Acórdão nº 558/19.0T9CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 27 de Abril de 2020
Magistrado Responsável | ANT |
Data da Resolução | 27 de Abril de 2020 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, os Juízes da Secção Criminal do Tribunal da Relação de Guimarães I.
RELATÓRIO 1.
No âmbito do Processo Comum Singular nº 558/19.0T9CHV, que corre termos no Juízo Local Criminal de Chaves, do Tribunal Judicial da Comarca de Vila Real, o Exmo. Sr. Juiz de Direito, Dr. J. A., a exercer funções nesse tribunal, veio ao abrigo do disposto nos Artºs. 43º, nºs. 1, 2 e 4, e 45º, nº 1, al. a), do C.P.Penal, requerer escusa de intervenção no referido processo.
O pedido mostra-se fundamentado nos seguintes termos (transcrição 1): “Nos presentes autos, foi deduzida acusação contra o arguido D. C. pela prática, em autoria material e na forma consumada, de um de um crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo artigo 360.º, n.º1 e 3 do Código Penal.
Os factos imputados ao arguido, na aludida acusação, respeitam directamente ao processo nº 591/15.1T9CHV, no âmbito do qual o ora arguido prestou depoimento na qualidade de testemunha, em julgamento que foi presidido pelo ora signatário.
Foi no contexto da audiência de julgamento, e após promoção do Ministério Público, que foi determinada pelo signatário a extracção de certidão que deu origem ao presente processo. Acresce que o Tribunal não conferiu, no âmbito daquele processo, qualquer credibilidade ao depoimento ali prestado pelo aqui arguido, por ter considerado que o mesmo o prestou de forma parcial e demonstrativa do seu intuito de desresponsabilizar os ali arguidos.
Assim, não obstante não tenha havido uma pronúncia expressa a propósito da desconformidade entre o depoimento prestado no âmbito daquele processo na fase de inquérito e na fase de julgamento, certo é que o Tribunal já valorou, em concreto, a credibilidade do depoimento ali prestado pelo arguido na fase de julgamento.
Entende-se que essa circunstância, por si só, é passível que gerar desconfiança sobre a imparcialidade do signatário, por poder constituir um indício, sério e grave, de que já foi feito um juízo prévio desfavorável à veracidade das declarações prestadas pelo arguido naquela sede.
Assim mesmo se decidiu, aliás, no Acórdão da Relação do Porto de 23.02.2011, (proc. n.º 5136/10.7TAVNG-A.P1, Relator: Desembargador Ricardo Costa e Silva, disponível em www.dgsi.pt), no qual pode ler-se que «Deve ser deferido o pedido de escusa do juiz a quem foi distribuído para julgamento um processo por crime de falsidade de testemunho, se foi esse juiz que procedeu ao julgamento onde foi prestado o imputado depoimento falso, ordenou, na audiência, a requerimento do Ministério Público, a extracção de certidão da acta para efeitos de procedimento criminal e, na sentença, considerou esse depoimento não credível».
Como se decidiu no Acórdão da Relação de Coimbra de 28.06.2017, Relatora: Desembargadora Alice Santos, in www.dgsi.pt: “I – O princípio do Juiz natural só poderá ser afastado quando outros princípios ou regras de igual ou maior dignidade o ponham em causa, como sucede quando o Juiz natural não oferece garantias de imparcialidade e isenção no exercício da sua função.
II – O motivo de escusa apresentado tem de ser sério e grave, objectivamente considerado, isto é, do ponto de vista do cidadão médio, que olha a justiça como uma instituição que tem de merecer confiança.
III – A concreta intervenção do senhor juiz requerente no processo em que, alegadamente, o ora arguido praticou o crime de falsidade de testemunho p. e p. pelo artigo 360.º, n.ºs 1 e 3 do CP, pelo qual irá agora ser nos presentes autos, constitui motivo sério e grave adequado a gerar desconfiança sobre a sua imparcialidade num dos seus aspectos fundamentais.” No mesmo sentido, os recentes Acórdãos da Relação de Guimarães de 8.10.2018, Relatora: Desembargadora Maria Teresa Coimbra, no processo 1036/17.8T9CHV-AG1, e de 29.04.2019, Relatora: Desembargadora Cândida Martinho, no processo 113/18.2T9CHV-A.G1, ambos não publicados.
Cumpre, portanto, ao Juiz, que não pode declarar-se voluntariamente suspeito, «pedir ao tribunal competente que o escuse de intervir quando se verificarem as condições dos n.os 1 e 2» (artigo 43.º, n.º4 do Código de Processo Penal).
Nesta conformidade e atentos os fundamentos de facto e de direito supra expostos, requer-se a V. Exas. se dignem escusar o ora signatário de intervir, nestes autos, no julgamento do arguido D. C..
*Extraia-se certidão do presente despacho e, ainda, de fls. 2 a 18, 27-46, 64-66 e da certidão com a referência 2225847 para criação do correspondente apenso, remetendo-se então a mesma ao Venerando Tribunal da Relação de Guimarães para apreciação.”.
*2.
O pedido de escusa foi instruído com certidão das peças processuais atinentes ao incidente suscitado, não havendo necessidade de proceder a diligências de prova.
*3.
Efectuado exame preliminar, colhidos os vistos legais, cumpre conhecer e decidir (2).
*II. FUNDAMENTAÇÃO 1. Antes de mais, há que atentar nos seguintes elementos fácticos que os autos nos revelam: - No dia 27/03/2019 realizou-se a 1ª sessão da audiência de discussão e julgamento no âmbito do Proc. Comum Singular nº 591/15.1T9CHV, do Juízo Local...
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