Acórdão nº 334/16.2T8CMN-G.G1.S2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Julho de 2019

Magistrado ResponsávelRICARDO COSTA
Data da Resolução11 de Julho de 2019
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Revista – Tribunal recorrido: Relação de Guimarães, 1.ª Secção Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 6.ª Secção I. RELATÓRIO 1.

“AA, Lda” intentou acção de impugnação da resolução de atos em benefício da massa insolvente, de acordo com o disposto no art. 125º do CIRE, por apenso ao processo especial de insolvência n.º 334/16.2T8CMN, em que é insolvente a sociedade “BB, Lda” e demandada a “Massa Insolvente de BB, Lda”, representada pelo Administrador de Insolvência CC, pedindo que fosse revogada a resolução em benefício da massa insolvente, por ausência da verificação dos respectivos pressupostos, e a manutenção como válido e eficaz do(s) contrato(s) de compra e venda impugnado(s) relativo a “bens de equipamento” da devedora insolvente (nos termos do art. 120º do CIRE); subsidiariamente, pede a condenação da Ré a pagar à Autora, o valor do pagamento da aquisição dos bens, bem como o valor das despesas suportadas com a reparação e/ou manutenção dos bens, constituindo estes um crédito da Autora sobre a massa insolvente, tudo acrescido de juros de mora à taxa legal; pugnando ainda pelo reconhecimento à Autora do direito de retenção sobre os bens até integral reembolso pela Ré.

2.

A Ré apresentou contestação, pedindo a improcedência por não provada da acção intentada pela Autora e, consequentemente, ser declarado e reconhecido a validade do acto resolutivo, tal como apresentado na carta enviada pelo Administrador da Insolvência, com as respectivas consequências condenatórias, e a improcedência por não provado do direito de retenção invocado pela Autora, absolvendo a Ré dos pedidos formulados, e deduziu reconvenção, cuja procedência implicaria a declaração e reconhecimento da eficácia e da validade do acto resolutivo tal como apresentado na carta registada enviada à Autora, com as respectivas consequências legais.

3.

A Autora apresentou réplica na qual sustentou a inadmissibilidade da reconvenção.

4.

Foi dispensada audiência prévia e proferido despacho nos termos do art. 593º, 1 e 2, do CPC (que faz fls. 117 e ss), com rejeição da reconvenção, decretamento da inadmissibilidade dos pedidos subsidiários da Autora, fixação do valor de causa, despacho saneador tabelar, identificação do objecto do litígio e enunciação dos temas da prova.

5.

Realizou-se a audiência final de discussão e julgamento em 21 de Maio e 18 de Junho de 2018.

6.

Foi proferida sentença pelo Tribunal Judicial da Comarca de Viana do Castelo, Juízo de Competência Genérica de Caminha, em 18 de Julho (fls. 135 e ss), julgando a ação improcedente, e, em consequência, mantendo válida e eficaz a declaração de resolução de 14.8.2017, por via da qual se operara a resolução do contrato de compra e venda, celebrado em 04.11.2015, entre a Autora e “BB, Lda”, entretanto declarada insolvente, “tendo por objecto mediato os seguintes bens: - Uma central de betão 750lts, de marca ... com 2 silos; - Um camião trator, matrícula nº -EI-; - Um camião trator, matrícula [nº] -OL; Um camião de 4 eixos, de matrícula [nº] -UD; - Um camião de 3 eixos, de matrícula [nº] -TH; Um semi-reboque betoneira, de matrícula [nº] P-; - Um semi-reboque basculante, de matrícula [nº] L-; - Um semi-reboque basculante, de matrícula [nº] L-; - Um semi-reboque porta máquinas, de matrícula nº L-; - Um camião, de matrícula nº TX-...; - Um camião, de matrícula nº ...-SR; - Um camião, de matrícula nº -PX-”.

7. Inconformada, a Autora interpôs recurso de apelação (fls. 143 e ss), tendo por fim a consequente revogação da sentença recorrida “no que concerne à procedência da resolução do negócio jurídico em causa, substituindo-a por outra que declare a resolução do negócio jurídico inválido e eficaz”, apresentando para esse efeito as seguintes conclusões: “i. A Autora celebrou com a ora insolvente, em 04.11.2015, contrato de compra e venda, mediante o qual lhe comprou, os bens titulados na fatura nº .... Perfazendo o valor global líquido de €36.900,00, acrescido da quantia de €8.487,00, correspondente ao IVA, à taxa legal, totalizando o montante de €45.387,00.

ii. A Autora não concorda com os fundamentos e os meios de prova utilizados para aferir a eficácia e a validade da resolução do negócio jurídico supra referido.

iii. O tribunal a quo para cada facto provado, numerado por itens, faz corresponder o meio de prova utilizado.

iv. Relativamente ao item 1, 2 e 3 importa ter em conta que a Autora não tem acesso ao processo principal através da plataforma CITIUS, pelo que não poderá apreciar este item e o meio de prova utilizado pelo tribunal a quo.

  1. Ora, todas as referências de meios de prova constantes do processo principal não poderiam ter sido valorados para a análise crítica dos factos dados como provados, porquanto não estão nos presentes autos, mas antes estão juntos aos autos do processo principal, o qual a Autora não tem acesso pela plataforma CITIUS.

    vi. Quanto ao Item 6 e 15 importa reter que a configuração das relações familiares entre as partes não servem para justificar a resolução do negócio jurídico, conforme pretende fazer o Tribunal a quo.

    vii. Em relação aos Itens 12 e 13, é de referir que o tribunal a quo aceitou uma metodologia de avaliação absolutamente generalista e abstrata, que não considerou os bens no seu estado físico e sem ter tido acesso à quilometragem dos veículos.

    viii. O tribunal a quo refere que “o resultado dessa avaliação não nos suscitou reservas, considerando quer a metodologia utilizada pelo avaliador, que tendo partido da análise dos valores de venda constantes da fatura, (…), acedeu às caraterísticas distintivas de cada um dos veículos avaliados e apurou os respetivos preços de mercado que fixou (…).” ix. Entenda-se que “características distintivas” está apenas em causa a informação constante na Conservatória do Registo Automóvel, e nada mais, como está evidenciado nestes autos.

  2. Ora, tal qual referido pelo Sr DD, os valores indicados podiam ser corrigidos após averiguação do estado físico dos veículos e quilometragem, o que não sucedeu e que não foi tido em conta pelo tribunal a quo.

    xi. Essa avaliação teve como base a “consulta ao mercado de veículos pesados e no Stand Virtual”, o que per se já é muito genérico e variável, dada a disparidade e diversidade de valores que se encontra no referido nesse site para o mesmo/idêntico bem.

    xii. Diante isto, não poderia o tribunal a quo concluir que a avaliação é ajustada, quando, os bens não foram avaliados no seu estado real.

    xiii. A avaliação dos bens, distante da realidade dos mesmos, não poderá servir como prova suficiente para desfazer um negócio jurídico.

    xiv. Certo é que das declarações que não continham certeza bastante, o tribunal a quo retirou grau de convicção bastante, indicando serem valores ajustados.

    xv. Quanto ao Item 14 saliente-se que o facto de só ter sido apreendido um bem imóvel para a Massa Insolvente não pode incitar que com o negócio cuja resolução o Sr. Administrador da Insolvência pretende, foram criados prejuízos para a Ré Massa Insolvente, diminuiu-se e frustrou-se a satisfação dos créditos dos credores.

    xvi. Assim, este facto não pode ser dado como provado, desde logo por falta de motivação do mesmo.

    xvii. A fundamentação do Tribunal a quo pecou tal qual pecou a avaliação dos bens móveis, por ausência na relevação de elementos concretos.

    xviii. Parece-nos que o Tribunal a quo também só se preocupou com valores numéricos em singelo, através de comparações entre a venda dos bens e o valor atribuído pela avaliação da JJ, mediante apreciações generalistas e não casuísticas, para concluir, como conclui, que os bens foram vendidos a preços manifestamente inferiores aos valores do mercado.

    xix. Como poderá o tribunal a quo não considerar as características concretas dos bens específicos em causa.

    xx. Não podemos olvidar que os bens em causa são de tal modo específicos que jamais poderiam ser avaliados sem um contacto com os mesmos.

    xxi. A avaliação destes bens só poderia ser válida através da visualização dos mesmos, pelo que não pode a Autora aceitar os métodos de avaliação utilizados, porque não se avaliam camiões sem se verificar o estado físico dos mesmos.

    xxii. Não poderia o tribunal a quo dar o enfâse que deu à avaliação efetuada pela JJ e, consequentemente, ter utilizado como meio de prova essencial.

    xxiii. O tribunal a quo desvalorizou um conjunto de fatores que justificaram o preço pago, nomeadamente o espaço temporal, o desgaste dos bens que justificaram avultadas despesas de reparação e manutenção suportadas pela Autora.

    xxiv. A Ré deveria ter sido convidada a aperfeiçoar a avaliação efetuado pela JJ, ou fazê-lo por iniciativa própria, pois só desta forma, tendo em conta o estado físico dos bens e a quilometragem poderíamos chegar a valores concretos e corretos.

    xxv. Só uma nova avaliação, com os valores corrigidos de acordo com o estado físico dos bens e da quilometragem poderia constituir meio de prova necessário a aferir os factos dados como provados.

    xxvi. A avaliação da JJ, bem como a Ré, não alegaram factos bastantes, nem deles fizeram prova, que pudessem revelar qualquer negócio inválido.

    xxvii. Dos depoimentos da testemunha da Ré não se retira com qualquer grau de probabilidade bastante que os bens foram vendidos à Autora por preço manifestamente abaixo dos valores de mercado.

    xxviii. Da prova produzida, ou da falta da mesma, não foi possível determinar qual foi o prejuízo causado aos credores, ou qual foi o benefício que a Massa Insolvente esperava.

    xxix. No nosso entendimento ocorreu aqui um manifesto erro de interpretação da matéria de facto pelo Tribunal a quo, já que o Tribunal deu como provados factos para os quais não tinha grau de convicção suficiente.

    xxx. O negócio jurídico cuja resolução se pretende não foi prejudicial à Massa Insolvente, tendo em conta o período temporal reportado e o estado concreto dos bens não teria sido possível vendê-los a preços superiores.

    xxxi. Mais, por influência de um conjunto de fatores preponderantes, nomeadamente, o...

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