Acórdão nº 622/08.1TVPRT.P2.S1-A de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelFERREIRA LOPES
Data da Resolução12 de Novembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam em conferência no Supremo Tribunal de Justiça Durst Phototechnick, A.G.

e Durst Phototechnick Digital Technology, Gmbh, Recorrentes nos autos à margem identificados, vieram, por apenso aos presentes autos, interpor recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência para o Pleno das Secções Cíveis, nos termos dos arts. 688º e ss do Cód. Proc. Civil, com o fundamento de, no domínio da mesma legislação e sobre as mesmas questões fundamentais de direito (a ressarcibilidade do interesse contratual positivo em caso de resolução do contrato e a competência para decidir a admissibilidade de recurso de revista com base em contradição de julgados) o Acórdão recorrido estar em oposição com os Acórdãos do STJ de 8.9.2016, Proc. 21769/10.9T2SNT.L1.S1 e de 7.5.14, Proc. nº 225/08.0TBNLS-C1.S1, respectivamente, já transitados em julgado.

As Recorrentes pedem a final a revogação do acórdão recorrido, uniformizando-se a jurisprudência no sentido dos acórdãos-fundamento supra identificados, a saber: a. Quanto à questão da ressarcibilidade do interesse contratual positivo, optando o contraente fiel pela resolução da relação contratual, não pode vir peticionar, como indemnização devida, os ganhos/lucros cessantes que auferiria se o contrato tivesse sido pontualmente cumprido; b. Quanto à competência para decidir a admissibilidade de recurso de revista com base em contradição de julgados, sendo um caso de revista normal, por a oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento constituir um fundamento de recorribilidade absoluta, é ao Mmo. Conselheiro Relator a quem o processo foi distribuído que compete decidir sobre a admissibilidade da revista, cabendo-lhe apreciar se se verificavam, quer os requisitos gerais de admissibilidade da revista, quer o requisito especial da contradição de julgado.

Contra alegou a Recorrida pugnando pelo indeferimento do recurso, defendendo basicamente não se verificarem os requisitos de que depende a prolação de um acórdão de uniformização de jurisprudência, por a questão essencial de direito nos acórdãos recorrido e fundamento serem diferentes. Pelo relator foi proferido o seguinte despacho liminar (art. 692º, nº1, do CPC): “O presente recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência interposto nos termos dos arts. 688º e ss do CPCivil, do acórdão proferido nos autos em 11.04.2019, tem como fundamento alegada contradição de julgados sobre duas questões fundamentais de direito, a saber: - a ressarcibilidade do interesse contratual positivo em caso de resolução do contrato, e - a competência para decidir a admissibilidade do recurso de revista com base em contradição de julgados.

Quanto ao primeiro fundamento, dizem os Recorrentes que o acórdão de 11.04.2019 admitiu a ressarcibilidade do interesse contratual positivo, está em contradição com o Acórdão deste Tribunal de 08.09.2016, proferido no P.21769/10.9T2SNT.L1.S1, que não a admitiu.

Resulta do nº1 do art. 688º do CPC que são três as condições ou requisitos indispensáveis para a interposição do recurso para uniformização de jurisprudência: - Que haja oposição entre acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça sobre a mesma questão de direito; - Que a oposição se verifique no domínio da mesma legislação; - Que tenham transitado em julgado quer o acórdão anterior invocado como fundamento do recurso quer o acórdão recorrido (mº1 do art. 689º).

É o primeiro requisito que importa apreciar, uma vez que não sofre dúvidas que se verificam os demais, e as recorrentes juntaram aos autos cópia do acórdão fundamento, como exigido pelo nº1 do art. 692º.

A mesma questão fundamental de direito, diz-nos Amâncio Ferreira, in Manual de Recursos em Processo Civil, 8ª edição, pag. 116, “deve considerar-se verificada quando o núcleo da situação de facto, à luz da norma aplicável, seja idêntico. (…) os elementos de facto relevantes para a ratio da regra jurídica devem ser coincidentes num e noutro caso, pouco importando que sejam diferentes os elementos acessórios da relação.

Do que resulta que o conflito jurisprudencial se verifica quando os mesmos preceitos são interpretados e aplicados diversamente a factos idênticos.” Este Tribunal por várias vezes foi chamado a pronunciar-se sobre este requisito, nomeadamente no Acórdão de 02.10.2014, relatado pelo Conselheiro Lopes do Rego, (CJ AcSTJ, 2014, 3º, pag. 45), assim sumariado: I - Para que exista um conflito jurisprudencial, susceptível de ser dirimido através de recurso extraordinário, é indispensável que as soluções jurídicas acolhidas no acórdão fundamento, assentem na mesma base normativa, e correspondem a soluções divergentes da mesma questão fundamental de direito.

II – Verificam-se soluções divergentes da mesma questão fundamental de direito quando as soluções alegadamente em conflito: a) Correspondem a interpretações divergentes de um mesmo regime normativo, situando-se ou movendo-se no mesmo instituto ou figura jurídica fundamental; b) Têm na sua base situações materiais litigiosas que, de um ponto de vista jurídico-normativo sejam análogas ou equiparáveis, pressupondo o conflito jurisprudencial uma verdadeira identidade substancial do núcleo essencial da matéria litigiosa subjacente a cada uma das decisões em confronto; c) A questão fundamental de direito em que assenta a alegada divergência assuma um carácter essencial para a solução do caso, ou seja, que integre uma verdadeira ratio decidendi dos acórdãos em confronto, não relevando os casos em que se traduza em mero obiter dictum ou num simples argumento lateral ou coadjuvante de uma solução já alcançada por outra via jurídica.

Cumpre ainda referir que o requisito de contradição jurisprudencial deve ser apreciado com rigor, de forma a obstar a um uso abusivo de um recurso que é de natureza extraordinária (cf. Abrantes Geraldes, Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª edição, pag. 471, e jurisprudência aí citada).

Daí que só deva concluir-se pela existência de oposição de julgados quando as situações de facto e o respectivo enquadramento jurídico, em ambas as situações, sejam idênticas, ou pelo menos, semelhantes no seu núcleo essencial (cf. Acórdãos do STJ de 08.02.2011, P. 153/04 e de 26.03.2015, P. 424/2001, entre muitos outros).

Tendo presente estes princípios, afigura-se-nos que não se verifica a invocada divergência sobre a mesma questão fundamental de direito, por serem distintas as situações materiais litigiosas subjacentes aos acórdão em confronto.

No acórdão recorrido estava em causa um contrato de concessão comercial; no acórdão fundamento um contrato de locação de loja em centro comercial.

No primeiro caso, foi reconhecido à autora/recorrida (concessionária) o direito de resolver o contrato por incumprimento das rés (concedentes), tendo estas sido condenadas numa indemnização a favor daquela a título de lucros cessantes, “correspondente aos lucros que a recorrida teria auferido se aqueles comportamentos não tivessem tido lugar, (arts. 562º, 563º, nºs 1 e 2 do art. 566º do Cód. Civil)).

Considerou o acórdão, relatado pelo Conselheiro António Joaquim Piçarra, que o traço distintivo do contrato de concessão comercial é “a integração do concessionário na rede do concedente, o que se concretiza através de regras de comportamento pelas quais se estabelecem laços de cooperação entre as partes e se articula e...

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