que se vê desapossado da sua habitação, casa de morada de família que foi objeto de venda nos presentes autos(durante situação pandémica), em relação a um executado que viu por seu lado aquando da situação pandémica a venda da referida casa suspensa. Pelo que, não foi este tratamento desigual e desproporcional que a introdução de dispositivos legais no âmbito de situação epidemiológica pelo coronavírus SARS - Cov-2 e da doença Covid 19 visou alcançar.

D) Assim e salvo devido respeito por opinião contraria, teremos que aplicar analogicamente, dada ausência de normativo expresso, o disposto no n.º 6 do artigo 7.º da Lei 4/2020: Ficam também suspensos: b) Quaisquer atos a realizar em sede de processo executivo, designadamente os referentes a vendas, concurso de credores, entregas judiciais de imóveis e diligências de penhora e seus atos preparatórios, com exceção daqueles que causem prejuízo grave à subsistência do exequente ou cuja não realização lhe provoque prejuízo irreparável, nos termos previstos no n.º 2 do artigo 137.º do Código de Processo Civil, prejuízo esse que depende de prévia decisão judicial.

E) Apesar de não se fazer referência expressa com a Lei 4/2020: aos atos de venda no âmbito de processo de insolvência, por aplicação analógica o mesmo seria aplicável à casa de morada de família da insolvente. Entendendo-se que não havia no espírito do legislador qualquer diferenciação entre a casa de morada de família do executado ou do insolvente. No entanto, e se duvidas houvesse, Tal situação foi devidamente esclarecida e resolvida com a Lei 16/2020 de 29 de Maio, na qual resulta a alteração as medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19, procedendo à quarta alteração à Lei n.º 1-A/2020, de 19 de março, à primeira alteração à Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, e à décima segunda alteração ao Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de março. b) Os atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência relacionados com a concretização de diligências de entrega judicial da casa de morada de família;

F) Prevendo no artigo 7.º: "Nos casos em que os atos a realizar em sede de processo executivo ou de insolvência referentes a vendas e entregas judiciais de imóveis sejam suscetíveis de causar prejuízo à subsistência do executado ou do declarado insolvente, este pode requerer a suspensão da sua prática, desde que essa suspensão não cause prejuízo grave à subsistência do exequente ou um prejuízo irreparável, devendo o tribunal decidir o incidente no prazo de 10 dias, ouvidas as partes." Ora, duvidas não restam que a venda por leilão online operou-se já no decurso da referida pandemia (entre 11 de março e 06 de abril de 2020), bem como a adjudicação ao credor hipotecário comunicada aos presentes autos a 9 de abril de 2020. Contendendo a referida adjudicação do imóvel com direito da insolvente que no atual contexto se vê limitada no exercício dos seus direitos, designadamente de prover a uma habitação. Pelo que, ao entender que" a suspensão dos prazos não impõe a...

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