Acórdão nº 1262/17.0T8PTG-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Maio de 2021

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução13 de Maio de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Procº 1262/17.0T8PTG-A.E1 Acordam os Juízes da 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora Recorrente: (…) Recorrido: Estado Português *No Tribunal Judicial da Comarca de Portalegre, Juízo Central Cível e Criminal de Portalegre - Juiz 3, na ação declarativa comum proposta por (…) contra o Estado Português e outros, foi proferida a seguinte decisão: - Da incompetência material dos tribunais comuns: Em sede de defesa por exceção o Ministério Público, em representação do Estado Português invocou a incompetência material dos tribunais comuns para julgar a presente ação por entender que se trata de matéria atribuída à jurisdição administrativa e fiscal.

O Autor pronunciou-se relativamente à invocada exceção de incompetência material, como decorre do articulado junto aos atos.

Cumpre apreciar.

De acordo com o disposto no artigo 64.º do Código de Processo Civil, as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional são da competência dos tribunais judiciais. A competência dos tribunais comuns é, pois, supletiva, cabendo a estes conhecer de todas as ações que não sejam atribuídas por lei ou disposição especial a qualquer outro tribunal. Ou seja, a competência em razão da matéria dos tribunais comuns ou judiciais é para as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.

Já aos tribunais administrativos e fiscais é atribuída a competência para dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais, nos termos dos artigos 1.º e 4.º do ETAF.

Estabelece o citado artigo 4.º do ETAF, de forma global quanto aos litígios jurídico-administrativos, que: “1 - Compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objeto: a) Tutela de direitos fundamentais, bem como dos direitos e interesses legalmente protegidos dos particulares diretamente fundados em normas de direito administrativo ou fiscal ou decorrentes de actos jurídicos praticados ao abrigo de disposições de direito administrativo ou fiscal; (…)”.

De acordo com o n.º 2 do mesmo preceito legal “Pertence à jurisdição administrativa e fiscal a competência para dirimir os litígios nos quais devam ser conjuntamente demandadas entidades públicas e particulares entre si ligados por vínculos jurídicos de solidariedade, designadamente por terem concorrido em conjunto para a produção dos mesmos danos ou por terem celebrado entre si contrato de seguro de responsabilidade.” Por sua vez, no artigo 2.º, n.º 2, do CPTA estipula-se que “A todo o direito ou interesse legalmente protegido corresponde a tutela adequada junto dos tribunais administrativos, designadamente para o efeito de obter: a) A anulação ou a declaração de nulidade ou de inexistência de atos administrativos; h) A condenação à adoção ou abstenção de comportamentos, pela Administração Pública ou por particulares; i) A condenação da Administração à adoção das condutas necessárias ao restabelecimento de direitos ou interesses violados, incluindo em situações de via de facto, desprovidas de título que as legitime; k) A condenação à reparação de danos causados por pessoas coletivas e pelos titulares dos seus órgãos ou respetivos trabalhadores em funções públicas;” Deve ainda sublinhar-se que à luz do atual ETAF deixou se fazer-se “(…) a distinção entre questões de direito público e questões de direito privado que vinha do anterior ETAF, aprovado pelo Decreto-lei n.º 129/84, de 27 de Abril, o qual excluía do seu âmbito de aplicação precisamente “questões de direito privado, ainda que qualquer das partes seja pessoa de direito público” (seu artigo 4.º, n.º 1, alínea f). Mas isso não passou para o novo ETAF, virado, como se sabe, para um forte alargamento das competências dos Tribunais Administrativos e Fiscais.” – cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 19/05/2011, processo n.º 198/10.0TBCBT, in www.dgsi.pt.

Ainda assim importa recordar essa distinção.

Atos de gestão pública são os praticados no exercício de uma função pública, para os fins de direito público da pessoa coletiva, regidos pelo direito público, por um conjunto de normas que revestem a pessoa coletiva de poderes de autoridade. O que os caracteriza é serem praticados pelos órgãos ou agentes da Administração, no exercício de um poder público, de uma função pública, sob o domínio do direito público, ainda que não envolvendo o exercício de meios de coerção (Cfr. Vaz Serra, RLJ, ano 110º-315).

No caso em apreço verifica-se que o A. peticiona que o Estado reconheça a nulidade dos contratos de compra e venda dos veículos com as matrículas 85-13-JJ e 17-10-RU, alegadamente celebrados abusivamente em nome do A e que os RR. e, cumulativamente, seja condenada na devolução, ao A., de todas as quantias recebidas, ou que venha a receber, a Autoridade Tributária e Aduaneira, desde 05 de Abril de 2013 e até ao cancelamento definitivo do registo da propriedade, atualmente existente em nome do A., das matrículas dos dois veículos, em causa, e com acréscimo de juros legais, vincendos, sobre todas as importâncias a devolver ao A., desde a data da citação para a presente lide, e até efetivo e integral pagamento em execução de sentença e no cancelamento definitivo do registo da propriedade, atualmente existente em nome do A.. Ou seja, o Autor pretende extrair as consequências legais próprias de uma eventual declaração de nulidade, o que constitui a nosso ver uma tautologia jurídica, na medida em que esse efeito decorre automaticamente da lei e dos efeitos oficiosos dessa eventual nulidade.

Por outro lado e cumulativamente, o Autor pretende que o Estado seja condenado a devolver as quantias referentes a tributos que pagou, sendo que essa discussão assenta necessariamente na apreciação de ato tributário de liquidação e cobrança de imposto praticados pelo Estado abrigo de normas de direito público, destinadas a regular a relação jurídica tributária entre o Estado e os cidadãos.

Por conseguinte, atendendo a todo o exposto e face ao enquadramento jurídico acima feito, entende-se que quanto ao pedido e causa de pedir deduzido contra o Estado a conclusão a extrair é que nesse âmbito a competência para o conhecimento do mérito da causa pertence, não a este tribunal, mas sim ao Tribunal Administrativo e Fiscal, por força do artigo 4.º, n.º 1, alínea a) do ETAF. Termos em que, julgo verificada a exceção de incompetência absoluta, em razão da matéria, e em consequência, nos termos dos artigos 96.º, 98.º, 99.º e 278.º, n.º 1, alínea a), 576.º, 577.º, 578.º do Código de Processo Civil, decido declarar este tribunal absolutamente incompetente, em razão da matéria, para o conhecimento do mérito dessa parte da ação e absolver o Réu Estado Português da instância.

* Não se conformando com o decidido, (…) recorreu do despacho, formulando as seguintes conclusões, que delimitam o objeto do recurso, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, artigos 608.º/2, 609.º, 635.º/4, 639.º e 663.º/2, do CPC: 1ª O ora recorrente, intentou a ação nos autos em epígrafe contra “os RR. (…), (…), Autoridade Tributária e Aduaneira, IMT, Instituto de Mobilidade e dos Transportes IP, Instituto dos Registos e Notariado, Estado Português, Banco (…), SA., Caixa Económica Montepio Geral, (…) – Serviços de Comunicações e Multimédia, S.A., e (…) Portugal – Comunicações Pessoais, conforme os pedidos alegados, na alegação 1ª, deste recurso.

  1. Tais pedidos prendem-se, entre outras situações, com os fatos vertidos nos artigos 1º a 57º da PI, em que o A., sargento da GNR, ora recorrente, invoca o furto e falsificação de documentos, de que foi objeto, usurpando-lhe a...

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