Acórdão nº 342/16.3GBPSR.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelLAURA GOULART MAUR
Data da Resolução27 de Abril de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em audiência, os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora Relatório Por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18/06/2020 foi decidido “1.Declarar inválida a decisão recorrida na parte atinente à não observância do contraditório, imposta pelo número 2 do artigo 82º-A, do Código de Processo Penal, para, oportunamente, no Tribunal de 1ª Instância e se possível pelos mesmos juízes, se proceder ao suprimento do vício apontado, proferindo-se, em sequência, quanto a essa parte, autónoma em relação ao demais, uma nova decisão que, devidamente fundamentada e tendo em conta o que o arguido vier porventura a dizer, ajuíze em conformidade quanto á atribuição às ofendidas dos montantes fixados a título de reparação; 2. Condenar, em cúmulo jurídico, o arguido (...) na pena conjunta de 11 (onze) anos de prisão

Cúmulo jurídico que engloba duas penas de 4 (quatro) e 6 (seis) meses de prisão cada, duas penas de 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de prisão cada, duas penas de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses prisão cada, uma pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão, e uma pena de 2 (dois) anos de prisão; 3. Manter no mais a decisão recorrida.” Remetidos os autos à 1ª instância: -Por despacho proferido em 4 de setembro de 2020, foi determinada a notificação do arguido para “ (…) querendo, em dez dias, exercer o direito do contraditório quanto ao arbitramento de quantia para reparação dos prejuízos sofridos pelas vítimas (art. 82º-A, nº 2, do Código de Processo Penal)”

- Por requerimento com a referencia 1674454, datado de 21-09-2021, o arguido veio requerer que lhe fosse “comunicada a factualidade concernente a eventuais danos e o valor da correspondente indemnização, com a concessão de prazo para se pronunciar e indicar prova,” negando a prática dos factos que lhe são imputados e arrolando testemunhas

-Em 24 de setembro de 2020 foi proferido despacho com o seguinte teor (transcrição): “Requerimento com referência 1674454: O arguido não pode ignorar que foi condenado como autor material de quatro crimes de abuso sexual de menor dependente, agravados, p. e p. pelos arts. 30º, nº 1, 172º, nº 1, e 177º, nº 1, al. a), por referência ao art. 171º, nºs 1, e 2, todos do Código Penal, nas penas de 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão); 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de prisão; 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de prisão; e 5 (cinco) anos e 8 (oito) meses de prisão, respetivamente; como autor material de dois crimes de abuso sexual de menor dependente, agravados, p. e p. pelos arts. 30º, nº 1, 172º, nº 1, e 177º, nº 1, al. a), por referência ao art. 171º, nº 1, todos do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos e 2 (dos) meses de prisão relativamente a cada um deles; como autor material de um crime de coação agravado, p. e p. pelos arts. 154º, nº 1, e 155º, nº 1, al. a), do Código Penal, na pena de 1 (um) ano e 6 (seis) meses de prisão; como autor material de um crime de violação, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 22º, 23, 73º, nº 1, alíneas a), e b), e 164º, nº 1, al. a), do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão, e que, efetuado o cúmulo jurídico das penas parcelares, foi condenado na pena única de 11 (onze anos de prisão, condenação que assenta na factualidade fixada na audiência de julgamento, inteiramente corroborada pelos tribunais superiores

O requerimento ora apresentado ignora, por completo, o que foi decidido pelo Colendo Supremo Tribunal de Justiça

O arguido não pode ignorar que não pode voltar a discutir os factos fixados definitivamente e com base nos quais está condenado

O tribunal em cumprimento do superiormente ordenado fez cumprir o exercício do direito do contraditório relativamente ao arbitramento de reparação às vítimas, nos termos previstos no art. 82º-A, do Código de Processo Penal

O arguido, no exercício do contraditório veio invocar a sua inocência e alegar factos que são exatamente aqueles que invocou oportunamente, que foram objeto de apreciação e decisão, e que não podem mais voltar a ser discutidos

Por isso, não se admite a produção de prova relativamente aos factos agora novamente invocados

A decisão a proferir ao abrigo do sobredito regime legal assentará nos factos provados em audiência, confirmados pelos Tribunais Superiores

Para realização do julgamento, para produção de alegações finais, designo o próximo dia 19 de novembro, às 10H, neste tribunal (e não antes por impossibilidade de agenda)

Notifique.” * Inconformado com esta decisão o arguido interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: 1º Verifica-se o vício de omissão de pronúncia, pois o despacho recorrido nada decide quanto à pretensão aduzida pelo arguido de que lhe fosse comunicada a factualidade concernente a eventuais danos e o valor da correspondente indemnização, com a concessão de prazo para o arguido se pronunciar e indicar prova

  1. O despacho recorrido não determina a convocação do arguido, o que significa o afastamento do direito de ele estar presente e prestar últimas declarações

  2. O despacho recorrido nega a produção de prova indicada pelo arguido, o que se traduz em desrespeito pelo princípio do contraditório no arbitramento de quantia a título de reparação pelos prejuízos sofridos pela vítima

  3. Não se mostram observados os direitos humanos, conforme imposto pelo artigo 6º da respetiva convenção europeia e pelo artigo 10º da competente declaração universal, que integra o direito internacional geral ou comum, vigorando na ordem jurídica portuguesa

  4. O nº 4 do artigo 20º e os nº 1 e 5 do artigo 32º da constituição colidem com as normas ínsitas nos nºs 1 e 2 do artigo 82º-A do CPP

  5. Normas jurídicas violadas: do código de processo penal alínea a) do nº 1 do artigo 61º nºs 1 e 2 do artigo 82º-A nº 5 do artigo 97º artigo 125º artigo 127º artigo 140º alínea a) do artigo 341º nº 1 do artigo 343º nº 1 do artigo 361º nº 2 do artigo 374º alínea c) do nº 1 do artigo 379º da constituição nº 1 do artigo 8º nº 4 do artigo 20º nºs 1 e 5 do artigo 32º da convenção europeia dos direitos humanos artigo 6º da declaração universal dos direitos humanos artigo 10º

  6. O tribunal recorrido deveria ter aplicado o nº 5 do artigo 97º e a alínea c) do nº 1 do artigo 379º do CPP, pronunciando-se fundamentadamente sobre a pretensão de o arguido de que lhe fosse comunicada a factualidade concernente a eventuais danos e o valor da correspondente indemnização, com a concessão de prazo para o arguido se pronunciar e indicar prova

  7. Erradamente o tribunal recorrido interpretou o nº 2 do artigo 82º-A do CPP como não conferindo ao arguido o direito a ver produzida prova e prestar declarações quando deveria ter interpretado a norma no sentido de que a mesma assegura-lhe a produção de prova e a faculdade de prestar declarações

  8. Termos em que deve ser revogado o despacho recorrido, ordenando-se a produção de prova indicada pelo arguido, devendo ele ser convocado para a audiência no decurso da qual lhe será assegurado o direito a últimas declarações. * O Ministério Público respondeu ao recurso interposto pugnando pela respetiva improcedência e formulando as seguintes conclusões: 1.Dos elementos dos autos constata-se que foram respeitados todos os direitos fundamentais do arguido, inexistindo, no douto despacho recorrido, qualquer invalidade por omissão de pronúncia ou por falta de fundamentação

    1. A decisão ora recorrida não violou qualquer norma legal ou constitucional e foi correctamente aplicada face aos elementos constantes dos autos

    2. O despacho ora posto em crise não enferma de qualquer irregularidade, pois é bem explícito quanto aos fundamentos que estiveram na sua base

    3. O tribunal em cumprimento do ordenado pelo STJ fez cumprir o exercício do direito do contraditório relativamente ao arbitramento de reparação às vítimas, nos termos previstos no art. 82º-A, do Código de Processo Penal. 5.O arguido exerceu o seu direito ao contraditório

    4. O arguido foi oportunamente notificado da data designada para julgamento e foi requisitada ao Estabelecimento Prisional a sua comparência em julgamento, tendo, efectivamente comparecido e prestado declarações. Louvando-nos, pois, no bem fundado do douto despacho recorrido somos de parecer que o recurso dele interposto não merece provimento

    V. Ex.as, porém, com superior apreciação e critério, farão, certamente, Justiça. * Após realização da audiência de discussão e julgamento, por Acórdão de 19 de novembro de 2020, o Tribunal decidiu: “Considerando tudo quanto se deixou exposto e no âmbito do quadro legal traçado, acordam os juízes que constituem este tribunal coletivo: A) Arbitrar a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos por (...), a quantia de € 10.000,00 (dez mil euros), e condenar o arguido a pagar-lhe tal valor indemnizatório, nos termos e ao abrigo das disposições conjugadas dos arts. 483º, nº 1, 494º, 496º, nºs 1, e 3, do Código Civil; arts. 1º, alíneas b), e j), 82º-A, do Código de Processo Penal, e art. 16º, nºs 1, e 2, da Lei nº 130/2015, de 4/09; B) Arbitrar a título de indemnização por danos não patrimoniais sofridos por (...), a quantia de € 3.000,00 (três mil euros), e condenar o arguido a pagar- lhe tal valor indemnizatório, nos termos e ao abrigo das disposições conjugadas dos arts. 483º, nº 1, 494º, 496º, nºs 1, e 3, do Código Civil; arts. 1º, alíneas b), e j), 82º-A, do Código de Processo Penal, e art. 16º, nºs 1, e 2, da Lei nº 130/2015, de 4/09.” * Inconformado com esta decisão, o arguido interpôs recurso, extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões: 1º A sentença condena o arguido, mas omite as indicações tendentes à sua identificação

  9. É incorreto dizer que o arguido negou a prática dos factos por que foi condenado, nos exatos termos feitos anteriormente em sede de contestação

  10. O arguido não gozou do “direito de dizer o que entendesse por conveniente em sua defesa”

  11. A sentença não transitou em julgado

  12. Não foi assegurado o contraditório

  13. Para fundamentar a decisão, a...

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