Acórdão nº 8/19.2PFCBR-A.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 09 de Dezembro de 2020
Magistrado Responsável | LU |
Data da Resolução | 09 de Dezembro de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam em conferência na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra No âmbito do processo acima identificado, o arguido SC apresentou o seguinte requerimento: “1. O Arguido foi condenado na pena de 64 dias de multa (descontado 1 dia aos 65 dias da condenação) à taxa diária de € 5,50 pela prática do crime de condução sob o efeito do álcool.
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O Arguido não tem antecedentes criminais sobre o mesmo tipo legal de crime.
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O crime em que foi condenado - e de cuja prática se mostrou desde logo arrependido - foi um ato isolado numa vida conforme o direito.
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Por outro lado, o Arguido é pessoa que se encontra neste momento absolutamente integrado do ponto de vista familiar, social e profissional, conforme resulta dos presentes autos.
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Assim, não se pode induzir perigo de prática de novos crimes, pelo que requer a não transcrição da sentença nos certificados do registo criminal, nos termos do art. 13º da Lei n.º 37/2015, de 05 de Maio.
Nestes termos e nos demais de direito requer a V. Exa. se digne ordenar a não transcrição da sentença aplicada nos certificados de registo criminal” O Ministério Público nada disse.
Na sequência, o tribunal “a quo” proferiu o seguinte despacho: “(…) Veio ainda o arguido SC requerer a não transcrição da sentença condenatória no registo criminal, nos termos dos artº. 13º, nº 1 e 10º, nºs 5 e 6, da Lei de Identificação Criminal, de modo a não prejudicar o mesmo a título profissional.
A não transcrição da condenação para o registo criminal está abstractamente prevista na Lei n.º 37/2015,de 5 de maio, e depende da verificação cumulativa de três requisitos: - primeiro, a condenação em pena de prisão até um ano ou em pena não privativa de liberdade; - segundo, o arguido não tiver sofrido condenação anterior por crime da mesma natureza.
- terceiro, sempre que das circunstâncias que acompanharam o crime não se puder induzir perigo de prática de novos crimes.
O primeiro requisito encontra-se preenchido, uma vez que o arguido foi condenada na pena concreta de 65 dias de multa.
O segundo requisito também, uma vez que não consta que o arguido tivesse sofrido condenação anterior por crime da mesma natureza.
Quanto ao último, do mesmo resulta, sem margem para dúvidas, atenta a sua formulação negativa, que a não transcrição é excepcional. Isto para dizer que, em regra, a prática de uma infracção tem como efeito reflexo o perigo de prática de outras infracções no futuro. Perante este perigo, surgem compreensíveis exigências de defesa da própria comunidade, que justificam a transcrição do registo criminal. Pelo que, a não transcrição há-de ser imposta por circunstâncias que excluam esse perigo, perante as quais não se verifiquem as referidas exigências.
Ora, in casu, ponderando que o arguido não tem antecedentes criminais sobre o mesmo tipo legal de crime, mostrou contrição, e se encontra bem inserido na sociedade (bem integrado do ponto de vista familiar e profissional) tudo parece indicar que, sendo este o primeiro contacto com o sistema judicial, ter-se-á tratado de um acto isolado, sem repercussões no futuro, e assim, alicerçar um juízo de prognose favorável no que concerne ao não cometimento de crimes idênticos.
Assim sendo, afigura-se ao tribunal, que de futuro, face às condições pessoais, sociais, familiares e profissionais do condenado, bem como às circunstâncias que rodearam o caso em apreço, será de conceder uma oportunidade ao mesmo para conformar a sua conduta com o direito, e assim não vir a cometer mais ilícitos.
Ademais, caso tal não suceda, o n.º 3, do art. 13º da Lei nº 37/2015, de 5 de maio impõe a revogação do cancelamento da transcrição, o que permite condicionar a não transcrição, ao comportamento do arguido.
Nestes termos, preenchidos os requisitos previstos no artigo 13º nº1 da Lei nº 37/2015, de 5 de maio determino a não transcrição para o certificado de registo criminal do condenado SC da presente decisão, nos certificados a que se refere o nº5 e 6, do artigos 10º do citado diploma legal.
Notifique.” Inconformado com o decidido, o Ministério Público recorreu. Apresentou as seguintes conclusões: “1. Por sentença datada de 04/11/2019 e transitada em julgado em 04/12/2019, foi o arguido SC condenado pela prática, como autor material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos artigos 292.º, n.º 1, e 69.º, n.º 1, alínea a), ambos do Código Penal, na pena de 64 (sessenta e quatro) dias de multa, à razão diária de € 5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), perfazendo o montante global de € 352,00 (trezentos e cinquenta e dois euros), bem assim na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, de qualquer categoria, pelo período de 3 (três) meses e 15 (quinze) dias.
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Por requerimento apresentado na mesma data da prolação da sentença, veio o arguido solicitar a não transcrição daquela decisão no certificado de registo criminal.
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Por ter entendido estarem preenchidos os requisitos de que o n.º 1, do artigo 13.º, da Lei n.º 37/2015, de 5 de maio, faz depender a não transcrição da sentença nos certificados, decidiu o tribunal a quo no sentido da não transcrição requerida.
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Muito embora estivessem de facto preenchidos os requisitos previstos no n.º 1, do citado artigo 13.º, considerando que o arguido foi condenado na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor e atento o disposto no n.º 2, do mesmo artigo, a decisão de não transcrição da sentença no certificado sob cogitação não deveria ter sido proferida previamente ao terminus do prazo para cumprimento da pena acessória em que o requerente foi condenado.
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Mal se compreenderia que o condenado pudesse beneficiar de uma não transcrição da sua condenação em certificado criminal para os fins previstos nos n.ºs 5 e 6 do artigo 10.º da Lei n.º 37/2015, de 5 de maio, antes mesmo de cumprir a pena acessória, podendo ocorrer que acabasse por incumprir a referida pena, tendo, no entanto, beneficiado previamente da oportunidade concedida com a aludida não transcrição.
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«(…) enquanto vigorar a interdição ela deverá constar do respectivo registo criminal para poder ser controlado o seu cumprimento pelo condenado, pois que se trata do controlo de uma conduta perspectivada para o futuro e não para o passado».
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A «interdição» mencionada no n.º 2, do artigo 13.º, da Lei n.º 37/2015, de 5 de maio, abrange qualquer interdição condenatória, aqui se incluindo qualquer pena acessória de proibição / inibição; conclusão que sai ainda reforçada se tivermos em conta a opção do legislador em fazer constar do normativo legal a locução «qualquer interdição» (negrito nosso), parecendo querer nela incluir qualquer proibição.
O despacho ora colocado em crise violou o disposto no n.º 2, do artigo 13.º, da Lei n.º 37/2015, de 5 de maio.
Termos em que, entende o Ministério Público, dever ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o despacho recorrido.” O arguido respondeu, tendo apresentado as seguintes conclusões: “1. O presente recurso vem interposto do despacho da Meritíssima Juiz a quo proferido nos autos à margem identificados, datado de 15/01/2020, no segmento em que se pronunciou favoravelmente sobre o requerimento de não transcrição, no registo criminal, da sentença condenatória sofrida pelo Arguido SC .
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De facto, por sentença datada de 04/11/2019 e transitada em julgado em 04/12/2019, o Arguido SC foi condenado, pela prática, como autor material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, p. e p. pelos arts. 292º, nº 1 e 69º, nº 1, al. a), ambos do CP, na pena de 64 dias de multa à razão diária de € 5,50, perfazendo o montante global de € 352,00, bem como na pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor, de qualquer categoria, pelo período de 3 meses e 15 dias.
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Por requerimento apresentado pelo Arguido, o Tribunal entendeu estarem verificados todos os pressupostos e requisitos do art. 13º da Lei nº 37/2015, de 5 de Maio, tendo proferido despacho favorável à não transcrição no registo criminal da sentença condenatória, no dia 15/01/2020.
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O Recorrente não pode concordar com a posição assumida pelo Ministério Público, nem quanto ao conteúdo nem quanto às conclusões.
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Salvo o devido respeito, que é muito, o Ministério Público assenta as suas conclusões na aplicação de sanção acessória de inibição de conduzir e a necessidade de aguardar pelo fim do cumprimento desta pena acessória.
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Posto isto, dúvidas não restam que se encontram verificados todos os pressupostos do art. 13º da Lei nº 37/2015, de 5 de Maio, ou seja, o Arguido não foi condenado pelos crimes previstos no art. 152º, no art. 152º-A e no capítulo V, do título I, do livro II do CP; o Arguido ter sido condenado em pena não privativa da liberdade; não ter o Arguido sofrido condenação anterior por crime da mesma natureza; das circunstâncias que acompanham o crime, não possa induzir-se o perigo de...
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