Acórdão nº 0547/15.4BEMDL de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 18 de Novembro de 2020

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução18 de Novembro de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.- Relatório Notificado, o Representante da Fazenda Pública no processo à margem identificado, da decisão sumária [de 02 de Julho de 2020] no mesmo proferido, vem, do mesmo – nos termos do n.º 3 do art.º 652.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável, ex vi da al. e) do art.º 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) –, reclamar para a conferência, requerendo, assim, que sobre a matéria da decisão sumária aqui posta em crise seja proferido acórdão, com os seguintes fundamentos: “I. DOS FACTOS 1.

O Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Mirandela decidiu indeferir a reclamação da nota discriminativa e justificativa de custas de parte, apresentada pela Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) ao abrigo do disposto no art.º 33.º n.º 1 da Portaria n.º 419-A/2009, de 17 de abril.

  1. O Exmo. Sr. Relator deste processo, remetendo para o Acórdão proferido em 20 de abril de 2020 no processo n.º 0415/17.5BEMDL do Supremo Tribunal Administrativo (STA), decidiu negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

  2. Não se conformando com o decidido nesta decisão sumária, a AT interpõe a presente reclamação para a conferência, requerendo, assim, que sobre a matéria da decisão sumária aqui posta em crise seja proferido acórdão.

    1. DO DIREITO 4.

    Apresenta, a FP contra a decisão sumária de 02 de julho de 2020 a presente reclamação, porquanto, entende, que a decisão sumária que nega provimento ao recurso e confirma a sentença recorrida, conduz a consequências jurídicas que são intoleráveis à luz dos princípios que enformam o sistema jurídico vigente.

  3. Ou seja, como diz FERNANDO AMÂNCIO FERREIRA, «[s]empre que a parte se considere prejudicada por qualquer decisão do relator, quer seja a que julgue sumariamente o recurso, nos termos previstos no art. 705.º [atual art.º 656.º], quer seja a que julgue extinta a instância por causa diversa do julgamento, quer seja qualquer outra proferida no decurso da preparação do processo, pode requerer, no prazo de 10 dias que sobre o despacho recaia um acórdão (art. 700.º, n.º 3) [atual art.º 652.º, n.º 3]» (Manual dos Recursos em Processo Civil, 9.ª edição, Almedina, pág. 106).

  4. A questão que aqui se coloca, é a de saber se se impõe à Reclamante a documentação dos honorários pagos ao Mandatário aquando da apresentação da nota discriminativa de custas de parte.

  5. Entende, a ora Reclamante (e, também, a jurisprudência consolidada, inclusive do STA), que o pagamento à parte vencedora do montante determinado nos termos da alínea c) do n.º 3 do art.º 26.º do Regulamento das Custas Processuais, para compensação das despesas incorridas com honorários do Mandatário judicial, está condicionada à comprovação do valor dos honorários efetivamente suportados.

  6. De facto, os valores indicados na nota discriminativa e justificativa de custas de parte relativos à compensação das despesas com honorários do Mandatário judicial, devem, sempre, mostrar-se devidamente comprovados, o que, in casu, não aconteceu.

  7. Impossibilitando, dessa forma, à AT, determinar se as despesas incorridas pela parte vencedora a título de honorários do Mandatário judicial, foram superiores, iguais ou inferiores ao valor que resulta da fórmula de cálculo da compensação, prevista no art.º 26 n.º 3 al. c) do RCP.

  8. Aliás, não faria qualquer sentido não se exigir comprovação quando as quantias - supostamente despendidas - são superiores a 50%, porquanto, a não se exigir essa comprovação, inexistiria qualquer controle de legalidade da nota discriminativa de custas.

  9. Diga-se, ainda, que a posição adotada pela decisão sumária ora em crise não está consolidada (inclusive, o acórdão que serviu de fundamentação a esta decisão sumária foi objeto de recurso para uniformização de jurisprudência), pelo que, caso a mesma fosse colegial, existiria fundamento para, ao abrigo do disposto no art.º 284.º do CPPT, interpor de recurso para uniformização de jurisprudência.

  10. Assim sendo, deve a presente decisão sumária ser revogada e, consequentemente, sobre a matéria aqui posta em crise ser proferido acórdão.

    Termos pelos quais se requer que seja deferida a presente reclamação e, consequentemente, seja revogada a decisão sumária (de 02 de julho de 2020) da Exma. Sra. Juiz Conselheira Relatora, devendo, a mesma, ser substituída por acórdão que julgue a reclamação procedente.” Satisfeitos os vistos legais, cumpre, pois, aquilatar se assiste razão à reclamante.

    * 2.

    O Relator deste processo, por decisão singular proferida em 2 de Julho de 2020, decidiu negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida.

    Irresignada com tal decisão a AT e Reclamante, veio reclamar para a conferência da decisão singular do relator.

    Vejamos.

    O regime da decisão singular de mérito apenas proferida pelo Relator foi introduzido pelo DL 329-A/95, podendo a parte afectada pela decisão reclamar desta para a conferência conforme disposições conjugadas dos art°s. 705° e 700° n° 3 CPC, hoje, art°s. 656° ex vi 652° n° 1 c) e n° 3 CPC da revisão de 2013.

    Deduzida reclamação para a conferência o colectivo de juízes reaprecia as questões que foram objecto da decisão singular do Relator e, nesse sentido, caso se esteja perante a decisão sumária do recurso, reaprecia novamente o recurso, naturalmente sem qualquer vinculação ao anteriormente decidido.

    No entanto, se assim é, ou seja, se normalmente a intervenção da conferência, no caso em que se reclama de uma decisão sumária, faz retroagir o conhecimento do mérito da apelação ao momento anterior àquela decisão, importa ter presente que, nos termos gerais, no recurso ou na reclamação, o Recorrente ou o Reclamante podem restringir o seu objecto, isto é, o requerimento para a conferência (mesmo resultante de convolação do requerimento de interposição de recurso de revista) pode restringir o objecto próprio da reclamação, concretamente identificando a parte da decisão sumária de que discorda (da qual se sente prejudicado).

    No que respeita à possibilidade de, em sede de reclamação da decisão singular do Relator, pode o Recorrente restringir o objecto do recurso, identificando os segmentos decisórios sobre os quais demonstra o seu inconformismo. Trata-se, na prática, de uma solução que se encaixa na possibilidade de desistência do recurso, nos termos que constam do art° 632° n° 5, com a especificidade de a extinção da instância ser, aqui, parcial- Cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos no novo Código de Processo Civil, Almedina/2013, pág. 85.

    O que implica precisar o pressuposto legal de delimitação do âmbito da pretensão recursória e das hipóteses legais de modificação.

    A delimitação objectiva do recurso é dada pelas conclusões, cfr. art°s. 635° n° 4, 637° n° 2 e 639° n°s 1 e 2 CPC, na medida em que "(..) A motivação do recurso é de geometria variável, dependendo tanto do teor da decisão recorrida como do objectivo procurado pelo recorrente, devendo este tomar em consideração a necessidade de aí sustentar os efeitos jurídicos que proclamara, de forma sintética, nas conclusões. (...) Mas, independentemente do âmbito definido pelo recorrente no requerimento de interposição, é legítimo restringir o objecto do recurso nas alegações, ou, mais correctamente, nas respectivas conclusões, indicando qual a decisão (ou parte da decisão) visada pela impugnação.

    (...) A restrição pode ser tácita em resultado da falta de correspondência entre a motivação e as alegações, isto é, quando, apesar da maior amplitude decorrente do requerimento de interposição de recurso, o recorrente restrinja o seu âmbito através das questões que identifica nas conclusões. (..)", cfr. art° 635° n° 4 CPC. (cfr. Abrantes Geraldes, in Recursos no novo Código de Processo Civil, págs. 115, 84/85).

    No tocante à ampliação do objecto do recurso, o art° 636° n°1 CPC permite que, embora a decisão seja favorável à parte e a parte vencida interponha recurso, caso no Tribunal a quo não tenha acolhido todos ou alguns dos fundamentos da acção (de facto ou de direito) suscitados pela parte vencedora, essas questões serão reapreciadas pelo Tribunal ad quem a requerimento do Recorrido em alegações complementares, isto é, o Tribunal de recurso reapreciará os fundamentos do segmento da sentença recorrida em que aparte vencedora tenha decaído.

    Do complexo normativo citado se conclui que o acto processual de convocação da conferência no regime do art° 652° n° 1 c) e n° 3 ex vi 656° CPC não é configurado como meio adjectivo próprio para alterar as conclusões de recurso, ressalvada a hipótese já mencionada de limitação do objecto (art° 635°/4 CPC), nem para desistir do recurso (art° 632° 5 CPC), posto que "(...) a...

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