Acórdão nº 4093/15.8T9CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 07 de Abril de 2021

Magistrado ResponsávelALCINA DA COSTA RIBEIRO
Data da Resolução07 de Abril de 2021
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em Conferência na 5ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra A. RELATÓRIO I.

Por sentença proferida em 9 de março de 2020, foram condenados: 1.

O arguido AP, em coautoria e na forma consumada, pela prática de um crime de insolvência dolosa agravada, previsto e punido pelo artigo 26º, 227º, nº 1, al. a) e b) e 3 e artigo 229º-A todos do Código Penal, na pena de 300 (trezentos) dias de multa, à taxa diária de € 10 (dez euros), o que perfaz o montante total de € 3000 (três mil euros).

  1. Os arguidos AM, J., F. e V.

    pela prática, cada um, em coautoria e na forma consumada, de um crime de insolvência dolosa, previsto e punido pelo artigo 26º, 227º, nº 1, al. a) e b) e 2 todos do Código Penal, na pena de 250 (duzentos e cinquenta) dias de multa, à taxa diária de € 10 (dez euros), o que perfaz o montante total de € 2500 (dois mil e quinhentos euros).

  2. Mais se decidiu na mesma sentença, julgar o pedido de indemnização civil deduzido por “Massa Insolvente de M – …, Lda.” totalmente improcedente e, em consequência, absolver os demandados civis AP, AM, J., F. e V. do montante peticionado.

    II.

    Inconformados, dela recorrem os arguidos e a demandante cível, formulando as seguintes conclusões: 1. AM, J.

  3. Como questão prévia e ab initio teremos de nos debruçar sobre a decisão de considerar nulo o depoimento da testemunha (…), isto porquanto vieram dois dos arguidos requerer a nulidade do depoimento da testemunha advogado.

  4. Foi entendimento do douto Tribunal a quo, dar provimento ao requerido pelos arguidos, e não só dá por nulo o depoimento da testemunha advogado, como faz inquinar outros depoimentos deste mesmo desvalor, nomeadamente o da testemunha administrativa forense (…).

  5. Importa, contudo, ponderar que em termos processuais a requerida nulidade do depoimento ocorreu antes da testemunha prestar o seu depoimento, sem que o douto Tribunal a quo se tenha pronunciado nesse momento e tendo vindo a pronunciar-se apenas na sentença ora em crise.

  6. A verdade, é que os dois recorrentes, usaram da testemunha como parte da sua estratégia de defesa, mantendo-se a mesma como previamente equacionada, para vir a final, ver declarado nulo o depoimento da testemunha, sem possibilidade de adaptar a sua estratégia processual.

  7. Assim e por apenas se ter declarado a jusante a nulidade do depoimento efectuado a montante, e por, ainda a montante da declaração de nulidade, se terem praticado actos processuais de produção de prova, quando o pedido de declaração de nulidade do mesmo foi também ele a montante, se devem declarar todos os actos processuais posteriores ao depoimento da (…) nulos, por forma da aplicação subsidiária aos autos dos artigos 195.º CPC e seguintes, sob pena se se encontrar violado o melhor disposto no artigo 32.º CRP.

  8. uma outra causa de nulidade da sentença ora em crise, nomeadamente, a valoração negativa do silêncio do arguido.

  9. O Tribunal a quo aprecia de facto negativamente o silêncio do Arguido, estando impedido de o fazer por imperativo legal e comando constitucional.

  10. “A testemunha (…), amigo do arguido (…) desde a faculdade. Este depoimento não se revelou minimamente credível, porque sabe muito e de tudo, mas com base no que o arguido (…) lhe transmitiu, limitando-se a apresentar a versão deste arguido, que, aliás, se remeteu ao silêncio, pelo que nenhum relevo tem.” 9. A valoração negativa do silêncio do arguido fere a Decisão com a nulidade prevista no n.º 3 do art. 126° do Cód. de Processo Penal e consubstancia uma interpretação do n.º 1 do art. 343° do Cód. de Processo Penal que viola o disposto nos n.ºs 1, 2, 5 e 10 da Const. da República Portuguesa.

  11. Ainda por questão prévia temos o reconhecimento da insolvência técnica da sociedade M. Lda, senão antes, pelo menos desde 2012.

  12. Ora, o crime pelo qual os recorrentes se encontram acusados é cada um, em coautoria e na forma consumada, de um crime de insolvência dolosa, previsto e punido pelo artigo 26º, 227º, nº 1, al. a) e b) e 2 todos do Código Penal, que alegadamente é dependência de uma reunião “algures no Verão de 2014”.

  13. Concebendo sem conceder na existência dessa reunião em2014haviamjá decorridos pelo menos dois anos (2012) desde a falência da sociedade M Lda., conforme melhor se encontra corroborado pela testemunha (…), Inspectora Judiciária.

  14. Assim e em bom rigor jurídico, inexiste qualquer bem objectivo à alegada data da pratica dos factos – sempre concebendo sem conceder – que pudesse determinar a imputação do crime aos arguidos ora recorrentes, razão pela qual devem os mesmos ser absolvidos, o que desde já se requer para todos os devidos efeitos legais.

  15. Por outro lado importa considerar que a única pessoa que sempre deteve na sua esfera jurídico o controlo efectivo do acto ou da omissão que possa ser considerado como crime, foi o arguido AP.

  16. “18. O arguido AP foi constituído fiel depositário daquele penhor, com a expressa advertência de que, a partir daquela data, não poderia alienar, modificar, destruir ou desencaminhar aqueles bens.” 16. Na verdade era sobre este arguido em exclusivo que recaia o dever e a imposição legal de não alienar, modificar, destruir ou desencaminhar aqueles bens, como na verdade o único.

  17. Não obstante, entende o Tribunal a quo que os arguidos actuaram da forma descrita em conjugação de esforços e de intentos, na execução de plano que haviam traçado entre eles, com o propósito, concretizado, de lesar os legítimos interesses dos credores da M. Lda., neles se incluindo os trabalhadores, e que estes se vissem impedidos de receber os seus créditos à custa dos respectivos bens daquela sociedade.

  18. Basta, contudo, compulsar os factos dados por provados, a titulo de exemplo, 1, 3, 14, 17, 18, 21, 25, 26, 31, para concluir que apenas um dos arguidos detinha o poder de praticar o facto considerado crime, i e, AP.

  19. O mesmo detinha o controlo da sociedade, 20. O mesmo deixou de organizar a contabilidade, 21. O mesmo deu maquinaria de penhor à Autoridade Tributária e Aduaneira e nunca revelou tal facto, 22. O mesmo foi nomeado fiel depositário dessa mesma maquinaria, 23. Ao contrário do facto dado por assente e provado no n.º 19, não foram os arguidos (todos) que retiraram das instalações da M. Lda. a maquinaria.

  20. Foi o arguido AP que deu ordens nesse sentido, 25. Conforme prova testemunhal vária que existe nos autos e neste recurso supra em alegações melhor se encontra identificada.

  21. Foi este mesmo arguido que transmitiu aos trabalhadores toda e qualquer decisão tomada, 27. Nunca estes trabalhadores tendo ouvido falar dos aqui recorrentes.

  22. Na verdade o nome do arguido AP é recorrente e de uso exaustivo na sentença, 29. O que não acontece com o nome dos recorrentes.

  23. Não se entende assim que actuação entre todos os arguidos se refere o douto Tribunal a quo, 31. Que conjugação de esforços e de intentos e sobretudo, 3 32. Que plano executado previamente gizado.

  24. Como pode em bom rigor jurídico, o douto Tribunal a quo entender que, os arguidos agiram sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal, sem nunca concretizar que actos foram praticados de forma livre, voluntária, consciente e bem sabendo que tal prática era proibida por lei penal pelos arguidos aqui recorrentes.

  25. Não se encontra um único acto imputado ao arguido J. que seja passível de ser considerado crime e, não se encontra um único acto imputado ao arguido AM que seja passível de ser considerado crime.

  26. A contradição é tanta e tamanha como se pode ler: “Ora, se em relação à deslocalização das máquinas da M. Lda. para E., o arguido admite que deu ordens nesse sentido, tendo sido cumprido pelos funcionários da sociedade, durante o mês de agosto de 2014, estando a empresa fechada para férias, já em relação à restante factualidade o arguido tenta imputar tais factos aos restantes arguidos, nomeadamente, ao arguido J.. Diremos nós sem conseguir, desde logo, porque autorizou, como gerente da sociedade, que a M. Lda. ficasse desprovida dos seus bens mais essenciais, ou seja, as máquinas que lhe permitiam produzir e manter a empresa em funcionamento, sem que tenha assegurado alguma contrapartida, nomeadamente, se algo corresse mal nas novas instalações, ou seja, a sua intenção de deslocalização das máquinas era definitiva.” 36. É o próprio douto Tribunal a quo que vem desconsiderar a tese do arguido AP, 37. Que vem concluir que este arguido tenta a todo o custo incriminar o arguido J., mas, segundo o mesmo, referindo-se a essa mesma tentativa: diremos nós sem conseguir, desde logo, porque autorizou, como gerente da sociedade, que a M. Lda. ficasse desprovida dos seus bens mais essenciais, ou seja, as máquinas que lhe permitiam produzir e manter a empresa em funcionamento.

  27. No entanto, vem depois a condenar o arguido que, ao que tudo indica afinal, apenas foi incriminado pelo arguido AP.

  28. Ainda neste seguimento e porquanto importa reter que para que existisse crime, os bens tinham de ter sido dissipados de forma a prejudicar a massa insolvente.

  29. A única forma de prejudicar a massa insolvente, era efectivamente os bens continuarem “dissipados”, i e, os bens continuarem em paradeiro incerto, O QUE NÃO ACONTECEU NOS AUTOS e, em particular, O QUE NÃO ACONTECE COM A VERDADE MATERIAL DOS FACTOS.

  30. Conforme depoimento prestado nos autos por (…), administradora de Insolvência da sociedade M. Lda., que aos autos alegou saber onde estavam as maquinas, mas que estas não lhe interessavam, que a contrario, ela queria era o dinheiro do alegado acordo verbal.

  31. Se no crime em concreto o bem jurídico tutelado pela norma incriminadora é o património dos credores e mediatamente, o correcto funcionamento da economia de mercado, como peça fundamental do sistema socioeconómico, 43. Então resulta claro que a dissipação do património foi decisão de quem conduziu a sua própria sociedade à insolvência, não em 2014, mas na verdade, já em 2012.

  32. E que, ocultando a existência de...

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