Acórdão nº 00308/19.8BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 19 de Março de 2021

Magistrado ResponsávelMaria Fernanda Antunes Apar
Data da Resolução19 de Março de 2021
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na secção de contencioso administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:*RELATÓRIO A., contribuinte fiscal nº (…), com domicilio profissional na Praceta (…), requereu, simultaneamente à propositura de ação administrativa (processo principal), providência cautelar visando, a suspensão da eficácia, e bem assim, a declaração de nulidade ou anulação do ato administrativo de suspensão preventiva do seu exercício de funções, da Autoria da Srª Diretora da Comissão de Disciplina dos Auxiliares da Justiça, datado de 20/11/2017, contra a CAAJ – COMISSÃO PARA O ACOMPANHAMENTO DOS AUXILIARES DA JUSTIÇA, COM SEDE NA RUA (…), pedindo: Termos em que deve a presente providência ser julgada procedente e, em consequência ser suspensa a eficácia do ato em apreço, intimando-se a Ré a não obstar e a provisoriamente permitir que, até á decisão da ação principal, o Autor retome funções como administrador judicial, mais devendo ser notificada para retirar das listas oficiais de administradores, nomeadamente enviadas aos tribunais de cada comarca e disponíveis no portal Citius, toda e qualquer menção de suspensão do Autor do exercício das suas funções, com todas as consequências legais.

Na petição inicial da ação principal, apensa aos presentes autos, com o n.º 307/18.0 BEAVR, o Autor formula o seguinte pedido: “Termos em que, deve a presente ação ser julgada procedente, por provada, e em consequência, ser declarado nulo ou, pelo menos, anulado o ato impugnado, mais devendo ser a R. notificada para retirar das listas oficiais, nomeadamente enviadas aos tribunais de cada comarca e disponíveis no portal Citius, toda e qualquer menção de suspensão do A. do exercício das suas funções, com todas as consequências legais.” Por sentença proferida pelo TAF de Aveiro foi antecipado o juízo sobre a causa principal, julgada a ação parcialmente procedente e anulado o ato impugnado, por violação do disposto no artigo 18.º, n.º 2, do Estatuto dos Administradores Judiciais, aprovado pela Lei n.º 22/2013, de 26 de fevereiro, na redação dada pela Lei n.º 17/2017, de 16/05, e, bem assim, do disposto no artigo 121.º do Código do Procedimento Administrativo.

Desta vêm interpostos recursos por ambas as Partes.

Alegando, o Requerente concluiu: 1. Desde logo, no segmento decisório respeitante à invocada prescrição, e salvo o devido respeito, que é muito, a sentença prolatada padece, entre o mais, de patente erro de julgamento.

  1. Pois, o asseverado na sentença a respeito desta matéria, ou seja, que basta estarmos perante um facto continuado, susceptível de consubstanciar a prática de um crime, para que a prescrição não se verifique, incorre em evidente erro.

  2. De facto, e salvo o devido respeito, não é assim em absoluto - desde logo, porquanto pode efectivamente encontrar-se prescrita uma suposta infracção, mesmo sendo de prática continuada - para tal basta que a sua data de consumação tenha ocorrido há mais de um, cinco ou dez anos, da data da abertura do procedimento disciplinar (consoante o prazo aplicável).

  3. Circunstância esta que é tanto mais relevante no caso concreto, se considerarmos que o recorrente foi destituído das funções de administrador de insolvência (cfr. ponto 7 do probatório), pelo que não se antevê, sequer, qualquer carácter continuado das alegadas infracções.

  4. Depois, sempre o merecido respeito, não podemos deixar de referir que apenas serão aplicáveis às infracções disciplinares os prazos de prescrição dos ilícitos criminais, quando ocorra uma efectiva acusação e condenação do arguido (o que, in casu, não sucedeu!) pelo que, impõe-se concluir que o prazo prescricional da suposta infracção, aplicável in casu, é de um ano - cfr. doutrina citada.

  5. Prazo este que se encontrava já amplamente precludido à data da abertura do procedimento disciplinar, conforme se alegou em sede de requerimento inicial (cfr. arts. 92.° e ss do articulado inicial).

  6. Não existindo, ademais, qualquer prática continuada das supostas infracções, posto que, como se alegou, o recorrente foi destituído das suas funções em 8 de setembro de 2016 (no que concerne ao processo judicial n.° (...)2/14.5TJBR), pelo que, no limite, ocorreu nesta data de 08/09/2016 a consumação de qualquer alegada infracção que estivesse a ser continuadamente praticada - cfr. autos a fls... .

  7. Razões estas pelas quais, logo a este passo, a sentença proferida, neste trecho decisório, padece de erro de julgamento, por afronta, entre o mais, ao disposto nos arts. 17.°, n.° 2 do EAJ, 178.° e 220.°, n.°s 3, 4 e 6 da LG11iP, e art. 18.° do Código Penal.

  8. Mas não só: para além de erróneo, o juízo decisório prolatado a propósito da matéria da prescrição afigura-se amplamente insuficiente e carecido de fundamentação.

  9. É que, pese embora o digno Tribunal a quo tenha alinhado pela tese da Recorrida, de que não se verifica prescrição, porque estamos alegadamente perante factos que podem consubstanciar um ilícito criminal, ademais, de prática continuada, o mesmo não refere, porém, em momento algum, nem que factos são esses, nem por que razão são de prática continuada, nem qual o prazo de prescrição aplicável, nem como é que o mesmo foi contabilizado - sendo, assim, impossível para um destinatário médio como o recorrente, compreender o juízo proferido.

  10. Temos, portanto, que o digno Tribunal a quo enuncia as premissas jurídicas de partida, sem, porém, subsumi-las ao caso concreto (sendo que, como é sabido, qualquer juízo sobre a prescrição não pode naturalmente alhear-se das concretas circunstâncias fácticas que a enformam).

  11. Todavia, como vimos, e salvo o devido respeito, que é muito, o circunstancialismo enunciado não foi ponderado pelo digníssimo Tribunal a quo; ou se o foi, tal não resulta do teor da sentença proferida, ficando-se, assim, sem compreender qual o iter cognitivo percorrido pelo Tribunal para sustentar a inexistência de prescrição.

  12. Portanto, salvo o merecido respeito, verifica-se nulidade, por falta de fundamentação de facto e de direito (cfr. 615.°, n.° 1, al. b) do CPC), ou, ainda que à tort, assim não se entendesse, impõe-se concluir que o julgamento proferido neste segmente decisório padece de erro de julgamento, por afronta, em patente erro de julgamento, ao disposto nos arts. 17.°, n.° 2 do EAJ, 178.° da LGTFP, art. 18.° do Código Penal.

  13. Noutra perspectiva, e a acrescer ao que vimos de expor, temos que o digno Tribunal a quo não se pronunciou quanto aos restantes tipos de prescrição invocados, ou, no mínimo, julgou em erro esta matéria, em afronta ao disposto nos art. 178.°, n.°s 1, 2 e 5 da LGTFP.

  14. Pois, recordemo-nos que em sede de requerimento inicial (arts. 92.° e ss), o recorrente invocou, entre o mais, a prescrição da infração disciplinar, do direito de exercer o poder disciplinar e do procedimento disciplinar, sem que, porém, o Tribunal a quo tenha emitido pronúncia, pelo menos em relação às últimas duas.

  15. Assim, e salvo o devido respeito, ressalta da sentença recorrida uma clara omissão de pronúncia (cfr. art. 615.°, n.° 1, al. d) do CPC, aplicável ex vi do art. 1.° do CPTA), ou, no mínimo, como se disse, sempre deverá entender-se que ocorreu patente erro de julgamento, pois que o Tribunal não distinguiu devidamente as diversas prescrições e caducidades invocadas e, assim, em evidente erro, concluiu pela sua não verificação.

  16. Sendo certo que as prescrições invocadas, consubstanciando vícios autónomos, não prejudicados pelo julgamento da primeira (a da infração), são questões que o julgador tem necessariamente que apreciar, em obediência ao princípio do pedido e nos termos do disposto no art. 95.° do CPTA.

  17. Efetivamente, o julgamento daquelas duas últimas prescrições (do exercício do poder disciplinar e do procedimento) não fica prejudicado pelo facto das alegadas infracções poderem consubstanciar a prática de crime, na óptica do Tribunal a quo.

  18. Estes últimos prazos prescricionais (de 60 dias e de 18 meses) são totalmente autónomos e alheios à natureza ou tipo de infracção (criminal ou não) e prendem-se, fundamentalmente, com razões de celeridade e diligência administrativa na propositura e tramitação do procedimento disciplinar e, bem assim, reflexamente, com a tutela do arguido nesta matéria especialmente lesiva.- cfr. doutrina e jurisprudência citada.

  19. Quando ao invocado vício de falta de assinatura do acto impugnado, o digno Tribunal a quo entendeu que é aplicável in casu, os arts. 29.° e 32.° do CPA, que determinam que existe quórum de funcionamento desde que esteja presente a maioria dos seus membros e, ainda, que as deliberações são tomadas por maioria - fê-lo, porém, na perspectiva do recorrente, e salvo o devido respeito, em erro de julgamento.

  20. Conforme determina o art. 9.°do Regulamento de Organização Interna da CAAJ e o art. 27.°, n.° 5 da Lei n.° 77/2013, de 21 de novembro, a comissão de disciplina é composta por equipas de três colaboradores, o que significa, portanto, (aliás, só pode significar) que o quórum de funcionamento deste órgão é de três elementos e não de dois, como sucedeu - cfr. autos a fls....

  21. De facto, se assim não fosse, se essa não fosse a intenção do legislador, então, como é evidente, jamais se teria consagrado expressamente que as equipas da comissão de disciplina se compõem por três colaboradores - o mencionado art. 9.° deverá pois ser interpretado, racional e teleologicamente, no sentido de que o número de três colaboradores é o número (pelo menos, mínimo) de composição e funcionamento das equipas da comissão de disciplina..

  22. Ademais, de acordo com o art. 10.°, n.° 2 do Regulamento de Organização Interna da CAAJ, "a comissão de disciplina delibera por maioria simples dos votos dos membros presentes", razão acrescida esta pela qual deverá interpretar-se o referido art. 9.° no sentido de que a equipa da comissão de disciplina não poderá funcionar e, assim, tomar decisões, apenas com a presença de dois membros, como sucedeu.

  23. Por outras palavras, se o legislador tivesse...

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