Acórdão nº 874/18.9BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 07 de Novembro de 2019
Magistrado Responsável | DORA LUCAS NETO |
Data da Resolução | 07 de Novembro de 2019 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Sul |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I. Relatório S......., ora Recorrente, não se conformando com a sentença do TAF de Almada que, nos autos de ação administrativa por si proposta contra o Fundo de Garantia Salarial, julgou improcedente a ação e absolveu o R. do pedido, veio recorrer para este TCA Sul.
As alegações de recurso que apresentou, culminam com as seguintes conclusões: «(…) I. Vem o presente Recurso de Apelação interposto da Sentença de fls. que julgou improcedente a presente ação, decidindo não decretar a anulação da decisão de indeferimento impugnada, absolvendo o Réu do pedido formulado pela Autora.
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Com efeito, cumpria, nos presentes autos, verificar se o requerimento apresentado pela aqui Recorrente ao Fundo de Garantia Salarial para pagamento de créditos salariais, cumpre com os requisitos legais previstos no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 59/2015, bem como apreciar a constitucionalidade da interpretação efetuada pelo Recorrido do n.º 4 do artigo 2.º do referido diploma legal e, consequentemente, a validade ou invalidade da decisão impugnada.
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No que respeita ao preenchimento dos requisitos legais previstos no artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 59/2015, andou mal o Tribunal o quo ao considerar que "o Autora não tem direito à pretensão material deduzida nos presentes autos, porque os seus créditos laborais não se venceram no período de abrangência dos 6 meses (cfr. factos provados n.º 1, n.º 2, n.º 4 e 5)." IV. Porém, tal acervo factual não integra todos os factos que deveriam ter sido dados como provados, por se revelarem essenciais para a boa decisão da causa, pelo que concretamente se impugna a sentença objeto do presente recurso.
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A aqui Recorrente apresentou, junto do seu articulado de petição inicial, certidão judicial como DOC. 3, a qual demonstra, inequivocamente, que a 07 de junho de 2017, foi requerida a insolvência da M...... - I........, Lda., no âmbito do processo n.º 13450/17.4T8LSB que correu termos no Juízo de Comércio de Lisboa, Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa.
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Ora, compulsados os presentes autos, verifica a aqui Recorrente que o referido documento não foi impugnado pelo Recorrido.
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Face o exposto, o Tribunal a quo não fez constar convenientemente todos os factos essenciais e alegados pela Recorrente, motivo pelo qual existiu uma deficiente apreciação da matéria de facto que importará o aditamento do seguinte facto: VIII. "A 07 de junho de 2017 foi requerida a insolvência da M...... - I........, Lda., no âmbito do processo n.º 13450/17.4T8LSB que correu termos no Juízo de Comércio de Lisboa -Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa." IX. Face o exposto, sempre deveria ter sido dado como provado que: a. "A 14 de junho de 2017 foi também requerida a insolvência da M...... - I........, Lda., no âmbito do processo n.º 13990/17.5T8LSB que correu termos no Juízo de Comércio de Lisboa - Juiz 4, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa." X. Com efeito, em conformidade com o que resulta provado do ponto 5 da fundamentação de facto da sentença em crise, em 2 de maio de 2017, a ora Recorrente cessou o contrato de trabalho com a M...... - I........, Lda.
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Não obstante o reconhecimento dos créditos laborais da aqui Recorrente pela sociedade M...... - I........, Lda., a mesma não procedeu o seu pagamento.
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A referida entidade patronal da aqui Recorrente era uma instituição de pagamento, na aceção da alínea e) do artigo 2..º do Decreto-Lei n.º 317/2009 de 30 de outubro, pelo que se encontrava sujeita à supervisão do Banco de Portugal, nos termos do disposto da alínea a) do n.º 1 do artigo 6.º do referido diploma legal (aplicável à data em que cessou a atividade da referida instituição de pagamento).
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Com efeito, nos presentes autos está em causa a articulação entre o prazo previsto no n..º 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 59/2015 de 21 de abril e a competência exclusiva do Banco de Portugal para requerer a dissolução e liquidação da instituição de crédito em que a ora Recorrente foi trabalhadora.
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Destarte, conforme dispõe o n.º 3 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 99/2006 de 25 de outubro, após a decisão de revogação da respetiva autorização, "cabe em exclusivo ao Banco de Portugal requerer, no tribunal competente, a liquidação da instituição de crédito, no prazo máximo de 10 dias úteis após a revogação da autorização, proferida nos termos do artigo 22.º do RGICSF".
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Não se pode olvidar que, nos presentes autos, a dissolução e liquidação da M...... - I........, Lda., é regulada pelo Decreto-Lei n.º 199/2006 de 25 de outubro, o qual prevê a competência exclusiva do Banco de Portugal para propositura da ação judicial de liquidação e dissolução, bem como prevê um íter processual distinto do processo de insolvência regulado no CIRE.
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Ora, a aqui Recorrente não dispunha sequer do domínio do impulso processual inicial, na medida em que não tinha competência para propor a ação de liquidação e dissolução da M...... - I........, Lda., nem tão pouco se encontrava em condições de assegurar que a apresentação da petição inicial pelo Banco de Portugal teria lugar dentro do prazo de seis meses após a data de vencimento dos créditos laborais em crise.
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Na verdade, do exposto resulta indubitável que a aqui Recorrente esteve condicionada à propositura do processo de dissolução e liquidação, cuja competência pertence, em exclusivo, ao Banco de Portugal, para, posteriormente, puder requerer o pagamento dos créditos laborais emergentes da cessação do contrato de trabalho.
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Na verdade, a ora Recorrente sempre atuou diligentemente, sendo alheia ao motivo pelo qual apenas em novembro de 2017 é que o Banco de Portugal requereu a dissolução e liquidação da sua ex-entidade patronal.
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No caso em apreço verificou-se a propositura de duas ações de insolvência, no âmbito do processo n.º 13450/17.4T8LSB, que correu termos no Juízo de Comércio de Lisboa - Juiz 2, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa e no âmbito do processo 13990/17.5T8LSB, que correu termos no Juízo de Comércio de Lisboa - Juiz 4, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa.
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Na verdade, nos processos de insolvência supra identificados a apresentação da respetiva petição inicial teve lugar dentro do período de referência previsto no n.º 4 do artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 59/2015, de 21 de abril.
XXL Sucede que, conforme supra se expôs, os processos judiciais foram extintos por inutilidade superveniente da lide, atenta a revogação da autorização para o exercício da atividade que havia sido concedida à ex-entidade patronal da aqui Recorrente, proferida a 7 de novembro de 2017.
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Não se pode olvidar que, no caso dos presentes autos, por se tratar de uma instituição de pagamentos, a propositura da ação de insolvência não era legalmente admissível, na medida em que a decisão de revogação da autorização para o exercício da atividade produz, ope legis, os efeitos da declaração de insolvência, nos termos do disposto nos n.º 1 e 2 do artigo 5.º e no n.º 2 do artigo 8.º do Decreto-Lei n.º 199/2006 de 25 de outubro.
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Consequentemente, a obtenção dos documentos que, nos termos legais, instruem obrigatoriamente o requerimento dirigido ao Recorrido para pagamento de créditos laborais, só podem ser obtidos após a propositura da ação de dissolução e liquidação pelo Banco de Portugal e da reclamação dos créditos laborais em crise.
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Porém, no caso em apreço, a aqui Recorrente foi excessivamente penalizada pela morosidade do Banco de Portugal na interposição da ação judicial de dissolução e liquidação da instituição de crédito.
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Na situação que aqui se trata, em face de toda a factualidade e cronologia supra descrita, verifica-se que a ora Recorrente não podia garantir que a propositura da ação judicial de liquidação e dissolução da...
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