Acórdão nº 187/20.6TXCBR-B.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 28 de Outubro de 2020
Magistrado Responsável | ALCINA DA COSTA RIBEIRO |
Data da Resolução | 28 de Outubro de 2020 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam em conferência os juízes na 5.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO 1.
Em 12 de Maio de 2020, foi perdoada a pena de dois anos de prisão aplicada ao condenado D.
, no âmbito do processo nº 2089/10.5PCCBR, por sentença transitada em julgado em 14 de fevereiro de 2014, ao abrigo do disposto no artigo 2º, da Lei nº 9/2020, de 10 de abril.
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Inconformado, recorre o Ministério Público, extraindo da respectiva motivação as conclusões que a seguir se transcrevem: 1ª - O perdão previsto no artigo 2º da Lei n.º 9/2020, de 10 de abril, só pode ser aplicado a reclusos, condenados por sentença transitada em julgado em data anterior à da sua entrada em vigor, excluindo os condenados que não tenham ainda ingressado fisicamente no estabelecimento prisional; 2ª - O artigo 7º, n.º 1, da Lei n.º 1- A/2020, de 19 de março, de 6 de abril, suspendeu todos os prazos para a prática de actos processuais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, até à cessação da situação excecional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19; 3ª - Pelo que, enquanto durar a situação excepcional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infeção epidemiológica por SARS-Co V - 2 e da doença COVID¬19, está suspensa toda a tramitação processual tendente à emissão e execução de mandados de captura na sequência de condenação transitada em julgado; 4ª - Desta forma se evitará que, durante esse mesmo período, ingressem no estabelecimento prisional novos reclusos, e assim se logrará garantir que não seja ocupado o espaço prisional deixado livre pela libertação dos reclusos abrangidos pelo perdão; 5ª - Restringir a aplicação do perdão previsto na Lei n.º 9/2020 aos condenados que se encontram já recluídos à data da entrada em vigor daquela mesma lei, excluindo os condenados ainda não recluídos, não viola o princípio da igualdade plasmado no art. 13.º da Constituição da República Portuguesa; 6ª - Ao perdoar a pena de prisão aplicada ao arguido D.
no âmbito do Processo n" 2089/1O.5PCCBR, não estando este preso à data da entrada em vigor da Lei nº 9/2020, o tribunal proferiu decisão ilegal, por violação no disposto no art. 2º, nº 1, desse mesmo diploma legal.
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Nesta Relação, o Digno Procurador – Geral Adjunto, secundando os argumentos aduzidos em primeira instância pelo Ministério Público, pronunciou-se no sentido da procedência do recurso.
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Cumprido o disposto no artigo 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, realizado o exame preliminar e colhidos os vistos, cumpre, agora, decidir.
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A DECISÃO RECORRIDA D.
foi condenado, por decisão proferida em 02/11/2011, no âmbito do processo n? 2089/1 0.5PCCBR, já transitada em julgado, na pena de 2 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, pela prática de crimes de roubo, simples e roubo tentado.
Por decisão proferida em 13/12/2013, transitada em julgado em 14/02/2014, foi revogada a suspensão da execução da pena de prisão, determinando-se o cumprimento de 2 anos de prisão.
O condenado ainda não iniciou o cumprimento da aludida pena.
Do exame do respectivo CRC resulta que o condenado não tem qualquer outra pena de prisão para cumprir.
Em 11 de Abril de 2020 entrou em vigor a L 9/2020, de 10 de abril, que no art. 2° estatui que "1 - São perdoadas as penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração igualou inferior a dois anos. /2 - São também perdoados os períodos remanescentes das penas de prisão de reclusos condenados por decisão transitada em julgado, de duração superior à referida no número anterior, se o tempo que faltar para o seu cumprimento integral for igualou inferior a dois anos, e o recluso tiver cumprido, pelo menos, metade da pena. /3 - O perdão referido nos números anteriores abrange a prisão subsidiária resultante da conversão da pena de multa e a execução da pena de prisão por não cumprimento da pena de multa de substituição e, em caso de cúmulo jurídico, incide sobre a pena. /4- Em caso de condenação do mesmo recluso em penas sucessivas sem que haja cúmulo jurídico, o perdão incide apenas sobre o remanescente do somatório dessas penas, se o tempo que faltar para o seu cumprimento integral for igualou inferior a dois anos./5 - Relativamente a condenações em penas de substituição, o perdão a que se refere este artigo só deve ser aplicado se houver lugar à revogação ou suspensão./6 - Ainda que também tenham sido condenados pela prática de outros crimes, não podem ser beneficiários do perdão referido nos n.ºs 1 e 2 os condenados pela prática: a) Do crime de homicídio previsto nos artigos 131.°, 132.° e 133.° do Código Penal, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 48/95, de 15 de março, na sua redação atual; b) Do crime de violência doméstica e de maus tratos previstos, respetivamente, nos artigos 152.° e 152.0-A do Código Penal; c) De crimes contra a liberdade pessoal, previstos no capítulo IV do título I do livro II do Código Penal; d) De crimes contra a liberdade sexual e autodeterminação sexual, previstos no capítulo V do título I do livro II do Código Penal; e) Dos crimes previstos na alínea a) do n.º 2 e no n.º 3 do artigo 210.° do Código Penal, ou previstos nessa alínea e nesse número em conjugação com o artigo 211.° do mesmo Código; f) De crimes contra a identidade cultural e integridade pessoal, previstos no título III do livro II do Código Penal; g) Dos crimes previstos nos artigos 272.°, 273.° e 274.° do Código Penal, quando tenham sido cometidos com dolo; h) Do crime previsto no artigo 299.° do Código Penal; i) Pelo crime previsto no artigo 368.0-A do Código Penal; j) Dos crimes previstos nos artigos 372.°, 373.° e 374.° do Código Penal; k) Dos crimes previstos nos artigos 21.°,22.° e 28.° do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de janeiro, na sua redação atual; I) De crime enquanto membro das forças policiais e de segurança, das forças armadas ou funcionários e guardas dos serviços prisionais, no exercício das suas funções, envolvendo violação de direitos, liberdades e garantias pessoais dos cidadãos, independentemente da pena; m) De crime enquanto titular de cargo político ou de alto cargo público, magistrado judicial ou do Ministério Público, no exercício de funções ou por causa delas; n) Dos crimes previstos nos artigos 144.°, 145.°, n.? 1, alínea c), e 147. ° do Código Penal. /7 - O perdão a que se referem os n.ºs 1 e 2 é concedido a reclusos cujas condenações tenham transitado em julgado em data anterior à da entrada em vigor da presente lei e sob a condição resolutiva de o beneficiário não praticar infração dolosa no ano subsequente, caso em que à pena aplicada à infração superveniente acresce a pena perdoada. 18 - Compete aos tribunais de execução de penas territorialmente competentes proceder à aplicação do perdão estabelecido na presente lei e emitir os respetivos mandados com caráter urgente. 19 - O perdão a que se referem os n.ºs 1 e 2 só pode ser aplicado uma vez por cada condenado." Questão que se coloca, assim, é a de se saber se o predito perdão concedido pela citada Lei é, ou não, aplicável no caso dos autos.
Com efeito, o crime por que o arguido foi condenado no processo nº 2089/10.5PCCBR, não é um daqueles excluído do referido perdão nos termos do citado art. 2°, nº 6 e, por outro lado, a pena que lhe foi aplicada e que terá de cumprir é inferior a dois anos de prisão.
No entanto, o mesmo, neste momento, não se encontra ainda recluído em estabelecimento prisional.
Salvo o devido respeito, na esteira do que defende o Sr. Desembargador José Quaresma - em artigo publicado em e-book do CEJ, em edição actualizada em 22 de abril de 2020, disponível na página do CEJ - pugnar que no caso dos autos não é aplicável o perdão, não se afigura...
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