Acórdão nº 492/16.6PABCL.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Novembro de 2019

Magistrado ResponsávelTERESA COIMBRA
Data da Resolução11 de Novembro de 2019
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

I.

Acordam, em conferência, os juízes da Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães.

No processo com intervenção do Tribunal Coletivo que, com o nº 492/16.6PABCL.G1, corre termos no juízo Central Criminal de Braga foi decidido (transcrição): a) condenar o arguido D. M., como reincidente, pela prática de um crime de furto qualificado, p.p. pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº 2 alínea e), por referência ao artigo 202º, alínea e), e 75º todos do Código Penal na pena de 3 (três) anos e 6 (seis) meses de prisão – NUIPC 492/16.6PABCL; b) condenar o arguido D. M., como reincidente, pela prática de um crime de furto qualificado, p.p. pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº1 alínea e) e nº 2 alínea e), por referência ao artigo 202º, alíneas d) e e), e 75º todos do Código Penal na pena de 3 (três) anos e 8 (oito) meses de prisão – NUIPC 600/16.7PABCL; c) condenar o arguido D. M., como reincidente, pela prática de um crime de furto qualificado, p.p. pelos artigos 203º, nº 1 e 204º, nº 1, alínea a) e nº 2 alínea e), por referência ao artigo 202º alíneas a) e e), e 75º todos do Código Penal na pena de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de prisão – NUIPC 609/16.0PABCL – absolvendo-o da prática do mesmo nos termos do disposto no artigo 204º, nº 2, alínea a), por referência à alínea b) do artigo 202º do Código Penal; d) condenar o arguido D. M., como reincidente, pela prática de um crime de furto simples, p.p. pelo artigo 203º, nº 1 e 75º do Código Penal na pena de 1 (um) ano, 6 (seis) meses e 10 (dez) dias de prisão – NUIPC 33/17.8PABCL – absolvendo-o da prática do crime na sua forma qualificada, p.p. pelo artigo 204º, nº 2, alínea e), por referência ao artigo 202º, alíneas e) e d) do Código Penal; e) Em cúmulo das penas descritas de a) a d) condena-se o arguido D. M.

, na pena única de 7 (sete) anos e 1 (um) mês de prisão, nos termos do disposto no artigo 77º do Código Penal.

f) Declarar a perda do valor de €21.556,60 (vinte e um mil, quinhentos e cinquenta e seis euros e sessenta cêntimos) a favor do Estado, condenando-se o arguido na sua restituição, sempre sem prejuízo dos direitos que porventura os ofendidos venham ainda a exercer.

(…)*Inconformado com a condenação por um dos crimes, recorreu o arguido para este tribunal, concluindo, o seu recurso do seguinte modo: I – Com o devido respeito, é notória a insuficiência de prova quanto aos factos que o Tribunal a quo deu como provados, e que alinhou sob pontos 17 a 22, inclusivé, de Fundamentação. Factos esses, referentes a apenso C ( NUIPC 33/17.18PABCL ).

II – Esses factos mereceram ao arguido, aqui recorrente, uma condenação pela prática de furto simples, previsto e punido pelo artigo 203.º, n.º 1 e 75º do Código penal.

III – No entanto, inexiste prova que fundamente tal condenação. E isso o admite, mesmo, o próprio Tribunal a quo! IV – Com efeito, a própria sentença recorrida, apela a um indício que consiste na impressão de um dedo anelar atribuído ao arguido, presente em destroço de acrílico, objeto esse, proveniente de máquina de tabaco furtada de estabelecimento comercial. E depois considera ( pg. 15 § 2 e 3 ): “Sucede que os vestígios em causa e a sua correspondência com o arguido não fazem prova direta da participação do mesmo nos factos criminosos em causa,. Mas pode e deve ser encarado como um indício dessa participação.

Importa, assim, analisar a restante prova produzida, por forma a aferir se a mesma se compagina com o indício resultante da prova pericial”.

V – Arredando a suficiência deste indício concreto – e único – como prova suficiente da prática dos atos por parte do recorrente. Ora, acresce que, pela testemunha, o agente PSP V. M., nada foi referido quanto ao apenso C, ou seja, o mesmo nunca visualizou e por isso nem foi confrontado em audiência, com qualquer documento produzido por sistema de vídeo vigilância em que o arguido surgisse no local dos factos em apenso C, muito menos a incorrer na sua prática.

VI – A sentença considera que a testemunha V. M. reconheceu cabalmente o arguido em visualizações levadas a cabo no processo, mas unicamente em apensos A e B. Sendo totalmente omissa a prova em audiência e admissível, nos autos, quanto à prática dos factos relatados em NUIPC 33/17.8PABCL. Cfr. depoimento reproduzido em alegações, da testemunha em causa em 08 de Abril ( minutos 01m:09ss até ao encerramento em 06m:28ss ) VII – Pelo que, é impugnada a matéria de facto dada como provada sob pontos 17 a 22 inclusive. Atento o regime do artigo 412º nº3 b) do Código de Processo Penal, tal prova assentou unicamente num indício, quando pelo contrário, deveria ter assento na documentação de apenso C e do depoimento especificado em alegações e supra em VI.

VIII – Esse indício, sustenta o próprio Tribunal a quo, que valia unicamente como um indício, permitindo provar unicamente a presença do arguido no local dos factos. Não dispensando o próprio Tribunal a quo – cfr pg15 de sentença § 2 e 3 - a sua corroboração por outros meios de prova, meios esses que não vieram a ter lugar em audiência, nem a qualquer outro título, nos autos.

Ora, condenar com base em um elemento ao qual o Tribunal a quo não atribui mais valor , do que um indício, faz a sentença incorrer em violação do princípio in dúbio pro reo. Pois, na face de um indício e ante a inexistência de mais prova, impunha-se a absolvição do recorrente.

IX - Ao dar esses factos como provados, a sentença incorreu, além de erro na apreciação da prova, mesmo em contradição entre fundamentação e decisão, à luz do artigo 410º nº2 al. b), n medida em que ( pg 15 de sentença ) perentoriamente atribuía mencionada impressão digital,a natureza de simples indiciária provando unicamente com certeza, a presença do arguido no local dos factos, sem dispensar a produção de prova que cabalmente confirme a suspeita. E, sem mais prova que ateste ou que com segurança permite deduzir a prática do crime por parte do recorrente, incorre na sua condenação! X – Pelo contrário, a ausência de prova quanto aos factos que se impugnam, vem mesmo confirmada na ausência de qualquer indício respeitante ao arguido que tenha sido detetada. A título do exemplo invocado, o auto de 28 de Janeiro de 2017 de Apenso C, em que se atestava não ter sido recolhida qualquer impressão digital, da máquina de tabaco furtada.

XI – Condenação que o recorrente não pode aceitar, impondo-se a revogação da sentença e a consequente absolvição do arguido,na parte em que o condena pela prática de furto simples.

XII – Se assim não procedesse, o que por cautela de patrocínio, cumpriu alegar supra, a sentença é nula na parte em que dá como provados os factos sob 17 a 22, inclusive e na condenação com base nesses factos, pela prática de furto simples ( al. d) de “5- Decisão”).

XIII – Esses factos referem-se, como distingue a sentença, ao NUIPC 33/17.18PABCL. No entanto, o recorrente vinha acusado por factos diferentes, conforme constavam em Acusação proferida em apenso C ( 11-09-2017 ). Resumidamente, vinha acusado da apropriação dos seguintes objetos: - 3 caixas de camarão, com 4Kg, no valor de €24,00; - 5 caixas de camarão tempura, no valor de €25,00; - 3 gelados vianeta, no valor de €24,00; - 1 caixa de de crepes no valor de €5,00; - 1 caixa de guiosas, no valor de €10,00; - uma máquina de distribuição de tabaco, marca Jofenar, modelo Goya, no interior da qual estavam: - 10 maços de malboro, no valor de €45,00; - 10 maços de Chesterfield, no valor de €45,00; - 10 maços de JP, no valor de €45,00; - 10 maços de Lm, no valor de €45,00; - 10 maços de Camel, no valor de €45,00 XIV – Ou seja, conforme Acusação deduzida, a máquina de tabaco não tinha valor patrimonial e o tabaco não ultrapassava os 225 euros. Ora, em pontos 17 a 22 de sentença, veio provado que esses tabaco, máquina e dinheiro ( bem este, sobre o qual a Acusação era omissa ) eram de valor global não inferior a 1000 euros! O que consubstancia uma alteração não substancial do objeto, sobre a qual não foi dada oportunidade ao recorrente de se pronunciar.

XV – Com efeito, de vários objetos que apresentam um valor máximo global de 225 euros e um objeto sem qualquer valor patrimonial, passou-se a ter como provado um conjunto de objetos: 1º: cujo valor não se discrimina individualmente, ao contrário do vertido em Acusação; 2º: que vêm descritos como máquina, destarte com valor patrimonial, ao contrário da Acusação, mas também não discriminado, tabaco e dinheiro! ( bem este, sobre o qual a Acusação foi totalmente omissa!) XVI–Tudo,sem qualquer assento na Acusação! Atenta a disparidade do quanto vinha imputado ao recorrente, em resultado do Inquérito, e do que lhe veio imputado em audiência, urgia exercer o seu direito de defesa, quanto a factos novos, que lhe desenharam uma factualidade bem diferente.

XVII – Pelo que, se não se decidir o tribunal ad quem, pela revogação da sentença na parte recorrida, e com a absolvição do arguido quanto ao crime de furto simples em que veio condenado, há-de pelo menos determinar-se a reabertura da audiência, para o exercício cabal do seu direito de defesa, nos termos previstos no artigo 358.º do Código de Processo Penal.

Assim fazendo os Venerandos Juízes a tão almejada e já costumada Justiça*O recurso foi corretamente admitido.

*Respondeu ao recurso o Ministério Público em primeira instância, pugnando pelo deferimento parcial do recurso, posição que concluiu do seguinte modo: 1 – O texto da decisão recorrida não enferma em si mesmo de qualquer um dos vícios elencados no art. 410.º do Código de Processo Penal que deva ser corrigido; 2 – Os motivos da prova dos factos 17 a 22 estão vertidos no acórdão e a argumentação usada é ajustada à realidade e consentânea com as regras da experiência comum; 3 – O tribunal deu como provados os factos da subtracção tendo por referência os depoimentos das testemunhas A. J. e C. M. e considerou que tais factos foram perpetrados pelo arguido através da conjugação desses depoimentos com as impressões digitais do mesmo que foram...

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