Acórdão nº 695/15.0BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 08 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução08 de Abril de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I – RELATÓRIO O Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, E.P.E., devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, datada de 08/11/2020, que no âmbito da ação administrativa instaurada contra a Secretaria Regional de Saúde da Região Autónoma dos Açores, julgou extinta a instância por desistência do Autor.

* O Autor, ora Recorrente, apresentou recurso contra a decisão recorrida, tendo nas respetivas alegações, formulado as seguintes conclusões, que ora se reproduzem: “I. Por sentença proferida nos presentes autos e notificada em 09/11/2020, foi declarada extinta a instância por desistência; II. Ora, para além, do Autor não ter desistido da instância, a referida sentença enferma, ainda, das nulidades previstas no art. 615.º, n.º 1, al. a), b) e c) do Código de Processo Civil; III. Com efeito, a sentença notificada, para além de não constar de papel timbrado e não estar datada, não se encontra assinada, sendo, por conseguinte, nula, nos termos do art. 615.º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Civil; IV. Acresce que a sentença não especifica os fundamentos (neste caso) de direito que justificam a decisão, limitando-se a Meritíssima Juiz a reproduzir legislação e a remeter para decisões proferidas noutros processos, sem, contudo, reproduzir o seu teor, identificar o litígio ou o Tribunal que as proferiu, para concluir, de forma ambígua, obscura e em clara violação da lei, pela extinção da instância por desistência por interpretação da conduta das partes, consubstanciando as nulidades previstas nas alíneas b) e c) do art. 615.º, n.º 1, do Código de Processo Civil; V. Com efeito, o ora Recorrente intentou a presente acção contra a Secretaria Regional da Saúde dos Açores, em 20/03/2015, peticionando o pagamento de prestações de saúde e fármacos a utentes beneficiários do Serviço Regional de Saúde dos Açores, no valor de € 4.673.746,07 (e não € 4.644.741,86, conforme referido); VI. Porém, ao contrário do referido na sentença, a invocada responsabilidade da Ré pelo pagamento dos cuidados de saúde facturados e peticionados não teve origem em quaisquer termos de responsabilidade, mas antes na qualidade de beneficiários do Serviço Regional de Saúde dos utentes (cfr. art. 5.º, 6.º, 8.º, 10.º, 11.º, 13.º e 18.º a 33.º da petição inicial); VII. Tal responsabilidade financeira, não obstante decorrer do regime legal já em vigor, conforme decidido pelos Tribunais Superiores (cfr. acórdão do Tribunal Central Administrativo, datado de 05/06/2014, proferido no âmbito do processo n.º 10121/13, e acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 03/04/2015 – Proc. n.º 01295/14, e 04/11/2015 – Proc. n.º 0255/15), foi, inclusive, reforçada pelas Leis de Orçamento de Estado de 2013 (art. 149.º, n.º 2, da lei n.º 66-B/2012), 2014 (art. 147.º, n.º 2, da Lei n.º 83-C/2013) e 2015 (art. 150.º, n.º 2, da Lei n.º 82-B/2014); VIII. Acontece, porém, que, em 2016, veio a Lei Orçamento de Estado de 2017 (Lei n.º 7- A/2016, de 30 de Março) consagrar o princípio da reciprocidade, no âmbito da responsabilidade financeira na prestação de cuidados de saúde pelo SNS aos utentes dos SRS das regiões autónomas e a destes para com os utentes do SNS (cfr. art. 111.º), com efeitos a partir da data de entrada em vigor dos diplomas aprovados pelas Assembleias legislativas das Regiões Autónomas que estabelecessem a reciprocidade dos cuidados prestados pelos SRS, ou entidades neles integrados, aos utentes do SNS;; IX. Em 08/04/2016, foi publicado o Decreto Legislativo Regional n.º 7/2016/A, nos termos do qual se determinava que, “no cumprimento do princípio da reciprocidade quanto à gratuitidade da prestação de cuidados de saúde, não são cobrados, pelo SRS, ou entidades nele integradas, aos utentes ou às unidades de saúde do SNS, os cuidados de saúde prestados aos utentes do SNS” (art. 2.º, n.º 1), com efeitos a partir da data da entrada em vigor de legislação nacional que viesse a estabelecer a gratuitidade dos cuidados prestados pelo SNS, ou entidades nele integradas, aos utentes do SRS; X. Tal veio a verificar-se em 16/07/2016, com a entrada em vigor da Lei n.º 20/2016, de 15/07/2016, nos termos da qual se determinava que, “no cumprimento do princípio da reciprocidade quanto à gratuidade da prestação de cuidados de saúde, não são cobrados, pelo SNS, ou entidades nele integradas, aos utentes ou às unidades de saúde dos SRS, os cuidados de saúde prestados aos utentes do SRS” (art. 2.º, n.º 1); XI. Em face da inversão do regime financeiro até então consagrado, determinou o art. 111.º, n.º 4, da LOE 2017, que “as dívidas liquidadas à presente data e derivadas da prestação de cuidados de saúde pelo SNS aos utentes dos SRS, e destes aos utentes do SNS, são regularizadas nos termos a acordar entre o Governo da República e os respectivos Governos Regionais, que, para o efeito, constituirão um grupo de trabalho conjunto”; XII. No seguimento desta solução, consagrou o art. 4.º do Decreto Legislativo Regional n.º 7/2016/A, que “as situações de custos derivados da prestação de cuidados de saúde aos utentes do SRS, que, à data da entrada em vigor do presente decreto legislativo regional, configurem uma situação de dívida perante as entidades integradas no SNS, serão resolvidas por um grupo de trabalho conjunto constituído entre o Governo da República e o Governo Regional dos Açores” (nosso sublinhado); XIII. E, de igual forma, a Lei n.º 20/2016: “as situações de custos derivados da prestação de cuidados de saúde aos utentes do SRS, que, à data da entrada em vigor do presente decreto legislativo regional, configurem uma situação de dívida perante as entidades integradas no SNS, serão resolvidas por um grupo de trabalho conjunto constituído entre o Governo da República e os Governos Regionais dos Açores e da Madeira” (nosso sublinhado); XIV. O referido grupo de trabalho foi formalmente constituído pelo Despacho n.º 9075/2016, de 15 de Julho, “com vista a acordar os devidos termos de acordo a celebrar entre o Governo da República e os respectivos Governos Regionais” (nosso sublinhado), ficando incumbido de apresentar, até ao dia 30 de Outubro de 2016, uma proposta de projecto de acordo de regularização de dívidas; XV. No decurso destas alterações legislativas, o ora Recorrente, notificado para se pronunciar sobre o requerimento de extinção da instância apresentado pelo Réu, requereu, em 19/05/2016, a suspensão da instância até à conclusão dos trabalhos do grupo (na altura ainda) a constituir pelo Governo da República e Governos Regionais; XVI. Por despacho datado de 06/06/2016, foi determinada a suspensão da instância, nos termos do art. 272.º, n.º 1, 2.ª parte do Código de Processo Civil, “por estar em curso o processo de aprovação de legislação com directa repercussão na matéria dos autos e não resultando inequivocamente da legislação actualmente em vigor a extinção da dívida em discussão”, tendo o Autor sido notificado para comunicar ao Tribunal as conclusões do grupo de trabalho logo que delas tivesse conhecimento; XVII. Em 08/06/2017, 23/10/2017, 17/04/2018 e 08/04/2019, foi o Autor notificado para informar o Tribunal da situação em que se encontrava o processo de regularização das dívidas, sendo respondido que ainda não tinha sido comunicada a formalização de acordo; XVIII. Em 30/05/2019, foram as partes notificadas do despacho que ordenava que os autos aguardassem a conclusão dos referidos trabalhos, e para comunicar ao Tribunal o desfecho de tais trabalhos, assim que do mesmo tivessem conhecimento; XIX. Em face do teor deste último despacho, que não determinava qualquer prazo para informar se já havia acordo, antes relegando para o momento em que se tivesse conhecimento do mesmo, nada foi respondido até à presente data, porque nenhum acordo foi ainda formalizado; XX. Aliás, decorridos mais de quatro anos sobre a data limite de apresentação da referida proposta de projecto de acordo, nada foi ainda comunicado ao ora Recorrente; XXI. É neste contexto que a Meritíssima Juiz a quo vem agora, ao arrepio do que foi sendo decidido ao longo destes quatro anos, com base na mesma legislação e sem que tenha havido qualquer facto superveniente que o justifique, considerar, tout court e sem qualquer fundamentação que não a mera reprodução de normas, que ocorreu a desjudicialização do litígio; XXII. Mais, decide ainda extinguir a instância, porque interpreta a conduta das partes como desistência do Autor, aceite pelo Réu; XXIII. Ora, com o devido respeito, para além da inexistente fundamentação, tal decisão é ambígua, obscura e violadora da lei, não só porque inexiste legalmente a figura da desjudicialização de litígio (a lei prevê o compromisso arbitral, podendo-se considerar-se, no limite, a figura de transacção, já que, nesse caso, o litigio é dirimido por acordo e não propriamente pela via judicial, mas excluindo estes casos, não se entende o...

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