Acórdão nº 237/16.0T9ABF.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 11 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelJO
Data da Resolução11 de Maio de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - RELATÓRIO Nos autos de Processo Comum (Tribunal Coletivo) nº 237/16.0T9ABF, do Juízo Central Criminal de Portimão (Juiz 3), e por acórdão proferido em 02-12-2020, foi reformulado o cúmulo jurídico de penas aplicadas ao arguido AFNM, envolvendo o presente processo e os processos 91/12.1GDLLE, 501/11.5GAOLH e 437/09.0GFLLE (tendo a pena deste último sido excluída com o fundamento de que não é admissível o cúmulo “por arrastamento”), do que resultou a condenação do arguido na pena única de 4 anos de prisão efetiva

Dessa decisão recorre o arguido AFNM, retirando da respetiva motivação as seguintes (transcritas) conclusões: “I - O presente recurso é interposto do douto Acórdão que procedeu ao novo cúmulo jurídico das penas, aplicadas nos presentes autos nº 237/16.OT9ABF, e nos Processos nº 501/11.5GAOLH e 91/12.1GDLLE, condenando o arguido, em cúmulo jurídico, na pena única de quatro anos prisão efetiva, desmanchando o cúmulo jurídico realizado no Processo nº 437/09.0GFLLE, da Secção Criminal (Juiz 1) da Instância Local de Loulé, que englobava a pena aplicada nesses autos e as aplicadas nos processos 501/11.5GAOLH e 91/12.1GDLLE

II - É da decisão de condenação na pena única de 4 anos de prisão efetiva, do cúmulo efetuado no âmbito dos três processos em referência, que o arguido não concorda, por ser excessiva, e ter excluído do mesmo a pena aplicada no Processo nº 437/09.0GFLLE

III - Ao ter sido desmanchado o cúmulo anteriormente realizado por conhecimento superveniente de novos crimes em concurso, o novo cúmulo incluirá todas as penas singulares que integravam aquela pena conjunta, bem como as penas supervenientes. Pelo que não podia o Tribunal “a quo” ter excluído do novo cúmulo a pena aplicada no processo 437/09.0GFLLE

IV - O arguido estava convicto de que o cúmulo agora efetuado ficaria nos três anos de prisão, englobando a pena aplicada no processo 437/09.OGFLLE, podendo iniciar medidas de flexibilização da pena, pelo que, quando foi confrontado com novo cúmulo de quatro anos de prisão, e excluindo do cúmulo a pena aplicada nos autos 437/09.OGFLLE, viu as suas expectativas completamente defraudadas

V - Sem este cúmulo ora efetuado, o arguido cumpriria a pena única de 3 anos aplicada nos autos 437/09.OGFLLE e a pena dos presentes autos, de 27 meses de prisão, o que daria 5 anos e 3 meses de prisão. Com o cúmulo ora efetuado (que aplica uma pena única de 4 anos de prisão), desmanchando o cúmulo anterior e excluindo da reformulação do cúmulo a pena aplicada no processo 437/09.OGFLLE, de um ano de prisão, resulta 5 anos de prisão

VI - Conforme Jurisprudência dominante, o cúmulo jurídico deve ser entendido como um instrumento através do qual se visa, precisamente, atingir, no caso de concurso de crimes, uma punição mais justa

VII - Conforme resulta da factualidade apurada, essencialmente baseada no relatório social junto aos autos, o arguido provém de um agregado familiar de modesta condição económica, tendo o seu processo de desenvolvimento decorrido num contexto marcado por doença e pelo falecimento do irmão mais velho, durante a sua adolescência, tendo sido diagnosticada ao pai, recentemente, uma doença oncológica

VIII - Resulta da análise do registo criminal do arguido, que este cometeu estes crimes, no ano de 2011 e 2012. A essa data tinha o arguido trinta e três anos de idade. A ilicitude dos factos praticados pelo arguido não se revela acentuada. Por outro lado, é de valorar o tempo já decorrido desde a prática dos factos

IX - Desde abril de 2014, não consta no seu registo qualquer atividade criminosa, sendo que o crime cometido em 28 de abril de 2014 foi um crime de condução em estado de embriaguez

X - A pena singular mais alta sofrida pelo arguido foi a dos presentes autos, de 27 meses de prisão

XI - O arguido encontra-se em cumprimento de pena, entre 05.04.2018 e 04.11.2018 cumpriu a pena de 7 meses de prisão aplicada no Proc. 1078/13.2PBMTS da Secção Criminal (Juiz 1) da Instância Local de Matosinhos e, reportado a 04.11.2018, cumpre a pena única de 3 anos de prisão aplicada no Proc. 437/09.OGFLLE (englobando a pena desses autos e as aplicadas nos Processos 501/11.5GAOLH e 91/12.1GDLLE), e conforme resulta dos factos dados como provados o arguido tem mantido um comportamento consonante com as regras, solicitou integração em atividade laboral

XII - Iniciou a frequência da escola e concluiu com sucesso o 6º ano de escolaridade, revelando motivação para dar continuidade à aprendizagem. Está laboralmente inserido

XIII - Aquando da presente reclusão e desde meados de 2017, AM mantinha relação marital com MIM, sua atual companheira, permanecendo o casal a residir em …. A sua companheira tem consubstanciado um importante suporte psicoafectivo, estando disponível para o acolher e apoiar

XIV - Conforme consta do relatório social, aquando da sua atual reclusão já tinha o arguido reorganizado a sua vida, mantendo um padrão comportamental estável a nível laboral, social e afetivo, tendo a sua prisão interrompido este ciclo positivo, sendo os crimes todos anteriores a 2014

XV - Consta ainda do relatório social que o arguido, no decurso desta avaliação bem como da anterior, revelou alguma capacidade critica, compreendeu o seu comportamento criminal, revelando respeito pelos bens jurídicos em causa

XVI - Ficando o arguido recolhido num estabelecimento prisional, em cumprimento de pena durante mais tempo, levará a que o mesmo tenha uma maior dificuldade em conseguir uma boa integração e reinserção na sociedade. XVII - Ao proceder ao cúmulo jurídico das penas, haverá que ter em conta a personalidade do arguido e o conjunto dos factos, nos termos do artigo 77º, nº 1, do Código Penal

XVIII - Ora, salvo o devido respeito por melhor opinião, não foi feita a correta aplicação do supra referido artigo 77º, nº 1, do Código Penal, porquanto o Tribunal “a quo” não valorizou adequadamente a personalidade do arguido, limitando-se a atender aos pontos mais negativos da mesma

XIX - Não foram respeitados, na douta decisão recorrida, os princípios da proporcionalidade, da adequação e da proibição do excesso, que deve presidir à fixação da pena conjunta, tornando-se fundamental a necessidade de ponderação entre a gravidade do facto global e a gravidade da pena conjunta

XX - Efetivamente, na medida da pena são considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, o que significa que o cúmulo jurídico das penas não é uma operação aritmética de adição, nem se destina, tão-só, a quantificar a pena conjunta a partir das penas parcelares cominadas

XXI - Assim se entende que deveria o Tribunal “a quo” ter aplicado pena bem mais próxima do seu limite mínimo, ao contrário do fixado

XXII - Pelo exposto, considera assim o arguido que seria suficientemente adequada às finalidades da punição, salvo o devido respeito por melhor opinião, a aplicação em cúmulo jurídico de uma pena única de dois anos e oito meses de prisão, suspensa na sua execução, caso se entenda que do cúmulo efetuado é de excluir a pena aplicada no processo nº 437/09.0GFLLE, e, se assim não se entender, e se inclua no cúmulo ora efetuado essa pena, deverá a pena única ser reduzida a três anos de prisão, suspensa na sua execução

XXIII - A decisão recorrida não é justa de direito, foi violado o disposto nos artigos 40º, 50º, 71º, 77º e 78º do Código Penal

Nestes termos, e nos mais de Direito, que V. Exas. doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, com as legais consequências, devendo o douto Acórdão recorrido ser revogado, e, consequentemente, reduzir-se a pena única aplicada em cúmulo jurídico, conforme supra exposto”

* O Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância apresentou resposta (na qual não formula conclusões), entendendo que deve ser negado provimento ao recurso interposto pelo arguido, devendo, por isso, ser confirmado inteiramente o acórdão recorrido

Neste Tribunal da Relação, o Exmº Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, concluindo que o recurso interposto pelo arguido deve ser julgado procedente no tocante às penas integrantes do cúmulo jurídico, mas improcedente quanto à forma de execução da pena única daí resultante

Cumprido o disposto no artigo 417º, nº 2, do C. P. Penal, não foi apresentada qualquer resposta

Foram colhidos os vistos legais e foi realizada a conferência

II - FUNDAMENTAÇÃO 1 - Delimitação do objeto do recurso

Tendo em conta as conclusões apresentadas pelo arguido (e acima transcritas), as quais delimitam o objeto do recurso e definem os poderes cognitivos deste tribunal ad quem, nos termos do disposto no artigo 412º, nº 1, do C. P. Penal, são três as questões a decidir: 1ª - Indevida exclusão, no cúmulo efetuado, da pena aplicada no Processo nº 437/09.0GFLLE

  1. - Medida concreta da pena única a aplicar (devendo ser aplicada pena próxima do limite mínimo da moldura abstrata do cúmulo jurídico - uma pena única de 2 anos e 8 meses de prisão, caso se entenda que do cúmulo efetuado é de excluir a pena aplicada no processo nº 437/09.0GFLLE, e, no caso contrário, uma pena única de 3 anos de prisão)

  2. - Suspensão da execução da pena única a aplicar

2 - O acórdão recorrido

O acórdão revidendo é do seguinte teor (integral): “I. RELATÓRIO Nos presentes autos procedeu-se à audiência de julgamento, nos termos do disposto no artigo 472º, nº 1 Código de Processo Penal, para realização de cúmulo jurídico das penas aplicadas ao Arguido AFNM, filho de AFSM e de MCSNM, solteiro, nascido em …, natural de …, com domicílio em Rua …, …

  1. FUNDAMENTAÇÃO A. Factos Provados Resultam provados, com relevância para a decisão da causa, os seguintes factos: 1. O Arguido sofreu as seguintes condenações: Processo Crime/s/Data/s Pena/s Data da Decisão Data do Trânsito 86/02.3PBMTS Condução de Veículo em Estado de Embriaguez- em 27.01.2002 60 dias de multa (extinta) 28.01.2002 13.02.2002 4514/99.5TDPRT Condução Sem...

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