Acórdão nº 768/17.5T9LLE.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 12 de Janeiro de 2021

Magistrado ResponsávelBEATRIZ MARQUES BORGES
Data da Resolução12 de Janeiro de 2021
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, em conferência, na 2ª Subsecção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I. RELATÓRIO 1. Da decisão Na Instrução n.º 768/17.5T9LLE da Comarca de Faro, Juízo de Instrução Criminal de Faro- Juiz 2, foi proferida decisão instrutória de não pronuncia das arguidas (...) e (...).

  1. Do recurso da decisão final 2.1. Das conclusões das assistentes (...) e (...) Inconformadas com a decisão de não pronuncia as assistentes interpuseram recurso extraindo da respetiva motivação as seguintes conclusões (transcrição): “1 – Para efeitos do início de contagem do exercício do direito de queixa por advogada, mandatária constituída em processo de execução, ofendida por ilícito criminal, previsto e punível pelos artigos 180.º, n.º1 e 184.º, ambos do Código Penal, cometido por via de dizeres veiculados em petição de embargos de executado, a data do conhecimento do facto ilícito, é a data em que, nos termos do artigo 248.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (2013), se presume efectuada a notificação ao mandatário, e não a data em que a notificação para este contestar a petição de embargos de executado foi elaborada e colocada em versão final na plataforma Citius.

    2 – Ao abrigo do disposto no artigo 248.º, n.º 1 do CPC (2013), a notificação electrónica ao mandatário constituído considera-se enviada na data da colocação em versão final, e presume-se efectuada àquele no terceiro dia seguinte ao do envio, ou no primeiro dia útil seguinte a este, quando o não seja, pelo que, tendo a notificação sido colocada em versão final em 22 de Fevereiro de 2017, a assistente (…) foi notificada da petição de embargos, e, por isso, teve conhecimento do facto ilícito, em 27 de Fevereiro de 2017.

    3 – Foi em 27 de Fevereiro de 2017 que teve o seu início de contagem o prazo de seis meses para o exercício do direito de queixa desta assistente, mandatária constituída pela exequente, na sequência do conhecimento do facto ilícito, perpetrado por meio da petição de embargos de executado.

    4 – Nos termos dos artigos 349.º e 350.º do Código Civil, a presunção estabelecida no artigo 248.º , n.º 1 do CPC é uma presunção legal, ilidível, ou seja, admite prova em contrário, a invocar e fazer pelo beneficiário da mesma, de modo que a assistente, mandatária constituída, a quem foi dirigida a notificação electrónica para contestar a petição de embargos, apenas teria que alegar, ao deduzir a queixa, factos e prova para ilidir a presunção, em caso de, por motivo que não lhe fosse imputável, à mesma ter tido acesso depois do prazo (legal) presumido, ou seja, após 27 de Fevereiro de 2017.

    5 – Nem as disposições relativas ao regime do exercício e tempo do direito de queixa, vertidas no Código Penal, nem outras, afastam a referida presunção legal, pelo que, tratando-se de ilícito criminal cometido por via de peça processual, inserida em processo de execução pendente, carece de fundamento, até porque onde a lei não distingue, o intérprete não deve distinguir, a conclusão de que tal presunção só vale dentro do referido processo, e que o prazo do exercício do direito de queixa tem início no dia em que a notificação foi “lida”.

    6 – Mesmo que à assistente tivesse sido exigível alegar e provar o necessário a ilidir a presunção do artigo 248.º n.º1 do CPC, tal ilisão, a ser procedente, implicaria sempre a extensão do prazo e nunca a sua redução, ou seja, a presunção legal não admite a alegação e prova, nem mesmo a indagação de ofício, de que o destinatário da notificação teve conhecimento da mesma antes do prazo presumido.

    7 – Desta forma, tendo o conhecimento do facto ilícito ocorrido em 27 de Fevereiro de 2017, e tendo a queixa que originou estes autos sido interposta pela assistente, mandatária constituída no processo de execução, em 25 de Agosto de 2017, a mesma é tempestiva, por feita antes de terminado o prazo de seis meses, o que sucederia em 28 de Agosto de 2017 (27 de Agosto de 2017 foi um Domingo).

    8 – Já no que respeita à assistente (…), advogada ofendida por meio da mesma petição de embargos de executado, a quem não foi feita notificação electrónica, e tendo a respectiva queixa dado entrada igualmente em 25 de Agosto de 2017, há que considerar tempestiva tal interposição, pois só pode ter tido conhecimento da mesma, no mínimo, na mesma data em que a mandatária constituída teve conhecimento da petição de embargos de executado, se não depois, pelo que também não lhe era exigível que alegasse e provasse que a data em que teve conhecimento da ofensa fosse posterior a 27 de Fevereiro de 2017.

    9 – Ao decidir que é a partir da “leitura” da notificação na plataforma Citius que tem início o prazo para exercício do direito de queixa, a decisão instrutória recorrida violou as disposições dos artigos 248.º, n.º 1 do CPC e dos artigos 249.º e 250.º do Código Civil, bem como o n.º 2 do artigo 9.º deste último diploma, razão por que deve ser revogada e substituída por outra que considere as queixas das duas assistentes, ora recorrentes, tempestivas, por interpostas no prazo legal, a contar do conhecimento do ilícito.

    10 – As assistentes declaram manter interesse no (único) recurso que já interpuseram, relativamente à decisão de desentranhamento de documentos por violação de segredo bancário.

    Nestes termos, e nos melhores de Direito aplicável, e sempre com o Mui Douto Suprimento de V. Excelências, deverá o presente recurso ser considerado procedente, e, em consequência, ser revogada a decisão instrutória, considerando-se tempestivas as queixas interpostas pelas duas assistentes, ora recorrentes.” 2.2. Das contra-alegações da arguida (...) Motivou a arguida (...) defendendo o acerto da decisão de não pronúncia, concluindo nos seguintes termos (transcrição): “1. A presente resposta (art. 413º nº 1 do CPP por remição do artigo 411º nº 6 do CPP) da arguida (...) consigna-se nos pressupostos elencados e aludidos no douto despacho do Tribunal recorrido na parte em que considerou não pronunciar as arguidas pela prática do crime de difamação atento a preclusão do prazo para intentar o procedimento criminal.

  2. A arguida (...) pugnou pela caducidade do direito de queixa relativamente ao crime por que se mostra acusada.

  3. Para o efeito referiu, em síntese, que a prática dos factos ocorreu aquando do envio dos e-mails pela arguida (...) às Assistentes, ocorridos ao longo do ano de 2014, sendo que as queixas foram apresentadas em 25/08/2017, ou seja, mais de seis meses após a prática dos factos.

  4. Assim, para que a queixa seja oportunamente apresentada, terá a mesma que ser apresentada no prazo de seis meses após o conhecimento dos factos.

  5. Segundo a arguida (...), as Assistentes tiveram conhecimento do facto em 2014, já que em tal altura lhes haviam sido remetidos e-mails de teor idêntico ao que constava na peça processual constante da acusação.

  6. No caso, a queixa-crime foi motivada por uma peça processual no âmbito do proc. n.º 2412/16.9T8LLE-A – embargos de executado – cuja notificação foi remetida electronicamente em 22/02/2017.

  7. Por seu turno, as respectivas queixas foram apresentadas pelos Assistentes em 25/08/2017 – vd. fls. 1 do apenso B quanto à Assistente (...) e fls. 1 do apenso C relativamente à Assistente (...).

  8. Resulta, por conseguinte, que desde o envio da notificação até à apresentação das queixas decorreram seis meses e três dias.

  9. Embora o art.º 248.º, n.º 1, do Cód. Proc. Civil, preveja uma presunção de notificação de acto processual remetido electronicamente, tal notificação apenas poderá ter efeito ao nível do processo, não servindo como modo de fundamentar a data em que se tomou conhecimento do facto.

  10. De facto, quanto a tal data, impõe-se a efectiva demonstração, pelo ofendido, que o seu conhecimento ocorreu em data posterior à remessa da notificação.

  11. Ora, no que ao presente caso diz respeito, foi solicitado ao proc. n.º 2412/16.9T8LLE-A o envio da concreta data em que a notificação que motivou o presente processo foi lida, resultando que tal leitura ocorreu em 23/02/2017, tendo a notificação sido remetida para a Assistente (...) – cfr. fls. 1233.

  12. Por seu turno, nada consta relativamente à específica data em que a Assistente (...) tomou conhecimento dos factos.

  13. Na verdade, nem a Assistente (...) fez referência a tal data na queixa por si apresentada, nem a mesma resulta da acusação pública, das acusações particulares ou dos requerimentos de abertura de instrução.

  14. Por conseguinte, e uma vez que a análise e interpretação dos factos deve ser sempre realizada tendo em vista o princípio “in dubio pro reo”, forçoso se mostra ao Tribunal ter que levar em consideração, como data de conhecimento dos factos por parte de ambas as Assistentes, o dia 23/02/2017 tendo, por conseguinte, o direito de queixa cessado em 23/08/2017.

  15. Por conseguinte, à data em que a queixa foi apresentada – 25/08/2017 – já o seu exercício era extemporâneo, motivo pelo qual não pode o presente procedimento criminal prosseguir.

    Termos em que se emite a presente resposta no sentido da improcedência do recurso apresentado pelas assistentes com todos os fundamentos alegados, que se reiteram e subscrevem integralmente na parte do despacho recorrido, fazendo assim V. Exas. a acostumada Justiça.” 2.3. Das contra-alegações da arguida (...) Motivou a arguida (...) defendendo o acerto da decisão recorrida, concluindo nos seguintes termos (transcrição): “1 – A notificação feita à assistente (...) que era mandatária nesse processo para contestar os embargos, lida por aquela em 23/02/2017, pelas 11.32, conforme print – folhas 1233 dos autos.

    2 – Ora, a dita assistente tomou conhecimento desse fato em 23/02/2017.

    3 – Ora assim, a partir dessa data iniciou-se o prazo de direito de queixa.

    4 – Que finalizou em 23/08/2017.

    5 – Tal como foi entendido pelo Meritíssimo Juiz a quo.

    6 – Ora, as assistentes apresentam queixa em 25/08/2017.

    7 – Ora ao fazerem-no nessa data, tal prazo já se encontrava expirado.

    8 – Vindo o Meritíssimo Juiz a quo, a julgar por despacho improcedente o...

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