Acórdão nº 13111/17.4T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelBERNARDO DOMINGOS
Data da Resolução11 de Julho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL * Relatório[1] « AA intentou a presente acção contra BB - Companhia de Seguros, S.A., pedindo que a ré fosse condenada a pagar-lhe 162.130,08€, reportados a 08/09/2016, data em que foi reconhecida ao autor a nova incapacidade de 37.8%, relativos ao contrato de seguro titulado pela apólice 5…9, e o montante correspondente aos prémios de seguro pagos pelo autor a título de prémio pelo referido seguro desde a mesma data, a liquidar posteriormente, tudo acrescido de juros a liquidar também posteriormente.

Alega para tanto, em síntese, que: o valor pedido corresponde ao capital que a ré se comprometeu a pagar-lhe caso viesse a ficar com uma invalidez total e permanente por acidente, que teria de ser decorrente de uma incapacidade permanente igual ou superior a 75%. Como o autor à data da celebração do contrato tinha uma incapacidade permanente por doença de 80% e veio a sofrer em 1996 um acidente que lhe determinou, desde 08/09/2016, uma incapacidade de 37.80%, já estão ultrapassados os 75% exigidos. A ré recusa-se a pagar-lhe o capital garantido, porque diz que a incapacidade por doença não entra para o cálculo, e portanto o autor só tem 37.80% de incapacidade, inferior aos pelo menos 75% exigidos. É certo, diz o autor, que numa acção anterior (de 2010) já foi julgado que o autor não linha direito ao capital em causa, mas nessa altura o autor só tinha 15% de incapacidade por acidente, pelo que a situação se modificou (embora defenda que já então se verificava o pressuposto exigido, pois que 15% da capacidade restante de 20% era igual a 75% desta).

A Seguradora veio contestar, entre o mais excepcionando a autoridade do caso julgado: estando decidido, na anterior acção, que não conta a incapacidade por doença, e que a incapacidade por acidente tem de ser superior a 75%, tal decisão vale para a anterior acção (15% de incapacidade), como para esta nova acção (37.80% de incapacidade), pois que também este novo valor é inferior aos pelo menos 75% exigidos. Ou seja, a questão de saber como valorar a incapacidade por acidente em relação aos 75% exigidos não pode ser decidida de forma diferente nas duas acções. Estando já decidido que ela conta só por si, não se acumulando com a incapacidade por doença, tal tem de ser decidido da mesma maneira nesta acção e, por isso, os 37.80% não podem levar à consideração de que foi ultrapassada a fasquia dos 75%. Conclui, por isso, que a acção deve ser julgada improcedente, absolvendo a ré do pedido.

No despacho saneador foi decido aplicar "a figura da autoridade do caso julgado e, consequentemente, absolver a ré da instância nos termos do art. 278/1-e do CPC" sem se justificar porque é que não se absolveu antes do pedido».

O autor veio recorrer deste despacho saneador, tendo o Tribunal da Relação, decidido confirmar a decisão da primeira instância, não por violação da autoridade do caso julgado, mas sim por se verificar a excepção de caso julgado.

Mais uma vez irresignado interpôs recurso de revista, tendo rematado as suas alegações com as seguintes Conclusões: «1ª - Pelo douto acórdão recorrido foi julgada procedente a exceção de caso julgado e a Recorrida absolvida da instância, considerando-se, em síntese, que é indiferente o facto de na 1ª ação estar em causa uma incapacidade de 15% e na 2ª ação uma incapacidade de 37,8%, uma vez que na primeira ação se decidiu que a pretensão do Recorrente só poderia ser julgada procedente se do acidente tivesse resultado uma incapacidade de 75%.

  1. - Mas esta conclusão parte, salvo o devido respeito, de um erro de raciocínio. É necessário apurar em que consiste essa incapacidade de 75% num caso como o dos autos.

  2. - A exigência, na primeira ação, de uma incapacidade, resultante do acidente, igual ou superior a 75% - com a exclusão da incapacidade de nascença de que o Recorrente padecia à data do contrato de seguro -, não se referia, seguramente, a 75% da capacidade geral de ganho.

  3. - Com efeito, se a capacidade geral de ganho do ser humano se exprime pela percentagem de 100%, um cidadão portador de uma deficiência de nascença correspondente a uma redução de 60% ou 80% da sua capacidade geral de ganho jamais poderá sofrer, posteriormente, uma nova redução da mesma capacidade em percentagem igual ou superior a 75%.

  4. - O que na primeira ação se exigia era que do acidente resultasse uma incapacidade correspondente a 75% da capacidade que o Recorrente possuía à data da celebração do contrato de seguro, o que torna relevante a diferença entre 15% ou 37,8%.

  5. - Aliás, a ora Recorrida fez também este raciocínio. Com efeito, tendo o Recorrente comunicado à Recorrida a situação de incapacidade em que se encontrava, com vista ao reconhecimento dessa situação e à consequente atribuição dos direitos correspondentes à apólice nº 5…9, a Recorrida veio a comunicar ao Recorrente o reconhecimento do direito invocado, tendo-lhe enviado a carta que se junta aos autos como doe. n° 9, com o recibo anexo, junto como doc. n° 10, para que o Recorrente efetuasse o levantamento do capital que, alegadamente, lhe era devido (€ 25.829,82).

  6. - O Recorrente, porém, considerou insuficiente o capital que a Recorrida pretendia pagar-lhe, uma vez que o agravamento da sua incapacidade resultou de acidente em serviço, e não de doença, pelo que, face à manutenção da posição da Recorrida quanto ao montante a pagar, o ora Recorrente instaurou a primeira ação. E, na contestação que apresentou na primeira ação, a Recorrida alegou que só reconheceu o direito do Recorrente ao capital correspondente à referida apólice por desconhecer, nessa ocasião, um outro atestado médico emitido em 23 de março de 1994, que fixava a incapacidade do Recorrente em 60%.

  7. - Isto é, face a este novo atestado, que teve por base a aplicação de uma Tabela Nacional de Incapacidades posterior, a incapacidade arbitrada ao Recorrente em consequência do acidente que sofreu em 1996 (15%) não atingia 75% da sua capacidade restante, que era de 40%. Entendia a Recorrida que se a incapacidade de nascença do Recorrente fosse de 80%, a incapacidade resultante do acidente, de 15%, preenchia a exigência constante da apólice, na medida em que 15% de redução da capacidade geral de ganho correspondia a 75% da capacidade restante.

  8. - O referido atestado que fixou ao recorrente uma incapacidade de nascença de 60% foi emitido por aplicação da nova Tabela Nacional de Incapacidades, aprovado pelo Decreto-Lei nº 341/93, de 30 de setembro, de cuja aplicação resultava, efetivamente, uma redução da incapacidade de nascença do Recorrente de 80% - fixada com base na lei anterior - para 60%.

  9. - À luz desta redução, quando a sentença proferida na primeira ação decidiu que a incapacidade do Recorrente, resultante do acidente, não atingiu não atingiu os 75%, tal decisão, reportada à capacidade que o Recorrente possuía à data do contrato de seguro (40%), estava correta, uma vez que 15 constitui uma percentagem de 37,5% de 40.

  10. - Porém, quando redução da capacidade geral de ganho do Recorrente, resultante do acidente foi elevada, mediante agravamento, de 15% para 37,8%, ultrapassou o grau de incapacidade exigido na apólice, isto é, constitui uma redução da capacidade geral de ganho do Recorrente superior a 75% da capacidade geral de ganho que o Recorrente possuía à data do seguro.

  11. - Aliás, em novembro de 1990, quando aceitou o seguro titulado pela apólice nº 5…9, a...

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