Acórdão nº 0860/17.6BEAVR de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Junho de 2020

Magistrado ResponsávelPAULO ANTUNES
Data da Resolução17 de Junho de 2020
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I. Relatório 1.1.

AdRA - Águas da Região de Aveiro, melhor identificada nos autos, interpõe recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Aveiro, proferida em 17/07/2018, que julgou improcedente a ação de injunção que segue contra herdeiros de A……….., sinalizados nos autos, visando o reconhecimento dos créditos em dívida, provenientes de tarifas de água relativas ao período de 11/6/2010 a 30/6/2011, no valor global de € 493,45 e a obtenção do respetivo título executivo.

1.2.

O recurso foi admitido, pese embora “o valor da ação não admitir recurso”, por ser intenção do recorrente fundar o mesmo nos artigos 280.º n.º 5 do C.P.P.T. e 629.º, n.º2, a), do C.P.C.

1.3.

Assim, a recorrente veio a apresentar alegações, as quais rematou com o seguinte quadro conclusivo: 1.

A questão centra-se em saber se sentença e respetiva decisão, proferida na data de 17.07.2018 junto aos autos a fls.., contraria o despacho datado de 27.02.2018, transitado em julgado e junto aos autos a fls…; 2.

Ora, na data de 28.11.2017 o Tribunal a quo, notificou a recorrente do despacho datado de 24.11.2017, para juntar aos autos “a) – juntar cópia das faturas em causa e da perfeição das respetivas notificações interpelando o devedor para efetuar o pagamento espontâneo (cláusulas 30ª, nºs 9 e 10 e 31ª, nº 2, do “Contrato de gestão”); b) – Juntar cópia do Regulamento a que alude a cláusula 7ª do “Contrato de gestão”, com informação da data de entrada em vigor; e c) – Informar motivos, de facto e ou de direito, que obstam à cobrança das dívidas tributárias em causa através do processo de execução fiscal (do Município de Oliveira o Bairro) nos termos do artigo 12º do RGTAL (Lei 53-E/2006, de 29 de dezembro).

“ sublinhado nosso; 3.

A recorrente na data de 15.12.2017, respondeu ao Tribunal a quo, nomeadamente quanto à questão da explicitação da natureza da AdRA - que obsta à cobrança de dívidas tributárias através de execução fiscal (do Município de Oliveira do Bairro): 4.

No quadro da implementação do Plano Estratégico de Abastecimento de Água e Saneamento de Águas Residuais para o período 2007-2013 (PEAASAR II), tornou-se necessário flexibilizar o modelo de exploração e gestão dos sistemas multimunicipais e municipais de captação, tratamento e distribuição de água para consumo público e de recolha, tratamento e rejeição de efluentes, estabelecido pelo DL n.º 379/93, de 5 de novembro; 5.

Assim como, a flexibilização do modelo vigente passou pela consagração da possibilidade duma gestão assente numa parceria entre o Estado e as autarquias locais, já prevista no art. 8.º da Lei n.º 159/99, de 14 de setembro, Lei Quadro de Transferência de Atribuições e Competências para as Autarquias, LQTACA, e cujo regime foi posteriormente definido no DL n.º 90/2009, de 09 de abril; 6.

O referido modelo corresponde à opção designada no PEAASAR II por “integração das baixas”, querendo com isto dizer, em suma e simplificando, a prestação de serviços diretamente ao consumidor (sistemas municipais), através de duas modalidades: a integração das “baixas” (sistemas municipais) nas “altas” (sistemas multimunicipais ou intermunicipais) e constituição de um novo modelo de gestão dos sistemas, com participação do Estado e dos municípios, quer diretamente, quer através de associações de municípios, quer através de uma entidade responsável pela gestão e exploração dos sistemas públicos; 7.

A AdRA enquadra-se nesta última modalidade, ou seja, é a entidade gestora da parceria constituída entre o Estado e dez municípios da região de Aveiro, para a gestão e exploração dos sistemas municipais de abastecimento de água para consumo público e saneamento de águas residuais urbanas, doravante sistemas de águas, conforme se passa a explicitar: 8. Em 29 de julho de 2009 foi outorgado o Contrato de Parceria Pública entre o Estado Português e o conjunto dos municípios de Águeda, Albergaria-a-Velha, Aveiro, Estarreja, Ílhavo, Murtosa, Oliveira do Bairro, Sever do Vouga, Vagos e, por Adenda ao referido Contrato, datada de 30.06.2010, também Ovar; 9.

Nos termos do referido Contrato de Parceria Pública, os dez municípios agregaram os respetivos sistemas municipais de águas, num sistema territorialmente integrado denominado Sistema de Águas da Região de Aveiro, doravante SARA ou Sistema, que é constituído pelas infraestruturas e equipamentos cuja operacionalidade concorre técnica e fisicamente, de forma direta, para a prestação dos serviços públicos de águas aos utilizadores; 10.

Para tanto, os municípios delegaram no Estado as competências (que são próprias dos municípios) de gestão e exploração dos sistemas de águas – vide a cláusula 2ª do Contrato de Parceria e art. 2.º, n.º 2, alínea a) e ainda os n.os 6 e 7, do mesmo artigo, do DL n.º 90/2009, de 09.04; 11. Em 23 de setembro de 2009, os Parceiros (isto é, o Estado e os municípios) e a entidade gestora da parceria, doravante EGP (a sociedade anónima AdRA), outorgaram o Contrato de Gestão, pelo qual os Parceiros atribuíram à AdRA, em regime de exclusivo, a gestão e exploração dos serviços públicos de águas relativos ao Sistema, criado pelo Contrato de Parceria; 12.

Estes serviços públicos de águas relativos ao Sistema passaram assim a ser geridos e explorados em regime de parceria pública, mediante a constituição conjunta de uma sociedade anónima, com data de 24.09.2009, nos termos do Código das Sociedades Comerciais, integrada no setor empresarial do Estado (atual setor público empresarial), na qual a “AdP – Águas de Portugal, SGPS, S.A.”, em representação do Estado, detém 51% do capital social, com direito a voto, e o conjunto dos municípios detém 49%, também com direito a voto, e que iniciou a sua atividade em 01 de maio de 2010, contrariamente ao enunciado na sentença onde refere tratar-se de uma concessão o que não é o caso conforme exposto; 13.

A recorrente que, nos termos do n.º 3 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 90/2009, de 9 de abril, que estabelece o regime das parcerias entre o Estado e as autarquias locais para a exploração e gestão de sistemas municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais urbanas e de gestão de resíduos urbanos (a AdRA não tem a componente de resíduos), encontra-se previsto que os “poderes de fiscalização, direção, autorização, aprovação e suspensão de atos da entidade gestora são exercidos pelo Estado, pelos municípios ou por ambos, nos termos do disposto no contrato de parceria, sem prejuízo das competências da entidade reguladora do sector”.

Resulta do exposto que, nos termos do regime legal vigente, os mencionados poderes de fiscalização, direção, autorização, aprovação e suspensão de atos da entidade gestora podem ser exercidos (i) pelo Estado, (ii) pelos municípios ou (iii) conjuntamente por ambos.

14.

Ora, no âmbito das parcerias instituídas ao abrigo do Decreto-Lei n.º 90/2009, de 9 de abril, foi criado um órgão colegial - Comissão de Parceria - através do qual os municípios e o Estado exercem conjuntamente os poderes que a lei consagra no artigo 6.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 90/2009, isto é, “poderes de fiscalização, direção, autorização, aprovação e suspensão de atos» dessas entidades gestoras, «podendo [as partes: o Estado e os municípios], para o efeito, emitir diretrizes e instruções vinculantes e definir as modalidades de verificação do respetivo cumprimento” (cfr. Cláusula 7.ª, n.º 1, do Contrato de Parceria vigente). Esta delegação desses poderes na comissão de parceria constitui um aspeto essencial da operacionalização e da legalidade do modelo de parcerias instituído pelo Decreto-Lei n.º 90/2009, de 9 de abril, na medida em que o regime de parceria entre o Estado e os municípios foi especificamente configurado com o propósito de observar o direito comunitário e acolher as preocupações da Comissão Europeia.

15.

Na modalidade de parceria em que a gestão e exploração conjunta dos sistemas de água e saneamento de raiz municipal sejam realizadas através de uma entidade do setor empresarial do Estado, os municípios começam, num primeiro momento, por atribuir ao Estado (que a não possui originariamente) competência para essa gestão e exploração. Seguidamente, o efetivo exercício da gestão e exploração dos sistemas municipais compete à entidade gestora, no quadro da parceria estabelecida entre o Estado e os municípios, a favor de quem é delegada a necessária competência para o efeito, seja ela uma entidade gestora de um sistema multimunicipal preexistente ou uma entidade do setor empresarial estatal criada especificamente para o efeito, sendo que os poderes de fiscalização e direção sob a entidade gestora pertencem aos parceiros, que a exercem através do órgão colegial comissão de parceria, doravante CP.

16.

A AdRA tem como objeto, nos termos do disposto na cláusula 3.ª, n.º 1 do Contrato de Parceria, “a gestão e a exploração dos serviços de águas relativos ao Sistema compreendem, em regime de exclusivo no âmbito territorial descrito no Anexo I, a concepção, o projecto, a reparação, a renovação, a manutenção, a aquisição das infra-estruturas e dos equipamentos, a respectiva exploração e a prestação dos serviços de águas”, 17.

Assim como, decorre da cláusula 3.ª, n.º 8 do Contrato de Parceria que os “municípios acordam com a EGP a transmissão, a favor desta, da sua posição em todos os instrumentos...

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