Acórdão nº 124/20 de Tribunal Constitucional (Port, 03 de Março de 2020

Magistrado ResponsávelCons. Gonçalo Almeida Ribeiro
Data da Resolução03 de Março de 2020
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 124/2020

Processo n.º 1195/2019

3ª Secção

Relator: Conselheiro Gonçalo de Almeida Ribeiro

Acordam, em conferência, na 3ª secção do Tribunal Constitucional

I. Relatório

1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal Administrativo, em que é recorrente A., S.A. e recorrida B., S.A., foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (Lei do Tribunal Constitucional, referida adiante pela sigla «LTC»).

2. Pela Decisão Sumária n.º 26/2020, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:

«4. Segundo o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º, da Constituição, e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, «identificando-se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto de tal recurso» (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/98).

No caso vertente, é manifesto que tal requisito não se mostra preenchido. De facto, não só a recorrente não identifica no requerimento, de forma idónea e processualmente adequada, uma questão de inconstitucionalidade normativa apta a constituir objeto do presente recurso, como a referência que faz à «necessidade de produção de prova adicional para avaliar da tempestividade do recurso interposto da sentença proferida em primeira instância», como exigência geradora de inconstitucionalidade, por violação dos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição, se traduz unicamente na discordância face ao conteúdo da decisão recorrida. Em suma, imputa a inconstitucionalidade à decisão e não a qualquer norma pela mesma aplicada. Ora, a jurisdição constitucional apenas pode conhecer de questões de constitucionalidade de normas legais e não de decisões jurisdicionais.

Acresce que, nem nas conclusões da alegação do recurso de revista, nem no subsequente pedido de reforma, a recorrente suscitou qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, como imposto pelo artigo 72.º, n.º 2, da LTC, o que sempre implicaria o não conhecimento do objeto do recurso e a prolação da presente decisão, nos termos do artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC.»

3. Da Decisão Sumária vem agora a recorrente reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 3 do artigo 78.º-A da LTC, o que fez nos seguintes termos:

«A., S.A,

Recorrente nos autos acima identificados em que é Recorrida B., S.A., notificada da Decisão Sumária n.º 26/2020 (“doravante Decisão Sumária”), proferida ao abrigo do n.º 1 do art.º 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro (“LTC”), vem apresentar, ao abrigo do disposto no art.º 78.º-A n.º 3 da LTC, RECLAMAÇÃO PARA A CONFERÊNCIA, o que faz nos termos e com os fundamentos seguintes:

1.º

A ora Reclamante interpôs o vertente recurso de inconstitucionalidade ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.

2.º

Tal recurso de inconstitucionalidade surge na sequência da interposição, também pela ora Reclamam-te, de recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul, de 2 de junho de 2016, o qual, por sua vez, havia indeferido reclamação apresentada ao abrigo do disposto no artigo 643.º do Código de Processo Civil, por não admissão de recurso de apelação interposto de decisão do Tribunal de 1.ª instância.

3.º

A tal recurso de revista foi concedido provimento por Acórdão de 11 de setembro de 2019, o Supremo Tribunal Administrativo, pelo qual se anulou o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul e se determinou a baixa do processo a esse Tribunal, para novo julgamento da reclamação.

4.º

Contudo, a ora Reclamante requereu a reforma do acórdão que deu provimento à revista, tendo essa reforma sido negada por Acórdão de 31 de outubro de 2019, do mesmo Supremo Tribunal Administrativo.

5.º

É, pois, da decisão do Supremo Tribunal Administrativo que nega a reforma de Acórdão anterior que vem interposto o recurso de constitucionalidade no âmbito de cujos autos se apresenta a vertente reclamação.

6.º

Da perspetiva da douta Decisão Sumária de que ora se reclama, se “Segundo o disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º, da Constituição, e na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º, da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, «identificando- se assim, o conceito de norma jurídica como elemento definidor do objeto do recurso de constitucionalidade, pelo que apenas as normas e não já as decisões judiciais podem constituir objeto de tal recurso» (v. Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 361/98) [,] (...) No caso vertente, é manifesto que tal requisito não se mostra preenchido [, porque,] (...) De facto, não só a recorrente não identifica no requerimento, de forma idónea e processualmente adequada, uma questão de inconstitucionalidade normativa apta a constituir objeto do presente recurso, como a referência que faz à «necessidade de produção de prova adicional para avaliar da tempestividade do recurso interposto da sentença proferida em primeira instância», como exigência geradora de inconstitucionalidade, por violação dos artigos 20.º e 268.º, n.º 4, da Constituição, se traduz unicamente na discordância face ao conteúdo da decisão recorrida”.

7.º

Por outras palavras, também empregues na douta Decisão Sumária ora objeto de Reclamação, a Reclamante e Recorrente “Em suma, imputa a inconstitucionalidade à decisão e não a qualquer norma pela mesma aplicada [, ao passo que] (...), a jurisdição constitucional apenas pode conhecer de questões de constitucionalidade de normas legais e não de decisões jurisdicionais”.

8.º

Porém, e pese embora uma certa implicitude dos termos da invocação da inconstitucionalidade em que a Recorrente e ora Reclamante agora se apercebe de ter incorrido, justificada e explicada em termos nos quais, como V. Ex.ªs, Venerandos Conselheiros, bem o saberão, nas sábias palavras do Professor Jorge Reis Novais, “um recurso interposto, não de uma norma, mas de uma decisão judicial, pode ser sempre mental e argumentativamente reconstruído como recurso de norma, de interpretação normativa” (cfr. Direitos Fundamentais e Justiça Constitucional, pp. 316-317);

9.º

A verdade é que é uma norma, numa particular interpretação, e não uma decisão em concreto, que se ataca no presente recurso! 

10.º

Repare-se como, nos seus dois doutos Arestos proferidos nos autos que originaram os presentes, o Supremo Tribunal Administrativo, sufragando a conduta das...

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