Acórdão nº 114/10 de Tribunal Constitucional (Port, 25 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelCons. Carlos Fernandes Cadilha
Data da Resolução25 de Março de 2010
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO Nº 114/2010

Processo n.º 998/09

  1. Secção

Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha

Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

    1. recorreu para o Tribunal da Relação de Évora do despacho proferido pelo juiz de primeira instância que lhe indeferiu a reabertura da audiência nos termos do artigo 371º-A do Código de Processo Penal, para o efeito da aplicação retroactiva de lei penal mais favorável resultante da nova redacção dos artigos 50º e 58º do Código Penal, alegando que a interpretação efectuada dessa referida disposição afronta as garantias constitucionais de defesa do arguido.

    Por acórdão de 3 de Novembro de 2009, o Tribunal da Relação de Évora negou provimento ao recurso, invocando, em síntese, o seguinte:

    […]

    Assim, entendemos que não se mostra preenchido um requisito fundamental para a reabertura da audiência estabelecido no citado artigo 371º-A, do CPP, pois que, o acórdão é proferido, em sede de recurso, após a entrada em vigor de regimes legais sucessivos, tendo analisado a sucessão de leis no tempo na condenação a proferir.

    A titulo complementar adianta-se que não se vislumbra que as novas leis penais sejam mais favoráveis ao condenado, e, sejam abstractamente aplicáveis ao caso do condenado, tendo em consideração a medida concreta da pena que lhe foi aplicada pela decisão transitada em julgado. Desde logo, o crime de homicídio negligente era previsto e punido pelo artigo 137°, n.° 1, do Código Penal, com uma moldura penal máxima abstractamente aplicável não superior a três anos de prisão, manteve-se na nova redacção do Código.

    […]

    Pelos motivos e fundamentos expostos não tem qualquer fundamento a afirmação de que com a prolação do despacho recorrido foram violadas as garantias constitucionais de defesa do arguido da aplicação retroactiva, das leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido e o principio da igualdade, previstos, respectivamente, no art.° 32°, n°s. 1 e 5, no art. 29°, n.° 4, e no art. 13° da Constituição da República Portuguesa, porquanto ao arguido foi coarctado o direito de invocar a aplicação de lei posterior mais favorável (...).

    Deste acórdão recorreu A. para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, pretendendo a apreciação da conformidade constitucional da norma do artigo 371º-A do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual não é possível a reabertura da audiência, caso a decisão de recurso pendente da sentença do tribunal de 1ª instância venha a ser proferida após a entrada em vigor da lei penal mais favorável.

    Por decisão sumária de fls. 676 e seguintes, proferida ao abrigo do disposto no artigo 78º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, não se conheceu do objecto do recurso de constitucionalidade, pelos seguintes fundamentos:

    “Para que se pudesse tomar conhecimento do objecto do presente recurso, seria necessário que a decisão deste apresentasse utilidade para o recorrente, ou seja, que essa decisão fosse susceptível de influir no sentido da decisão recorrida.

    Sucede, porém, que a decisão do presente recurso nenhuma utilidade apresenta para o recorrente, pois que mesmo que este Tribunal decidisse no sentido da procedência da questão de inconstitucionalidade colocada pelo recorrente, sempre se manteria a decisão recorrida que entendeu não estarem preenchidos os pressupostos de aplicação do artigo 371º-A do Código de Processo Penal.

    Com efeito, e como resulta da leitura do texto do correspondente acórdão, o tribunal recorrido entendeu, a título complementar, que as novas leis penais que o recorrente pretendia que lhe fossem aplicadas não eram mais favoráveis ao condenado nem eram abstractamente aplicáveis ao caso do condenado, sendo que estes são também – na perspectiva do tribunal recorrido, que ao Tribunal Constitucional não compete agora sindicar – pressupostos de aplicação do regime do artigo 371º-A do Código de Processo Penal, a par do pressuposto que o recorrente censura (o da entrada em vigor de novas leis penais após a prolação de decisão transitada em julgado).

    Dito de outro modo: mesmo que o Tribunal Constitucional viesse a entender que o pressuposto que o recorrente censura assenta numa interpretação inconstitucional da norma do artigo 371º-A do Código de Processo Penal, sempre não estaria verificado outro pressuposto de aplicação deste preceito, mantendo-se, como tal, o sentido da decisão ora recorrida, que considerou não haver lugar à reabertura da audiência.

    Termos em que, por falta de interesse processual do recorrente, se não conhece do objecto do presente recurso de constitucionalidade.”.

    O recorrente vem agora reclamar a conferência, sustentando o seguinte (fls. 684 e seguintes):

    “[…]

    1. 4. Antes de mais, cumpre salientar que, nos termos do art. 371°-A do CPP, o Tribunal competente para conhecer o pedido de reabertura da audiência para aplicação de lei penal mais favorável é o Tribunal de primeira instância.

    2. Na realidade, tem sido pacífica a recente jurisprudência do STJ que se vem pronunciando sobre a aplicação do art. 371°-A do CPP, no sentido de competir ao Tribunal de 1ª instância, e não ao Tribunal de recurso, o julgamento do incidente de reabertura da audiência, v.g. ac. STJ de 30/04/2008, Proc. 4723/07 da 3ª Secção, relator Raul Borges, in www.dgsi.pt acórdãos do STJ.

    3. E, na situação dos presentes autos, a decisão do tribunal de primeira instância que indeferiu o pedido de reabertura da audiência requerido pelo ora recorrente assentou exclusivamente na interpretação formal, cuja inconstitucionalidade se invoca e constitui o objecto do presente recurso, de pretensamente faltar o primeiro pressuposto de aplicação do art. 371°-A do CPP.

    4. Isto é, como resulta do D. despacho do Tribunal de primeira instância, como a condenação do arguido no D. acórdão do Tribunal da Relação de Évora ocorreu já após a entrada em vigor do novo regime legal que pretende ver-lhe aplicado, falha o pressuposto de aplicação daquela norma consistente em a decisão que condenou o arguido ter transitado em julgado antes da entrada em vigor da lei mais favorável.

    5. Para tanto, o tribunal de primeira instância fundamenta-se numa presunção juridicamente inadmissível (e inconstitucional, conforme o recorrente sempre invocou nos autos) de a decisão que é proferida após a entrada em vigor de regimes legais sucessivos ter já em linha de conta a sucessão de leis no tempo na condenação a proferir (quer se trate de decisão proferida em primeira instância ou nas instâncias superiores), ainda que, como resulta manifestamente da fundamentação do D. acórdão do Tribunal da Relação de Évora, ser a mesma totalmente omissa quanto à aplicação do novo regime legal resultante das alterações de 2007 aos Códigos Penal e de Processo Penal.

    6. Verifica-se, assim, que a decisão do Tribunal de primeira instância sobre a reabertura da audiência que foi objecto de recurso para o Tribunal da Relação de Évora (e subsequentemente para esse Venerando Tribunal Constitucional) nunca se pronunciou sobre a questão de o novo regime penal ser ou não mais favorável, a qual serve de fundamento à decisão sumária objecto da presente reclamação de não conhecimento do presente recurso por pretensa e putativa falta de interesse processual do recorrente.

    7. Com efeito, é no D. acórdão do...

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