Acórdão nº 02011/18.0BALSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 23 de Outubro de 2019

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução23 de Outubro de 2019
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Recurso para uniformização de jurisprudência da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa - CAAD no processo n.º 64/2016-T 1. RELATÓRIO 1.1 A AT veio, ao abrigo do disposto no art. 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, interpor recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo de decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), tendo apresentado alegações do seguinte teor: «

  1. Constitui objecto do presente recurso o segmento decisório identificado na alínea b) da decisão arbitral final [condenação da AT ao pagamento de juros indemnizatórios], proferida em 16-11-2016, pelo Tribunal Arbitral Singular em matéria tributária, constituídos sob a égide do CAAD, na sequência de pedido de pronúncia arbitral apresentado ao abrigo do regime aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20.01 (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, doravante apenas RJAT) e que correu termos sob o n.º 64/2016-T.

  2. Tendo o Tribunal julgado procedente o pedido de pronúncia arbitral considerando que as liquidações controvertidas, referentes a IMT e Imposto do Selo, se encontram feridas de ilegalidade com fundamento em inconstitucionalidade, por violação do art. 103.º n.º 3 da CRP, foi apresentado pela AT recurso para o Tribunal Constitucional, no âmbito do qual foi proferido acórdão, em 09-10-2018, que julgou improcedente o recurso interposto e confirmou a decisão arbitral no que respeita à questão de inconstitucionalidade suscitada.

  3. Tendo este acórdão sido notificado a 22-10-2018, transitou em julgado em 03-11-2018, pelo que, atenta a interrupção da contagem dos prazos prevista no artigo 75.º da LTC bem como o disposto no artigo 25.º do RJAT, o presente recurso é tempestivo.

  4. Defende a Recorrente que a decisão arbitral recorrida incorreu em erro de julgamento por errónea interpretação do artigo 43.º da LGT, colidindo frontalmente com o acórdão do STA prolatado no processo n.º 01529/14, em 03/04/2015, já transitado em julgado, pelo que considera-se inteiramente justificado o recurso à presente via processual para uniformização de jurisprudência, com a consequente anulação da decisão arbitral na parte recorrida e substituição por outra que julgue improcedente o pedido de juros indemnizatórios, uma vez que, estando a AT sujeita ao princípio da legalidade, não podia recusar a aplicação de uma norma legal vigente no ordenamento jurídico com o argumento de que a considera inconstitucional, inexistindo, assim, erro imputável aos serviços para os efeitos previstos no artigo 43.º da Lei Geral Tributária.

  5. Ambas decisões versam sobre situações fácticas substancialmente idênticas, uma vez que em cada um dos respectivos litígios estão em causa actos tributários de liquidação declarados ilegais com fundamento em inconstitucionalidade e, em que, subsequentemente foi apreciado o pedido de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º da LGT, isto é, sabendo se houve, ou não erro imputável aos serviços – cf. arts. 22.º e 23.º supra.

  6. Também nas duas decisões há pronúncia sobre a mesma questão fundamental de direito, qual seja o direito a juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º da LGT, quando a anulação da liquidação impugnada foi por inconstitucionalidade da norma legal aplicável, apurando-se se houve, ou não, erro imputável aos serviços da AT – cf. arts. 28.º e 29.º supra.

  7. E, quanto a esta mesma questão, as decisões chegaram a soluções opostas.

  8. Na decisão recorrida, o Tribunal Arbitral, não obstante ter anulado as liquidações impugnadas com fundamento em inconstitucionalidade, condenou a AT ao pagamento de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43.º da LGT.

  9. Enquanto o Acórdão fundamento pronunciou-se em sentido totalmente oposto, ao concluir, na mesma situação que, atenta a circunstância da administração tributária não poder deixar de decidir, como decidiu, porque não pode desaplicar normas com fundamento em inconstitucionalidade, então nenhum erro pode ser assacado aos seus serviços, não se verificando assim os pressupostos constitutivos da obrigação de indemnizar que encontra previsão no artigo 43.º da LGT.

  10. Demonstrada que está uma evidente contradição entra a decisão recorrida e o Acórdão fundamento, no estrito cumprimento do artigo 152.º do CPTA, cumpre assinalar que a infracção em causa consiste num erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que o Tribunal Arbitral adoptou uma interpretação do artigo 43.º da LGT em patente desconformidade com o quadro jurídico vigente.

  11. Decidindo deste modo, ficou devidamente demonstrado que a decisão adoptada pelo colectivo de árbitros do Tribunal Arbitral é ilegal, uma vez que em conformidade com o entendimento vertido no Acórdão fundamento, o pedido de juros indemnizatórios devia ter sido julgado improcedente, por inexistir erro imputável aos serviços.

    Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados, revogada parcialmente a decisão arbitral recorrida e substituída por outro Acórdão consentâneo com o quadro jurídico vigente».

    1.2 O recurso foi admitido.

    1.3 A Recorrida contra-alegou nos seguintes termos: «§ 1 Em conformidade com o disposto no artigo 43.º da Lei Geral Tributária (LGT), aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, e recentemente aditado pela Lei n.º 9/2019, de 1 de Fevereiro, são devidos juros indemnizatórios «em caso de decisão judicial transitada em julgado que declare ou julgue a inconstitucionalidade ou ilegalidade da norma legislativa ou regulamentar em que se fundou a liquidação da prestação tributária e que determine a respectiva devolução» (cfr. artigo 43.º, n.º 3, al. d) da LGT).

    § 2 O referido aditamento, posterior às ilustres alegações da Recorrente, é «aplicável também a decisões judiciais de inconstitucionalidade ou ilegalidade anteriores à sua entrada em vigor, sendo devidos juros relativos a prestações tributárias que tenham sido liquidados após 1 de Janeiro de 2011» (cfr. artigo 3.º da Lei n.º 9/2019, de 1 de Fevereiro), tal como no caso em apreço.

    § 3 Perante esta recente alteração legislativa, parece-nos não restarem dúvidas quanto à questão fundamental de direito a que se refere a Recorrente, Termos em que deve o recurso para uniformização de jurisprudência, caso seja admitido, confirmar plenamente a decisão arbitral recorrida».

    1.4 Dada vista ao Ministério Público, a Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido de que seja julgada verificada a oposição e uniformizada a jurisprudência no sentido da posição que foi adoptada pela decisão arbitral recorrida. Isto, após elencar os requisitos de admissibilidade do recurso, com a seguinte fundamentação: «[…] a questão fundamental de direito aqui em apreço prende-se com o direito ou não a juros indemnizatórios devidos nos termos do disposto no artigo 43.º da LGT, quando houver pagamento indevido de prestações tributárias fundado em normas declaradas judicialmente inconstitucionais ou ilegais.

    De facto, constata-se que quer na decisão recorrida quer no acórdão fundamento a questão fundamental em apreço – o direito a juros indemnizatórios nos termos atrás...

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